25/6/2013, Robert
Parry, Consortium News
“Supreme
Court’s War on Democracy”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Comentário
do Zeca Aribú, açougueiro da Vila Vudu:
O site Workers World publica
hoje matéria de um norte-americano que milita no PSOL-RJ, intitulado “Surprise
upsurge shakes Brazil” – e só diz besteiras psolistas “jovens”. (só pra
saberem. Não vale a pena traduzir, porque o PSOL e a rede Globo promovem os
mesmos “eventos”, praticamente nos mesmos termos).
No
mesmo dia, a rede Consortium News publica matéria sobre outro evento que,
por vias mais complexas e muito mais interessantes, tem muito mais a ver com a
realidade do capitalismo à moda ocidental -- racista! -- vale dizer, já
estabelecido firmemente dentro da Suprema Corte de Justiça – nos EUA, como no
Brasil, embora com traços diferentes.
Ontem,
nos EUA, a Suprema Corte aprovou uma lei que dá aos estados o poder para
definirem exigências locais para que cidadãos possam votar. Parece pouco. Mas é
lei extraordinariamente regressista. A nova lei “libera” estados quase
inacreditavelmente racistas – e o racismo tem história funda e longa nos EUA – a
legislar como lhe apraza para DIFICULTAR o acesso de negros e mestiços às
eleições, o que os estados mais racistas JÁ SE PREPARAM PARA FAZER.
O
PSOL, esqueçam. O artigo (“link” acima) que WW publica diz quase
exatamente a mesma coisa que disse a “jornalista” Ana Maria Brega, hoje, em “Mais você”,
pela TV Globo.
A
pergunta que não quer calar é: O STF-EUA é racista e odeia negros e hispânicos.
Isso já entendi. MAS...
por que, diabos, tooooda a direita brasileira, até o extremo fascismo mais ativo
e todo o STF-Br, assim como a Ana Maria Brega ... ODEIAM A PEC
37?!
Aí
vai o artigo de Consortium News, traduzido:
Robert Parry |
A
maioria de extrema direita na Suprema Corte dos EUA age como assassina serial da
democracia nos EUA. Primeiro foi “Bush vs. Gore”; depois, os “Cidadãos Unidos”;
agora, estriparam a Lei dos Direitos de Votar [orig. Voting Rights Act] –
mas parte significativa da mesma história criminosa leva a marca do suprematismo
branco – escreve Robert Parry.
Seja
qual for o palavreado ou a torturada lógica “de lei” que se aplique, a feia
verdade é que a maioria de extrema direita que domina hoje a Suprema Corte dos
EUA está em guerra contra a democracia norte-americana. Ou, dito de outro modo:
aqueles juízes [no Brasil, não se sabe por quê, os juízes da Suprema Corte
brasileira, o STF, são chamados “ministros”] entendem que ninguém estaria
obrigado a respeitar decisão democrática, no caso de ser decisão tomada por
maioria de votos de negros e mulatos.
Os
cinco juízes Republicanos que hoje votam na Corte Suprema dos EUA sabem
perfeitamente que estados que têm macabra história documentada de legislação
racista, premiados com o fim das garantias antes vigentes de igualdade para
todos, rapidamente cuidarão de impor mudanças nas leis eleitorais estaduais,
para dificultar o mais possível o voto de negros, mulatos, hispânicos. Os mesmos
cinco juízes também sabiam que, em 2010, ao dar ganho de causa ao movimento
“Cidadãos Unidos” [orig. Citizens United] estavam abrindo as comportas
para que conhecidos super bilionários de extrema direita inundassem de dólares
as campanhas políticas e a imprensa-empresa, veiculando propaganda de
mistificação.
John Roberts - Chefe da Justiça nos EUA |
O cenário para esse ataque
jurídico-assassino contra a democracia nos EUA já estava construído, quando a
Corte [presidida pelo juiz] Roberts, já antes da Corte [presidida pelo juiz]
Rehnquist, agiu para suspender a contagem de votos na Flórida, e, de fato, impôs
George W. Bush na Casa Branca – apesar de derrotado no voto popular nacional e
também derrotado no estado “indeciso” da Florida pelo Democrata Al Gore, se a
contagem física de votos fosse levada a término, como ordenava a lei estadual.
(Todos os detalhes em meu livro Neck
Deep [Afundados até o pescoço]. [1])
O caso Bush vs. Gore foi o primeiro indicador claro de que a moderna Direita
Republicana estava decidida a usar a Suprema Corte como arma para renegar a
democracia e assegurar que os Republicanos continuassem a controlar o governo
dos EUA. A direita, naquele momento, já estava decidida a manter o próprio
poder; e a usar, para tanto, quase qualquer meio possível.
Por
mais que a presidência de Bush tenha sido um desastre para os EUA e para o
mundo, foi maná caído do céu para a maioria da Corte Suprema, de direita. Bush
conseguiu substituir dois juízes que não ajudaram na sua “eleição” – William
Rehnquist e Sandra Day O’Connor – por extremistas de direita: John Roberts e
Samuel Alito.
Os
dois indicados por Bush empurraram a Corte Suprema ainda mais para a direita e
deram aos Republicanos a esperança de conseguir conter a onda crescente de
mudanças demográficas pela qual passam os EUA e que se refletiram na eleição de
Barack Obama em 2008 – o primeiro presidente afro-americano da história dos EUA.
Com a nova composição, a Corte Suprema dos EUA tinha meios reais para (re)impor
o poder branco.
O
caso dos “Cidadãos Unidos” de 2010 foi o golpe seguinte, cujo autor foi a Corte
[presidida pelo juiz] Roberts, no “STF” dos EUA: tornou legal o gasto de
“dinheiro obscuro” [de fonte não declarada] para a propaganda eleitoral
(veiculada sempre pela imprensa-empresa, televisões e jornais) nos EUA. Aquela
avalanche de dinheiro da direita – combinada com a crescente frustração entre os
eleitores, ao final dos dois primeiros anos da presidência de Obama – ajudou a
eleger as maiorias Republicanas mais sordidamente direitistas que os EUA jamais
viram na Câmara de Deputados e nas Assembleias estaduais por todo o país.
Suprema Corte dos EUA em 2013 |
Dado
que 2010 foi ano de censo, os Republicanos estavam exatamente onde desejavam
estar para tomar muitas e muitas cadeiras no Congresso e usá-las para concentrar
os votos Democratas e da esquerda em alguns poucos distritos isolados, montando
maiorias conservadoras sólidas em outros distritos cuidadosamente traçados no
mapa. (A redistribuição de eleitores em novos distritos eleitorais traçados “a
dedo” garantiu que continuasse a haver maioria Republicana na Câmara de
Representantes, apesar de os candidatos Democratas terem tido mais de um milhões
de votos, que os Republicanos, em todo o país, em 2012).
Suprimindo
eleitores
O resultado da eleição de 2010
também capacitou as câmaras de deputados estaduais controladas por Republicanos
para que começassem a coordenar estratégias para suprimir votos de negros,
hispânicos, jovens e pobres – vistos como eleitores predominantemente
Democratas. Foi quando, por todo o país começaram as surgir leis que obrigavam a
exibir documento com foto, aumentaram-se os requisitos a ser cumpridos pelos
candidatos e reduziu-se o tempo funcionamento das sessões eleitorais. [2]
Mas
esse plano não levou a todos os resultados que a direita esperava obter, porque
ainda encontrou o obstáculo da Lei dos Direitos do Eleitor, sobretudo nos
estados “Confederados”, como o Texas, onde a lei geral continuou a amparar o
eleitor. Servindo-se dela, o Departamento de Justiça conseguiu coibir inúmeros
efeitos das tentativas para dificultar a ida do eleitor às urnas. E as minorias,
em 2012, ainda asseguraram votos chaves para a reeleição de Obama.
Assim
sendo, a Lei dos Direitos do Eleitor, de 1965 (confirmada pelo Congresso em
2006), passou a ser o alvo prioritário da Suprema Corte dos EUA, presidida pelo
Juiz Roberts.
Em decisão histórica, ontem,
3ª-feira, 25/6/2013, os cinco juízes de extrema direita que operam na Suprema
Corte dos EUA – Roberts, Alito, Antonin Scalia, Anthony Kennedy e Clarence
Thomas – estriparam, esquartejaram a Lei dos Direitos do Eleitor. [3]
Os cinco juízes nem se preocuparam
com apresentar qualquer argumento lógico ou de Direito Constitucional. O único
“argumento” apresentado foram mapas demográficos mostrando que os eleitores
negros concentravam-se em áreas que a Lei dos Direitos do Eleitor protegia e
que, nessas áreas, o percentual de eleitores negros era, em geral, equivalente,
e às vezes superior, ao percentual de eleitores brancos. Assim sendo... brancos
e negros não estariam sendo tratados como iguais perante a lei... A lei, pois,
seria antidemocrática... porque protegia eleitores negros contra eleitores
brancos...
[4]
Ruth Bader Ginsburg |
Mas
a verdade é que a lei estava funcionando na direção de proteger minorias. E a
nova lei nada faz na direção de impedir que voltem a ser implementados os mesmos
velhos truques usados antes contra as minorias, contra os quais a lei se fez.
Como disse a juíza Ruth Bader Ginsburg, contra a modificação, ninguém apresentou
qualquer argumento a favor de a Suprema Corte atropelar decisão do Congresso,
reafirmada há apenas sete anos.
Excluir
da lei a exigência de nada modificar sem autorização, em lei vigente que está
tendo sucesso no objetivo visado, é como jogar fora o guarda-chuva, sob uma
tempestade, porque, com ele aberto, você está conseguindo não se
molhar
– escreveu Ginsburg.
Não
há qualquer dúvida de que a Constituição dá ao Congresso poder explícito para
aprovar leis que protejam o direito de votar dos negros nos EUA. A 15ª Emenda
diz que:
O
direito de votar dos cidadãos dos EUA não será negado nem reduzido pelos EUA nem
por qualquer dos estados, por motivos de raça, cor, ou condição preexistente de
escravidão.
E
acrescenta:
O
Congresso terá poder para fazer valer esse artigo mediante a legislação
adequada.
Essa
emenda teve de ser ratificada em 1870 durante a Reconstrução, o que implica
dizer que muitos brancos nos estados do sul e em outros distritos racistas
jamais a aceitaram como legítima. Com o fim da Reconstrução, em 1877, os brancos
da Velha Confederação trataram de reafirmar o controle político e usaram táticas
as mais variadas para impedir que muitos negros votassem.
Só
em 1960, com o Movimento dos Direitos Civis, o governo federal reafirmou sua
decisão de garantir justiça também aos afro-norte-americanos, inclusive o
direito de votar: foi quando foi aprovada a Lei dos Direitos de Votar, de 1965.
Porque o Partido Democrata nacional muito se empenhou para divulgar essas
mudanças e fazer aprovar a nova legislação, muitos brancos, nos estados do sul,
filiaram-se ao Partido Republicano.
Esse
“recrudescimento” na organização das elites brancas deu impulso à eleição de
Richard Nixon, depois, de Ronald Reagan, e de George H.W. Bush – todos esses
apelaram aos eleitores brancos, em campanha carregada de slogans racistas, embora construídos
em linguagem
cifrada. A estratégia Republicana incluiu meter juízes racistas
na Suprema Corte, sempre atentos ao projeto de fazer retroceder os ganhos dos
anos 1960s no campo dos direitos civis.
Para
que seus clamores racistas soassem menos ofensivos, a direita começou a
apresentar-se como aderida à mitologia fundacional dos EUA, com renovados apelos
aos “direitos dos estados”, numa narrativa histórica inventada segundo a qual os
principais “Modeladores da Constituição” [orig. Framers of the
Constitution] – gente como George Washington e James Madison – desprezariam
a ideia de qualquer governo central forte. A verdade é quase o perfeito oposto
disso.
“Reposicionar a marca” dos
racistas
O que a direita estava fazendo com
sua história-simulacro era abrir caminho para que neoconfederados neoliberais se
“reposicionassem” (como marca, no mercado): dos declarados apelos ao racismo
simbolizados pela bandeira Stars and Bars, [5]
substituída pela bandeira da Guerra Revolucionária, com uma cobra enrolada e o
motto “Não mexa comigo”. [6] Mas,
apesar das imagens de apelo mais popular de 1776 para 1860, a filosofia “de fundo”
era o mesmo racismo.
Essa
transformação cosmética da direita norte-americana – das alusões cruas à Velha
Confederação às referências mais palatáveis à Guerra Revolucionária – apareceu
mais visível depois da eleição de Barack Obama em 2008. A direita reconheceu que as
mudanças na demografia que haviam possibilitado a eleição de um negro já
ameaçavam frontalmente a sobrevivência da supremacia dos brancos.
Assim,
o movimento Tea Party – invocando o
mito fundador que a direita cuidadosamente reinventara – organizou-se para
“retomar para nós o nosso país” [orig. take our country back], ajudada
pelo financiamento massivo que lhe vinha dos irmãos Koch e de outros bilionários
da extrema direita.
A
atual mensagem da direita norte-americana continua ocultada numa embalagem que
leva estampada a palavra “liberdade” – no sentido em que a palavra era usada por
proprietários de escravos e pelos Confederados durante a Guerra Civil. Toda a
mensagem da direita nos EUA visa exclusivamente a promover a “liberdade” dos
brancos norte-americanos, para voltarem a reinar sobre – e manter sob rédea
curta – os norte-americanos não brancos.
Não
está claro sequer se muitos norte-americanos brancos de direita aceitam ou não
que negros e outros não brancos merecem plena cidadania, posição que muitos no
Tea Party parecem partilhar com seus
‘líderes’ – proprietários de escravos “Fundadores”, vários grupos no sul de
antes da Guerra Civil, os Confederados e a Ku Klux Klan.
Esse
sentimento estava no coração das leis Jim Crow durante a segregação no sul, que
negava direitos de cidadania aos negros, apesar do que determinam as 14ª e 15ª
emendas; é visível também na persistência com que a direita negou direitos de
votar a moradores do District of
Columbia, muitos dos quais são negros e enfrentam “taxação sem
representação”; é visível ainda na obsessão com que a direita mantém-se agarrada
à teoria conspiracionista segundo a qual Obama teria nascido no Quênia; e
incendeia a oposição Republicana que impede absolutamente qualquer reforma da
imigração, porque abre a possibilidade de cerca de 11 milhões de imigrantes sem
documentos – a maioria dos quais são hispânicos – receberem direitos de
cidadania.
É
esse medo de real democracia – com a promessa genuína de “uma pessoa, um voto” –
que levou a maioria de direita que hoje comanda a Suprema Corte dos EUA a dar
mais esse presente ao neoconfederados dos EUA, para inverter a tendência de os
eleitores construírem, nas urnas, uma crescente consciência de igualdade racial
no país.
Se
a era dos direitos civis começou nos anos 1960s como uma espécie de Segunda
Reconstrução – metendo justiça e decência guela abaixo até dos brancos sulistas
mais racistas –, então não parece haver dúvidas de que a decisão dos juízes
Roberts, Scalia, Kennedy, Thomas e Alito do Supremo Tribunal Federal (STF!) dos
EUA equivale a pautar, em 2013, o início de uma nova era do mais repugnante
racismo legal nos EUA.
Depois
que a Lei dos Direitos de Votar foi estripada na 3ª-feira, velhos operadores dos
Velhos Confederados esfregaram as mãos de júbilo, já calculando quantos votos de
eleitores negros e mulatos poderão subtrair nas próximas eleições, para engordar
o número de Republicanos brancos no Congresso.
Com
a decisão de hoje, a lei que obriga o eleitor a exibir a Cédula de Identidade
com foto entra em vigor imediatamente. E
podem-se usar mapas de novos distritos eleitorais, aprovados em Assembleias
estaduais, sem ter de esperar aprovação do governo federal,
disse Greg Abbott, do Ministério Público do Texas
Notas de
rodapé
[1] Em Consortium
News Books
[2] Nos EUA, as eleições nem sempre
são aos domingos e há zonas eleitorais que só funcionam em horário comercial, o
que torna impossível o voto para muitos trabalhadores [NTs].
[3]Ontem, a Suprema Corte introduziu
duas
modificações na Lei dos Direitos do Eleitor: [NTs].
(1) excluiu o
artigo que tornava a lei obrigatória em todos os estados. Agora, o Congresso
terá de reescrever a fórmula demográfica segundo a qual a lei se aplicará,
estado a estado (tarefa que os especialistas consideram impossível; assim, sem
nova fórmula, as garantias que a lei assegurava aos eleitores ficaram, de fato,
suspensas); e
(2) excluiu o
artigo, da seção 4 da Lei, que obrigava todos os distritos e estados a respeitar
a Lei “nacional”, impedindo-os de introduzir mudanças locais sem prévia
aprovação do Departamento de Justiça; as mudanças – todas e quaisquer – foram,
na prática, liberadas. Para entender isso, é preciso ter em mente que a lei,
antes, visava a proteger minorias étnicas e raciais; essa proteção foi retirada.
[4] É exatamente
o mesmo argumento que o PSDB apresentou, no Brasil-2012-13, para votar contra a
Lei de Quotas para Pobres: disseram que criar quotas mínimas a serem preenchidas
por pobres seria proteger os pobres e não proteger igualmente os ricos; que se
se reservassem quotas para negros, a lei seria racista, porque estaria vendo
diferenças entre brancos e negros... Esse é EXATAMENTE o mesmo argumento que o
Magnolli vive a repetir no jornal O Estado de S.Paulo e na tela da rede Globo.
[NTs]
[5]Lit.
“Estrelas e barras”. A primeira
bandeira dos EUA, dos Confederados. [NTs]
[6] Vê-se em: “Gadsden Flag History” (em
inglês).
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