sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Pepe Escobar: “E o Prêmio Nobel da Guerra? Para a OTAN?”


13/12/2012, Pepe Escobar, Asia Times Online – The Roving Eye
Traduzido e musicado pelo pessoal da Vila Vudu

Para ler ao som de “It’s only rock’roll, but I like it” [É só rock’n roll, mas eu gosto],
dos Rolling Stones [com Tina Turner – por que não? – em 23/3/1988, (NTs)]


Pepe Escobar
Nessa 2ª-feira, a União Europeia (EU) recebeu, em Oslo, o Prêmio Nobel da Paz, por promover a paz, a reconciliação, a democracia e os direitos humanos.

Que emocionante. Observem o elenco selecionado para receber a honraria: o espetacularmente inútil Herman van Rompuy (presidente do Conselho Europeu); o espetacularmente medíocre Jose Manuel Barroso (presidente da Comissão Europeia); e Martin Schulz, essa não entidade, presidente do Parlamento Europeu. Os Rolling Stones podem estar geriátricos, mas, pelo menos, sabem comandar a massa.

Barroso falou feito pudim de vinho do Douro; disse que a União Europeia é “poderosa inspiração para muitos em todo o mundo”. Ora bolas! O caso de amor que as massas chinesas vivem hoje com Audi e Prada não é inspirado exatamente pela União Europeia. Disse também que a União Europeia é produto “do livre consenso dos estados para partilhar a soberania”. Ora bolas! Os britânicos estão tão entusiasmados com a tal partilha, que a vasta maioria da população quer pular fora.

José Manuel Barroso
Mas Barroso argumentou bem, ao defender o euro: “Vamos defender o euro”.

O que os noruegueses – os quais, espertamente, não se deixaram arrastar para a União Europeia – fizeram foi entregar um Prêmio Nobel ao (desvalorizado, detonado) Euro. Movimento de Relações Públicas. Afinal, não há dois membros da União Europeia que concordem, numa linha, que seja, sobre impostos, regulação para o turbocapitalismo, ou sobre o que fazer de uma Grécia falida, nem de todos os países do “Clube Med” que logo também estarão falidos; ou sobre o que estão fazendo, de verdade, aqueles soturnos sujeitos do Banco Central Europeu.

Verdade é que poucos, exceto a legião de burocratas de Bruxelas, com gordos cartões para despesas, sabe para que serve, diabos, a União Europeia, além de servir para almoçar em Paris e jantar em Parma sem precisar carregar o passaporte (oh, sim, o que salva a União Europeia é a gastronomia fabulosa, pelo menos para os que possam pagar).

A União Europeia existe, basicamente, por causa do artigo 3º do Tratado de Lisboa; espera-se que seja “economia social de mercado altamente competitiva”, negociando em euros. Sim, você tem todo o direito de continuar intrigado – porque qualquer exame das manchetes recentes revela que esse esquema não está funcionando. O esquema é comandado por uma casta de tecnocratas viciados em “ajustes estruturais” que condenam dúzias de milhões ao fundo do poço da austeridade. Como se aqueles burocratas de Bruxelas dissessem “Vocês estão ou conosco – com o euro – ou contra nós (e, nesse caso, é guerra). O caso é que a guerra econômica – contra cidadãos europeus – já ruge.

It's only rock'n war... / É só gritaria e guerra...

A política externa da União Europeia também pode não passar de piada, 27 galinhas degoladas atirando a esmo (e umas contra as outras) contra tudo, da Palestina à admissão da Turquia. Mas se há coisa que a União Europeia faz bem feito é produzir, pôr no mercado e vender armas a todos os envolvidos no business da guerra.

O jornal Asia Times Online confirmou, de fonte independente (dois diplomatas com base na EU) que os EUA – pelo seu braço armado dominado pelos EUA, a OTAN – estão prontos para mais uma guerra, na Síria. Confirma-se assim matéria recente, nessa linha, publicada no diário alemão Suddeutsche Zeitung (Moon of Alabama oferece boa tradução ao inglês).

Anders Fogh Rasmussen
Os diplomatas confirmaram ao jornal ATol, que o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – o espetacularmente medíocre Anders Fogh Rasmussen – comicha, de tanto que quer guerra na Síria, envolto na retórica de “a OTAN não deve enterrar a cabeça na areia”.

Para recitar suas linhas diretamente de Washington, Rasmussen conta com forte apoio da Turquia, Grã-Bretanha e França, com a Alemanha apanhada em posição extremamente ambivalente: o ministro alemão de Relações Exteriores, Guido Westerwelle descartou a guerra, em favor de uma solução política.

Uma coisa é um ataque de comichão a favor da guerra; acertar o negócio é outra. Até a diretiva geral para que a OTAN comece o espetáculo na Síria tem de ser aprovada por todos os 28 países da OTAN. Seja como for, o esqueleto do negócio é o seguinte: Washington mantém a ordem dada ao seu fantoche dinamarquês Rasmussen para que prossiga no serviço de preparar o caminho da guerra, por todos os meios necessários.

Bem-vindos à Síria, nova Líbia 2.0 – apesar de não haver jeito de Washington usar mais uma vez a conversa fiada da Responsabilidade para Proteger [orig. Responsibility to Protect (R2P) no Conselho de Segurança da ONU.

Angela Merkel
É, Bruxelas, temos um problema. Tudo acontece no momento em que mísseis Patriots são deslocados para a fronteira turca, com 400 soldados alemães. A opinião pública alemã não quer outra guerra no mundo muçulmano. Em 2013, haverá eleições na Alemanha. Nem Angela Merkel nem Westerwelle são suicidas.

A conversa sobre os mísseis Patriots – que “protegerão” a Turquia contra mísseis a serem lançados da Síria – saiu, sem tirar nem pôr, do Manual de Uso de Armas de Enganação em Massa. Frederick Ben Hodges, chefe do recém inventado Comando dos Aliados em Terra da OTAN [orig. Allied Land Command], com base em Izmir, Turquia, contou à agência de notícias da Anatolia que os Patriots lá estarão para conter os mísseis químicos da Síria.

Como se Bashar al-Assad, tanto quanto Frau Merkel, fosse doido suicida. Os únicos que realmente acreditam na invenção de propaganda instigada pela inteligência em Washington – segundo a qual Damasco “pode” usar armas químicas como último recurso é o cãozinho-de-madame, Rasmussen, e o clube britânico-franco-turco de mediocridades políticas. Nada faz crer que a propaganda da OTAN assuste o governo sírio.

Recep Tayyip Erdogan
Quanto ao espetacularmente errático primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan, fez pleno sentido em, pelo menos, uma coisa: é como uma febre, uma doença; o homem só pensa em zona aérea de exclusão. Mesmo que a opinião pública turca não queira guerra, nada cura Erdogan da tal doença. A máquina de propaganda de EUA/OTAN tentou de tudo: de suborno a hordas de funcionários em Damasco, até culpar Assad por mini-holocaustos semanais. Nada funcionou.

Os chamados “rebeldes” – infestados de jihadistas-salafistas – só “controlam” áreas rurais; pequenos enclaves de maioria sunita ou favelas em torno das grandes cidades. Há cerca de 40 mil combatentes nos subúrbios de Damasco; podem estar caminhando para cair diretamente numa monstruosa armadilha montada pelo Exército Sírio.

Deve-se, portanto, esperar que o dito “fator decisivo” tenha de fazer hora extra. Até que o medo das tais armas químicas leve – como tantos querem? – à zona aérea de exclusão, buscada como se fosse o Santo Graal.

...But I like it /... Mas eu gosto

Esqueçam o sempre propagandeado Exército Sírio Livre [orig. Free Syrian Army (FSA)] “pró-democracia”. Não passa de gangue financiada e logisticamente apoiada e organizada por EUA, OTAN e as petromonarquias do Golfo Pérsico, exemplares de boa democracia; totalmente infiltrado por jihadistas linha duríssima, sírios, líbios e iraquianos, que matam civis indiscriminadamente, em nome da União Europeia, laureada com o Prêmio Nobel da Paz e ardente defensora de direitos humanos.

Mas não desistem. Sob o olhar vigilante dos EUA e do Clube CCGOTAN (Conselho de Cooperação do Golfo e OTAN), rebeldes de alto escalão reuniram-se na Turquia na 6ª-feira passada, para eleger um “comando unificado de 30 membros”. Como é fácil adivinhar, todos os 30 membros são ligados ou aos salafistas ou à Fraternidade Muçulmana (FM); dos comandantes islamistas Jamal Marouf e Ahmad al-Issa, ao ícone salafista coronel Abdelbasset al-Tawil. Os dois cabeças de Aleppo são – claro! – salafistas. Tradução: exatamente os mesmos que o Departamento de Estado (ainda) não redefiniu como “terroristas”.

O modus operandi genérico deve ser expandido: mais armas financiadas por europeus para as gangues de jihadis-salafistas assassinos. A França está fazendo chover euros sobre eles, a partir da fronteira turca. Na quarta-feira, 12/12, os “Amigos da Síria” reúnem-se novamente em Marrakesh, Marrocos, já pesadamente tendentes a votar com o núcleo “queremos guerra” do Clube CCGOTAN.

Noruegueses, vocês nada têm a perder, senão o senso do ridículo – se já não se foi, de vez, também ele.

Afinal, se uma União Europeia em ruínas, moeda em ruínas e tudo, pode meter na mala o Prêmio Nobel da Paz de vocês... é hora, já, de entregar um Prêmio Nobel da Guerra à OTAN, que nada faz além de guerra.

Rasmussen não é nenhum Mick Jagger, mas já baba de vontade de guerra. É só gritaria e guerra, mas ele gosta.

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