quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Dupla explosão em Volgogrado (1ª avaliação)

30/12/2013, The Saker, Blog The Vineyard of the Saker
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

The Saker
A recente dupla explosão em Volgogrado (ex-Stalingrado) manifesta escalada considerável na guerra de baixo nível, mas ininterrupta, que opõe insurgentes wahhabistas não só ao Kremlin, mas também às tradicionais autoridades muçulmanas na Rússia. Antes de examinar o que esses dois recentes ataques podem significar para a Rússia em geral e para os próximos Jogos Olímpicos de Sochi, será útil reunir aqui alguns fatos básicos.

Explosão de um ônibus, um dos 2 atentados em Volgogrado na Rússia em 23/12/2013
Chechênia

Primeiro, é erro assumir que qualquer ato terrorista “islâmico” cometido na Rússia, sempre envolveria chechenos. A realidade é que a Chechênia não apenas “foi pacificada”: está hoje realmente em paz. O líder checheno, Ramzan Kadyrov, realmente operou um milagre, quando converteu o “buraco negro” checheno, devastado pela guerra, em república próspera e REALMENTE em paz.

O fato de esse milagre não ter sido jamais nem noticiado nem ridicularizado pelos veículos da imprensa-empresa anglo-sionista, que chegou a publicar que a insurgência chechena jamais seria destruída, faz perfeito sentido: seria politicamente impensável, para o bloco anglo-sionista, admitir esse sucesso local.

Mesmo assim, o fato de um jovem, com perfeita aparência externa de bandido checheno, ter-se revelado líder político extremamente capaz, inteligente e esperto, é inegável. Embora nenhuma “guerra ao terror” possa ser jamais realmente “vencida”, é justo dizer que, pelo menos atualmente, o fenômeno do terrorismo checheno foi, sim, reduzido a quase zero. Infelizmente, se o futuro se abre radioso, para a Chechênia, as coisas estão infinitamente piores no vizinho Daguestão.

Mapa do sul da Rússia caucasiana com as repúblicas vizinhas
Daguestão

Chechênia e Daguestão são vizinhos, mas se fossem antípodas não seriam mais diferentes. Para começar, a Chechênia é habitada predominantemente, por chechenos, mas não existe sequer o adjetivo pátrio “daguestanês”: no Daguestão vivem mais de uma dúzia de diferentes grupos étnicos. De fato, o Daguestão é a mais diversificada de todas as repúblicas russas; ali, nenhum grupo constitui qualquer tipo de maioria. Esse aspecto é crucial, porque o fato de não haver um grupo étnico dominante significa que não há como surgir um “Kadyrov daguestanês”.

Segundo, a economia do Daguestão está em mãos de elites muito corruptas, que lutam entre elas e entre outros clãs. Em termos práticos, significa que a “receita” usada na Chechênia (dar a um líder checheno local nível máximo de autonomia e autoridade) seria um desastre para o Daguestão. A”‘solução” para o Daguestão envolve provavelmente intervenção forçada do Centro Federal e a destruição do atual sistema clânico baseado nas etnias – coisa que ninguém no Kremlin vê como possibilidade a tentar.

Por hora, contudo, o Daguestão é o ninho, para o terrorismo wahhabista. Alguém pode dizer que o câncer wahhabista tomou conta, primeiro, da Chechênia, e disseminou-se para o Daguestão enquanto era destruído na Chechênia. A extrema pobreza do Daguestão, combinada aos milhões de dólares fornecidos pelos sauditas aos seus aliados e agentes facilitou muito para eles a operação de implantar sua griffe de wahhabismo no Daguestão e recrutar agentes locais de influência e terroristas.

Mapa étnico do cáucaso russo e a diversidade do Daguestão
(clique no mapa para aumentar)
Os terroristas daguestaneses aprenderam bem as lições da Chechênia e jamais tentaram tomar posse de qualquer território ou criar alguma espécie de “estado” wahhabista no Daguestão. Exatamente o contrário disso: dia após dia, após dia, após dia, as forças de segurança combatem os terroristas daguestaneses, os quais, na maioria das vezes acabam presos ou mortos (mais frequentemente, mortos). A razão disso é óbvia: os terroristas daguestaneses são fracos e não conseguem impor-se nem à polícia local. Mas são suficientemente fortes para amarrar um colete de explosivos na cintura de um adolescente ou de um adulto jovem, homem ou mulher, e mandá-los explodirem-se numa estação de ônibus ou de trem.

Wahhabistas no resto da Rússia

Também seria erro assumir que todo o terrorismo wahhabista na Rússia teria de vir do Daguestão ou mesmo do Cáucaso. Os wahhabistas financiados pelos sauditas estão recrutando literalmente por todos os cantos – do sul da Rússia a São Petersburgo e, nas duas direções, do Tartarstão a Moscou. Resultado disso, há russos étnicos envolvidos em atos terroristas wahhabistas. Resumo disso tudo: o terrorismo wahhabista na Rússia não é nem problema regional nem problema étnico; é problema ideológico. Assim sendo, que ninguém pule diretamente a qualquer conclusão. Não se pode assumir coisa alguma sobre quem estaria por trás dos últimos ataques; literalmente, pode ser qualquer um.

De Volgogrado a Sochi?

Volgogrado tem sido cenário de vários ataques terroristas no passado recente, e os dois mais recentes são apenas isso: os mais recentes de uma longa série. Por que Volgogrado?

Bem... Volgogrado – com Rostov-sobre-o-Don e Krasnodar – é uma das maiores cidades do sul da Rússia e é suficientemente perto do Daguestão para permitir que os wahhabistas dagestaneses (assumindo-se que estejam envolvidos) organizem um ataque terrorista naquela cidade. Na verdade, entre Daguestão e Volgogrado a distância é praticamente igual à que separa o Daguestão e Sochi. Não é pensamento agradável.

Os estados caucasianos do sul da Rússia e as distâncias referidas
Outro fator que deve ter pesado na decisão dos terroristas de atacarem em Volgogrado é que a expressiva maioria dos esforços contraterroristas russos estão atualmente concentrados em, e em torno de, Sochi. Uma das regras básicas do contraterrorismo ensina que sempre há mais alvos a proteger, que recursos para protegê-los. Ainda que Volgogrado estivesse totalmente fechada e protegida, o terrorista poderia ter escolhido Astracã, Elista, Savropol ou qualquer outra cidade. Meu palpite é que a infraestrutura local e federal de segurança está focada, basicamente, em proteger a infraestrutura dos Jogos Olímpicos; assim, Volgogrado pode ter ficado mais exposta que o “normal”.

O que se sabe até agora?

Pavel Pechenkin
Recebi muitas mensagens, diretas, por e-mail, ou na seção de comentários, de pessoas que me perguntam se penso que os recentes ataques são efeito de ameaças recentes dos sauditas. Honestamente: ainda não sei, é muito cedo para dizer. Os russos estão trabalhando rápido e a imprensa noticiou que o suicida-bomba que explodiu a estação de trem ontem foi identificado como Pavel Pechenkin.

Que eu saiba, ainda não há confirmação oficial, e ainda estão sendo feitas análises de DNA. Se for verdade, o indício apontará para um grupo de russos étnicos que deve incluir Dimitri Sokolov, recentemente morto por forças de segurança; era russo étnico que vivia no Daguestão e que se ligou a um grupo terrorista na cidade de Makhachkala. Contudo, é interessante registrar que seu contato com os wahhabistas clandestinos não começou no Daguestão, mas numa mesquita em Moscou, onde se inscreveu para aulas do idioma árabe. Sokolov era amante de Naida Asiialova, também suicida-bomba, que se autoexplodiu num ônibus lotado em Volgogrado em outubro desse ano. Pechenkin, Sokolov e Asiialova aparentemente eram parte da mesma célula terrorista que, embora baseada no Daguestão, incluía russos étnicos.

Dimitri Sokolov                                           Naida Asiialova
Esse grupo é muito bem conhecido dos serviços de segurança russos. Os pais de Sokolov e Pechenkin apareceram várias vezes na mídia russa, implorando que os filhos não cometessem atos violentos e que abandonassem a vida de terroristas. Embora evidentemente trabalhassem com cúmplices, Sokolov e Pechenkin eram a imagem pública desse grupo e, tanto quanto sei, não há outras figuras importantes nessa célula, que os serviços de segurança já não tenham apanhado.

Por enquanto – e essa é uma avaliação muito preliminar – não se veem “impressões digitais” sauditas nesses ataques. Parecem ser o que os norte-americanos chamam de “terror doméstico”. Se alguma pegada saudita há aí, está na quantidade massiva de dinheiro que os sauditas fornecem a mesquitas wahhabistas na Rússia (e em todo o mundo).

Opções russas internas

Como H.L.Mencken escreveu, “para todo problema complexo sempre há uma resposta clara, simples e errada”. Nesse caso, a solução simples é fechar todas as mesquitas ligadas a wahhabistas na Rússia, e algumas cabeças-fracas na Rússia já manifestaram desejo de ver acontecer precisamente isso. Há inúmeros problemas com essa “solução”.

Vladimir Putin
1). Seria, numa palavra, ilegal. A Rússia (finalmente!) tornou-se país no qual (mais ou menos) a lei é respeitada, ou, pelo menos, a Rússia está a caminho de vir a ser esse tipo de país. Certo é que a vasta maioria dos russos querem que o país deles torne-se país normal, civilizado, onde a lei está no centro da vida política. Fechar mesquitas seria, simplesmente, ilegal. Para começar, fechar mesquitas por quê? Por “suspeita de wahhabismo”? Não há lei na Rússia que proíba o wahhabismo. Por receberem dinheiro? Também não é proibido. Por estarem ligadas a redes terroristas? Sim, seria ilegal, mas é preciso provar a ligação, o que é muito difícil, e não há meio para fazer “colar” esse tipo de “acusação”, em tribunais legais, contra muitas daquelas mesquitas.

Resumo, até aqui: Putin não é ditador e não pode agir à margem da lei russa. De fato, nem quer.

2). Seria também imoral. Vivi durante muitos anos literalmente ao lado de uma grande mesquita integralmente financiada pelos sauditas e, que eu saiba, nem aquela mesquita jamais teve algo a ver com terrorismo, nem as pessoas que frequentavam aquela mesquita jamais cometeram sequer algum pequeno crime. Deus sabe que odeio, do fundo do coração e da mente, a ideologia wahhabista. Mas isso não implica que a maioria dos wahhabistas sejam bandidos, ou ligados ao terrorismo. A maioria não é, nem se pode convertê-los em, bodes expiatórios para ações de outras pessoas. Sou absolutamente a favor da destruição física de todos os terroristas wahhabista que haja no mundo, mas, enquanto não se armam e põem-se a matar seres humanos, os seguidores de Ibn Taymiyyah, Ahmad ibn Hanbal e Muhammad ibn Abd al-Wahhab não podem ser forçados a pagar por atos de outros.

3). Seria contraproducente. A favor de deixar livres para operar as mesquitas ligadas aos wahhabistas, pesa, sim, também, a evidência de que muitas delas oferecem às forças de segurança um “elo fraco” e alvo perfeito, pelo qual podem entrar e mantê-las sob observação. Fechem aquelas mesquitas, e os terroristas que ali haja serão empurrados para a clandestinidade, espaço sempre muito mais difícil para qualquer tipo de infiltração. De fato, as mesquitas ligadas aos wahhabistas podem até ser usadas como pote de mel para atrair, identificar e prender terroristas domésticos.

Não. O melhor modo de lidar com a propaganda e o terror financiados pelos sauditas é apoiar organizações islamistas tradicionais, anti-wahhabistas, e líderes religiosos. Há muitos, muitos muçulmanos inteligentes e bem educados na Rússia, inclusive alguns imãs bem conhecidos, que podem fazer a luta espiritual e de ideias contra os terroristas wahhabistas e denunciá-los pelo que realmente são. O estado russo deve:

(a) proteger fisicamente essas pessoas;
(b) ouvi-los e ouvir a avaliação que façam da situação atual;
(c) explicar à população não muçulmana que aquelas figuras religiosas são aliados vitalmente importantes na luta contra o terrorismo wahhabista.

E se se encontrarem pegadas sauditas?

Aí está um grande “se”! Mas assumamos, só para argumentar, que os russos descubram alguma espécie de “impressão digital” saudita nesses ataques, ou em outros, durante os Jogos Olímpicos, e examine várias respostas russas:

Base naval russa de Tartus na Síria (vista aérea)
1). Ataque aberto, de retaliação, contra a Arábia Saudita:

Em termos puramente militares, coisa facílima de fazer. Os russos poderiam atacar com bombardeiros, mísseis cruzadores disparados de submarinos, mísseis balísticos – de fato, tudo, qualquer coisa. Os EUA manifestariam todas as variantes de ofensa e ultraje, mas o CENTCOM faria absolutamente nada, porque o propósito original do CENTCOM era impedir invasão soviética no Irã, não defender os sauditas contra ataque russo de retaliação. O problema, nessa resposta, é que seria ilegal nos termos da lei internacional; e a Rússia não quer saber desse tipo de problema. Se a Rússia decidir acusar oficialmente e publicamente a Arábia Saudita, de ataques terroristas contra a Rússia, terá de ir ao Conselho de Segurança da ONU ou à Corte Internacional de Justiça, e encaminhar legalmente o próprio caso.

Conselho de Segurança da ONU
2). Registrar queixa oficial na Corte Internacional de Justiça e tentar arrancar do Conselho de Segurança da ONU um voto de condenação contra o Reino da Arábia Saudita:

Essa é opção clara e limpa, porque poria os sauditas em posição política muito embaraçosa. Dependendo dos termos da Resolução, os EUA podem ou abster-se de votar ou vetar a proposta de resolução, porque, não importa quantos e quais problemas haja atualmente entre os dois lados, EUA e Reino Saudita são ainda aliados estratégicos. Mesmo assim, a queixa oficial russa contra o regime saudita jogaria mais um ovo no nariz dos macacos medievais no poder em Riad. Pessoalmente, gostaria que acontecesse. Mas não faz o estilo de Putin – que prefere diplomacia em chave muito mais discreta.

3). Ataque não aberto de retaliação, contra a Arábia Saudita:

Também nada difícil de fazer com os meios do Kremlin, não só porque poderia usar capacidades russas para atingir um ou dois príncipes sauditas, mas porque poderia facilmente subempreitar o serviço, transferindo-o a força aliada. O problema nesse caso é que, ainda que resposta de retaliação, mesmo assim seria ato de terrorismo.

Ibn al-Khattab
Até hoje, o único caso que eu conheça de os russos assassinarem alguém foi quando mataram Ibn al-Khattab, terrorista conhecido e procurado: os serviços especiais russos interceptaram uma carta endereçada a Khattab, trataram a carta com um veneno especial que nada causaria a ninguém, exceto ao próprio Khattab (coisa muito mais efetiva e método muito mais sofisticado que a bobagem de que os russos são acusados, de que usariam polônio para matar alguém). Mas naquele caso, os russos admitiram o papel que tiveram, e até fizeram declarações mais ou menos oficiais, fornecendo detalhes da operação. Foi assassinato que usou métodos não abertos, mas não foi propriamente operação não aberta completa, porque os russos voluntariamente admitiram que estavam por trás de tudo aquilo. Khattab era bandido de tal ordem que ninguém mentalmente são manifestou qualquer problema contra a ação: é um daqueles raros casos, claros, branco e preto, caso em que ninguém discorda, em que praticamente toda a humanidade concorda que o executado realmente teve o que merecia e que se fez justiça. Mas aquele caso foi absolutamente excepcional. Na grande maioria das vezes, as chamadas “operações secretas” não passam de eufemismo para (contra)ataque terrorista, vale dizer: ato que nenhum país civilizado deve cometer ou admitir.

4). Nesse caso... fazer o quê? Com vistas ao longo prazo:

Dick Cheney
Numa luta contra o terrorismo, é absolutamente vital manter alta a moral em campo: você tem de fazer o máximo, para negar ao inimigo o status de “combatente da liberdade”. Para fazer isso, é absolutamente necessário que você conserve as suas mãos o mais limpas possível; e você só deve engajar-se em ações que, se descobertas, o mostrarão como gente honrada. A noção de Dick Cheney, segundo o qual, em dado momento, “[agora] tiramos as luvas” é reflexo de seu pensamento absolutamente sem refinamento e sofisticação. O mesmo se pode dizer da negabilidade plausível, da CIA. O resultado dessa autoilusão é que os EUA são odiados e desprezados em todo o mundo, e literalmente, não há ação vil, vergonhosa ou estúpida que alguém não acredite facilmente que possa ter sido cometida pela comunidade norte-americana de operações secretas. Por que a Rússia desejaria tornar-se “o vilão da hora” (outra vez)?!

Pessoalmente, entendo que é crucial, para país civilizado, manter sua política oficial, pública, declaratória, em harmonia com o que faz por trás do palco. Nada há de inerentemente errado em operações clandestinas, se forem conduzidas de modo tal que os que as ordenam continuem a mostrar atitude racional e honrada, no caso de a operação ser descoberta. A Rússia não pode falar constantemente do papel crucial que deve ter a lei internacional nas relações internacionais, e, de repente, sem mais nem menos, pôr-se a violar as leis internacionais mais básicas.

Por essa razão, qualquer uso de força (militar ou de serviços especiais) pela Rússia terá de basear-se nos seguintes princípios:

a). Só depois de todas as opções não violentas terem sido tentadas ou quando seja absolutamente impossível pô-las em prática.
b) A força usada tem de ser proporcional ao ataque que a provocou.
c) Todos os esforços devem ser empreendidos, para evitar que inocentes sejam mortos, feridos ou atingidos de qualquer modo.

Soa como fala de Poliana? Pois não deveria soar assim.

Décadas de uso absolutamente irresponsável, temerário e impiedoso da força, por EUA, Israel, europeus, e soviéticos acabaram por nos dessensibilizar: já poucos percebem que a violência é fundamentalmente imoral. “Educados” como fomos muitos de nós pelos filmes de John Wayne e pelos governos de Ronald Reagan, perdemos a capacidade de nos horrorizar, como se horrorizaria qualquer pessoa civilizada, com a feiúra e a imoralidade da violência. Pior: estamos tão condicionados por décadas de audiência ante os televisores, assistindo a “reportagens especiais” da CNN, a repetir o mais recente briefing sobre uma ou outra intervenção militar norte-americana, que já esquecemos que “atirar sem sacar a arma do coldre” é o meio menos eficiente de lidar com qualquer problema.

Quando se enfrenta questão como o terrorismo, o melhor é, sempre, planejar para o longo prazo. Desse ponto de vista, entendo que o regime saudita é problema suficientemente grande, para merecer ser considerado como ameaça inerente à segurança nacional da Rússia; e isso, por sua vez, implica que a Rússia deve ter, como objetivo de sua estratégia de segurança nacional, obter mudança de regime no Reino da Arábia Saudita.

Mas essa meta deve ser buscada exclusivamente ou, no mínimo, principalmente, mediante meios legais. Por exemplo, armando iranianos e sírios os quais, por sua vez, armarão o Hezbollah. A mesma meta pode também ser alcançada isolando a Arábia Saudita no cenário internacional, mediante “consultas” com aliados e nações amigas. Além disso, a Rússia deve buscar ampliar seu papel e sua influência no mundo muçulmano e árabe, para contra-atacar a atual influência dos sauditas e de outras monarquias do Golfo.

No curto prazo, o público russo tem de ser abertamente informado de que o terrorismo não pode ser erradicado; que qualquer ideia nessa direção é delírio de fumaças alimentadas por políticos desonestos. Mas se nenhuma nação ou governo conseguirá jamais erradicar o terrorismo, é possível aprender a conviver com ele. Afinal, o número total de vítimas de terrorismo é extremamente pequeno; muito, muito menor que o número de vítimas, digamos, de acidentes de carro. O real poder do terrorismo está no efeito psicológico que tem, não sobre as vítimas diretas, mas sobre as testemunhas. Tão logo a opinião pública aceite a ideia de que é possível reduzir ao mínimo o número de ataques terroristas, mesmo que alguns sempre possam ocorrer, o terrorismo perderá a única força que realmente tem.

O terrorismo tem de ser aceito como fato da vida [exatamente o que a imprensa-empresa do capital existe para IMPEDIR que aconteça (NTs)], porque, se não for assim, qualquer país sempre acabará arrastado para uma interminável espiral de medidas perfeitamente inócuas de contraterrorismo, que são, de fato, muito mais daninhas à vida social que o terrorismo que as inspirou.

Será que interessa à Rússia converter-se em estado paranoico fascista aterrorizado, como são hoje os EUA? Não será mais produtivo aceitar o fato de que o terrorismo jamais será “derrotado”, e tocar a vida do melhor modo possível, nesse mundo sempre tão perigoso?

Já há políticos russos debatendo acaloradamente a importância de suspender a atual “moratória” que suspendeu a pena de morte no país: Nikolay Pligin, deputado do Partido Rússia Unida, e presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Parlamento Russo, declarou que:

(...) nenhum grupo social será discriminado, nenhuma atividade especial será dirigida contra nenhum grupo específico – todas as atividades serão conduzidas estritamente segundo as normas constitucionais e a lei vigente.

Ramzan Kadyrov
E Ramzan Kadyrov exigiu que o Parlamento

(...) aumente infinitamente a pena para os que, não apenas cometam atos terroristas, mas também partilhem as ideias dos terroristas, disseminem sua ideologia e lhes deem treinamento. Estou absolutamente convencido de que não venceremos esse mal só com democracia e humanidade.

Ora... Pelo menos os dois concordam que o lugar certo para discutir a questão e decidir sobre quais políticas adotar é o Parlamento. Espero que a Duma se manifeste com clareza e dê ao Kremlin as leis de que o Kremlin precise. Porque, de fato, a decisão real estará nas mãos de Putin.

Pessoalmente, tenho confiança de que Putin se pautará estritamente pela letra e pelo espírito da lei nacional russa e pela lei internacional. E que não haverá excessos, na reação russa.

[assina] The Saker




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