Conseguirá o Euro sobreviver?
Mas sobretudo: conseguirão os Europeus ultrapassar as divisões e as antigas desconfianças?
Segundo Lucio Caracciolo, professor de Geografia Política e jornalista, estes são os problemas que impedem de olhar para o futuro com grande esperança.
Nós achamos que o verdadeiro problema seja outro: esta não é a Europa que os Europeus sonharam. É uma Europa imposta, não desejada: e as coisas impostas aturam-se ao longo duns tempos.
Mas só ao longo duns tempos.
Sem um País real por trás não há dinheiro real. O defeito genético da moeda única. Ainda há os estereótipos dos Países virtuosos e dos não-confiáveis.
A Europa dos van Rompuy, Barroso e Baronesa Ashton não pode dar-se ao luxo do Euro. Com a primeira grave crise, os defeitos genéticos da moeda única, que é a principal moeda em circulação nos doze Países da Europa, vieram à tona, com consequências potencialmente devastadoras: sem um Estado real por trás não existe uma verdadeira moeda. O bluff pode trabalhar em dias de sol, mas quando se desencadeia a tempestade já não sabemos o que fazer. A lição de Atenas, para aqueles que querem compreende-la, é clara: ou adaptamos a Europa ao Euro ou abandonamos o Euro.
História e Crónica da União Europeia sugerem que vamos escolher uma terceira via. Adiar, adiar, adiar. Entre um tampão financeiro e um outro. Até que a doença não esteja difundida e profundamente enraizada
O Europeísmo federalista estilo clássico tinha apostado no Euro como um marco da própria estratégia esotérica: partir da economia para chegar à política, numa paradoxal reabilitação das teorias marxistas. Como se após o carvão e o aço, após o mercado, após a moeda, fosse possível chegar de forma leve à política unificada. Sem que os Europeus soubessem, porque então teriam evitado este desfecho.
Daí o medo de enfrentar qualquer debate público sobre as finalidades e os limites da constituição europeia, ilustrada como um eterno trabalho em progressão. Mas uma progressão sem um objectivo é uma aventura. Que com o tempo perdeu o lado fascinante, excitante, para dar lugar ao Euroaborrecimento generalizado. No limite da Eurofobia. Clima ideal para os inimigos da Europa e para aqueles que antes da democracia liberal e duma sociedade aberta, colocam a chamada da pátria, a tecnocracia autoritária e o racismo.
Este último aspecto é central na história do Euro. Desde a gestação da moeda europeia no contexto do pós-muro [de Berlim, NDT] até a crise actual, o factor étnico tem sido e continua a ser essencial
As queixas actuais dos Países "virtuosos" (as aspas são obrigatórias), contra a flacidez (sem aspas) do "Club Med" ou dos "Pigs" reapareceram com as mesmas exactas palavras utilizadas durante os anos Noventa, quando era preciso estabelecer quem fosse e quem não fosse autorizado a entrar na família da moeda única.
Além dos vagos critérios de Maastricht, interpretados de acordo com a evolução económica e as relações de poder, a classificação foi e continua a ser antropológica e cultural. Assim, os gregos, mas também os Portugueses, os Espanhóis e os Italianos não merecem confiança a longo prazo porque vocacionados a disparar por cima ou mascarar os orçamentos. Enquanto os Alemães ou os Holandeses, por nascimento, são rigorosos, oportunos, exactos.
Pouco importa se os factos demonstram muitas vezes o oposto: os preconceitos persistem. E afectam as decisões dos políticos e dos mercados.
Um dia vamos conseguir sair desta crise económica e monetária. Esperemos em condições não tão desastrosas. O que parece destinado a sobreviver é esse racismo soft, o que intensifica a tese de Schumpeter sobre a relação entre o "carácter nacional" e a política monetária. Se a Europa não é completa, se o Euro está sofrendo é porque nada de comum e de duradouro pode ser construído entre quem se considera geneticamente diferente.
Tradução e origem: Informação Incorrecta