domingo, 24 de março de 2013

A desavergonhada arrogância do Washington Post


(digo: d’O Estado de S.Paulo, p. ex.)

23/3/2013, Robert Parry, Consortium News
Traduzido e comentado pelo pessoal da Vila Vudu


Robert Parry
Talvez mais que qualquer outra empresa jornalística, o Washington Post empurrou os EUA para a invasão ilegal do Iraque. Mas um editorial do Post, que registrou, antecipado, o décimo aniversário da guerra, não admite qualquer erro, nem lição a aprender . Escreve Robert Parry



Nota dos tradutores: No Brasil, nem se pode(ria) dizer que só o Estadão viva de tentar arrastar o Brasil para trás, de volta às velhas neocatástrofes neoliberais tucanas (no plano interno) e reacionárias norte-americanófilas (no plano internacional): aqui, todas as empresas da imprensa-empresa (o chamado “jornalismo” [só rindo]) vivem de papagaiar agências noticiosas norte-americanas comerciais, nenhuma das quais jamais fez outra coisa além de propaganda pró-EUA (o que equivale a dizer “propaganda pró Israel e pró guerras e mais guerras). No Brasil, o problema é, mesmo, todo o Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão).

Mas deve-se registrar que, nos EUA, já se leem críticas de críticos consistentes, que já não se satisfazem – como ainda se vê no Brasil – com vagos comentários acadêmicos autoproclamados “críticos” sobre um vago conceito de “jornalismo”, do qual se servem tanto “jornalistas” como “críticos” academizados e professores do mesmo vago “jornalismo” e profissionais da mesma vaga “crítica”, sempre conservadora. 
(O lixo crítico produzido pelo Observatório da Imprensa – especialistas em observar o NADA – é exemplo típico [Nota da redecastorphoto])

Nos EUA já se leem comentários legitimamente críticos – críticos para transformar – que começam a declarar que é mais que hora de demitir uma dúzia e meia de propagandistas fascistizantes autodeclarados jornalistas. É excelente ideia! Só assim se pode pensar em começar a implantar alguma ordem democrática, no galinheiro das empresas comerciais do jornalismo [só rindo] brasileiro, as quais, afinal, vivem de VENDER notícias podres a consumidores, os quais, no Brasil, são necessariamente ELEITORES.

De fato, se se considera a crescente importância do Brasil no cenário internacional, é mais que hora de as empresas jornalísticas brasileiras entenderem que não conseguirão continuar a ser, para sempre, o que sempre foram, por aqui: organizações comerciais reacionárias, paroquiais, sempre burramente conservadoras, veículo, só, de “saberes arrogantes”, que escrevem e falam só para uma meia dúzia de eleitores udenistas já sem votos e sem partido e sem candidato (chega a ser CÔMICO!) – um erro de concepção empresarial que, bem feitas as contas, pode explicar os números DESPENCANTES de leitores consumidores de jornais e de revistas vejas, no Brasil.

A quem, diabos, interessaria a opinião de algum williamwaack, de alguma cantanhede, de alguma loprete, de algum augustonunes?! Por que alguém se interessaria por esse tipo de opinião, que, afinal, é sempre a mesma, igualzinha em diferentes caras e bocas?! Por que algum consumidor se interessaria por pagar por ISSO?!

O Brasil está rico e maduro para ver surgir uma (UMA – e seria dona do mercado!) empresa de jornalismo de boa qualidade. Não é preciso ser chinês, nem leninista, para ver.

Qualquer marketeiro, qualquer mercadólogo, qualquer crítico, qualquer professor de jornalismo, qualquer jornalista que não tivesse alma reacionária e conservadora, já teria percebido isso.

Quatro dias antes do décimo aniversário da Guerra do Iraque, o Washington Post publicou editorial sobre a desastrada opção pela guerra, conflito que os editores neoconservadores do Post promoveram com mentiras e distorções, tanto antes da invasão quanto por anos a fio, dali em diante.

Contudo, se alguém pensou que leria ali alguma confissão de culpa, pela longa litania de erros e vícios que o jornal difundiu, ou alguma espécie de pedido de desculpas aos que se opunham àquela guerra e foram diariamente demonizados nos editoriais e colunas do Post, só encontrou desapontamento. Nem qualquer mínima referência aos cerca de 4.500 soldados norte-americanos mortos, nem às centenas de milhares de iraquianos massacrados.

Além de dispensável reconhecimento de que o 10º aniversário daquela guerra “gerou muitos comentários sobre lições”, os editores do Post nada disseram sobre o quê, no mínimo, eles mesmos talvez tivessem aprendido. Em vez disso, mantiveram o tom de jornalismo de propaganda e promoção do próprio jornalismo fracassante, “noticiando” um pressuposto sucesso da invasão.

Pela primeira vez em décadas, o Iraque contemporâneo não representa qualquer ameaça aos seus vizinhos – “noticia” o Post.

Pois também isso é só mentira, em dois fronts.

Primeiro, que o Iraque de Saddam Hussein já não representava qualquer ameaça aos seus vizinhos desde a Guerra do Golfo de 1990-91, a menos que os editores do Post estivessem tendo um surto de lembranças dos dias de glória de 2002-03, quando o jornal vivia de disseminar as mentiras do ex-presidente George W. Bush sobre armas de destruição em massa. Será que o Post ainda acredita nesses delírios?

Segundo, que o Iraque de hoje, em governo do Primeiro-Ministro Nouri al-Maliki, tornou-se, sim, ameaça aos países vizinhos, porque extremistas sunitas aliados à al-Qaeda, do oeste do Iraque, já atravessaram a fronteira para a Síria, onde assumiram posição destacada na violenta oposição ao governo do presidente Bashar al-Assad.

Mas os editores do Post, querem que os leitores acreditem que a expedição dos tresloucados neoconservadores à Bush ao Iraque teria sido imensíssimo sucesso... até que o presidente Obama apareceu e estragou tudo... porque não insistiu em manter a ocupação militar norte-americana no Iraque.

“A influência do Irã sobre o governo de Maliki aumenta dia a dia, graças, em parte, ao fracasso do governo Obama que não conseguiu qualquer acordo com Bagdá, para que uma força norte-americana lá permanecesse” – escreveu o Post, tentando fazer crer que alguma petulância, no governo Obama, teria impedido a continuada presença militar dos EUA no Iraque, e tentando fazer não ver que o governo de Maliki impôs aos EUA um “Acordo do Estado das Forças” inaceitável.

Influência perdida

Na fantasia que o Post divulga como se fosse notícia, contudo, esse fracasso, que teria impedido que se mantivessem dezenas de milhares de soldados dos EUA no Iraque, teria levado a terríveis consequências:

Segundo funcionários do governo dos EUA, o Iraque está permitindo que o Irã envie armas para o regime sírio de Bashar al-Assad. Repetidos apelos de Washington, para conter esse contrabando, não são ouvidos.

A verdade, como qualquer observador realista já teria notado, é que a fúria sanguinária dos neoconservadores de Bush, que mal podiam esperar para entrar em guerra e depor o regime de Hussein e dos sunitas, é que fez aumentar, como faria sempre, inevitavelmente, a influência do Irã sobre o regime xiita que os EUA impuseram no Iraque. Responsáveis por isso são os neoconservadores à Bush. Pois o Post não faz outra coisa além de “noticiar” que a culpa seria de Obama e só de Obama.

O editorial do Post, então retoma sua ininterrupta campanha para pressionar o governo Obama na direção de mais uma guerra, dessa vez contra a Síria – a acusa o presidente de ser “mole”, pouco viril:

A guerra civil na Síria, e a passividade da resposta do governo Obama a ela, reforçaram essas tendências negativas. Maliki teme que a queda do governo de Assad leve a um governo de sunitas, que apoiaria a insurreição sunita em parte do Iraque. (...) Como outros líderes em todo o Oriente Médio, Maliki percebe que os EUA não dão sinais de interesse em defender os próprios interesses na região, seja atacando para conter o banho de sangue na Síria, seja atacando para conter as intervenções do Irã. O risco de tumulto ainda maior, ou, mesmo, de nova guerra civil no Iraque, é um dos fatores que obrigam os EUA a empreender ação mais agressiva para pôr fim à guerra na Síria.

O Post então resume a causa a favor da qual trabalha, e sugere que Obama teria traído a grande vitória que os neoconservadores, como o Post delira, teriam obtido no Iraque:

O presidente Obama várias vezes deu a impressão de ter virado as costas ao Iraque, e muitos norte-americanos, compreensivelmente, simpatizam com ele. Mas um fracasso no envolvimento com a frágil situação que os soldados dos EUA deixaram para trás põe sob grave risco interesses dos EUA e traem os muitos norte-americanos que morreram para defendê-los.

Chama particularmente a atenção, no editorial do Post – o qual, curiosamente apareceu quatro dias antes do 10º aniversário da Guerra do Iraque – é que o principal jornal da capital dos EUA ainda vive sob num delirante mundo de fantasias neoconservadoras ou, no mínimo, recusa-se a ver realidades chaves do Oriente Médio.

Na Neoliberalândia, o grande erro dos EUA não foi ter suposto que obrigariam os iraquianos a aceitar ocupação militar norte-americana eterna. O grande erro teria sido Obama não aceitar o “convite” de Israel para bombardear o Irã e enfiar-se, até o pescoço, em outro sorvedouro de sangue, na Síria. Os EUA, para os jornais da Neoliberalândia, teriam de dar prosseguimento ao grande projeto dos neoliberais neoconservadores para “mudanças de regime”, várias, em todo o Oriente Médio.

O editorial do Post, intitulado Iraq, 10 years later, is less threatening but riven by turmoil não faz qualquer autorreflexão sobre os inúmeros erros factuais que o jornal difundiu sobre as inexistentes armas de destruição em massa; não se veem pedido de desculpas por ter enganado os leitores e por ter induzido a erro tanta gente; nem qualquer reconhecimento do fato de que o jornal foi cúmplice de uma invasão criminosa. Os editores do jornal não dão qualquer sinal de ter aprendido coisa alguma, da tragédia para a qual tanto contribuíram para empurrar os EUA, há dez anos.

A incompetência e a incapacidade para escrever, pelo menos, que fosse, um necessário mea culpa são incômodas e perturbadoras, por elas mesmas. De fato, se o Post ainda fosse organização jornalística séria, comprometida com os princípios do jornalismo comercial sério, já teria, pelo menos, promovido um remodelação na equipe de editores. E não conservaria lá aqueles mesmos profissionais que tanta vergonha atraíram sobre a empresa, ao errar tão completamente no caso da Guerra do Iraque.

Fred Hiatt
De fato, é pior que isso: os editores do Post insistem em pontificar com a mesma arrogância, contra fatos sobejamente conhecidos, não conseguem ver sequer os próprios erros, bem conhecidos, já, de tantos leitores, são impermeáveis – mais que muitos leitores – à própria incompetência e à própria imoralidade.

Nesse sentido é que se pode dizer que o Washington Post já se converteu em ameaça muito real aos EUA e ao mundo. [Para mais detalhes, ver Why WPost’s Hiatt Should be Fired [Porque Hiatt, editor do Post, deve ser demitido].

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