Frank Hammer |
25/1/2012, Frank
Hammer, The Real News
Network
(vídeo e entrevista
traduzida)
Transcrição
traduzida pelo pessoal da Vila Vudu
Assista também a
entevista: Sobre “State
of the Union” (SOTU), 2012 : “Obama jura promover o
império”
Frank
Hammer é empregado
aposentado da General Motors de Detroit, onde trabalhou durante 32 anos, e
ex-presidente de Local 909 em Warren, Michigan. Atualmente, está organizando
a Auto Worker Caravan [Caravana dos Trabalhadores da Indústria
Automobilística], associação de trabalhadores ativos e aposentados, que viajará
a Washington para apresentar suas reivindicações ao
governo.
PAUL
JAY, editor sênior de
TRNN: Pode-se dizer
que a peça central do discurso do presidente Obama foi restaurar as fábricas
norte-americanas. E o modelo de sucesso da intervenção do governo Obama teria
sido a ‘salvação’ da General Motors e da indústria automobilística. Que lhe
parece?
HAMMER: Acho que o modelo é ruim, é
péssimo. Acho que se alguém soubesse o que realmente foi feito, que fomos
jogados à falência pela crise financeira e, claro, Wall Street traçou o plano e ditou os
termos do que fazer para tirar os bancos da falência. Resultado disso, os
empregos desapareceram na indústria automobilística. Mais ainda: para recuperar
a GM, foi preciso atar mãos e pés e amordaçar os trabalhadores. E tudo, a partir
do mito inicial: de que a causa da falência teriam sido os salários. Não foram.
A causa da falência foi a crise financeira.
JAY: O que você quer dizer, quando fala
em atar mãos e pés e amordaçar os trabalhadores?
HAMMER: O presidente Obama mencionou que
seu governo deixou que as empresas e os trabalhadores resolvessem suas
diferenças. É. O que o governo Obama fez foi, primeiro, acabar com o direito de
greve. Segundo, o governo Obama fixou, como salário máximo aqui em Detroit, o
salário das fábricas do sul onde os trabalhadores não são sindicalizados. Assim
reduziram nossos salários e nossa expectativa de vida decente. As fábricas em
Detroit foram equiparadas às fábricas dos sul, cujos trabalhadores não são
sindicalizados. Tudo isso foi feito pelo governo Obama, sim. Que obedeceu ordens
de Wall
Street.
E se
esse é o modelo que Obama usou em seu discurso, o que Obama disse, de fato, é
que todos devem reduzir o padrão de vida dos trabalhadores, equipará-los ao
padrão de vida de trabalhadores do Terceiro Mundo, para que os EUA – lembre-se
ele citou o exemplo da Master
Lock[1] . O presidente Obama disse, isso
sim, é que os trabalhadores chineses têm tido aumentos no salário mínimo e,
portanto, é agora melhor negócio para a Master Lock voltar para os EUA, onde os
salários dos trabalhadores são menores a cada dia. O que ele de fato disse é que
está convertendo os EUA em país do Terceiro Mundo. E que, assim, seremos mais
competitivos e que assim criaremos empregos. Mas só se os trabalhadores dos EUA
aceitarem trabalhar por salários de Terceiro Mundo e sem direito de
greve.
JAY: Obama também falou sobre
desenvolver energia limpa. O que lhe pareceu?
HAMMER: Pareceu-me que ele mencionou a
mudança climática uma vez. E só disse, sobre mudança climática, que o Congresso
talvez esteja excessivamente dividido para discutir o problema. Foi muito pouco,
uma droga de concessão, se se sabe que os cientistas têm dito que é preciso agir
rapidamente. E continua repetindo aquelas bobagens, energia nuclear,
biocombustíveis e petróleo. Quer dizer: Obama não parece ter ideia clara de que
a questão central, definitória desse nosso tempo, são as energias renováveis,
não os bicombustíveis, nem a energia nuclear, mas energia limpa. Para Obama, a
questão definitória desse nosso tempo é se os EUA conseguirão manter o padrão de
vida da classe média dos EUA. E ninguém manterá padrão algum de vida de classe
média alguma, se não começar a preocupar-se com a mudança
climática.
JAY: Um dos temas sobre os quais
conversamos em outras entrevistas é que a recuperação da indústria de
transportes poderia ser ponto de partida para outro tipo de economia. Mas Obama
voltou ao modelo de Detroit.
HAMMER: Ele mencionou, a certa altura, que
entende que as empresas devem receber incentivos para construir novas fábricas,
nas áreas que foram mais duramente atingidas pela crise. Em 2009, Obama disse
que cuidaria de áreas como Detroit como o governo Bush deveria ter cuidado de New Orleans depois do Katrina. Gostei daquela ideia, achei
que ia na direção certa. Mas nesse discurso já nem apareceu um tópico que
aparecera nos outros discursos Estado da União: a questão de construir
transporte público, linhas férreas, transporte leve. Há muito tempo nós
repetimos que algumas das grandes fábricas que foram fechadas em Detroit
deveriam ser convertidas em fábricas de vagões, vagões leves, para linhas de
alta velocidade. Em 2012, o presidente nem falou sobre isso. Tenho esperança de
que se possa ver algum movimento na direção de utilizar energia solar e eólica,
para reabrir algumas das fábricas que continuam fechadas. E que apareçam os
incentivos que Obama mencionou no discurso.
JAY: Em termos gerais, qual foi sua
impressão do discurso? Alguns dos que entrevistei hoje disseram que estão
felizes de Obama ter falado, pelo menos, da desigualdade de renda. Quero
dizer... Alguma coisa que se ouviu nesse discurso permite esperar que algum dia
apareça um Obama diferente do que se viu?
HAMMER: Olhe, francamente, discordo muito
de alguns dos meus queridos amigos afro-americanos, que ainda creem que, no
segundo mandato, Obama será presidente diferente. Acho que, se for reeleito,
veremos mais do mesmo Obama. O momento perfeito para um discurso que incendiasse
a base foi ontem, naquela fala do Estado da União (State of the Union). E não aconteceu.
Sei disso, porque minha filha, por exemplo, trabalhou muitíssimo para eleger
Obama em 2008. Falei com ela hoje, e com meu genro, e nenhum dos dois estava
muito entusiasmado com o discurso. Essa era a base de Obama. São os jovens que
votaram aos milhões e o elegeram. E não acho que Obama os tenha emocionado, com
o discurso de ontem. Fiquei com a impressão de que Obama cantava pelo livro de
salmos dos Republicanos. Perdi a conta de quantas vezes repetiu que regulações
são péssimas. Acho que o que se viu foi mais rendição, mais um passo na direção
do que para muitos seria o centro, mas que cada dia mais é mais à direita, à
direita, à direita, mais a cada ano que passa. Acho que Obama teria de tentar
incendiar a sua base, em ano eleitoral. Fiquei com a impressão de que Obama está
dando por garantidos os votos de sua base. Obama nem falou, nenhuma vez, sobre
Occupy Wall Street – e é o movimento
que está varrendo todo o país. Aliás... não falou de 99%, mas falou de 98% (os
que estão com os salários estagnados). Entendeu?
JAY: Talvez tenha redefinido a base.
Talvez esteja jogando para a base. Só que não é a base que acredita que ainda
seja a base de Obama.
HAMMER: Pode ser. Mas a base de Obama em
2008 foi fonte de energia e entusiasmo para a campanha. Se Obama redefiniu sua
base... Escolheu caminho terrivelmente perigoso.
JAY: Obrigado pela entrevista,
Frank.
Nota
dos tradutores
[1] Master
Lock fabrica produtos de segurança, com sede em Milwaukee; há pouco tempo a
empresa declarou que traria de volta os empregos que exportou para a China, se
encontrasse condições de apoio econômico. Desde meados de 2010, a empresa “reimportou”
100 postos de trabalho, que voltaram à fábrica em Milwaukee
(25/1/2012).
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