sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Editorial da redecastorphoto de 17 de setembro de 2010

Achamos estimulante que, passo a passo, todos começam a se mexer, incomodados, na posição ideológica pressuposta “óbvia”, segundo a qual o jornalismo seria “naturalmente” necessário e até útil (vejam vocês!) às democracias. Vemos próxima a hora em que muitos saquem que não haver nenhum jornalismo pode ser MUITO MAIS democrático, do que haver o jornalismo que há. Os jornalistas que entendam isso terão de mudar de profissão.

Agora já muitos falam em "jornalismo independente" -- o que não há nem pode haver, porque o jornalismo, como o conhecemos, é empresa; e pretender que alguma empresa possa algum dia ser 'independente' do lucro é delirium tremens de gente embriagada de ideologias liberais ocas e clareza zero, para a luta política, não nos jornais, mas no mundo.

Outros falam de “mídia hegemônica” -- o que é erro conceitual grave. Quem quer que tenha algum dia lido Gramsci deve saber que a hegemonia comunista gramsciana NÃO É sinônimo de "dominação" e que, portanto, "mídia hegemônica" não é sinônimo de "mídia dominante por dominação". Bom. É erro conceitual grave, mas, pelo menos, já manifesta alguma necessidade de adjetivar a tal de “mídia”, o que já manifesta, por sua vez, algum incômodo ante a ideia de que haveria alguma "mídia" em si, acima dos “hegemonismos” de ocasião.

Gramsci ensina BRILHANTEMENTE que é preciso CONSTRUIR a hegemonia dos pobres (não alguma dominação pelos pobres). Em Gramsci não se cogita de hegemonia por dominação, construída pela força. A hegemonia em Gramsci é construção à qual se chega pela persuasão. É conceito perfeitamente maravilhosamente democrático e realista e que dá à linguagem a importância DECISIVA que o jornalismo que há (1) não sabe e (2) não pode, por definição, reconhecer a linguagem.

O conceito de hegemonia democrática comunista de Gramsci implica MUITO trabalho de construção dos discursos dos pobres e persuasão; não de intimidação nem de imposição, e nem que seja de algum discurso “de pobre”, mas construído sem a ambição dignificante de vir a ser hegemônico (por persuasão, não por convencimento-morto, alcançado a golpes de repetição e repetição e repetição).

No artigo “Marcos Coimbra: Os jornalistas tucanos” se vê mais uma qualificação dos jornalistas, que também manifesta incômodo com o que os jornalistas fazem, mas tenta dizer que os bandidos do jornalismo que há no Brasil não seriam bandidos por serem jornalistas, só seriam bandidos por serem tucanos. É argumentação que eu chamo de "argumento ginástico", por causa dos contorcionismos.

Não é o tucanismo que “distorce” o jornalismo dos jornalistas tucanos. É muito diferente disso.

O próprio jornalismo que há é que serve como luva -- e veículo -- para a manifestação do tucanismo udenista sempre golpista de TODOS os tucanos, pefelês e outrinhos. Não é difícil demonstrar que o jornalismo-empresa nasceu, no mundo, quando nasceu a empresa liberal, para fazê-la crescer e “naturalizá-la”. As “teorias” do jornalismo e, depois, da cumunicação fizeram o resto.

Não sendo o jornalismo-empresa, o mundo só conheceu, de jornalismo não comercial, o dazibao ("jornal de muro") chinês que Mao inventou em 1924; e, agora, a internet. Mas tem de ser a internet anárquica dos muitos, das listas de discussão e dos tweeters de ação rápida; não a internet dos blogs jornalísticos, por democráticos que se pressuponham os blogueiros, mesmo que sejam pessoalmente democratizantes. Se os blogueiros forem mais jornalistas que blogueiros, o jornalismo que há devora, até nos mais democráticos, o espírito democrático.

Ainda falta provar que os "jornalistas tucanos" constituiriam categoria à parte. Afinal, pode haver jornalistas petistas e jornalistas comunistas, mas todos SÓ SABEM FAZER o jornalismo que aprenderam, no Brasil da ditadura e da tucanaria, nas academias e redações de empresas jornalísticas liberais UDENISTAS GOLPISTAS, que só circunstancialmente são hoje academias, redações e empresas jornalísticas tucanas.

Os "jornalistas tucanos", de fato, fazem o que fazem porque (1) encontram à mão o veículo-instrumento jornalístico perfeito para suas tucanarias e tucanagens; e porque (2) são tucanos, udenistas, golpistas de berço ou por adesão profissional.

Essa luta é longa. Mas às vezes vivemos a alegria de ver que talvez estejamos começando a sair do fundo do poço do marco zero. Mais uma vez, a glória caberá a quem devorar mais rapidamente quem o queira devorar.

Ou os muitos devoramos o jornalismo ou o jornalismo nos devorará.