domingo, 27 de maio de 2012

Jovem nua se refugia na Suécia


Aliaa Magda Elmahdy

Publicado em 27/05/2012 por Rui Martins*

Berna (Suiça) - Vocês se lembram da jovem egípcia que, em plena primavera árabe no Egito, tirou a roupa e ficou nua em nome da liberdade ? (coluna 13 de dezembro).  
«Eu reivindico minha liberdade sexual, o direito de não me casar, meu ateismo. As mulheres devem poder viver sua vida como bem entendem», dizia ela.

Era dezembro, e a primavera árabe, seguindo o calendário,  estava virando inverno, pois a revolta juvenil estava mudando de dono. Os jovens com sua revolta, iniciada na praça Tahir, tinham derrubado Mubarak, mas não eram eles quem iam decidir o futuro. A praça foi pouco a pouco tomada por outros jovens, barbudos, partidários de outro tipo de revolução – queriam o retorno aos princípios religiosos do Profeta e que se voltasse a aplicar como lei, no Egito, a chariá.

Aliaa Magda Elmahdy percebeu que sua foto de protesto nua, publicada no seu blog mas distribuída por todo mundo pela imprensa, ia lhe sair caro. Mesmo os homens jovens, que com ela protestavam na Praça Tahir, não aprovavam seu gesto, mostrando que a intolerância penetra profundo e que a visão machista da mulher não se podia mudar em algumas semanas.

E mesmo as próprias feministas egípcias condenavam o gesto da jovem Aliaa. « Ela nos dá vergonha, disseram. Não é mostrando o sexo e os seios que vai avançar a causa feminina ». Em síntese, mesmo para os revolucionários e para as feministas Aliaa era uma pessoa incômoda. Não faltava muito para deixarem os islamitas aplicarem a pena devida a esse tipo de comportamento – a morte a pedradas ou lapidação.

Aliaa se eclipsou e se escondeu no apartamento de seu namorado, na periferia do Cairo. Mas mesmo ali, sua maneira livre de ser, vivendo com alguém sem ter se casado como manda o Corão, já começavam a lhe causar problemas.

Felizmente, um grupo de mulheres suecas convidou Aliaa para participar de uma manifestação, em Estocolmo, dentro da Jornada Internacional da Mulher, no mês de março. Era a única chance de escapar de um processo, tão logo algum praticamente islamita localizasse a jovem nua das fotos.

E hoje Aliaa – segundo reportagem exclusiva publicada pela revista semanal suíça L´Hebdo – vive numa pequena cidade sueca, mas ainda traumatizada e temendo ser assassinada na própria Suécia, onde vive uma enorme comunidade islamita fundamentalista.

Nesse meio tempo, houve o primeiro turno das eleições presidenciais no Egito pós-primavera árabe. Dois candidatos se qualificaram para o segundo turno – o representante dos Irmãos Muçulmanos que, embora prometa ser moderado, irá instaurar a lei corânica da chariá; e um sobrevivente do regime de Mubarak.

Nas duas hipóteses, a primavera árabe foi usurpada e seus participantes não terão parte na reconstrução do Egito. E o mais provável é o Egito sair do regime laico para se tornar mais uma república teocrática islamita.

As grandes perdedoras serão as mulheres que voltarão a ser propriedade de seus pais e maridos, obrigadas a usar o véu, cobrindo a cabeça e parte do rosto ou, no caso, de ascensão dos fundamentalistas, será a burca, a touca que cobre toda a cabeça, deixando apenas os orifícios para os olhos e a respiração.

O panarabismo, laico e mesmo socialista, está longe. A união dos árabes vem sendo feita pelos religiosos do islamismo integrista que exigem o retorno às regras literais do Corão, um rígido código moral que, repetindo a Idade Média cristã, também enquadra, limita e dita suas leis à ciência.

Tudo começou quando Bush destruiu o Iraque laico, cujo ditador Saddam Hussein servia de muralha ao avanço do islamismo fundamentalista. A queda de outro ditador, Kadafi, na Líbia, rompeu a muralha erguida no Magreb. Duas guerras dignas de aprendizes de feiticeiros que abriram a Caixa de Pandora.

Difícil agora de prever o futuro.

Rui Martins* - Jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, ex-membro eleito no primeiro conselho de emigrantes junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreve para o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress.

Enviado por Direto da Redação

Imagens extraídas da internet pela redecastorphoto

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