sábado, 5 de março de 2011

O PORQUÊ DA GRAXA PRETA

Laerte Braga

Laerte Braga

Ao escrever com freqüência que Barack Obama é um branco engraxado com graxa preta não incido em racismo. É simples entender o motivo disso. História, só história. No passado, década de 50 e 60 do século XX, era comum os estúdios cinematográficos nos EUA e em outros países (Brasil inclusive), conferir papéis de negros a atores brancos engraxados, aí sim, numa visível manifestação de racismo, de preconceito.

Do início do século XX e até hoje os Estados Unidos mantém o caráter de país racista a despeito das leis que falam de direitos civis aprovadas no governo democrata de Lyndon Johnson (o presidente que assumiu com a morte de Kennedy e encontrou o projeto pronto, condições objetivas, portanto, para sua aprovação).

Líderes negros nacionais como Martin Luther King, Malcom X, Ângela Davis e outros foram assassinados por grupos brancos de extrema-direita nos EUA e à época, Millôr Fernandes, um dos mais notáveis jornalistas da história do jornalismo brasileiro, chegou a dizer que “no Brasil não temos racismo, o negro reconhece o seu lugar”.

Era uma afirmação que desmistificava a hipocrisia do discurso oficial feito entre nós que o racismo não encontrava abrigo no Brasil. Era claro e visível em todos os setores da sociedade.

Na escola havia uma conversa de um norte-americano que perambulava pelo Brasil quando da abolição da escravatura e pediu para levar um pouco de terra de nosso País para os Estados Unidos. Seu objetivo era mostrar que por aqui se fazia com paz, visão dele, o que lá se fez com sangue – a Guerra da Secessão –.

Se o fato é verídico ou não, não sei, mas era aceito como tal e enchia de orgulho os estudantes brasileiros do antigo primário e ginásio diante da grandeza de nossos amados líderes.

O ator Grande Otelo – Sebastião Prata – queixava-se constantemente do racismo no teatro e no cinema e depois na televisão. Só conseguiu romper barreiras em caráter excepcional por se tratar de um fora-de-série e por conta do sucesso alcançado com Oscarito, que, por sinal, era espanhol de nascimento.

Mas, em CABANA DO PAI TOMÁS, a televisão preferiu engraxar Sérgio Cardoso e transformá-lo em negro a contratar o também extraordinário ator Milton Gonçalves, à época disponível para o papel.

Nos Estados Unidos isso não era diferente. A aversão a atores e músicos negros era característica de Hollywood e das grandes gravadoras. Romper essa barreira custou, por exemplo, a Billie Holliday lágrimas e sangue em noites de prostituição para a sobrevivência pura e simples.

O que muda hoje é que o preconceito ganhou a cara do mundo neoliberal e se volta contra os excluídos de um modo geral, as minorias (que não são tanto assim). Se volta contra negros, contra mulheres, contra homossexuais, lésbicas, ciganos, contra trabalhadores no todo, com requintes de barbárie contra o povo muçulmano (uma quarta parte da humanidade).

O Brasil não foge à regra do resto do mundo. De um lado as elites econômicas e políticas e de outro a classe trabalhadora e neste cesto os negros, os ciganos, os homossexuais, as lésbicas, as mulheres.

Há um fenômeno interessante hoje entre nós. As elites torcem o nariz para a legião de fanáticos incautos gerados pelas seitas neopentecostais, mas os aceita, pelo caráter submisso rasteiro e vergonhoso que se lhes impõem no achaque e na mercadoria vendida, o fundamentalismo boçal da religião, falo de seus pastores. Edir Macedo hoje é um dos principais aliados e integrantes do esquema norte-americano de boçalização do ser humano. 

Quando Celso Furtado constatou que a revolução mais importante do século XX foi a “revolução feminista”, as elites já imaginavam um jeito de apropriar-se dos valores dessa revolução e enquadrar o esquema numa espécie de VIVA A VIDA MARIA. Frase de Pedro Bial preocupado com a audiência do BBB-11 e a resistência de uma das sisters, Maria, em cair na gandaia debaixo do edredon com um brother.

VIVA A VIDA MARIA.

A meu juízo ser politicamente correto é ser hipócrita. Ou existe consciência política ou não existe. Existe o racismo num espectro muito maior que o voltado exclusivamente contra o negro.

Luta de classes, é simples entender isso.

A mais valia, a acumulação, citadas e desenvolvidas por Marx, por si só, mostram que não existe “patrão” bom ou generoso. Existem formas diversas de exploração, tanto quanto de preconceito, até porque, a própria exploração já é preconceito.

O capitalismo é fantástico na capacidade de apropriar-se de extremos. Não vou nem citar o exemplo da imagem de Guevara estampada em camisetas, outdoors, etc.

A maneira como a televisão – principal veículo de comunicação hoje, ainda – incorporou o negro – mesmo assim quase sempre empregado/a doméstica/o ou bandido –, eventualmente um protagonista principal de um filme, uma novela, traz embutido o preconceito.

Surge, entre outras, a figura do “negro de alma branca”. Caso de Pelé, ou alguém acha que Pelé é negro?

Quando Marlon Brando disse que não filmaria mais, pois os estúdios em Hollywood eram todos controlados por grupos judeus e isso determinava a política do setor – cinematográfico – foi execrado e colocado no limbo. É considerado pelos críticos de cinema de todos os tempos, o maior ator de todos os tempos. Desafiou as leis da gravidade nazi/sionista.

É conveniente abrir a porta a negros, a ciganos, a homossexuais, a lésbicas, a minorias, desde que se comportem dentro das regras estabelecidas pelos brancos (branco no sentido de classe dominante, o princípio ariano de Hitler e que antecede ao próprio, ele apenas deu-lhe forma clara, precisa) e sair proclamando que não “tenho preconceito”.

Num aspecto que nem vale analisar aqui, o capitalismo mergulha no inconsciente das pessoas, faz isso com freqüência, traz à tona seus mais recônditos fantasmas e insere aí o negro em meio ao branco/a da forma mais abjeta possível, transformando o fato num caso psiquiátrico.

Foi o que aconteceu a um negro campeão mundial de boxe, década de 20 nos EUA, por ter um relacionamento amoroso com a mulher de um senador branco. Teve o título cassado, foi preso, expulso do país e a mulher levada a uma espécie de exorcismo para purificar-se da “doença” de ter desejado um negro e tido uma vida amorosa com esse negro. Deve ter usado o “omo” da época para limpar-se.

Num viés em que o lucro é líquido e certo o capitalismo apropriou-se dessa maneira de mostrar o “pecado”, na indústria de filmes pornográficos.

Obama é branco. Não tem nenhum compromisso com a luta do povo negro. Repete as políticas de Bush e apenas o faz de forma politicamente correta. Mas “canta”, os jornais e revistas dos EUA vivem falando disso, Angelina Jolie.

Daí, que por dedução simples, levando em conta a prática de estúdios e redes de tevê não há racismo algum em afirmar que o presidente terrorista dos EUA é branco engraxado com graxa preta para parecer negro.

O primeiro presidente “negro” dos EUA é branco.

Do ponto de vista da política do seu país, um demagogo refinado, um pilantra de alto calibre. Só isso, mais nada.

O episódio, logo no início de seu governo, envolvendo a prisão arbitrária de um professor e líder do movimento negro por um policial branco, que terminou numa rodada de cerveja e paz na Casa Branca, atesta isso. O policial não foi punido e o negro instado a apertar a mão do algoz na busca da convivência fraterna.

O máximo que Obama fez foi mexer os pauzinhos para o professor negro sair da cadeia num prazo menor que o que a justiça o libertaria, já que inocente.

Em seguida serviu cerveja a ambos nos jardins da Casa Branca.

Quem conhece os EUA sabe que o racismo é visceral fora de cidades como New York. O interior do país é branco e se a Ku Klux Klan não tem a mesma forma do passado, adequou-se ao politicamente correto, mas com as mesmas práticas de violência e barbárie que são características do Estado. 

Miami, na visão de boa parte dos norte-americanos, é uma espécie de esgoto do país, diante da presença de imigrantes – maioria, inclusive –.

Um grupo de voluntários pela defesa da democracia se reveza na fronteira com o México, além das autoridades policiais, para fiscalizar as tentativas de mexicanos entrarem no país. Quando pegam um “clandestino”, surram-no antes de entregar à polícia e fica por isso mesmo, são “patriotas”.

Numa das olimpíadas realizadas em Atlanta, um habitante da cidade declarou alto e bom som a repórteres que foram saber o que pensava do evento que “era uma porcaria, esses negros chegam aqui e sujam a cidade toda”.

Por um descuido isso à época saiu até no JORNAL NACIONAL.

A luta dos negros, dos excluídos no todo, transcende ao “oba-oba” fomentado pela própria mídia, essa de o primeiro presidente negro dos EUA. Obama é branco por fora e por dentro.

Está apenas engraxado e com tecnologia de Hollywood.

Só difere de George Bush no estilo.

A propósito, quando o furacão que varreu New Orleans o presidente Bush foi criticado pela demora no socorro às vítimas, a maioria esmagadora de negros. Passado certo tempo muitos desses desabrigados foram levados para acampamentos no Texas.

A mãe de Bush, também mulher de ex-presidente, Bush pai, disse o seguinte – “eles estão melhores aqui que antes, pois fazem três refeições por dia e têm água quente para tomar banho”.

Foi nesse episódio que o jornalista William Bonner chamou o telespectador do JORNAL NACIONAL de “Homer Simpson”. Um pacato cidadão, bebedor de cerveja e incapaz de pensar por si, idiota lato sensu. É que um neto de John Kennedy havia dito que os norte-americanos deveriam agradecer ao presidente Chávez da Venezuela que mandou vender gasolina pela metade do preço para facilitar a saída dos moradores que fugiam de New Orleans.

Bonner omitiu a notícia alegando que poderia desagradar os “nossos amigos americanos”.

E para ele isso não tinha a menor importância para o telespectador, no caso o Homer Simpson, o idiota.

Está ali para vender a ideologia branca, da classe dominante.

Um dos preconceitos mais brutais da atualidade é contra o povo muçulmano. David Cameron, principal funcionário norte-americano na colônia Grã Bretanha – tem o título de primeiro-ministro, uma espécie de governador geral – decretou o fim do multiculturalismo. A coexistência e a convivência pacíficas entre diferentes.

E Obama não é diferente desses arianos. É um deles. Está é engraxado.

Essa luta fica mais difícil ainda quando se enxerga racismo na literatura infantil de Monteiro Lobato, quando ali está, para crianças e adolescentes, o germe da consciência em tudo e por tudo, da desconstrução dessa realidade brutal que o capitalismo nos impõe.

São os efeitos do politicamente correto, a hipocrisia transformada em compreensão piedosa.

Esse tipo de luta não tem meio termo. Nem espaço para acordos.

Como disse, é luta de classes.

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