28/6/2013, Jean-Luc Mélenchon, Courrier du Blog
Le Brésil en question
[*]
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Jean-Luc Mélenchon |
No
Brasil, um potente movimento popular e jovem invade as ruas. Não tenho, cá da
minha mesa em Paris, a pretensão de que saberia o que se passa nesse momento no
Brasil e de que eu teria a resposta política mais certa. Mas a prática que tenho
daquele continente e meu trabalho sobre os eventos que ali se veem já há 15 anos
me permitem, sem temeridade, propor alguns elementos à reflexão.
Mesmo
visto de bem longe, salta aos olhos o conteúdo progressista do movimento, que
exige melhores serviços públicos, protesta contra a corrupção e denuncia o jogo
dos jornais e redes de televisão. Essas demandas formam o tripé de base dos
primeiros passos de todas as revoluções cidadãs pelo mundo. Mas, no Brasil, esse
movimento aparece sob governo de esquerda, da presidenta Dilma Rousseff.
O
governo Dilma, depois do governo de Lula, é parte constitutiva da onda de
revoluções democráticas que atravessaram o continente. E obteve vitórias
brilhantes na luta contra a pobreza. Em período recente, Dilma Rousseff deu
provas de coragem e de determinação, nas respostas que deu contra manobras do
império norte-americano que obra para desestabilizar o país, naquela região. Deu
provas de que vê com lucidez os limites da Europa atual em geral, apesar dos
movimentos eurobéats [1] do
grupo social-democrata de seu partido.
Rio de Janeiro (Pozzebon) |
A
proposição de Dilma, para responder positivamente ao movimento em andamento nas
ruas foi, na minha avaliação, completa novidade na arte da gestão de situações
insurrecionais. Foi, em minha opinião, resposta perfeitamente adaptada ao que é
mais necessário no momento. Não o digo pensando no interesse do partido da
presidente, nem, sequer, em sua presidência.
Digo-o pensando do ponto de vista do país e do futuro
revolucionário do processo para o qual os governos do PT abriram caminho em
2002. A
presidenta propôs convocar uma Assembleia Constituinte. Que melhor via para
refundar a sociedade política e repensar seus valores e objetivos, dando ao povo
o meio pra se construir politicamente? Essa proposta foi engolida pelos
protestos dos especialistas constitucionalistas conservadores cabeças-de-ovo brasileiros, por um lado.
E, por outro lado, pelo tiroteio que a presidente recebeu, pelas costas, de seu
próprio campo. Não haverá Assembleia Constituinte. Essa é a pior notícia de
todas. Adiante, tentarei explicar-me melhor.
Antes
disso, temos outra discussão a fazer: o movimento que cresce com
palavras de ordem hostis ao governo de Dilma Rousseff exige todo o nosso
empenho. É nosso dever intelectual analisá-lo com seriedade. Afinal, se trata de
compreender o que se passa, para extrair lições e, com elas, conduzir nossa
estratégia.
Na
emergência desse processo quase insurrecional, sabe-se que se conjugam vários
parâmetros e que é perda de tempo procurar alguma causa única. Dentre as várias
causas, muitas são clara e pesadamente imputáveis ao próprio governo, ao sistema
do Partido dos Trabalhadores (PT), à política produtivista e extrativista ainda
seguida por vários setores decisivos. Mas, para produzir reflexão útil, acho que
temos de nos propor novas perguntas, tão novas, pelo menos, quanto a situação.
De nada nos servirá retomar os termos habituais: “eles” fizeram pouco, “eles”
foram insuficientes”. Mudemos de cantoria.
Uma
boa pergunta a propor, me parece, é “como o PT – se ainda houver tempo – pode
repensar e encontrar, no movimento atual, algum elemento positivo para
aprofundar o que o partido começava a ter, com Lula”. Essa não é discussão, nem
esse é assunto reservado só aos brasileiros. Minha intuição diz que temos de
aprender a pensar de outro modo nossa ação de governo. Não só em torno do nosso
programa, mas também em termos de como fazer a gestão da mais longa duração.
Arcos da Lapa (RJ) - J.Cruz |
Situo-me
aqui como alguém que se sente muito próximo do governo do Brasil, o suficiente
para não querer vê-lo se estatelar sob golpes e mais golpes de um movimento que,
como se vê, une muita gente. Escolho esse ângulo de análise, para não me deixar
prender na armadilha de discutir duas conhecidas linhas de crítica de esquerda
que, como entendo, nos levariam ao impasse.
A primeira
dessas linhas sem saída, em minha opinião, é nos
deixar consumir, escrevendo o catálogo das críticas pequenas e grandes contra
tudo o que não foi feito, que foi mal feito ou que não foi suficientemente
feito. Falo aqui, para fugir dela, da crítica de tipo “ala esquerda”, que
vive a lamentar que ela própria nunca consiga fazer coisa melhor. Essa crítica
está abaixo da realidade que se vai produzindo nas ruas. Para dizê-lo bem
diretamente: se, amanhã, Dilma Rousseff anunciasse a imediata construção de
todas as escolas que todos exigem, duvido muito que essa “resposta” bastasse
para acalmar alguém. O movimento parece já ter chegado ao ponto no qual suas
reivindicações parecem inscritas num projeto muito maior do que o que se
manifesta nas reivindicações pontuais. De onde vem essa dinâmica?
Vejo
aí razões de efeito quase mecânico, que estão operando dentro da sociedade.
Adiante, também voltarei a esse assunto.
A
segunda das linhas sem saída é a que se autolimita a uma via revolucionária
tradicional do século 19 e 20. Para esses, tratar-se-ia de varrer tudo, numa
vassourada só, não só os avanços já conquistados pelos governos do PT
(apresentados como incertos e superficiais), mas também o método democrático de
conquistar e de exercitar o poder. Esse caminho me parece condenado a fracassar,
fracasso cruel, que custará muito caro.
As
massas populares recentemente chegadas à classe média e as massas recém saídas
da miséria não parecem dispostas a desprezar suas recentes aquisições. Diferente
disso, tudo leva a crer que o movimento começou e cresceu para proteger e para
ampliar essas aquisições. Essa circunstância soma-se ao que a história ensina: a
consciência de um movimento não lhe vem de fora para dentro. É resultado da
dinâmica própria do movimento e do desenrolar de etapas que o movimento percorre
até alcançar seus objetivos. É imperioso compreender esse recurso íntimo, e está
na ordem do dia brasileiro.
Os
fenômenos que se veem nascendo no Brasil resultam do estado da sociedade que é
hoje governada por nossos amigos. Quero
dizer: de uma sociedade como é hoje, em processo de se reformatar por sua
própria ação. A característica de base desse processo é, essencialmente, a saída
da miséria – que alcança uma grande maioria da população; a elevação do nível de
educação e de saúde de muitos.
Cartazes (RJ) Tomas Silva |
A
sociedade que caminha pelas ruas ante nossos olhos é a mesma que tornou
possíveis as conquistas sociais dos governos do PT. Nesse
contexto, o primeiro fato a registrar, na minha avaliação, é o seguinte: os
movimentos de rua no Brasil não se opõem ao que foi feito. Ao contrário: os
movimentos são o atestado, a prova do que foi feito. Menos pobre, mais bem
educada, mais segura do que é e do que pode, uma nova geração está entrando num
processo legítimo de vontade de controlar as questões públicas. Já sentiu a
necessidade de influir. E identifica uma insuportável perda de legitimidade das
autoridades às quais cabe fazer a sociedade funcionar bem. Estão errados? Estão
certos?
Se for
justa a causa do movimento, a via a adotar é assumir e pôr em prática o programa
que o movimento popular trouxe à luz. Esse
movimento não se oporá aos partidos progressistas, senão no caso de esses
partidos se oporem a eles, ou se derem as costas ao movimento, porque não o
compreendem ou porque não gostam dele, ou porque desprezam a direção que tome o
próprio movimento.
Sei que é
paradoxal evocar
um modo de avaliar positivamente, para nosso benefício, um movimento que se
constrói em oposição a governo “nosso”. Meu ponto de vista só é compreensível no
quadro de uma análise que parte da teoria da revolução cidadã.
A
teoria da revolução cidadã não descreve um formato de uma grande noite
revolucionária, primícias e apoteose eterna. Ela descreve um processo permanente
que se nutre de seus próprios sucessos e fracassos e rebate sempre, inscrevendo
novas questões a acertar, à medida que se amplia o campo da consciência social e
política dos cidadãos. O objeto desse amadurecimento não é saber qual, dentre os
partidos políticos em confronto, deve ser apoiado; nem produzir um efeito de
balanceio eleitoral sob a forma de alternâncias políticas. O objeto da revolução
cidadão é o exercício da soberania popular.
As
pessoas que se põem em movimento querem decidir. Outro modo de dizer a mesma
coisa é dizer que já não se trata de ‘permitir’ que os que hoje decidem decidam.
Esses que hoje decidem estão sendo eliminados, não por razões “políticas” ou
ideológicas, mas porque são vistos como incapazes para resolver os problemas que
lhes cabia resolver diante da sociedade. São as duas faces da mesma moeda. A
fórmula “que se vão todos!”, que se ouviu na Argentina ou o “caiam fora!” [orig.
“dégage!”] repetido na Tunísia e no Egito não significava “que venham
outros”.
Insisto
na ideia de que a crise de autoridade traduz-se como crise de legitimidade.
Nessas condições, a revolução cidadã não é uma ideologia que venha trazida por
um partido, de fora para dentro, mas um produto quase mecânico da evolução da
sociedade, de seu desenvolvimento educacional.
Reunião com Dilma (Brasília) - Pozzebon |
Naturalmente,
o parâmetro decisivo é a parte jovem da população, na população total. E
simplesmente porque, para que a sociedade entre em movimento, todos dependemos
do impulso que nos venha da fração menos integrada nas rotinas do cotidiano e da
reprodução do cotidiano.
O
outro parâmetro de igual importância é a parte urbanizada da população. As
revoluções cidadãs acontecem nas cidades, porque só aí as populações mantêm
entre elas o tipo de relação de interdependência e de socialização que cria um
tecido social altamente condutor e reativo. Por isso, só muito raramente se veem
representadas nas revoluções cidadãs as formas tradicionais da ação operária.
Sem ver aquelas formas tradicionais da ação operária nos advém, muitas vezes,
uma espécie de perplexidade ante tais movimentos. O erro está também em
acreditar que os assalariados só assumiriam sua identidade social no quadro de
seus postos de trabalho. O conjunto das relações sociais implicadas na vida
urbana não participam também, se não até mais do que o trabalho, dessa
identidade social?
Por
tudo isso, entendo como muito eloquente a evidência de que, nos atuais
movimentos no Brasil, a fagulha que desencadeou a ação tenha sido o aumento no
preço dos bilhetes de ônibus. Não é o próprio símbolo da reivindicação urbana?
Não é revelador de uma condição social de classe média jovem, sem carro próprio?
Aliás, foi um movimento semelhante ao que se vê hoje no Brasil, que deflagrou o
processo que levou Chávez à vitória.
Para
não desencaminhar o leitor, suspendo por aqui a discussão de outros aspectos
estruturantes da formação da consciência cidadã – dentre os quais a existência
de densas redes sociais. Mas é importante, quanto a isso, não se
deixar convencer de que se trate de alguma simples comodidade técnica de
“comunicação”! As redes sociais contribuem para a consciência política
instantânea dos que se ligam nelas.
Em resumo,
o movimento que se manifesta sob formas mais ou menos agudas e que
designamos como “a revolução cidadã” é resultado de uma dinâmica autônoma cujos
ingredientes, princípios de auto-organização, estão nos dados permanentes e
evidentes da vida, não em alguns circunstância particular extrema que os
provocariam.
Já
estudei neste blog essa forma de mudança brutal na trajetória da sociedade sobre
seus próprios parâmetros, que chamei de “bifurcação”. Se essa tese é bem
fundada, todos os países da revolução democrática começada há quinze anos no
continente, precisamente pelos resultados sociais positivos que gerem,
conhecerão movimentos semelhantes aos que se observam no Brasil.
Não
se os deve interpretar como incidentes de percurso, mas como bifurcações no
interior do processo revolucionário – seja para prolongá-los seja para dele se
separar definitivamente.
Para
refletir sobre os eventos no Brasil,
gostaria de sugerir uma lista breve do que não se deve fazer. Para começar, não
zombar. É verdade que a tentação está aí, depois de ouvir tudo que se disse na
Europa, especialmente na França, onde as boas almas opunham, de modo
caricaturesco, o bom social-democrata Lula e o odioso Chávez, comunizante. E eu
acrescentaria alguns sarcasmos dirigidos a nossos próprios bons camaradas, casca
grossa antigos, reconvertidos agora aos ternos e coletes da diplomacia. Como
esquecer os pudores de gazela, quando se falava de organizar um encontro entre a
Frente de Esquerda, ainda há pouco, quando Dilma Rousseff passou por Paris?
Tiveram medo de ofender nosso bom Hollande e sua corte EUA-atlanticista
[2].
Assembleia (RJ) - Wilson Dias |
Longe
vai o tempo em que eu era encarregado de receber Lula-candidato em Paris, quando
ninguém do Partido Socialista o recebia!
Longe
vai o tempo em que a sede do Partido Comunista Francês acolhia as reuniões do PT
na França, porque o Partido Socialista não queria nem ouvir falar deles!
Longe
vai o tempo quando os socialistas de terno e colete de hoje contavam com o
dinheiro que nós recolhíamos para mandar para grupos guerrilheiros! Não se
incomodavam. O bom Brasil moderado contra a Venezuela perigosíssima era invenção
de propaganda. E depois? De que serviria validar aquela esquerda, se tão pouco
ajudava a compreender o que acontecia?!
O
prazer pueril de demonstrar que movimentos populares só acontecem entre os
destinados a servir de modelo seria de bem curta duração. Se minha tese está
correta, não tarda e se verá na Venezuela e em outros países o mesmo movimento
que já se vê no Brasil.
ATENÇÃO:
SEGUNDO ALERTA IMPORTANTE: Não
cedamos à paranoia de ver no desencadear do movimento e no seu desenvolvimento o
resultado de um complô da direita oligárquica local e dos EUA. Seria deixar de
lado o essencial: a oportunidade que esse movimento oferece à nossa própria
ação.
É
evidente que a oligarquia e os EUA têm dedos nisso tudo. Mas não são o fator
decisivo. Se a irrupção nas ruas de uma população hostil ao governo agrada a
eles, nem por isso significa que o andamento e o rumo dos eventos lhes deem
muito prazer. Nenhuma das palavras de ordem do movimento interessa aos objetivos
deles. Pode-se, é claro, considerar que qualquer rejeição ao PT de Dilma
Rousseff lhes interessa. Disso não há dúvida, de um ponto de vista político
superficial.
Quem
conhece a ferocidade de besta da direita brasileira e da imprensa no Brasil
encontrará mil e um exemplos do que estão fazendo na “repercussão” dos tumultos
em curso, como manifestações contra o governo Dilma. Não há como duvidar que,
chegada a hora, serão rápidos a exigir “que a ordem seja restabelecida”. E
acusarão Dilma por não ter protegido suas propriedades e a “liberdade de
imprensa”. Basta, para isso, que vejam bancos quebrados, jornalistas perseguidos
e os escritórios e estúdios da “Rede Globo” tomados como objeto de protestos.
Em
resumo: se nossos camaradas encontrarem o caminho que os leve ao coração do
movimento, pode-se dizer que ali mesmo terá início a revolução democrática no
Brasil.
Todos
devemos buscar nossas referências nessa direção e só nessa direção.
Ao
dizer isso, não estou dizendo que os anos Lula e Rousseff nada tenham tido a ver
com a emergência da democracia no Brasil. Digo, sim, exatamente o contrário
disso!
Estou
dizendo que arrancar tanta gente da miséria foi condição necessária, básica,
para a renovação do país. Mas as formas revolucionárias que conhecemos, pelas
quais passaram outros países, são diferentes demais do processo em curso no Brasil ,
para que já saibamos identificar, no percurso brasileiro, os pontos-marcos de
passagem pelos quais têm de passar as transições revolucionárias.
Multidão em frente ao Municipal (RJ) - Tomas Silva |
Uma
Assembleia Constituinte que dê conta de novos tempos é um desses pontos-marcos a
ultrapassar. Para
começar, pela simples convocação e pela campanha que a precederá. Além disso,
pelo desenrolar dos trabalhos, sobretudo se forem conduzidos em osmose com uma
implicação popular de todos os instantes, de todas as categorias, de todos os
pontos do país implicados. Tudo isso é um processo de educação popular e de
politização da sociedade que decida fazê-lo e o faça em profundidade, que altera
todas as rotinas e revoluciona todos os compartimentos sociais. Esse foi o
método aplicado com sucesso no Equador e na Venezuela. Sua potência operacional
está plenamente demonstrada. Sim: também já se conhece seu limite: a segunda
reforma da Constituição na Venezuela foi um fracasso. Perdemos o referendo sobre
aquela reforma.
Na
Venezuela, muitos camaradas me explicaram que esse segundo tempo nada teve a ver
com o primeiro. Muito pesadamente institucionalizada, com discussões políticas
opacas, o processo não teve potência para empolgar as camadas populares. Anoto
aqui esse episódio, apenas para mostrar melhor que a Constituinte só é
significativa se encaminhada em momento essencial e como modo insubstituível da
atividade popular para refundar a nação e o próprio povo. Não leva a resultado
algum se for tratada como ferramenta “ocupacional”, nem como item de barganha
política.
A
ideia essencial é que o povo “refunda-se”, aproprie-se da identidade coletiva
dos princípios que decida implantar na Constituição e das regras democráticas
que daí o povo deduza. A Constituição está no coração da estratégia da revolução
cidadã e de seu desdobramento real, quando ela alcança o extremo de sua lógica.
Caminhada (RJ) - Tomas Silva |
Ao
propor uma Constituinte limitada a alguns temas, Dilma Rousseff, infelizmente,
retirou de sua proposta a carga emocional radical. Foi contida e limitada por
adversários da ideia, todos em postos influentes, precisamente quando a rua
começava a ensaiar as primeiras respostas positivas!
Sem
Constituinte, Dilma Rousseff ficou sem o ponto de apoio do qual muito precisa
para fazer avançar o programa que a insurreição levou-lhe em mãos. Explico por
quê.
O processo
de ebulição que a Constituinte dispara é o
ponto de apoio para o assalto social. Porque é claro, absolutamente claro, que a
sociedade tem de assaltar o poder.
Não
se pode esvaziar, deixar de lado a partilha das riquezas. Os sociais-democratas
vivem a tentar substituir a batalha social e o assalto social ao poder, por o
que chamam “batalha democrática”. Mesmo que o “prêmio” já esteja reduzido a um
mínimo, que já não implique partilha alguma de riqueza alguma, ainda assim a
“batalha democrática” fracassa. Nenhuma sociedade pode pretender “esquecer” essa
questão, sobretudo ante a grande finança que nosso tempo tem de enfrentar.
Nenhuma solução que alguma sociedade encontre para os problemas de momento,
hoje, jamais implicará qualquer solução de fundo e estável, se a questão do
assalto social ao poder não for discutida e encaminhada.
Mas
a partilha das riquezas dispara o espírito de guerra total entre nossos
adversários nas classes dominantes. Daí resulta um conflito no qual os
dominantes e seus veículos e empresas-imprensa passam a combater em tempo
integral em todos os fronts. As
manobras mais vis, mais baixas. Nem preciso me deter nisso, porque todos aqui
conhecem esse processo de cor e salteado.
A
discussão que nos interessa é que método usar para replicar. A fórmula algébrica
é nossa velha conhecida: não temos outro meio além de ganhar a adesão e a
iniciativa popular. O que significa, concretamente, essa ideia? Significa
convocar uma Assembleia Constituinte.
A
mobilização para a Assembleia Constituinte permite articular duas demarches: uma, que fixa a regra do jogo
democrático; e a outra, que lhe dá o conteúdo social. Sem isso, de mãos vazias,
sem arma e de cima para baixo, não há nem uma remota chance de levar a cabo, com
sucesso, o assalto ao poder. Não, com certeza, se só se conta, nessa luta, com
um Partido e suas redes, por mais extensas que sejam.
Por
isso, me parece erro grave e pesado, que o governo do Brasil tenha renunciado à
ideia de uma Assembleia Constituinte no Brasil. Qualquer resposta positiva às
demandas populares exige e impõe a partilha efetiva da riqueza, naquela
sociedade.
Como
agir, sem o peso da massa popular? Dito de outro modo: como fazer política
popular de esquerda, sem relação de forças menos desigual? E quanto a construir
relação de forças, a primeira pergunta que temos de responder a nós mesmos é:
com quem e contra quem?
[*]
Quem
quiser pode ler este artigo em espanhol.
Notas
dos tradutores
[1]
Eurobéats (fr.) (aprox. “beatos do euro”, “eurófilos”, que batem tambor a
favor do euro); em oposição semântica aos eurocéticos). Por ex.: “Os
eurobéats partem do princípio que nada existia antes do euro, reinava a
anarquia, andávamos de carroça puxada por burros etc.”.
[2]
Ver, sobre isso em português: 31/5/2013, redecastorphoto, Jean-Luc
Mélenchon: “URGENTE. Impedir o acordo secreto entre UE e EUA
(TTIP)”.
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