29/12/2011, *MK
Bhadrakumar, Indian
Punchline
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
O
evento marco de 2011, na geopolítica da segurança energética, não será o negócio
de petróleo que a China firmou na quarta-feira com o Afeganistão[1]. Na madrugada da quinta-feira,
chega a notícia de que Rússia e Turquia acertaram os ponteiros sobre o
gigantesco gasoduto South Stream, que
levará energia russa ao sul da Europa.
[2]
Ainda não se sabe
o que levou a Turquia a mudar de opinião. Terão os russos feito concessões que
os turcos consideraram interessantes? Seja como for, toda a geopolítica da
segurança energética do mundo mudou, literalmente, do dia para a noite.
Os dois eventos –
o negócio sino-afegão e o gasoduto South
Stream – estão “correlacionados”, na medida em que a China chega afinal às
reservas de energia da Ásia Central, ao mesmo tempo em que a Rússia olha para o
ocidente e fortalece seu status de potência fornecedora de energia para a
Europa.
De
fato, nem as incertezas da segurança regional na Ásia Central impedem que a
China ponha dinheiro sobre a mesa e busque novos métodos, criativos, para
construir situações de “ganha-ganha” [3]. Nem, simultaneamente, os
percalços no relacionamento com o ocidente (e, particularmente, o “reset” com os
EUA) tiram um átomo do entusiasmo dos russos, que buscam ligar-se, por laços
firmes, aos europeus afluentes. (...) Nem o tempo nem as marés esperam pelos
retardatários.
O que a Rússia
está fazendo é instalar firmemente, anel após anel, os seus elos de engajamento
com Alemanha, Itália e França, de tal modo que se tornem “acionistas” na
integração dos russos à Europa. Assim, passarão a ter de dar atenção às
sensibilidades russas, em questões controversas, como a expansão da OTAN ou a
instalação do sistema de mísseis balísticos de defesa dos EUA – projeto no qual
Washington tanto se empenha, e não por motivos de defesa.
O gasoduto South Stream sempre foi menina-dos-olhos
de Vladimir Putin, e torna-se agora seu legado histórico à política externa
russa. Não faltaram detratores, mas Putin insistiu sempre, muitas vezes contra
todas as probabilidades. Com o outro gasoduto, o Nord Stream (também legado de Putin) já
contratado há poucos meses, o South
Stream integra ainda mais a Rússia e os mercados europeus de energia, e dá
força a Moscou, que busca ganhar espaço no altamente lucrativo mercado de venda
a varejo nos países europeus.
Em
resumo, a integração doravante só aumentará. 2012 verá como a diplomacia do
gasoduto fará aumentar a cooperação necessária para o desenvolvimento do
fantástico campo de gás natural que os russos têm em Shtokman.[4]
A China observará
tudo muito atentamente. 2012 será também o ano do ápice da cooperação energética
Russia-China, assumindo-se que chegue a bom termo o negócio de trilhões de
dólares de gás, que enfrenta dificuldades, hoje, na fixação dos preços. Putin
também se envolveu pessoalmente nesse projeto.
Não
há dúvida alguma que Moscou derrotou a diplomacia dos EUA, nas questões de
energia do Mar Cáspio.[5] O gasoduto South Stream, que a Rússia quer ter em
pleno funcionamento em 2015, também desloca, em importância, o projeto rival
Nabucco, que os EUA apóiam. A interdependência entre a Europa ocidental e a
Rússia, no campo da segurança energética, é vista com extrema preocupação em
Washington, porque trabalha contra a estratégia norte-americana para “conter” a
Rússia e debilita a liderança trans-Atlântica dos EUA. Está em curso uma dura
batalha de ambições entre EUA e Rússia, ambos tentando ganhar acesso às reservas
de gás no Turcomenistão e no Azerbaijão.
O gasoduto South Stream reduz fortemente a
dependência russa da Ucrânia, como país de passagem para o gás exportado para a
Europa. O quê, por sua vez, altera a equação Rússia-Ucrânia.
Kiev
pode escolher: ou se une à União Aduaneira de Moscou e obtém dos russos melhores
preços pela energia, ou paga preços de mercado. Evidentemente, se a Ucrânia
unir-se “ao lar eurasiano comum”, com Rússia, Cazaquistão e Bielorrúsia, Moscou
terá deixado para trás o colapso da União Soviética – que muitos importantes
líderes russos, como Evgeny Primakov[6], ainda entendem que nunca foi tão
inevitável quanto tem sido pintado.
Não
há dúvida de que a possibilidade de Putin voltar ao Kremlin desestabiliza o
pessoal em Washington.
Notas dos tradutores
[1] 28/12/2011,
People Daily, Pequim, “Afghanistan ,
China sign agreement on oil
extraction” (em
ingles).
[2] 28/12/2011, Reuters Africa, “UPDATE
2 – Turkey ,
Russia reach South Stream gas
deal” (em ingles).
[5] 9/9/2011, MK Bhadrakumar, Asia Times Online, “Putin's European
goal no longer a pipe dream” (em ingles).
[6] 26/12/2011,
Russia Today, “Soviet collapse
more costly than WWII – Primakov” (em inglês)
*MK Bhadrakumar foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre
temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais
The
Hindu,
Asia
Online
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