quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Editorial da redecastorphoto de 23 de setembro de 2010

Cadê a grana das privatizações?


Ontem, o jornalista norte-americano Robert Scheer publicou coluna sob o título “Adeus, Summers” no blog que edita e que leva o interessante título de “Perfurando por baixo das manchetes” (1).


Robert Scheer é jornalista veterano e exímio perfurador do chão real por baixo das manchetes. É uma modalidade de jornalista que não há nos jornais que desgraçam o Brasil-2010.


Hoje, Scheer festeja com bom jornalismo e sem meias palavras a demissão [a pedido, que Obama aceitou] de Lawrence Summers, professor-doutor de Harvard e principal assessor de economia de Obama. Diz Scheer:


“O que Harvard perde, ao ter de volta o professor e “presidente” [de Harvard, título e cargo que se compram] que recebe 586.996 dólares de salário por ano e que também recebe milhões de Wall Street, é equivalente ao que os EUA ganham por vê-lo pelas costas. (...)


[Ainda durante o governo Clinton], ao primeiro sinal de alarme, nos primeiros movimentos do mercado que antecederam os perigosamente suspeitos “pacotes” das hipotecas, Summers disse em audiência no Senado, como representante do governo Clinton:


“Nossa opinião é que [não se deve] lançar as sombras da incerteza regulatória sobre um mercado pujante – aumentando o risco para a estabilidade da competitividade do mercado de derivativos nos EUA”.


(...) A quebradeira dos bancos, que Summers construiu desde o tempo do governo Clinton, fez dos EUA um país onde, hoje, 43,6 milhões de norte-americanos vivem abaixo da linha da miséria – mais do que nunca antes na história desse país. Os norte-americanos viram sumir 11 trilhões de seu PIB, 1,5 trilhões só no segundo trimestre; a dívida cresceu de forma alarmante; o desemprego não baixa de 9,6%; e há uma massa tóxica de casas que foram tomadas de seus proprietários inadimplentes, que os bancos conservam em seu poder, como garantia de bons preços, e que serão lançadas no mercado no instante em que o preço das casas dê sinal de começar a melhorar. O “brilho” de Summers ocultava um poço de desgraças.” (1)


Tenho certeza de que, como nós, qualquer brasileiro que leia esse perfil sinistro, de professor-doutor neoliberal sinistro, a serviço de um projeto sinistro de governo neoliberal sinistro, pensará nos governo de Fernando Henrique Cardoso no Brasil.


Tivemos por aqui o nosso monstro. Felizmente, já o despachamos para a lata de lixo da história, duas (já quase três) vezes, em eleições democráticas.


Os eleitores fizemos a nossa parte. Por aqui, os governos de Fernando Henrique Cardoso não conseguiram dar cabo do Brasil, mesmo que, como lembra o professor Delfim Neto, “eles tenham quebrado o Brasil três vezes!” Os eleitores fizemos nossa parte.


Mas ainda não conseguimos produzir jornalistas, jornais e jornalismo que desmascare o monstro, para começar, aos olhos dos próprios jornalistas.


O jornalismo de jornalão e os jornalistas de jornalão, no Brasil, ainda não sabem ver o monstro, sobretudo quando o mostro aparece babando “sociologias” uspeanas. Se for “sociólogo” uspeano, o jornalismo brasileiro de jornalão ouve reverentemente qualquer idiota. Chega a ser impressionante!


Na 2ª-feira passada, foi a vez de o Estadão consultar o monstro (3). O Estadão ajoelhou-se, reverente, frente ao monstro. Ouviu-o como oráculo, sem qualquer pudor. O monstro – e que monstro tolo! –, acreditou na reverência da entrevista-bajulação pelo Estadão, deitou e rolou.


O Estadão, é claro, não fez ao monstro a pergunta mais óbvia e, de fato, até, a mais jornalística: “Cadê o dinheiro das privatizações?” O monstro pré-absolvido pelo roubo que foram as privatizações, foi consultado como sumidade! O monstro, tolo e vaidoso, acreditou em tudo. Deixou-se entrevistar. Gozou. Disse, sem jornalista sério que o entrevistasse às veras, todas as besteiras que lhe ocorreram. O pseudo entrevistador anotou tudo. O Estadão publicou! ("Responda sim ou não", ordenou o entrevistador, às tantas. E o monstro, atrevidinho, respondeu: "Sim". O que poderia ser menos jornalístico e mais perfeitamente imbecil do que essas perguntas e respostas?!)


Não bastasse o Estadão na 2ª-feira, hoje foi a vez da Folha de S.Paulo (2). Aí, o ridículo foi total. Não bastasse a reverência ante o monstro desdentado e terminal, o colunista, embevecido, disse, do monstro, que o monstro é bom! Que tem “boas palavras”. Um sábio, o monstro!


Na conclusão do comentário lacaio de entrevista lacaia, o colunista da Folha de S.Paulo diz, do monstro: “[o PSDB] não sabe o que fazer com sua figura mais sábia” (2).


De onde se conclui o que já se sabia: até o PSDB moribundo já aprendeu a ver, no monstro, o monstro. “Fernando Henrique é uma âncora eleitoral: quem se juntar a ele vai pro fundo e gruda na lama”. Isso é saber ver o monstro, no monstro.


Com o que se demonstra o que também muitos sabemos: que a desgraça do Brasil não são as aberrações tucano-pefelês – que, pelo menos, souberam fugir do monstro, tirar-lhe o microfone e o palanque e, de fato, conseguiram escondê-lo completamente.


Fernando Henrique Cardoso já estaria também esquecido, lá, grudado à lama do fundo do lixo, não fosse ele periodicamente exumado, para somar, à miséria de ideias que são os jornais brasileiros, suas sociologias mofadas.


Para chamar de “caudilho” (2 e 3) o presidente Lula, ninguém precisa de pós-graduação, Sêo Fernando! Qualquer colunista analfabeto da Folha de S.Paulo sabe repetir essa asnice. D. Danuza, por exemplo, enuncia essa estupidez periodicamente, “rejuvenescida” a golpes de botox “sociológico” de-Danuza. Até D. Eliane, a marketológica, volta e meia, vem com essa!


O que a universidade brasileira udenista se acanalha em ter Fernando Henrique Cardoso, é o que o Brasil se descanalha por vê-lo pelas costas – pela ação saneadora dos nossos votos democráticos. Xô, sub-Clinton! Já foi tarde, esse sub-do-sub-Lawrence Summers!


A desgraça do Brasil não é o PSDB ou o PFL – até aí, é só a velha UDN nos estertores & finais; e o Brasil sempre sobreviveu à UDN!


A desgraça do Brasil é a imprensa de jornalão.


Toda a imprensa de jornalão.


No Brasil, nenhuma imprensa - de jornalão - sempre será melhor que a imprensa - de jornalão - que há.



NOTAS


(1)So Long, Summers”, 21/9/2010, Robert Scheer, Blog ThruthDig, Drilling beneath the Headlines.

(2)A boa palavra de FHC”, 22/9/2010, Fernando de Barros e Silva, Folha de S.Paulo, p. 2.

(3)Fernando Henrique Cardoso. Entrevista”, 22/9/2010, O Estado de S.Paulo.