30/11/2012, Joseph
Massad,The Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Joseph
Massad é professor
associado de Política Moderna e História Intelectual Árabes, na Columbia University, USA
Dia
29/11/1947, a Assembleia Geral da ONU votou e aprovou a divisão da Palestina
entre os palestinos nativos e colonos judeus majoritariamente europeus. O plano
de partição assegurava aos colonos (1/3 da população) 57% da terra; e aos
habitantes originais (2/3 da população) 43%. Dia 30/11, os colonos iniciaram a
conquista militar da Palestina, expulsando de lá centenas de milhares de
palestinos. Declararam seu estado, no dia 14/5/1948. Dos 37 judeus que assinaram
a “Declaração do Estabelecimento do Estado de Israel”, apenas um era nascido na
Palestina, o marroquino Behor Chetrit. Os palestinos rejeitaram o plano, que os
expropriava de terras suas. Exércitos árabes intervieram para fazer parar a
expulsão dos nativos, mas falharam e mais centenas de milhares de palestinos
foram expulsos. Os colonos conquistaram o território a eles atribuído pelo plano
de partição da ONU, plus metade do território que a ONU atribuíra aos
palestinos.
O
plano de partição estipulava que até 47% da população do estado judeu seria
composta de árabes; e que a população do estado árabe teria menos de 1% de
judeus. O plano insistia em que os dois estados ficavam proibidos de expulsar ou
discriminar contra suas minorias. Para a ONU, “estado judeu” significava estado
que pregava e defendia o nacionalismo judeu, sem discriminar contra não judeus;
e a definição de estado judeu e estado árabe não permitia limpeza étnica, razão
pela qual os colonos judeus a aceitaram imediatamente. Mas, desde então, os
colonos e seus descendentes insistem em que, para eles, o “estado judeu” pode
discriminar, mediante leis e políticas, contra, por exemplo, não judeus; e
promovem limpeza étnica.
A
ONU afirmou o direito dos refugiados, de retornar às próprias casas e receberem
compensação pelas perdas; Israel recusa-se a cumprir o que a ONU afirmou. Depois
que Israel ocupou 22% da Palestina restante, em 1967, e estabeleceu mais
colônias nos territórios ocupados, mais resoluções foram aprovadas na ONU, de
condenação às violações pelos israelenses, da lei internacional.
Em
1974,
a ONU reconheceu a Organização para a Libertação da
Palestina (OLP) como única representante legítima dos palestinos; desde então, a
ONU várias vezes reiterou o compromisso com as resoluções aprovadas desde 1948,
e conclamou Israel a reverter as medidas ilegais implantadas por sucessivos
governos israelenses.
Depois
dos Acordos de Oslo de 1993,
a OLP foi marginalizada, e a Autoridade Palestina (AP) foi
reconhecida como representante dos palestinos da Cisjordânia e de Gaza (mas não
dos palestinos habitantes de Jerusalém Leste, embora eles também votassem nas
eleições em área da Autoridade Palestina). Depois de 2007, a Autoridade Palestina
deixou de representar os palestinos de Gaza, que passaram a ser representados
pelo Hamás eleito. O novo projeto da Autoridade Palestina passou a ser
estabelecer um miniestado, em território não contínuo na Cisjordânia e sem
soberania. Esse projeto logo entrou em dificuldades, porque Israel não
interrompeu a colonização ilegal da Cisjordânia (e de Jerusalém Leste). Cessaram
as negociações, o que deixou a Autoridade Palestina sem qualquer legitimidade ou
objetivo final real que explicasse sua existência.
Ontem,
a Assembleia Geral da ONU votou a favor de a Palestina ser admitida como estado
observador. Por mais que alguns digam que não, a nova situação mina ainda mais
o status da OLP na ONU: a OLP representava todos os palestinos; a
Autoridade Palestina só representa os habitantes da Cisjordânia.
O
reconhecimento também diminui geograficamente o estado palestino, que passa, dos
43% da Palestina histórica assegurados pelo plano de partição inicial, para
menos de 18% do território original (e, provavelmente, para 10%, se se
descontarem as anexações, colônias, áreas militares etc.); e reduziu a população
palestina, de cerca de 12 milhões, para 2,4 milhões de habitantes da
Cisjordânia, 40% dos quais ali vivem como refugiados.
A
votação não passa, na essência, de uma atualização do plano de partição de 1947,
posto que, agora, a ONU garante aos colonos judeus e seus descendentes 80-90% da
Palestina, deixando o restante aos habitantes originários; e há alta
probabilidade de o plano agora reconhecido pela ONU cancelar o direito de
retorno dos refugiados.
Uma
pequena minoria de nativos da Cisjordânia (cerca de 1,3 milhões de pessoas),
pelos quais a Autoridade Palestina diz falar, ganhará da ONU status de
estado-sob-ocupação; e os refugiados palestinos que vivem na Cisjordânia (1
milhão de pessoas), além dos 6 milhões de outros refugiados, correm o risco de
perder o direito de retorno.
Ao
reconhecer um estado palestino diminuído, o voto da ONU, de fato, abandona a
interpretação original da ONU, pela qual “o estado judeu” não teria direito de
discriminar e estava impedido de promover limpeza étnica contra não judeus. O
novo arranjo abençoa Israel e a leitura israelense do que seja um “estado judeu”
e tudo o que essa leitura implica: a saber, a atual, real e existente
discriminação, por lei e por políticas; e a limpeza étnica que Israel pratica.
Tudo isso passa a ser aceitável. Já quase, na prática, é tudo legal.
A
evidência de que a “atualização” tenha acontecido também num 29 de novembro –
data do primeiro plano de partição – contribui para demarcar a mesma data como
data de repetidas derrotas dos palestinos, que continuam a sofrer sob as leis
colonialistas de Israel. A data marca a repetição, também, do crime e da culpa
da ONU, que nega outra vez, aos palestinos, seus direitos humanos básicos de não
serem expropriados de suas propriedades e de não serem alvo de práticas
racistas.
Mas, de garantido, é que os
palestinos, cuja maioria não é representada pela Autoridade Palestina, não se
renderão ao novo plano de partição, como nunca se renderam ao primeiro plano. Os
palestinos continuarão a resistir contra o colonialismo israelense, até
derrotá-lo, e até que Israel, afinal, se converta em estado para todos os seus
cidadãos, todos com direitos iguais e assegurados, independente de
nacionalidade, origem étnica ou religião.
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