26/7/2011, *MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu
Visitas de alto nível são banquete para os analistas. São ocasiões raras em que se pode, de pleno direito, conjecturar, como Madhuri Dixit, “O que haverá por baixo dessa blusa [camisa ou farda]?”[1] A visita da secretária de Estado Hillary Clinton à Índia não foi exceção.
Na preparação para a visita, o secretário-assistente Robert Blake passou rapidamente por West Bengal e sugeriu que a cidade de Kolkatta [ex-Calcutá] fosse incluída no itinerário de Clinton. Sabe-se lá por quê, o departamento de Estado em Washington não tinha dúvidas de que Clinton faria estrondoso sucesso em Kolkatta, a cidade que enterrou o comunismo[2]. A expectativa dos EUA parece ser converter West Bengal em alguma espécie de “campo base”, no volátil leste da Índia, próxima da fronteira chinesa. Mas, ao que parece, Delhi já tinha outros planos.
Do ponto de vista de Delhi, o controle sobre a política exterior sempre foi prerrogativa, apaixonadamente defendida, do Bloco Sul. Além do mais, a locomotiva das relações entre Índia e EUA tem de ser conduzida com mão prudente, não como trem-bala. Assim sendo, o Bloco Sul propôs que Clinton visitasse Chennai, como destino alternativo. E os americanos tiveram de fazer seu caldo, com Chennai.
Clinton colheu a oportunidade para embarcar em discussão profunda com a ministra-chefe Jayalalithaa, sobre a situação no Sri Lanka. As duas senhoras elevaram, elevaram, elevaram a importância da diplomacia, tanto, tanto, até lançá-la às nuvens, depois à estratosfera, onde virou pó. Então, puseram-se ambas a espancar Colombo, por admitir crimes tão horríveis. Clinton, em seguida, pronunciou o famoso discurso sobre o glorioso destino da Índia como potência asiática re-emergente – espécie de cutucão, nos tímidos líderes indianos, para que se ergam contra o crescimento da China.
Clinton é político(a) experiente e diplomata consumada, que conhece um pouco sobre “indianos” e sabe de sua timidez congênita, da dificuldade genética para serem “assertivos”.
De fato, ela sabia que estava ultrapassando a linha “diplomática”, ao requerer que a Índia seja a Mahima Chaudhry [3] dá Ásia, porque a Índia não é um bando de arrivistas, recém-chegados à política mundial, que não saberiam que as nações asiáticas são orgulhosíssimas. Imaginem que o ministro das Relações Exteriores da Índia desembarque um dia, em pleno verão, no Alasca, em busca de Sarah Palin, para discutirem o que há de errado com a folha corrida de direitos humanos da Rússia no norte do Cáucaso – e, depois, pronuncie discurso no salão de cerimônias da prefeitura de Juneau, para dar conselhos que ninguém lhe pediu sobre como os EUA devem reconciliar-se com seu destino de ex-potência, hoje declinante.
Felizmente, só o primeiro-ministro do Paquistão Yousuf Gilani levou a sério a conversa de Clinton. Pequim e Colombo simplesmente a ignoraram. Adiante, sem precipitação, o Bloco Sul manifestou-se a caráter, para acertar as coisas, que parecem estar tomando rumo exatamente oposto ao que Clinton imagina: Delhi e Pequim já estão em processo de consultas bilaterais sobre segurança e desenvolvimento da Ásia. Washington parece ter sido excluída do circuito.
Notas dos Tradutores ;
Notas dos Tradutores ;
[1] No original, “Choli ke peechhe kya hai?”. É fala de uma atriz (Madhuri Dixit) num filme muito popular na Índia e título da música-tema do mesmo filme.
[2] Calcutá [hoje Kolkatta] foi importante base dos comunistas no período em que West Bengal foi governado pela Frente de Esquerda, com maioria do Partido Comunista (Marxista) da Índia, por 34 anos (1977-2011) — o mais longo governo comunista eleito do mundo.
[3] Mahima Chaudhry é famosíssima atriz de “Bollywood”.
Embaixador*M K Bhadrakumar foi diplomata de carreira; serviu no Ministério de Relações Exteriores da Índia. Ocupou postos diplomáticos em vários países, incluindo União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão, Kuwait e Turquia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.