quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Obama quer virar a maré da opinião pública nos EUA

5/9/2013, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Martin Dempsey (E), John Kerry (C) e Chuck Hagel (D) em 4/9/2013
Rápida passada de olhos na transcrição completa da reunião da Comissão de Relações Exteriores do Senado dos EUA em Washington na 3ª-feira, sobre possível autorização para ação militar contra a Síria, permite conjecturar sobre o pensamento do governo Obama. Falaram os secretários de Estado e da Defesa, John Kerry e Chuck Hagel e o comandante do Estado-Maior, general Martin Dempsey.

“Coturnos em solo”

Sobre “coturnos em solo”, Kerry repetiu várias vezes que não serão mobilizados soldados “para finalidades de combate” e, em resumo, que soldados norte-americanos não serão envolvidos “nas lutas dessa guerra civil”. Mesmo assim, entendeu apropriadas as palavras na resolução do Senado de que “não se tira da mesa uma opção que deva ou não ser disponível” para o presidente. Para Kerry, “é fácil, não é assim tão complicado, arrumar a escrita... Tenho certeza de que se pode dar um jeito”.

“Proteger a aliança”

Kerry repetiu várias vezes que, se os EUA não agirem na Síria agora, estarão estressando a aliança regional dos EUA com estados regionais. “Se não agirmos [na Síria], ficaremos com menos aliados”. Disse que os aliados dos EUA na região já estão duvidando e “avisando” Washington.

“Mudança de regime”

Kerry deixou bem claro que os EUA forçarão mudança de regime, custe o que custar, apoiando os rebeldes. O projeto fez “curvas e voltas ao longo dos últimos meses.” Mas trata-se de “ação secreta” [orig. a covert action] e os senadores teriam “audiência fechada ou secreta”.

Ameaças à Síria

Bashar al-Assad
Kerry ameaçou o regime sírio de que, se retaliar contra aliados regionais dos EUA – mencionou Turquia, Jordânia, os Emirados Árabes Unidos, a Arábia Saudita, o Qatar –, “se ele [presidente Bashar al-Assad] for doido o bastante para responder... se fizer isso, receberá algo muito pior... algo que não conseguirá suportar”. Os EUA estão “cheios de opções”, ameaçou. Assad, no melhor dos casos, mal sobreviverá a um ataque militar dos EUA e a oposição e o povo sírio chegarão à conclusão de que “ele não é aposta de longo prazo”, o que, por sua vez, levará a deserções do regime.

Rússia e Irã

Kerry avaliou a posição de Rússia e Irã. Revelou que Obama espera discutir a Síria com Putin à margem dos encontros do G20 em São Petersburgo, porque os EUA não estão procurando “uma espécie de luta desnecessária” com a Rússia, que está “cooperando com os EUA para construir um processo de trabalho negociado sobre o conflito sírio, como também em outras grandes questões como desarmamento, Coreia do Norte e Irã”.

Portanto, o governo Obama gostaria de negociar “pensadamente” com Moscou. Disse Kerry: “A Rússia não tem um comprometimento ideológico aqui [sobre a Síria]. É um compromisso geopolítico transacional” e, embora Moscou possa estar procurando uma oportunidade para vender mais armas à Síria, “não criará qualquer tipo de mais ampla confrontação”.

Dempsey acrescentou que os quatro navios de guerra russos estão mantendo “distância respeitosa” da frota dos EUA no Mediterrâneo Leste, e os EUA não veem os navios russos como “um fator”.

Mas Kerry disse que, em “sessão secreta”, o governo dará conhecimento aos senadores sobre a provável resposta de Rússia, Irã e Hezbollah a um ataque liderado pelos EUA à Síria.

Dempsey disse que os EUA têm “alguma indicação” de que Moscou garantiu ao regime sírio que pode substituir qualquer equipamento militar destruído em ataque dos EUA.

Kerry manifestou a esperança de que, conforme surjam mais provas da culpa do regime sírio, “ficará muito difícil para Irã ou Rússia” continuar a defender o regime sírio.

Envolvimento da OTAN

Kerry revelou que os EUA estão “avaliando” algum envolvimento da OTAN. “As discussões estão acontecendo”. No sábado discutiu com seus contrapartes europeus, numa reunião em Vilna. Uma “coalizão muito ampla” já está disponível, com 53 países que já reconheceram (e condenaram) que foram usadas armas químicas no conflito sírio, dos quais 31 países responsabilizaram o regime sírio, e 34 declararam que, se se provar que o regime de Damasco usou armas químicas, apoiarão algum tipo de ação militar.

Vladimir Putin
Putin

A audiência no Senado aconteceu um dia antes de entrevista de Putin à Associated Press, publicada ontem, na qual Putin deixou sugerido que a Rússia estaria reativando um contrato suspenso com a Síria para fornecimento de mísseis S-300 de defesa antiárea e fez ameaça velada de reativar também um contrato com o Irã para fornecimento do mesmo tipo de armas, contrato que Moscou cancelara há poucos anos, sob forte pressão de EUA e Israel.

China?

Chama a atenção que na transcrição integral das falas na Comissão de Relações Exteriores do Senado dos EUA, mais de 35 mil palavras,a palavra “China” não ocorreu sequer uma vez.
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[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Irã, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Times Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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