18/1/2014, [*] Lorenzo Franceschi-Bicchierai, Mashable, New York
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Barack Obama no discurso de ontem (17/1/2014) sobre ESPIONAGEM e VIGILÂNCIA |
Em fala longamente esperada, o
presidente Barack Obama propôs ontem algumas mudanças nas atividades de
vigilância da Agência de Segurança Nacional dos EUA que vêm causando indignação
nos últimos meses. Mas... nem uma palavra sobre mudanças importantes que lhe
foram sugeridas pelo grupo interno para reforma do mesmo sistema de vigilância
que o próprio Obama criou.
Aqui, cinco pontos sobre os quais
Obama ou disse que não mudarão ou apagou completamente, em sua fala sobre a
ASN-EUA.
1. Todos os outros
programas de coleta em massa de dados
O programa de coleta em massa de
metadados de conversações telefônicas, que permite que a ASN-EUA recolha e
armazene virtualmente todos os dados de telefonemas dos norte-americanos numa
base de dados, à qual seus analistas têm acesso, parece que terá fim. Obama
apoiou a proposta de seu grupo interno de estudo e revisão desse assunto, que
sugeriu que esse banco de dados saia das mãos da Agência de Segurança Nacional
dos EUA.
Mas... e quanto à coleta em massa de
metadados da Internet, usados para construir grafos
sociais com dados dos norte-americanos, atividade
legalizada nos termos da seção 702 da Lei FISA [orig. Foreign
Intelligence Surveillance Amendments Act / aprox. “Emendas à Lei da
Vigilância Contra Atividade da Inteligência Estrangeira”]? E quanto à vasta
coleta de mensagens de texto? E quanto à coleta de milhões de listas de
contactos de e-mails e “torpedos”, inclusive os enviados e
recebidos por norte-americanos e que pertencem a norte-americanos?
Obama não disse coisa alguma sobre
isso. O mais provável é que esses programas continuem intactos. De fato, a Casa
Branca até elogiou o “programa da Seção 702”: disse que é “valioso”, no resumo
por escrito da fala de ontem [“facts-sheet”], enviado a jornalistas.
2. O Defensor
Público, no Tribunal FISA
O grupo interno de análise e estudo
sobre atividades da ASN-EUA criado por Obama recomendou a criação de um “Advogado Defensor do
Interesse Público, para defender interesses de privacidade e liberdades civis
perante o Tribunal FISA [orig. Foreign Intelligence Surveillance
Court]”. Muitos especialistas apoiaram a criação desse Defensor Público,
porque, nos julgamentos por esse Tribunal FISA, não havia “o
contraditório”, quer dizer: quando o governo solicita autorização para vigiar
alguém, não há quem argumente contra a solicitação.
Obama não confirmou a presença desse
Defensor Público: disse que um grupo de especialistas participará das sessões
secretas do Tribunal FISA. Mas esses especialistas não interferirão
sempre. Serão ouvidos só em “casos significativos”, se o Tribunal tiver de
decidir sobre questões gerais relacionadas à privacidade e a como a ASN-EUA
opera a vigilância.
Um alto funcionário do governo Obama
defendeu essa decisão, dizendo que até em casos da justiça criminal “comum”,
quando o governo pede autorização para vigiar alguém, o juiz pode decidir sem
ter de ouvir nenhum advogado da parte contrária ou qualquer tipo de Defensor
Público.
“Ouvir pontos de vista externos à
questão é quase sempre desnecessário, e seria um custo administrativo a mais” –
disse esse funcionário que falou a Mashable, mas pediu que seu nome não
fosse citado.
Também o Tribunal
FISA considerou “desnecessário” e potencialmente “contraproducente”
criar-se um Defensor Público, em carta que enviou às comissões de Inteligência
e Justiça do Senado e da Câmara de Deputados.
3. O trabalho da
ASN-EUA para derrubar os padrões de segurança e encriptação
Edward Snowden ontem (17/1/2014), na Rússia, comentando o discurso de Obama |
Em setembro, documentos vazados por Edward Snowden
revelaram que a ASN-EUA montou vasto esforço, em vários setores, com
especialistas de várias áreas, para derrubar
os padrões de segurança e encriptação, de modo a permitir que os
espiões da ASN-EUA tenham acesso a comunicações que os usuários da Internet acreditam
que sejam protegidas.
A ASN-EUA e até o
FBI, já foram acusados de
invadir sistemas de encriptação, depois de terem solicitado e conseguido que
empresas de software incluíssem “portas dos fundos” nos programas
vendidos a consumidores. As empresas de software negaram que tivessem
feito isso. Mas a ASN-EUA contratou e pagou
$10 milhões à empresa de segurança RSA, em contrato secreto, para que trabalhasse
na direção de enfraquecer os protocolos de encriptação.
À luz dessas revelações, o grupo que
Obama criou apoiou a criação de tecnologia mais forte de encriptação,
argumentando que o governo dos EUA não pode “de modo algum subverter, minar,
enfraquecer ou trabalhar para tornar vulneráveis, softwares oferecidos à
venda a consumidores como se fossem seguros”
Obama nada disse sobre isso em sua
fala. Mas um porta-voz da Casa Branca disse que Obama e seu governo “apoiam o
objetivo da recomendação com vistas a proteger a integridade dos padrões da
encriptação comercial”. Mas o problema é que, até agora, a Casa Branca nada fez
além de – segundo um porta-voz da Casa Branca – ter solicitado um estudo, que
será preparado pelo assessor especial para ciber-segurança e pelo Gabinete de
Políticas para Ciência e Tecnologia.
Para os especialistas, essa questão é
vitalmente importante.
O presidente deve dizer claramente, sem ambiguidades e sem margem para
dúvidas, que a política do governo dos EUA visa a fortalecer, não a
enfraquecer, a ciber-segurança, e que renuncia a todas as práticas correntes
nas agências de inteligência que visem a introduzir “portas dos fundos” e “pontos
vulneráveis” em produtos vendidos a consumidores – disse Daniel Castro, analista
sênior da Fundação para Inovação Tecnológica e Tecnologia da Informação [orig. Information
Technology and Innovation Foundation (ITIF).
4. Revisão Judicial
das Cartas da Segurança Nacional [National Security Letters, NSL]
O FBI vem usando as NSLs
há anos, para exigir que empresas de internet e de telefonia entreguem dados de
seus clientes e usuários. Essas Cartas são uma espécie de “salvo conduto”
administrativo, para liberar o FBI de ter de pedir autorização judicial antes
de requerer os dados diretamente às empresas. Essas cartas ordenam que os
agentes que recebam os dados não revelem a existência deles a ninguém, nem aos interessados
no caso em que o FBI esteja investigando, nem no momento, nem por muitos anos
depois de as cartas terem sido redigidas.
Os especialistas que trabalharam no
grupo interno que Obama criou sugeriram mudar esse procedimento, reformando a
lei, para tornar indispensável a aprovação de um juiz, em todos os casos em que
seja usada alguma Carta de Segurança Nacional. Obama apoiou mais “transparência”,
mas não disse uma palavra sobre a necessidade de supervisão judicial.
5. Espionagem nas
bases de dados de empresas comerciais norte-americanas em todo o mundo
Documentos vazados por Snowden
revelaram em outubro que a ASN-EUA vem recolhendo vastas quantidades de dados
de usuários da Internet, porque tem
acesso aos links que conectam os centros de
dados das empresas Google e Yahoo.
Obama não disse uma palavra sobre
isso. Porta-voz da Casa Branca, contactado por nós, não quis comentar.
[*] Lorenzo Franceschi-Bicchierai é repórter do Mashable
sediado em New York. Especializado em
Segurança Cibernética, Políticas Tecnológicas, Privacidade e Vigilância, hackers, drones e, de modo geral, a intersecção entre Tecnologia e
Liberdades Civis. Antes de trabalhar no Mashable
foi estagiário na Wired e também
escreveu para Danger Room, e Threat Level. Graduou-se na Escola
Superior de Jornalismo da University of Columbia
e licenciou-se em Direito pela Universidade de Barcelona (Espanha). interessado
em todos os tipos de esportes (futebol, NBA, NFL, etc.), ciências, meio
ambiente e tecnologia verde. Ele se define como um geek (CdeF) de código aberto e entusiasta do software livre.
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