Centro de Torturas de Guantánamo |
30/5/2013, The Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Aos
médicos militares da Base Naval, Baía de Guantánamo
Senhores
médicos:
Não
quero morrer, mas estou preparado para o risco de vir a morrer, porque estou em
ato de protesto contra o fato de permanecer preso por mais de uma década, sem
julgamento, submetido a tratamento desumano e degradante, sem acesso à justiça.
Não
tenho outro meio para fazer ouvir essa mensagem. Os médicos sabem que as
autoridades tiraram de mim todos os meios e objetos pelos quais pudesse me
comunicar.
Por
essa razão, respeitosamente peço que me seja garantida a assistência por
profissionais médicos independentes, que sejam autorizados a entrar em
Guantánamo para me tratar, e que lhes seja dado pleno acesso aos meus registros
médicos, para que possam determinar o melhor tratamento para o meu caso.
Os
senhores médicos militares aos quais tenho acesso dizem que cumprem seu dever
médico de preservar minha vida. Essa atitude vai de encontro ao meu desejo
expresso de não me alimentar.
Como
os senhores devem saber, sou competente para tomar decisão própria sobre
tratamento médico para mim mesmo. Quando tento recusar o tratamento que os
senhores trazem, os senhores o impõem, às vezes com violência. Por essas razões,
não tenho dúvidas de que os senhores violam o compromisso ético profissional,
como a Associação Médica Norte-Americana e a Associação Médica Mundial já
declararam bem explicitamente.
Minha
decisão de fazer greve de fome e de manter-me em estado de subnutrição por mais
de cem dias não foi tomada levianamente. Faço o que faço, porque não encontrei
outro meio para chamar a atenção do mundo exterior para o que acontece aqui. A
resposta que os senhores médicos dão à minha decisão cuidadosamente refletida
não permite que se conclua, logicamente, que os senhores estejam tentando salvar
a minha vida. Nenhuma de suas ações ao longo já de vários meses comprova essa
inferência.
Para
aqueles de nós que têm sido alimentados contra nossa vontade, o processo de ter
um tubo repetidas vezes forçado para dentro de nossas narinas ou pela garganta
até o estômago, para que assim sejamos mantidos em estado de seminutrição, é
extremamente doloroso, e as condições sob as quais se executam esses
procedimentos é abusiva. Se os senhores realmente tivessem em vista meus
melhores interesses, de receber tratamento médico realmente recomendado, seria
indispensável que tivessem falado comigo como ser humano, sobre minhas escolhas
e decisões, em vez de me impor tratamento, de modo tal que se sinto como se
estivesse sendo castigado por alguma coisa.
Os
senhores devem saber que os excessos que têm cometido relacionados à minha
participação no movimento coletivo de greve de fome de vários outros
prisioneiros já foram condenados por mais de uma alta autoridade, dentre as a
ONU. O Relator Especial da ONU para Assuntos de Saúde declarou, inequivocamente
que “o pessoal médico não pode exercer pressão indevida de qualquer tipo sobre
indivíduos que tenham recorrido ao recurso extremo de uma greve de fome, nem é
aceitável que usem ameaças de alimentação forçada ou outros tipos de coerção
física ou psicológica contra indivíduos que voluntariamente decidam-se por uma
greve de fome”.
Seja
como for, não posso confiar no que os senhores digam ou façam, sobre minha
saúde, porque os senhores devem obediência aos seus superiores militares que
exigem que os senhores me imponham qualquer meio inaceitável para mim, e os
senhores põem o dever de obedecer aos militares seus superiores acima dos
deveres de médico que têm para comigo. Esse tipo de dupla fidelidade impede
completamente que eu confie nos senhores.
Por
essas razões, a relação médico-paciente que se criou entre nós absolutamente não
pode contribuir para diminuir os riscos que essa greve de fome gere para minha
saúde. Os senhores talvez sejam capazes de manter-me vivo por longo tempo, em
estado de debilitação extrema. Mas aqui, com tantos prisioneiros, como eu,
também em greve de fome, os senhores estão, isso sim, conduzindo um experimento,
um tratamento experimental, em escala jamais vista. E nada garante que não
ocorra erro humano, que resulte na morte de um ou mais de um de nós, não por
greve de fome, mas por culpa ativa ou erro dos médicos que nos estão sendo
impostos.
Seus
superiores, incluindo o presidente Obama, comandante-em-chefe dos seus
superiores, reconhecem que minha morte ou de qualquer outro prisioneiro em greve
de fome geraria consequências graves e indesejáveis para eles. Os senhores,
médicos, receberam portanto ordens para garantir – com certeza absoluta – minha
sobrevivência, uma ordem que nem os senhores nem qualquer médico poderá jamais
aceitar, porque não pode garantir, com certeza, que possa cumpri-la.
A
posição impossível em que estão os médicos de Guantánamo hoje me inspira alguma
simpatia. Quer continuem como militares, quer retornem à vida civil, os senhores
terão de sobreviver com a consciência do que fizeram e não fizeram aqui em
Guantánamo, até o dia de morrerem. Mas se se opuserem às ordens absurdas, os
senhores conseguirão fazer alguma diferença. Os senhores podem escolher parar de
contribuir ativamente para manter a condição de permanente abuso às quais estou
hoje exposto.
Peço
apenas que levem aos seus superiores meu pedido urgente para que eu seja
submetido a exame médico por médico ou médicos independentes, a serem escolhidos
por meus advogados, nos quais eu confie, e que esses médicos recebam todas as
notações médicas com as quais os senhores trabalham aqui, para que as estudem
antes de me examinarem. É o mínimo que os senhores podem fazer, para manter,
minimamente, a palavra que empenharam quando juraram “não causar dano” a ninguém
de quem os senhores se aproximem, como médicos.
Atenciosamente,
[assinam]
Os prisioneiros em greve de fome na Base Naval, Baía de Guantánamo
[seguem-se
as assinaturas dos prisioneiros identificados pelos nomes e por um número; dos
advogados que representam os prisioneiros, como testemunhas; e de representantes
do Conselho de Defesa de Guantánamo]
(Prisioneiros)
|
(Advogados,
em nome de seus representados)
|
(Advogados
Defensores, em Guantánamo)
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Younous Chekkouri, ISN 197 |
Joseph K. Hetrick
abogado
de:
|
Charles H. Carpenter
Carpenter Law Firm plc
|
Nabil
Hadjarab, ISN 238
|
Abdul
Haq Wasiq, ISN 004
Mohammad
Nabi Omari, ISN 832
|
David H. Remes
Appeal for Justice
|
Shaker Aamer, ISN 239
Ahmed Belbacha, ISN 290
Abu Wa’el Dhiab, ISN 722
Samir Mukbel, ISN 043
|
Michael Rapkin
Scott Rapkin
Steve Truitt
Law Offices of Michael Rapkin
Abogados de:
Mohammed
Ghanem, ISN 044
|
Carlos
Warner
Defensor
Público Federal Adjunto
Distrito
Norte de Ohio
|
Adel al-Hakeemy, ISN 168
Sanad al-Kazimi, ISN 1453
Mohammed
Hidar, ISN 498
|
Thomas Anthony Durkin
Janis D. Roberts
Durkin
& Roberts
Abogados
de:
Abdullatif
Nasser, ISN 244
|
Buz Eisenberg, Weinberg & Garber
Jerry Cohen, Burns and Levinson LLP
Martha Rayner
Fordham University School of Law
Abogados
de:
Sanad
al-Kazimi, ISN 1453
|
|
Peter B. Ellis & Kiran Ghia
Foley Hoag LLP, Boston
Abogados
de:
Mohammed
Ghanem, ISN 498
|
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