4/3/2015, [*] Pepe Escobar, Sputnik News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Epígrafe acrescentada na Vila Vudu, colhida de mensagem que
recebemos hoje, boa demais para não aproveitar aqui:
– [Netanyahu] is trying to kill ME, Yossarian told him calmly.
– No one's trying to kill you, Clevinger cried.
–Then why [Netanyahu] is shooting at ME? Yossarian asked.
– Not at you! [Netanyahu] is shooting at everyone, Clevinger answered. [Netanyahu]’s
trying to kill everyone.
– I told ya.
Adaptada de HELLER,
Joseph, Catch-22, 1961, (ing. PDF grátis).
Tradução:
− [Netanyahu] quer ME matar, Yossarian disse calmamente.
− Ninguém quer matar você, Clevinger berrou.
− Então, por que [Netanyahu] está atirando em MIM? Yossarian
perguntou.
− Não em você! [Netanyahu] está atirando em todo mundo,
disse Clevinger. [Netanyahu] quer matar todo mundo.
− Foi o que eu disse.
Mohammad Javad Zarif - MRE do Irã |
A verdadeira
história nunca teve coisa alguma a ver com o primeiro-ministro de Israel,
doente-por-guerras, Bibi Netanyahu, líder estrangeiro que se serviu
violentamente do Castelo de Cartas (House of Cards), desculpem, do Capitólio, nos EUA, como
palancão de campanha de reeleição e para enquadrar a presidência e a política
externa dos EUA.
Prova muito
clara disso é que, enquanto em Washington, Bibi “Bombardeie o Irã” destilava
aquela arenga de 39 minutos, em Montreux o Secretário de Estado dos EUA, John
Kerry e o Ministro de Relações Exteriores do Irã, Javad Zarif trabalhavam na
terceira rodada de negociações nucleares.
A verdadeira
história é também, em parte, sobre esse novelão perene – o dossiê nuclear
iraniano. Mas ao final do corrente mês há um prazo a ser cumprido para um
primeiro arranjo; e em junho – com otimismo – um acordo final amplo.
O que está em
jogo nesse mais alto nível é coisa que todos os principais jogadores já sabem
há eras. Teerã não assinará acordo algum que não ponha fim ao imundo e ilegal
pacote de sanções ainda vigentes. E Washington, inspirada sempre pela política
de “Não faça nenhuma merda coisa estúpida” do governo Obama, só faz
puxar as traves do gol, de um lado para o outro, ao longo das negociações.
A mais
recente “ideia” de Obama foi “exigir” que o Irã suspenda toda a atividade
nuclear por dez anos. Para Zarif, a coisa é “ilógica” e
“excessiva”.
É. Tão
ilógica quando a paranoia que é marca registrada da cesta de
neoconservadores e extremistas de direita no governo dos EUA. Comparem-se a
reação dos norte-americanos e o modo como o líder supremo do Irã, Aiatolá
Khamenei considera o poder nuclear – com todas as implicações que tem; e é
posição divulgada há eras, para todos verem. Assista vídeo dele a seguir
legendado em inglês:
China, Rússia e o Plano B
Diferente do
regime Cheney, o governo Obama parece ter chegado a uma conclusão lógica –
induzida por horas e horas que o Pentágono perde de joystick na mão:
Washington não pode destruir o sistema nuclear iraniano – a não ser que use
armas nucleares.
Ao longo da
maior parte da década passada, esse foi o Plano A. Plano B são as “negociações”
que nunca terminam, que se resumem a aparecer sempre com várias limitações ao
programa nuclear iraniano em troca de um sempre muito duvidoso fim das sanções.
De fato, o
verdadeiro objetivo dos Masters of the Universe que controlam o
teatro de sombras no eixo Washington/Wall Street é administrar o declínio
imperial. Implica, no sudeste da Ásia, uma nova sessão de “Dividir para
Governar”, dessa vez com Turquia, Irã, Arábia Saudita e Israel nos papeis
principais.
Alguns
jogadores−chave em Washington estão ficando cada dia mais impacientes com a
Casa de Saud, a qual – com sua estratégia de baixo preço do petróleo – está
bombardeando a indústria de petróleo de xisto dos EUA. Outros se preocupam por
a Turquia – depois de negócio-monstro no Oleogasodutostão, o Ramo Turco –
estar-se deslocando para mais perto da Rússia. Assim, enquanto não for fechada,
a opção de reintegrar o Irã numa colaboração com o ocidente, continua a render negócios
lucrativos para empresas norte-americanas.
Mas Rússia e
China tampouco estão sentadas vendo a vida passar: lá estão, como partes
importantes do grupo P5+1 que negocia com os especialistas e autoridades do
Irã. Os dois países BRICS podem usar – e usam – o Irã como alavanca no modo
como negociam com o hegemon, sempre encontrando vias pelas quais minar o
“pivoteamento para a Ásia”, dos EUA.
Organização de Cooperação de Xangai |
Tão logo
estejam normalizadas as relações com o Irã, Teerã será admitida à Organização
de Cooperação de Xangai [Shanghai Cooperation Organization (SCO)];
atualmente, o Irã participa como observador. Washington teme esse movimento –
porque acelera a integração eurasiana do Irã, e dá firmeza a um eixo
político/comercial Moscou-Teerã-Pequim.
A Rússia já
mantém bons negócios com o Irã – de usinas nucleares à venda de armas. Nenhum
acerto EUA-Irã acontecerá sem aquiescência tácita (no mínimo) dos russos – e os
norte-americanos sabem disso. Pequim, por sua vez, tende a firmar-se no status
quo. A China não quer Teerã muito mais próxima do ocidente, porque
implicaria um hegemon muito mais ‘'solto'’ no movimento de “pivotear-se” para a
Ásia. A China corretamente vê o Irã numa função de conter o “ocidente”.
No futuro,
passos adiante, nessa estrada, Teerã pode usar essa alguma ‘'reaproximação'’ com
o ocidente, para aumentar seu poder de barganha com Pequim. Se algum acordo for
obtido nesse verão, Teerã estará numa excelente posição para extrair concessões
– na economia, segurança, defesa – de seus parceiros chineses. Mas em todos os
casos o nome do jogo sempre é integração eurasiana.
O Califato, “nossos”
filhos-da-puta
Quanto ao
vociferante Bibi, só lhe restou mais uma vez tentar vender a Washington a
escolha de uma guerra israelense contra um Irã demonizado ensandecidamente. Não
funcionou – mais essa tentativa de os suspeitos de sempre, o lobby organizado
no AIPAC, ordenarem, sem meias palavras, que suas tropas de choque
dissessem ao Castelo de Cartas [House of Cards], digo, ao Congresso dos
EUA, que guerra é paz, e acordo nuclear é acordo com o demônio em pessoa.
Como escreveu
Trita Parsi, para Bibi,
a verdadeira “ameaça existencial” é a paz.
O culpado é o Irã! |
Mais uma vez,
também aqui a história verdadeira não é algum Irã nuclear; é a possibilidade de
uma détente EUA–Irã; nesse caso, as garras de Israel sobre a política
exterior dos EUA enfraquecem, deixam de ser garras de ferro.
Como se
poderia prever, Bibi esbravejou furiosamente contra aquelas forças do mal que pululam
em sua “vizinhança”, de Irã e “Líbano” (falava do Hezbollah), à Síria de Assad
e ao Hamas. Mas... nem uma palavra contra ISIS/ISIL/Daesh.
É como declarar que um Irã não nuclear é ameaça pior à civilização que o
Califato fake, viciado em degolas. Esposando tal visão de mundo, Bibi
não pode aspirar nem a extra no seriado House of Cards [Castelo de
Cartas] – agora no Netflix.
Enquanto
isso, a verdadeira história de Israel – o apartheid/ocupação ilegal imposto aos
palestinos – prossegue, ocultada pelo cacarejo daqueles sonâmbulos que circulam
na House of Cards, desculpem, no Senado dos EUA, que Bibi bombardeou até
deixar em ruínas.
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[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today, The Real News Network Televison e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros:
− Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Nimble Books, 2007.
− Red Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007.
− Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009.
− Adquira seu novo livro, Empire of Chaos, que acaba de ser publicado pela Nimble Books.
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