Por Rafael
Patto
Hoje pela manhã (4/5/2012) tive a honra e o
prazer de participar, no Teatro João Caetano, no centro do Rio de Janeiro, da
cerimônia de entrega do título de Doutor Honoris Causa, concedido por cinco
universidades: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade
Federal Fluminense (UFF), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ),
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), e Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ), ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Estiveram presentes personalidades do mundo das artes além de autoridades
políticas e acadêmicas.
Compareceram a Deputada Benedita
da Silva, os atores Hugo Carvana e Paulo Betti, o cineasta Luiz Carlos
Barreto (o Barretão), o Secretário e ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc,
o Senador Lindbergh Farias, o ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, a quem
saudei com um “bom dia, prefeito”, além do ex-ministro Franklin Martins, entre
tantos outros.
Doutor Lula e Dilma |
Ao entrar no teatro, enquanto
procurava uma cadeira para me sentar, tive a minha grande surpresa do dia: ao
pedir licença a quem já estava sentado para poder alcançar um lugar vago no meio
da fileira, uma senhora muito gentilmente me ofereceu a cadeira onde ela havia
colocado sua mochila, e que eu julgava estar já ocupado por alguma outra pessoa.
Agradeci o gesto e me sentei ao
lado daquela senhora, que imediatamente me confessou: “eu não estou nem
acreditando que eu estou aqui”. Ao me virar em sua direção para poder conversar
com ela, percebi o quanto estava emocionada. Ela secava com uma toalhinha de
rosto suas lágrimas que rolavam desenfreadamente.
Eu disse a ela: “o Lula merece
todas as homenagens desse mundo”.
Ao que ela assentiu: “todas! É
graças a esse homem que hoje minha filha está na universidade. Ela sonhava em
fazer zootecnia, e com a nota que ela obteve no ENEM eu disse a ela, ‘você vai
consguir’. Hoje ela estuda aqui em Seropédica, na Federal Rual do Rio de
Janeiro”.
Doutor Lula e Dilma |
Por sinal, uma das instituições
que homenageavam o ídolo daquela mãe orgulhosa da vitória de sua filha. Como é
meu costume nessas ocasiões, procurei saber mais sobre aquela mulher que, só por
estar ali manifestando tanto carinho por alguém a quem eu também tenho como
ídolo, já havia conquistado minha simpatia.
Após finalmente termos nos
apresentado pelos nossos nomes, fui sondar de onde ela vinha: “Peruíbe, litoral
sul de São Paulo. Passei a noite toda num ônibus, e agora estou aqui. Não estou
nem acreditando...” Me contou ainda muito emocionada, a incrédula Gisele.
Daí então pude concluir que aquela
mochila que ela trazia consigo, e que agora estava colocada no chão entre os
seus pés, para que eu pudesse me sentar, provavelmente guardava as provisões
básicas de alguém que se aventurara a pegar estrada para poder, de algum modo,
estar próximo de quem se admira. Hipótese que me deixou ainda mais tocado por
aquela mulher tão emotiva que exalava, de uma forma absolutamente discreta, a
gratidão mais sincera que eu já tinha visto na minha vida.
Quando Camila Pitanga, a mestre de
cerimônia, falou ao microfone, as expectativas se assomaram. Muito descontraída
(e linda, permitam-me), convidou aqueles que comporiam a mesa para que tomassem
seus lugares: o presidente da UNE, os ministros de Estado da Educação, Aloizio
Mercadante, e da Ciência e Tecnologia, Marco Antonio Raupp, o governador e o
vice-governador do Rio de Janeiro e o prefeito da Capital, além dos cinco
reitores.
Ao ser anunciada a entrada de Lula
na companhia da presidenta Dilma, a platéia não se conteve. Embalado por aquela
euforia, soltei meu grito de “olê-olê-olê-olá Lula, Lula!”.
Doutor Lula, Dilma e Camila (Veta Dilma!) Pitanga |
Nesse clima de descontração,
Camila Pitanga pediu licença para quebrar o protocolo: “gente, eu não vou
resistir. ‘Veta, Dilma!’”.
Gesto que, de tão espontâneo,
arrancou risadas da presidenta e ganhou a adesão unânime da platéia.
Todo aquele entusiasmo só foi
contrastado pela surpresa que tive ao ver que, hoje, Lula exibe uma silhueta
mais esguia do que aquela a que meus olhos estavam acostumados. Efeito natural
do tratamento a que teve de se submeter para vencer mais um dos incontáveis
desafios que teve de transpor ao longo de toda a sua biografia.
O efeito ruim dessa surpresa se
desfaria ao constatar a enorme disposição de Lula em sorrir e em evidenciar o
seu bom-humor de sempre. Mesmo admitindo alguma fraqueza, Lula fez questão de
mostrar sua satisfação em estar ali, sendo homenageado por cinco centros de
excelência acadêmica do país, e sendo acarinhado por uma platéia composta por
inúmeras giseles.
Ao ser convidado para ser
investido nos trages talares, conforme protocolo cerimonial, ouviu-se uma
emocionante interpretação da Bachiana nº 5 de Villa-Lobos.
Já devidamente composto, Lula
voltou para sua posição ao centro da mesa, e todos fomos convidados a nos
colocarmos de pé para a execução do Hino Nacional.
Estava aberta a cerimônia.
A partir dali, os cinco reitores
se encarregaram de, por meio de seus discursos, expressarem a justiça daquela
homenagem que se fazia ao maior presidente da história desse país.
O reitor da UniRio chegou a dizer
que “Lula, diferentemente de outros presidentes letrados do passado, foi quem se
comprometeu com a qualidade do ensino no Brasil”.
O reitor da UERJ, que se referiu a
Lula como “Doutor da causa da Humanidade”, em um discurso maravilhoso, recordou
a história da sua universidade, que foi a primeira do país a oferecer cursos
noturnos, que criaram maiores oportunidades para os trabalhadores poderem
estudar, e também a primeira instituição de ensino superior a praticar a reserva
de cotas no Brasil.
O reitor da UFRJ, por sua vez,
disse que se tivesse de oferecer ao Lula um título exclusivamente criado para o
presidente, este serio o de “Campeão das utopias realizadas”, e ressaltou a
realização utópica da própria trajetória de vida de Lula, um sertanejo de
alfabetização tardia, que tendo se destacado na liderança sindical chegou à
presidência de um país de 200 milhões de habitantes e se tornou reconhecido
internacionalmente pela transformação social que operou neste país.
Todos os cinco reitores fizeram
questão de mencionar o trabalho de Fernando Haddad, que estava na platéia, como
fator fundamental para os progressos alcançados no campo da educação no nosso
país.
O reitor da UFF reivindicou maior
participação da educação no Orçamento nacional e enfatizou que as metas do
governo Dilma, ainda mais ambiciosas do que as de Lula, serão sim alcançadas,
“claro que em dois mandatos”, como ele fez questão de salientar.
O reitor da UERJ ainda se
confessaria testemunha ocular de muitos episódios da atividade política de Lula,
e se lembrou de uma ocasião em que presenciou Lula e
Hélio Pellegrino travarem um debate intelectual na casa de Frei Betto.
Pelas palavras do reitor, “nem nos
momentos mais elevados da minha vida acadêmica eu tive a oportunidade de
presenciar um debate tão fecundo como aquele.”
Ao final de cada discurso, Lula
recebia os diplomas e posava com cada um deles para fotos.
Já devidamente agraciado, foi a
vez dele falar, matando a nossa saudade de sua voz. Iniciou se justificando que
faria seu discurso sentado, diferentemente do seu costume. E alertou também para
o risco de, no meio da leitura, vir a precisar de um “substituto”, como ele
mesmo disse em tom de brincadeira, para terminar por ele o pronunciamento, caso
sua garganta viesse a pedir descanso.
Não foi preciso.
Incansável como sempre, Lula foi
até o fim. Com sua voz sensivelmente rouca, leu quase sem nenhum improviso o
texto que havia preparado para o evento. Ressaltou os progressos do país a
partir de seu governo e reafirmou seu compromisso com a educação do país.
Enalteceu o governo de Dilma Rousseff e se disse confiante nas metas que o
Brasil tem para o futuro.
Terminado o discurso do
homenageado, Camila Pitanga encerrou o evento.
“Tico-tico no fubá” foi tocada por
dois clarinetistas que se apresentaram no palco e a platéia de pé fazia a sua
algazarra: cada um manifestava da forma como dava o seu carinho.
Gritos dos mais variados: “Lula,
eu te amo!”, “Dilma linda!”, “Lula, guerreiro do povo brasileiro!”, e outras
muitas declarações de amor que devem ter sido feitas silenciosamente, no íntimo
daqueles que não gritaram porque só conseguiam externar sua emoção com lágrimas,
como a Dona Gisele.
Gratificados por termos estado
ali, nos demos um abraço de cumplicidade. Acho que é uma reação natural que
ocorre a quem está muito emocionado e quer compartilhar com alguém tanto
sentimento.
Eu disse para ela: “ainda bem que
viemos”, ao que ela só me respondeu com um suspiro e o peculiar gesto de erguer
a cabeça para cima no mesmo momento em que se fecham os olhos. Ao abri-los
novamente, abriu-se junto um sorriso de indizível contentamento.
Foi de fato edificante.
Gisele Martensen |
Antes de nos despedirmos,
arrisquei: “você tem Facebook?”. Contrariando minhas expectativas, ela me
respondeu: “tenho sim. Gisele Martensen”. Fomos cada um para um lado, e eu lhe
prometi que a procuraria para adicioná-la como amiga. Estou só aguardando que
ela chegue novamente na sua Peruíbe, depois de visitar a filha universitária em
Seropédica, para aceitar meu convite.
Gisele Martensen, minha mais nova
amiga de infância com quem compartilhei um momento muito gostoso da minha vida,
e que acabei de contar aqui para quem teve paciência e disposição de ler tudo
isso.
Enviado por Maria
Rodrigues
Comentário de Florivaldo Menezes - enviado por e-mail)
ResponderExcluirComo gostaria que uma imensa maioria, não só política, mas simplesmente informada, lesse esse texto simples e divinatório, permitam-me o sacrilégio e o superlativo... mas invejo, sempre invejei quando alicerçado na verdade, tudo que esteja "à tona dos finneganswakes de um tempo certo da existência". Divulgue o máximo esta comoção de Rafael Patto.
Repito ali de cima: Invejo e sempre invejarei um texto carregado de pura emoção. Quando é pura!... Eppur si muove!
(enviado por e-mail e postado por Castor)
ResponderExcluirUm texto excelente e emocionante, aliás um relato feito por Rafael Patto, por ocasião da cerimônia de entrega do título de Doutor Honoris Causa ao presidente Lula, concedido por cinco universidades do Rio de Janeiro.
Por gentileza, leia até o fim e sinta-se transportado para este momento ímpar.
Abraços,
Maria Rodrigues