quinta-feira, 17 de outubro de 2013

O embaixador brasileiro demitido da Organização para a Proibição de Armas Químicas há 11 anos...

E o “jornalismo” vagabundo do New York Times ONTEM!

15/10/2013, Moon of Alabama, EUA
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Sede da Organização para a Proibição de Armas Químicas em Haia
Em 2002, José Bustani, então diretor da hoje laureada com o Prêmio Nobel da Paz, Organização para a Proibição de Armas Químicas [orig. Organization for the Prohibition of Chemical Weapons, OPCW], foi demitido, porque insistia em que o Iraque fosse incorporado ao Tratado das Armas Químicas, o que atrapalhava os planos de guerra do governo Bush.

José Bustani
Ontem, o New York Times voltou àquela história: [1]

Mr. [John] Bolton, então subsecretário de Estado e ex-embaixador dos EUA à ONU, disse ao diretor Bustani que o governo Bush não estava satisfeito com seu estilo de administrar.

Mas o diretor Bustani, 68, que fora reeleito por unanimidade apenas 11 meses antes, se recusou a mudar de atitude; semanas depois, dia 22/4/2002, foi demitido numa sessão especial da Organização para Proibição de Armas Químicas que reúne 145 países.

A história por trás dessa demissão foi objeto de muita especulação e diferentes interpretações durante anos, e Bustani, diplomata brasileiro, tem mantido posição discreta desde então.

Esse último parágrafo (negrito/itálico) está errado. O New York Times apresenta o caso como reles “diz-que-disse”, e deixa acintosamente de lado a informação de que o caso foi julgado, que há sentença sobre a questão, e que a sentença é integralmente favorável ao diplomata brasileiro:

John Bolton
“Mr. Bolton insiste que Mr. Bustani foi demitido por incompetência. Em entrevista por telefone na 6ª-feira, o norte-americano confirmou que abordou diretamente o então diretor da Organização para Proibição de Armas Químicas: “Disse a ele que, se concordasse em demitir-se e sair voluntariamente, lhe garantiríamos saída honrosa e discreta” – disse Bolton.

Na versão de Mr. Bustani, a campanha contra ele começara no final de 2001, depois que Iraque e Líbia sinalizaram que desejavam assinar a Convenção das Armas Químicas, o tratado internacional cuja aplicação é supervisionada pela Organização para Proibição de Armas Químicas”.

[...]

“Discutimos muito, porque todos sabíamos que seria difícil” – disse Bustani, que é o atual embaixador do Brasil na França. Os planos para integrar o Iraque e a Líbia ao Tratado, que Bustani apresentara a vários países, “causaram fúria em Washington” – contou ele. Poucos dias depois, começaram os avisos (e ameaças) de diplomatas norte-americanos e outros.

“No final de dezembro de 2001, já era bem evidente que os norte-americanos estavam decididos a livrar-se de mim” – disse Bustani. – “As pessoas diziam eles querem sua cabeça”.

As tais “interpretação” e “especulação” que o Times insiste em repetir e requentar já foram esclarecidas e decididas há muito tempo. Imediatamente depois de demitido por pressão dos EUA, Bustani recorreu à justiça, em ação que apresentou à Organização do Trabalho Internacional, que tem jurisdição sobre as organizações internacionais. O processo concluiu, em sentença perfeitamente clara, ao processo n. 2.232, que: [2]

1. A DECISÃO TOMADA EM CONFERÊNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS DA OPCW DIA 22/4/2002 É NULA.

2. A OPCW DEVE PAGAR AO RECLAMANTE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, A SEREM CALCULADOS NOS TERMOS ADIANTE ESPECIFICADOS (...).

3. A ORGANIZAÇÃO DEVE PAGAR AO RECLAMANTE, 50 MIL EUROS, PARA REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS.

4. A ORGAIZAÇÃO DEVE PAGAR AO RECLAMANTE 5 MIL EUROS, DE CUSTAS PROCESSUAIS.

A corte concluiu que a indevida influência política dos EUA levou à demissão ilegal do diretor Bustani, o que caracteriza demissão por interesses políticos, e agride o princípio da neutralidade de organizações internacionais como a Organização para a Proibição de Armas Químicas, OPCW. A organização foi condenada a indenizar o diretor ilegalmente demitido, por danos morais e pelos custos processuais, e a pagar-lhe todos os salários a que faria jus até 2005, quando terminaria o mandato para o qual fora eleito.

Pois... para o New York Times não aconteceram nem o processo nem a sentença! Não são referidos na matéria publicada. Para o Times, a questão continua a ser de “interpretação e especulação”, mesmo depois de já haver sentença que confirma que os fatos se passaram como narrados pelo diplomata brasileiro.

Apagar da informação a sentença de um tribunal internacional é o meio que o New York Times encontra ainda hoje para defender os neoconservadores do governo Bush, para os quais lei alguma tem qualquer valor; e cuja única obsessão é um projeto de hegemonia global.




Notas dos tradutores
[1] 13/10/2013, To Ousted Boss, Arms Watchdog Was Seen as an Obstacle in Iraq (Para o diretor demitido, a Organização para Proibição de Armas Químicas era vista como obstáculo no Iraque), NYTimes.  
[2] International Labour Organization, ILO, 16/7/2003, Judgment No. 2232; íntegra da sentença (em inglês). 

Um comentário:

  1. Comentário enviado por e-mail e postado por Castor

    Há quem opine -- sem base, como toda opinião -- que mídia mentirosa só tem no Brasil. Nada disso. The New York Times e a mídia estadunidense são campeãs nesse quesito.
    Não fosse a mídia independente -- no caso, a Moon of Alabama, dos EUA, e os sempre atentos tradutores do coletivo Vila Vudu --, ficaríamos à mercê da desinformação criminosa da imprensa corporativa, safadíssima.

    BSA

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