Medo
histérico em Chicago, à espera do encontro do G8-OTAN, em
maio
14/2/2012, Kevin
Gosztola, The Dissenter
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Kevin Gosztola |
A prefeitura de Chicago do prefeito Rahm Emanuel
comprou “novos escudos protetores de rosto”
para os policiais de Chicago, para serem usados durante a reunião do G8-OTAN na
cidade, em maio próximo. Os “protetores de rosto”, segundo o Chicago
Sun-Times, “adaptam-se perfeitamente sobre as máscaras antigás e blindarão
os policiais contra líquidos que sejam jogados contra
eles”.
Os
escudos estão sendo comprados da empresa Super Seer Corporation com sede no
Colorado. 3.057 “escudos novos e aprimorados” já foram comprados. São parte de
“contrato de emergência no valor de $193.461”, “primeira aplicação” do “poder
extraordinário garantido a Emanuel para comprar equipamentos e serviços
necessários para a reunião do G8-OTAN na cidade”. [Em janeiro passado, o
Conselho Municipal de Chicago deu ao prefeito Emanuel autorização para fazer
compras sem licitação e sem depender de aprovação do Conselho Municipal, no caso
de os equipamentos ou serviços necessários para a reunião do G9-OTAN na cidade
não estarem previstos nos contratos já existentes.]
Mas exatamente que líquidos o prefeito e os policiais
temem que os manifestantes contra a reunião do G8-OTAN “lancem” contra os
policiais? O presidente da Frateneral
Order of Police (FOP) [Ordem Fraterna da Polícia] Mike Shields argumenta que
os novos escudos são necessários para impedir que “anarquistas e outros
manifestantes extremistas ceguem os policiais com urina e fezes”. [1]
Segundo
o Sun-Times, Shields gostou que a compra esteja feita, mas teme que a
quantidade seja insuficiente:
“[Shields]
não tem certeza de que bastem os 3.057 escudos se, como ele teme, dezenas de
milhares de manifestantes chegarem a Chicago para os encontros sem precedentes
que atrairão para a cidade as atenções de todo o
mundo.
Temos
9.500 policiais. Cada um deles precisa de novo escudo, porque só têm o modelo
antigo, que é absolutamente ineficaz, feito de plexiglass muito fino. Se se
pressiona o escudo com o polegar, ele se quebra. Se receber uma pedrada, pula
fora. Não é impermeável e qualquer líquido o atravessa” – diz
Shields.
Sabe-se
que os manifestantes que aqui estarão para protestar contra as reuniões do G8 e
da OTAN são conhecidos por jogar garrafas com urina e sacos de fezes contra a
polícia. Os policiais precisam de escudo que se adapte às substâncias que são
jogadas contra eles.”
O
presidente da empresa Super Seer
Corporation, Steve Smith, não descarta a suposta “ameaça” de “urina e fezes”
durante as reuniões na cidade. Sua empresa, que fabrica escudos para policiais,
ganhará mais, quanto mais se dissemine esse medo histérico, irracional. Para
Smith, o risco de os policiais serem atacados com “sacos de urina e outros
líquidos” é “risco bem evidente”. Os protestos serão “voláteis”. Há risco de
“policiais serem feridos”. E, aparentemente, há risco de que, entre os
projéteis, haja excrementos humanos.
Mas,
afinal, quando aconteceu de policiais serem atingidos por tais substâncias? Na
matéria publicada no Sun-Times, há rápida referência, perdida no texto, a
uma vez, há muitos anos, quando um “anarquista” ou “agitador” foi preso por pôr
a polícia em risco de ser atingida por cocô ou xixi de esquerdistas. De fato,
jamais se registrou nenhum incidente desse tipo. Não há nenhum incidente que
justifique a militarização da polícia e a demonização preventiva dos
manifestantes na preparação para os eventos previstos para
Chicago.
Pesquisa
no noticiário revela que todos os policiais e agentes de segurança da cidade
sempre tomaram as medidas de prevenção que uma pessoa razoável considere
necessárias. E urina e fezes aparecem entre riscos a temer, porque alguém teria
dito que aconteceu, provavelmente em 1999, nos protestos de Seattle contra
reunião da Organização Mundial do Comércio, de os policiais terem sido agredidos
com urina e fezes. Infelizmente, bastou esse boato, porque nenhum jornalista ou
repórter parece ter considerado importante informar que nenhum “anarquista”
conhecido jamais jogou urina e fezes contra policiais e que esse é um dos memes
que persistem sobre os grandes protestos de nossos dias.
Cidadãos Normais Organizados contra o Cocô "Cocô-NÃO" |
Por
isso, em 2008, pouco antes da Convenção Nacional do Partido Democrata em Denver,
Colorado, três grupos que organizavam grandes manifestações assinaram um
documento que chamaram de “Acordo do Cocô”. Tinha tom satírico, mas foi assinado
a sério. O tratado de “não proliferação do cocô” na Convenção Nacional dos
Democratas dizia, no preâmbulo:
“O
grupo não partidário “Cidadãos Normais Organizados contra o Cocô” (doravante
chamado “Cocô-NÃO”) conclama todos os partidos para uma moratória na prática de
lançar, portar, distribuir ou induzir o lançamento de excrementos, na semana de
25-29 de agosto.
Reconhecendo
afirmações recentes sobre a possível utilização de fezes e urina como arma de
ataque, ouvidas nas discussões sobre métodos de controle de multidões durante a
Convenção Nacional do Partido Democrata em 2008, criou-se o pânico de que a
cidade de Denver possa ser inundada em excremento humano durante o
evento;
Movidos
pelo desejo implícito de policiais, manifestantes, delegados e do povo de
Denver, de evitar-se o contato indesejado com tais
dejetos;
Resolveram
que se faz necessário um acordo multilateral para pôr fim à paranóia que lançou
em confusão tantas pessoas aparentemente racionais;
Declaramos
que, juntos, podemos iniciar uma nova era no planejamento de convenções, livres
da ameaça de urina e fezes.
Infelizmente,
nem esse acordo teve muito impacto na percepção dos policiais, de que estariam
sob risco de serem agredidos com urina e fezes. O mesmo medo voltou à tona na
Convenção Nacional do Partido Republicano em St. Paul, Minnesota, na primeira
semana de setembro de 2008.
A
polícia de Minneapolis revistava um ônibus. E há declarações segundo as quais
“ao cair a tampa de um contêiner, todos sentiram odor típico de fezes humanas
que vinha do ônibus” – segundo o Centro de Jornalismo Investigativo. [2]
O
ônibus pertencia a Stan e DeLyla Wilson. A polícia fez contato com um “centro de
fusão” [3]
em
Montana e descobriu que os Wilsons eram ligado à organização Earth First!, que
apoiava métodos radicais para deter a degradação do meio
ambiente.
O
“odor”, como depois se viu, vinha de cinco galões de “ração para galinhas”, não
de urina ou fezes. O ônibus dos Wilsons foi levado para um ponto deserto da
rodovia, por suspeitas de que contivesse outras substâncias, mas nada foi
encontrado.
Durante
os protestos contra reunião da Free Trade
Area of the Americas (FTAA) em Miami em 2003 (quando o “modelo Miami” foi
usado pela primeira vez), a polícia de Miami preparou para resistir a um ataque
de urina e fezes. Quando o ataque não aconteceu, a polícia declarou que nem por
isso os temores policiais seriam injustificados. O sargento Denis Morales,
porta-voz do departamento de polícia, disse à impressa, ao apresentar as “armas”
que os manifestante haviam planejado usar contra a polícia:
“Infelizmente
não podemos exibir as garrafas de urina nem as fezes que os manifestantes
planejavam usar.” Afirmou que “agentes não uniformizados” misturados à multidão
de manifestantes haviam detectado, antes das manifestações, a presença daqueles
“objetos potencialmente ameaçadores”.
Todos
os discursos sobre policiais agredidos com urina e fezes não passam de mito.
Como David Solnit escreveu em dezembro de 2011:
“Manifestantes
que lançam urina e fezes contra policiais” é um dos mitos que as autoridades
usam para criminalizar os protestos desde Seattle, embora nada comprove a
ocorrência desse tipo de agressão em Seattle nem em qualquer outro evento de
protesto global. É mais um mito que se criou para encobrir e, de algum modo
justificar, a violência contra as liberdades civis e a violência policial contra
manifestantes.
Para
o militante David Meieran, do Grupo “Salve Nossas Liberdades Civis”, “É parte de
um espectro de estratégias de guerra de informação que o Estado usa para
reprimir qualquer oposição ou dissidência. ‘Urina e fezes’ deve ser analisado no
contexto mais amplo da completa ignorância dos policiais sobre tudo que tenha a
ver com manifestações populares e eventos sociais de protesto. Temos ouvido a
mesma linguagem e expressões similares em praticamente todas as cidades onde há
manifestações populares (policiais agredidos com ‘urina e fezes’; ‘no tempo dos
pais de vocês isso não acontecia’ etc.).”
[4]
Mas,
como a maioria dos policiais trata os manifestantes como seres que ameaçam
gravemente a ordem pública, em vez de os verem como cidadãos que exercem o
direito de discordar, garantido pela 1ª Emenda da Constituição dos EUA, não
surpreende que o mito se perpetue.
Os
novos escudos são mais um símbolo da mesma ideia sobre o que seja a lei e a
aplicação da lei, resposta a gente ‘inferior’ que se atreve a protestar, e que
os policiais desprezam, porque não entendem que alguém se atreva a protestar
contra a realização, na cidade, de um evento de grande significação, como a
reunião do G8. Tampouco em Miami os policiais tinham qualquer ideia aproveitável
sobre os protestos contra o ALCA. Antes das manifestações, os policiais falavam
sobre “táticas de Seattle” que seriam usadas pelos manifestantes em Miami, que
envolviam coquetéis Molotov, porretes, pistolas d’água carregadas com urina ou
ácido, e perigosos estilingues que disparariam bolas de aço ou projéteis
maiores”. São praticamente as mesmas palavras que se ouviram da polícia de New York, a qual, durante a Convenção
Nacional dos Republicanos em 2004, alertava para a presença, na Convenção, de
“militantes treinados em técnicas de sequestro, produção de bombas de fabricação
caseira e de munição artesanal de vários tipos”.
Dado
que a imprensa-empresa nos EUA é sempre absolutamente reverente, quando se trata
de justificar violências praticadas pela polícia (até, pelo menos, que
jornalistas comecem também a apanhar da polícia ou são feridos à bala por
policiais), a promoção de mitos como os “sacos de urina e fezes atirados contra
os policiais” por manifestantes e agitadores é recurso útil, que dá cobertura
aos policiais quando se põem a prender cidadãos preventivamente, nas semanas que
antecedem eventos em relação aos quais a polícia teme que haja protestos de rua.
Os “centros de fusão” produzem e distribuem informação sobre a vida pessoal dos
ativistas. Alguns desses cidadãos já tiveram seus nomes publicados na imprensa,
associados à ameaça de violência em manifestações que a polícia prevê que
aconteçam durante a reunião do G8-OTAN, em maio, em Chicago. É também recurso de
que a polícia se serve para intimidar outras pessoas menos habituadas a
participar de manifestações públicas, por mais que desejem engajar-se nos
protestos.
O
jornal Chicago Sun-Times oferece hoje uma prévia da operação de
demonizar e apresentar como agitadores perigosos quem se manifeste contra os
encontros do G8-OTAN; e, simultaneamente, também da operação de apresentar os
próprios policiais como “salvadores” dos encontros G8-OTAN.
Os
escudos “à prova de urina e fezes” são boa amostra da quantidade de informação
distorcida e de desinformação, em “declarações” de funcionários da prefeitura de
Chicago, oficiais de polícia, empresários e líderes políticos, que será
apresentada à opinião pública como informação verdadeira e confiável.
Ironicamente,
tanta desinformação pode acabar por prejudicar, em primeiro lugar, o próprio
prefeito Emanuel.
Estimulados
e alimentados pela atual onda de desinformação e de demonização “preventiva” dos
manifestantes e dos protestos esperados para maio em Chicago, muitos já dizem
que as autoridades jamais deveriam ter concordado com a ideia de realizar na
cidade o encontro do G8-OTAN – que deixará a população exposta “a protestos
violentos”. Moradores já reclamam do custo de organizar a reunião e do alto
risco de “danos às propriedades” (outra ameaça que a polícia não se cansa de
repetir, para justificar as compras e as medidas de violência “preventiva” em
curso).
O
que o prefeito esperava ganhar em prestígio e honra, por Chicago hospedar a
reunião do G8-OTAN em maio, pode rapidamente cair abaixo de zero.
Notas
dos tradutores
[1] 14/2/2012, Chicago Sun Times, “City
buys face shields to protect cops from G-8
protesters”
[3]
Orig.
fusion center. São
centros para concentração e partilha/distribuição de informações de segurança, a
maioria dos quais foram criados por projeto conjunto entre o Departamento
Nacional de Segurança Interna e o Departamento de Justiça dos EUA, entre 2003 e
2007.
[4] 5/11/2012, The Indypendent, “Seattle WTO Shutdown ’99 to Occupy: Organizing to
Win 12 Years Later”
Esses cabras não sabem de nada, bom é OVO podre, é tão destruidor quanto um EXOCET, o cabra fraqueja, perde as vista, muda até de cor.
ResponderExcluirQuando fazia passeatas em Osasco na década de 1960 via pessoas jogarem cal extinta na polícia com bisnagas de carnaval, aquelas de espremer, para dificultar a visão dos meganhas; . A cal era "roubada" nas obras da vizinhança. Tinha lá o seu efeito!
ExcluirAbraço
Castor