sexta-feira, 9 de julho de 2010

Editorial redecastorphoto em 9 de julho de 2010

Bom, mesmo, esse artigo logo abaixo.

Mas acho que já basta de a gente tanto trabalhar para EXPLICAR a chamada “grande mídia”. Pior ainda: por trás de tanto explicar a grande mídia, há, bem evidente, o desejo de defender (ou, pelo menos, de justificar) a existência da grande mídia. É onde nós nos separamos de todos que “criticam” a grande mídia e sonham com “reformar” a grande mídia ou “democratizar” a Folha de S.Paulo, p. ex., e com "democratização da cumunicação". Aí, não contem conosco.

A grande mídia é EMPRESA. Não faz sentido algum nós defendermos alguma empresa, seja qual for. E só doido, mesmo, viveria de tentar reformar a revista (não)Veja p.ex., ou o Estadão, ou o grupo Folha. Ou até o cartel-de-Medellin. Reformá-los... como? Sobretudo: reformar essa gente, prá quê?!

De fato, por trás dessa defesa da empresa-mídia -- como se a empresa-mídia fosse essencialmente diferente de outras empresas -- há vários mitos totalmente ideológicos, nos quais muitos embarcam sem nem ver.

Um desses mitos é o mito da “informação”. A grande mídia não informa objetivamente sobre coisa alguma. É como a empresa-OMO fazer dinheiro e gerar lucros, só com (1) divulgar e promover exclusivamente as qualidades do OMO e (2) argumentar para “provar” que ninguém jamais poderia viver limpo se não comprar OMO.

Outro desses mitos é o mito da importância essencial do OMO para a sobrevivência da democracia. Claro que nenhuma Folha de S.Paulo é necessária à democracia. Antes, é exatamente o contrário: SEM a Folha de S.Paulo, a democracia estará sempre mais bem servida.

A redecastorphoto tem trabalhado pra SER, ela mesma, uma fonte de informação. Claro que somos fontes PESSOAIS e ninguém é obrigado a sair repetindo o que nós postamos ou distribuímos aos correspondentes. Não temos nada com a vida dos outros. Só fazemos, mesmo, repetir INCANSAVELMENTE o que pensamos.

De tanto fazer, acabamos por aprender que não há nem pode existir informação objetiva-isenta: a informação SEMPRE TEM LADO. É fatal e inevitável, e o lado de quem escreva sempre aparece.
Então, é claro que o melhor é a gente NEM TENTAR fingir que não tem lado, deixar aparecer logo, bem claramente, o lado que se tem e defender, cada um o seu lado.

E o resto do mundo que vá à luta e escreva, como bem entender, defendendo, cada um, o seu lado. Dará certo, SE E SOMENTE SE ninguém mais falar nessa tal de “isenção” ou “objetividade” da empresa-mídia.

E se alguém pensar em argumentar que nós, redecastorphoto, seríamos obrigados, democraticamente, a tolerar a opinião da FSP, aviso, desde já, que nós só seríamos democraticamente obrigados a tolerar a opinião da FSP, já vâmo avisando: nós S-E-R-I-A-M-O-S obrigados a tolerar a FSP, se e somente se a FSP publicasse, na íntegra, TODAS, mas TODAS MESMO, as "Cartas do Leitor" que nós e muitos de nossos correspondentes, escrevemos há anos, ESCULHAMBANDO a FSP. Dado que não há lei de mercado que obrigue OMO a fazer publicidade de outros sabões em pó... tá na cara que tampouco há lei que nos obrigue a tolerar a FSP. Lembrando sempre de que quando citamos como exemplo a FSP, queremos citar TODOS os órgãos de imprensa escrita, falada(?), e/ou televisonada.

A democracia existe para garantir O NOSSO DIREITO DE EXPRESSÃO. É claro que não há democracia no mundo que nos obrigue a OUVIR o que digam outros.

Se todos tiverem assegurado o direito de dizer, basta deixar solta a gritaria geral. E a luta ensinará o resto.

De fato, AINDA É INDISPENSÁVEL entrar nas redações com paus e pedras nas mãos (melhor, se possível, entrar com um drone Predator!), p’ra fazer ouvir vozes que não sejam idênticas às vozes pagas que há nas redações dos jornais-empresa. É onde o ARTIGO ABAIXO nos parece ainda embarcado em algumas fantasias (sobre a internet).

Hoje, 9 de julho, é feriado em SP. Esperamos conseguir trabalhar no sossego...

***

Há um certo mal-estar na grande mídia brasileira. Há descuidos ideológicos, politicagem sem um mínimo bom senso, campanha política de baixo nível, uma insatisfação, uma certa ira, um leve desencantamento, uma agressividade ansiosa.

A grande mídia parece uma fera, que sabe de seu poder, mas se sente um pouco acuada. Esse mal-estar não afeta somente o jornalismo, mas também a tolerância e a liberdade de imprensa. A mídia começa a usar e abusar do Poder Judiciário contra pessoas que noticiam ou emitem opiniões com críticas a ela.

Freud, talvez, diria que é um mal-estar provocado pelo nascimento de um irmão mais novo. Talvez. Na realidade, há possivelmente inúmeras razões para a situação em que se encontra a grande mídia, mas longe da psicanálise, algumas considerações podem ser feitas.

A primeira é o próprio desenvolvimento democrático do Brasil. Há no país, apesar de ter apenas 20 anos de democracia, o retorno de uma pressão muito grande por demandas sociais, que estão sendo parcialmente atendidas pelo governo. Isso deveria ser orgulho para a grande mídia, que sempre criticou e mostrou as mazelas do país. No entanto, há um sabor amargo e um certo rancor, visto que essas demandas sociais e democráticas acabam tangenciando os latifúndios cartoriais da mídia. Há, portanto, uma mal-estar pelos avanços democráticos e sociais.

Há também um mal-estar provocado pelo desenvolvimento tecnológico, pela internet e outras mídias, pelo barateamento da produção gráfica e audiovisual.

Há muita gente com capacidade técnica e tecnológica para produzir conteúdo, há muita gente com possibilidade de publicação e distribuição de conteúdo por meio de novas tecnologias.

Isso afeta diretamente a grande mídia porque as pessoas começam a comparar, analisar e questionar a qualidade e as omissões. Começa a haver certa concorrência de conteúdo, que não é exatamente uma concorrência econômica.

Há menos de uma década, a Folha de S. Paulo noticiou que um jovem músico entrou em um estúdio de rádio e, com um revólver em punho, exigiu que o locutor tocasse as músicas de sua banda. Esse era o único meio de dar visibilidade ao seu trabalho artístico.

Hoje há novas possibilidades tecnológicas de distribuição, principalmente a internet, que transforma tal fato em algo pré-histórico. Esse poder centralizador da distribuição cultural está ruindo e isso provoca inevitavelmente um mal-estar.

O surgimento da ferramenta de publicação dos blogs é outra potencialização do mal-estar. Há uma grande quantidade de blogs bem estruturados em processos e conhecimentos de comunicação e jornalismo, além de inúmeros outros com a qualidade simples, mas primordial de um bom texto, uma boa análise ou inesperada criatividade. Exemplos não faltam: Paulo Henrique Amorim, Luiz Carlos Azenha, Altamiro Borges, Rodrigo Vianna, Blog do Mello, Luís Nassif, Na Maria News, Eduardo Guimarães, Rovai, portal Vermelho, Carta Maior, FNDC e tantos outros que nem dá para inumerar, mas que dissecam a relação entre a mídia e o poder. Há uma mal-estar pela sensação de não só pautar, mas também ser a pauta.

Há um mal-estar político e com o governo Lula. É um governo que não prejudicou e nem enfrentou a mídia durante os dois mandatos, mas também não é facilmente domesticado, enquadrado.

Há um certo mal-estar porque parece que a mídia culpa o governo por não a socorrer no momento em que o mar parece agitado. Mas há também um mal-estar por apostar em um projeto político da oposição (PSDB/DEM) que está completamente vazio de utopia, é um projeto de manutenção das desigualdades sociais travestido de sonhos gerado pelo marketing político.

É um projeto que não pode pegar a bandeira da igualdade, da justiça e nem da fraternidade, moralidade, ética ou mesmo da gestão pública.

É um projeto que, no fundo, visa manter o status quo. E isso é desagradável.

Há um mal-estar também na mídia porque parece que parte do povo, essa entidade, desprendeu-se do seu cabresto. Há uma certa insatisfação e angústia com a impotência das ações da própria mídia no que diz respeito à sua capacidade de convencimento, de direcionamento.

É um mal-estar que beira a insanidade e gera frases como "o povo está contra a opinião pública".

Há um mal-estar por ter de dialogar e de se confrontar de igual para igual com blogs, sites e empresas sem grande capital financeiro. É algo como: "quem é esse Zé mané que está me criticando sem o meu filtro, sem minha permissão?" ou "quem é esse povinho que agora diz quem eu sou e como deve ser o jornalismo?".

É aquele mal-estar de ter de falar de igual para igual com quem sempre lhe foi subalterno.

Por fim, há um profundo mal-estar porque estamos em um processo de reorganização das formas produtivas de comunicação. É possível que o capitalismo continue o mesmo na fábrica de sabonete, na usina de aço ou na indústria têxtil, mas há uma profunda mudança econômica e produtiva em andamento na indústria da cultura e isso inevitavelmente provoca uma incerteza, uma angústia, um certo medo.

A má notícia para a grande mídia é que isso parece ser só o começo. Quando organizações sociais, sindicatos e grupos utópicos de diversos setores da sociedade entenderem a comunicação não é simplesmente um front de guerra, mas um espaço de mediação cultural que se porta como uma instância de superação da consciência de classes, de superação da consciência de grupo, aí as transformações serão muito mais aceleradas, muito mais intensas.

(Glauco Cortez)