30/12/2012, Danny Schechter, Consortium News
Traduzido pelo pessoal da Vila
Vudu
Danny Schechter |
As
redes de noticiário praticamente não trabalharam na última semana, apenas
reapresentando cenas do ano que termina, para lembrar os telespectadores.
Pesquisadores varrem os arquivos à caça das melhores imagens para encher o
“pacote” anual de cenas requentadas que sempre termina com fotomontagem musicada
de imagens de políticos, celebridades em geral (muitos jornalistas!) e
celebridades (e mais jornalistas) falecidos durante 2012.
Assistindo
àquilo, nos boquiabrimos em ohs! e ahs! e relembramos as calamidades que nos
atingiram, como a já (bem) denominada “Tempestade Frankenstein”, Sandy; e o
assassinato, a tiros, de crianças pequenas na Escola Primária Sandy Hook em
Connecticut. As redes de notícias repassarão cenas das eleições de 2012, que de
nada adiantaram para superar o atual “despenhadeiro fiscal” à beira do qual o
país permanece pendurado.
Ah!
Sabem o que mais as redes noticiosas noticiarão? Que foi o ano do I-Phone 5 e do
I-Pad 3, de jogos Olímpicos e da dancinha do cavalinho invisível de Nostradamus
e de Gangham Style. E haverá notícias
sobre a ascensão de Kate Middleton e o fim de Whitney Houston, além de notícias
sobre o sobe e desce na carreira de Jeremy Lin, sino-norte-americano, jogador de
basquete.
No
que tenha a ver com o mundo, muito se falará da não guerra contra o Irã e da sim
guerra que está reduzindo a Síria a ruínas. Ouvir-se-á alguma rápida referência
ao novo líder chinês, a confusões no México, à eleição vitoriosa e a luta contra
o câncer de Hugo Chávez. Nem uma palavra, uma, que seja, sobre as mortes em
Gaza, completamente apagadas do noticiário e dos noticiários sobre o noticiário.
Andrés Oppenheimer |
Pode-se
apostar que ninguém cuidará de ajudar os telespectadores a recordar os eventos
que Andres Oppenheimer optou por relembrar, no Miami Herald: a matéria,
de 16 de julho, de Kuala Lumpur, em que informava sobre o acordo comercial da
Parceria Trans-Pacífico, já praticamente concluído, e destinado a ser o mais
ambicioso acordo comercial do tipo; lá se anunciava que, em outubro de
2013,
a “parceria” estaria assinada e sacramentada. E daí? O que
significa(ria)? Continuamos a esperar o quê, para o próximo mês de outubro? Quem
ganha? Quem perde? Notícias que talvez nunca cheguem a ser notícias...
Ou:
“Dia 25 de novembro, na Catalunha, Espanha, cerca de 70% dos eleitores votaram
para eleger representantes dos partidos que apoiam um referendo que decida sobre
a independência do norte rico da Espanha, o que assusta muita gente, porque há o
risco de a independência dos catalães disparar uma reação em cadeia de outros
movimento de secessão em todos os 27 países da União Europeia. Muitos temem que,
se a Catalunha conseguir tornar-se independente da Espanha, a Córsega e o País
Basco também se livrarão, de vez, da França; a Escócia livrar-se-á da
Grã-Bretanha, e Flanders e Wallonia, da Bélgica, dentre outros casos. Às
dificuldades econômicas somar-se-ia o caos político na Europa”.
Alguns
desses eventos passados e “iminentes” foram apresentados como catástrofes de tal
magnitude, que muitos já ansiavam que se cumprissem integralmente as tais
previsões para o fim do mundo com data e horário marcados.
Os
que, dentre nós, esperaram que a eleição e depois a reeleição do presidente
Obama introduziriam mais justiça e igualdade no “sistema”, desapontaram-se. Os
que tanto desejavam mudança na qual pudéssemos confiar, foram às ruas para
fazer, eles mesmos, a tal mudança... e ali colidiram frontalmente com o Estado
policial – a Polícia de NY, o FBI, vários uniformes e também gente sem uniforme
“infiltrada”, etc. Só recentemente, a partir de documentos que, afinal, foram
liberados para consulta, começamos a ter alguma ideia de como tantos
norte-americanos espionam tantos norte-americanos há tanto tempo, e por quê e
por que nos mentem tanto, há tanto tempo.
Todos
os “noticiários” com os quais temos de lidar lidam com eventos e narrativas
especificamente selecionados, não com as tendências nem com as forças ocultadas
que comandam a economia e o sistema político nos EUA. Ouvimos sobre supostos
atos e supostos feitos, nunca sobre os interesses que movem uns e outros. Os
programas de “notícias” apagam cuidadosamente os contextos, o que houve antes,
análises anteriores e diferentes interpretações sobre os tais feitos e atos
“noticiados”. Os “noticiários” de televisão são o que são e são feitos como os
conhecemos, para apalermar o telespectador ou o ouvinte, não para torná-los mais
interessados ou mais ativos no que realmente interessa aos próprios
telespectadores ou ouvintes.
O
que fazem ou deixam de fazer os grandes bancos é assunto tratado sempre nos
termos mais ralos, rasos e distanciados; absolutamente jamais se ouve notícia
alguma que tenha algo a ver com o modo como os grandes bancos operam como canais
para influenciar a opinião pública a favor dos 1%. Não há “plantão de notícias”
que interrompa a programação regular, cada vez que os reguladores não regulam
coisa alguma; nem há edição especial de “Globo Repórter” para mostrar como a
empresas-imprensa “capturariam” funcionários públicos, para impor-lhes
restrições que democratizassem, se não por bem, à força de lei, as tais
empresas-imprensa.
O
“problema” das armas em mãos de civis esteve em todos os noticiários, mas nunca
se ouviu notícia alguma sobre gigantescos negócios de produção, compra e venda
de armas, sequer sobre os sistemas de drones, hoje best-sellers em
todo o planeta. Os EUA são sempre apresentados, nas “notícias” para o público
doméstico, como “nossa pátria mãe” – expressão muito frequente na Alemanha nos
anos 1930s e na África do Sul do suprematismo dos brancos e do apartheid,
décadas depois. Os norte-americanos nos vemos nós mesmos como uma nação; o resto
do mundo nos vê como império.
Quanto
à economia, os “noticiários”, todos, parecem cópias dos editoriais da revista
Wealth Daily [Riqueza Dia a Dia], alertando que os norte-americanos
preparem-se para inevitáveis cortes nos salários:
“Agora
que tudo converge – impostos cada vez maiores e salários cada vez menores – nas
discussão sobre “despenhadeiro fiscal”, os políticos começam a apresentar
programas de revisão das leis. (...) Tudo muda, de minuto em minuto. No papel,
estamos à beira de promover trocas em equações obscuras que, de fato, são as
mesmas de sempre e são basicamente semelhantes. Mas a verdade é uma só: o
público leigo nada entenderá, se não começar a prestar atenção. E se ninguém
prestar atenção, ninguém jamais aprenderá a castigar os políticos que fazem o
que fazem”.
E
absolutamente não se ouve nem vê notícia alguma sobre a manipulação da taxa
LIBOR, que fez trilhões de dólares mudarem de mãos e de dono, sem qualquer
comentário. Coisinha fácil de explicar e de entender, verdade seja dita, em 10
segundos!
Steven Spielberg |
Cada
vez mais, o que realmente interessaria conhecer, as forças que subjazem aos
processos dos quais os noticiários só “noticiam” o que não é nem jamais será
notícia significativa aparecem mais no cinema, que nos noticiários; na ficção,
muito mais que no “fato inventado-noticiado” (orig. faction); nos filmes,
muito mais, com certeza, que nos “noticiários” de televisão.
Nas
salas de cinema, podemos escolher entre duas visões do impacto da escravidão nos
EUA: Lincoln, de Spielberg; e Django Unchained, de Tarantino. Um
trata a corrupção no Congresso para tornar ilegal a escravidão; o outro, da
brutalidade da escravidão sobre os escravos. Para o primeiro, uma reforma que
mudaria o país de alto a baixo, seria problema de Teoria da Constituição; o
outro mostra uma revolta armada até os dentes contra o feio racismo.
Quentin Tarantino |
A
versão cinematográfica musical de Les Miserables narra em canções a
história de uma revolução francesa fracassada: só as barricadas, não qualquer
valor revolucionário. Argo, por sua vez, fala superficial e rapidamente
sobre algumas razões da Revolução Iraniana de 1979, para, de fato, celebrar o
trabalho da CIA no resgate de reféns norte-americanos e, claro, reforça a
hostilidade dos norte-americana contra os iranianos.
O
filme Zero Dark Thirty mostra como a CIA tortura, com detalhes muito mais
explícitos e escabrosos que qualquer “noticiário” de televisão jamais mostrou,
mas, simultaneamente, ensina não a prender e julgar bin Laden, mas a
assassiná-lo a sangue frio e, consequentemente, a fazer dele herói imortal.
James Gandolfini |
O
filme acovarda-se e não condena a tortura, os torturadores e os esquadrões da
morte financiados pelo estado norte-americano e, ao que parece, erra também ao
olhar a história, porque o que se chama “interrogatório estimulado” jamais foi
elemento criticamente decisivo para descobrir o esconderijo de bin Laden,
segundo a própria CIA, inúmeros senadores dos EUA e vários especialistas.
Realmente
interessante, isso sim, no filme, é que alguém teve a brilhante, eloquente,
esclarecedora, informativa ideia, de escalar, para o papel do então diretor da
CIA, Leon Panetta, o ator que representa, no seriado de televisão, o papel do
chefão mafioso Tony Soprano (James Gandolfini). (...) [pano
rápido].
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