6/8/2010
Noah Shachtman, Blog “Danger Room", revista Wired – Traduzido por
Todos os civis, todos os espiões estrangeiros, todos os Talibãs e todos os terroristas podem visitar a página WikiLeaks e baixar informações detalhadas sobre onde estavam, o que faziam os soldados dos EUA, como o fizeram e o que fizeram e não fizeram na Guerra do Afeganistão de
Ouviram um grito lancinante? É o bom-senso sendo espancado, berrando de dor.
Tempo houve, há apenas poucos meses,
A Marinha acaba de distribuir memorando aos fuzileiros e empregados civis, no qual se lê:
“Acesso voluntário e deliberado à página WIKILEAKS para o propósito de ver o material secreto lá postado implica procedimento não autorizado de processar, ver e baixar informação secreta em computador NÃO-AUTORIZADO e não aprovado para armazenar informação secreta. [Quem o faça] estará VOLUNTARIAMENTE cometendo VIOLAÇÃO DE SEGURANÇA.”
Outros ramos das Forças Armadas divulgaram memorandos de teor semelhante. O Washington Times foi o primeiro a noticiar a proibição. Mas a matéria já foi retirada do website do jornal.
Sumit Agarwal, ex-gerente da Google e atualmente empregado na função de czar dos contatos com a mídia no Departamento de Defesa, explicou a lógica do Pentágono em e-mail enviado a esse “Danger Room”.
“Penso na coisa como se se tratasse de MP3s ou de romance com copyrighs para distribuição online — a distribuição não apaga o que digam as leis sobre o uso daqueles materiais” – escreveu ele. “Se Avatar aparecesse disponível online, seria legal que todos baixassem o filme? Na prática, muitas pessoas baixariam. Mas também na prática, é muito provável que James Cameron processasse as páginas e as pessoas que estivessem distribuindo ou facilitando a distribuição. Mas mesmo que não processasse ninguém, ainda assim seria distribuição ilegal e seria ilegal tornar Avatar disponível, mesmo que num desses websites tipo torrent, ou equivalentes.”
“Com pequenas modificações quanto ao que seja legal/ilegal, entre material secreto e filme protegido por copyrights, a analogia é boa, não lhe parece?” – pergunta Argawal. “Uma pessoa que distribua o que é proibido distribuir não muda a lei sobre material secreto. Nossa posição é simples: os soldados e agentes civis que trabalham para o exército não podem usar computadores do governo para fazer algo que é completamente ilegal (tráfico de material secreto).”
No mínimo, a analogia é imperfeita. Cameron ainda poderá argumentar que cada cópia pirata de Avatar diminui o público interessado em comprar as versões legais (embora já se saiba que acontece exatamente o contrário). Mas proibir os soldados de ler os arquivos de guerra publicados na página WikiLeaks de modo algum prejudicará as expectativas de lucro, nem ensinará “o público” a mais piratear filmes do que a desejar pagar por eles. A analogia só estaria correta, se Cameron resolvesse proibir que toda a equipe do filme assistisse a Avatar — fosse onde fosse, depois de o filme ter sido pirateado, e exclusivamente porque tivesse sido pirateado.
Ao mesmo tempo, o secretário de imprensa do Pentágono Geoff Morrell exigiu, semana passada, que WikiLeaks “entregue todas as versões de todos os documentos do governo dos EUA e as delete permanentemente de seu website, computadores e registros”.
E imediatamente acrescentou: “Não sei se todos confiamos muito em que eles mudarão substancialmente de posição. Até agora não deram qualquer sinal de perceber a gravidade, a seriedade da situação que causaram, as vidas que puseram em risco, as operações que podem ter obrigado a abortar, as pessoas inocentes cujas vidas puseram em risco, como resultado do que fizeram. Portanto, duvido que isso – esse pedido, essa exigência, só ela, os preocupe muito”.
Todos os oficiais militares – e muitos dos alistados – tem um credencial básica, de acesso a documentos “secretos”. São centenas de milhares de fontes potenciais para WikiLeaks. Em minha opinião, a única explicação plausível para a ordem do Pentágono é lembrar os soldados de que não devem vazar segredos.
A questão, portanto, é: “Será que a obediência a regulamentos militares que não fazem qualquer sentido e que espancam o bom senso estimularia algum soldado a respeitar a política de sigilo do Pentágono – ou só serve para tornar ainda mais absurdo o regime dos segredos?
Atualização: “Tirem a palavra “wikileaks’ de circulação” – diz mensagem por e-mail de uma das empresas contratadas pelo Exército, a esse blog Danger Room. Os filtros foram atualizados para bloquear qualquer coisa que contenha “wikileaks” na URL [1].”
“Oh, yeah, agora, jogaram o bom senso pela janela” – conclui o empresário.
Nota de Rodapé:
[1] Uniform Resource Locator, em português Localizador-Padrão de Recursos. URL é um endereço virtual. Não é rua, nem CEP, nem bairro ou tampouco uma imagem do Google Maps. Um endereço virtual é um caminho que indica onde está um arquivo, uma máquina, uma página, um site, uma pasta. Simplificando ainda mais, URL é normalmente o "link", o endereço de uma página ou conteúdo da página ver definições aqui.
A postagem original, em inglês, pode ser lida em: Pentagon to Troops: Taliban Can Read WikiLeaks, You Can’t