23/1/2014, Jim Lobe, IPSnews, Washington
Traduzido pelo
pessoal da Vila Vudu
O "lobby" sionista no Congresso dos EUA |
Há oito anos, Jeffrey Goldberg, da revista New Yorker, perguntou a
Stephen Rosen, então alto funcionário do Comitê para Assuntos Públicos
EUA-Israel [orig. American Israel Public Affairs Committee (AIPAC)] e
conhecido em Washington pela agressividade, pensamento conservador e violência
política, se uma então recente publicidade negativa havia abalado o legendário
controle que o lobby tinha sobre a política de Washington.
“Um semi-sorriso apareceu no rosto de Rosen” – escreveu Goldberg sobre
aquela entrevista. – “Está vendo esse guardanapo?” – perguntou-me ele. – “Em
menos de 24 horas podemos ter aqui a assinatura de 70 senadores, bem aqui,
nesse guardanapo”.
Oito anos depois, o mesmo funcionário, Stephen Rosen, que foi forçado a
demitir-se do AIPAC depois de ter sido acusado – adiante, foi absolvido
– de espionar a favor de Israel, disse a Ron Kampeas da Agência Telegráfica
Judaica [orig. Jewish Telegraphic Agency (JTA)] que o AIPAC teve
de abandonar a posição de confrontação contra o presidente Obama, depois de só
ter conseguido 59 assinaturas de senadores – e quase todos, exceto 16,
Republicanos – de apoio a uma nova lei de sanções contra o Irã que visava a
fazer gorar completamente as negociações nucleares entre o Irã e o chamado
grupo P5+1 (EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia, China, mais Alemanha).
Eles não
querem ser vistos em posição derrotada, nem como desistentes... Mas acho que a
postura confrontacional não é sustentável – disse Rosen.
Chanceleres do Irã e P5 +1 após as negociações sobre as capacidades nucleares do Irã, celebrado em 24 de novembro de 2013, em Genebra. Crédito: EUA Depto de Estado, EUA |
Se tivesse obtido as 70 assinaturas necessárias para aprovar novas sanções
– as quais o governo argumentava que violariam um acordo provisório de 24/11
entre o Irã e o P5+1 (que congela o programa nuclear iraniano em troca do
alívio em algumas sanções, por um período renovável de seis meses), o AIPAC
teria três assinaturas a mais, além do número de votos necessários para
derrubar o veto de Obama.
Mas, ao reunir os 59 co-patrocinadores da lei das novas sanções, depois do
recesso de Natal, foi como se o AIPAC e os autores do projeto de lei,
senadores Mark Kirk (Rep.) e Robert Menendez (Dem.), colidiram de frente contra
uma muralha de resistência liderada por dez Democratas da Comissão e apoiada
por uma Casa Branca surpreendentemente determinada, com discurso estranhamente
muito firme.
Bernadette Meehan |
Se alguns
membros do Congresso desejam que os EUA ajam militarmente, eles que apareçam e
digam claramente à opinião pública dos EUA – disse Bernadette Meehan, porta-voz do
Conselho de Segurança Nacional. Se nada
dizem, fica-se sem saber por que algum membro do Congresso apoiaria uma lei que
praticamente fecha as portas a qualquer diplomacia e põe os EUA muito mais
próximos de ter de escolher entre ou a opção militar ou deixar que prossiga o
programa nuclear do Irã.
Assim aconteceu que a Casa Branca venceu o AIPAC naquela
queda-de-braço. E surgiu a questão de saber quanto poder o AIPAC ainda
tenha. (...)
A incapacidade do AIPAC para mobilizar mais apoiadores entre os
Democratas, principalmente, foi efeito de dois revezes que o grupo sionista sofreu
ao longo do ano passado.
Embora o AIPAC não se tenha manifestado publicamente, sabe-se que o
lobby trabalhou em silêncio contra a nomeação do ex-senador Republicano,
Chuck Hagel, para o posto de Secretário da Defesa, por causa da atitude em
geral crítica de Hagel contra a influência de Israel na política dos EUA para o
Oriente Médio.
Vários grupos e indivíduos alinharam-se firmemente com o AIPAC,
especialmente o Comitê Judeu-Norte-americano [orig. American Jewish
Committee] e a Liga Antidifamação [orig. Anti-Defamation League (ADL)
– dois grupos que se uniram ao AIPAC no lobbying a favor da lei
de novas sanções contra o Irã – na oposição à indicação de Hagel. Mas, afinal,
a indicação foi confirmada no Congresso, com 58 votos a favor e 41 contra, com
a grande maioria dos Democratas votando a favor de Hagel.
Barack Obama (E) e "Chuck" Hagel (D) |
Na sequência, oito meses depois, o AIPAC e outros grupos judeus de
direita fizeram lobby no Congresso a favor de uma resolução favorável ao
uso de força militar contra a Síria – embora, dessa vez, o Congresso tenha sido
acionado por Obama, mas com a aprovação do primeiro-ministro “Bibi” Netanyahu
de Israel.
Mas o gigantesco protesto popular contra qualquer intervenção militar
norte-americana em mais um conflito do Oriente Médio – além da aversão “automática”
da extrema-direita Republicana a virtualmente qualquer iniciativa de Obama –
fez gorar o movimento dos sionistas.
Nem Hagel, nem a Síria têm, sequer aproximadamente, a mesma importância
que o AIPAC atribui ao Irã e ao programa nuclear iraniano, que dominam a
agenda de política exterior do grupo há mais de uma década. Ao longo desse
tempo, os sionistas norte-americanos habituaram-se a mandar e desmandar sobre
amplas maiorias de senadores e deputados dos dois partidos, com a política de
sanções e outras leis criadas para aumentar cada vez mais as tensões – e
impedir qualquer movimento de reaproximação ou “aquecimento” nas relações entre
Teerã e Washington.
Em julho do ano passado, por exemplo, a Câmara de Deputados aprovou, por
400 votos a favor e 20 contra, uma legislação de sanções para bloquear todas as
exportações de petróleo do Irã. As medidas foram aprovadas apenas quatro dias
antes da posse do presidente Hassan Rouhani em Teerã.
Hassan Rouhani em seu discurso de posse na Presidência do Irã |
Durante todo o outono, o AIPAC trabalhou duro – mas, afinal, sem
qualquer sucesso – para fazer aprovar a mesma lei também no Senado.
Agora, dois meses adiante, e incapaz de arregimentar sequer 60 votos (o
mínimo indispensável para impedir a obstrução regimental [orig. filibuster])
no Senado, o AIPAC parece já ter engavetado o projeto de lei
“Kirk-Menendez”, que, dentre outras provisões, teria imposto novas sanções ao
Irã se o país violasse o acordo de 24/11 ou não alcançasse, no prazo máximo de
um ano, acordo satisfatório com o P5+1, sobre seu programa nuclear.
“É perfeitamente visível que as coisas mudaram, e o AIPAC e outros
grupos que fizeram lobby muito ativo [a favor de novas sanções contra o
Irã] sofreram dura derrota” – escreveu Lara Friedman, militante do grupo judeu Americans for
Peace Now, em seu blog; e outros comentaristas,
entre os quais Rosen, alertam que o apoio muito predominantemente Republicano à
lei do AIPAC ameaça a imagem de bipartidarismo tão cuidadosamente
cultivada pelo grupo sionista, e pode afugentar políticos e principais doadores
Democratas.
“O AIPAC perdeu, sim, sem dúvida, esse round; e essa derrota
custou-lhe imensa quantidade de capital político e de prestígio dentro do
governo e no cálculo de muitos Democratas” – disse um veterano observador do
Capitólio. O mesmo observador comentou que “o AIPAC enfrentou tempestade
quase perfeita”: o governo lutando por uma política que também tinha amplo
apoio entre os mais altos quadros da elite da política exterior e, também, de
grupos de ativistas e movimentos de base, que pressionaram seus senadores e
deputados. “Os gabinetes dos senadores recebiam um ou dois telefonemas a favor [daquele
projeto de lei], e centenas contra! Não há dúvida de que isso pesou muito”.
Stephen Walt |
O AIPAC e outros grupos linha-dura
continuam a ser poderosa força para assegurar generosa ajuda dos EUA a Israel,
e para boicotar quaisquer esforços que os EUA façam na direção de uma solução
de dois estados. Mas o poder do AIPAC
diminui sempre que os sionistas põem-se a trabalhar na direção de mais guerras
no Oriente Médio – escreveu-nos Stephen Walt, coautor de The Israel
Lobby and U.S. Foreign Policy, em mensagem de e-mail.
Os
neoliberais e neoconservadores conseguiram empurrar Bush & Co. para a
invasão do Iraque em 2003, mas o sucesso, naquele caso, contou com um conjunto
excepcional de circunstâncias. O público norte-americano aprendeu muito,
daquela experiência desastrosa – continuou Stephen Walt.
Mas ninguém crê que o AIPAC e seus aliados tenham desistido. Se as
negociações do P5+1 derem em nada, a lei “Kirk-Menendez” será rapidamente
reapresentada; de fato um influente senador Republicano já disse que a lei deve
ser incluída na agenda de julho, seis meses depois do dia 20 de janeiro, data
em que o acordo provisório de 24/11 entrou formalmente em vigência.
Lara Friedman |
Tudo faz crer
que [os defensores daquela lei] estão-se preparando para iniciar uma espécie de
Plano B [o qual] (...), parece, será igual ao Plano A; mas, em vez de visar a
fazer gorar as negociações usando mais sanções, o “novo” plano cuidará de impor
condições sobre qualquer acordo final a que se chegue algum dia; condições que
sejam impossível de satisfazer e, assim, sempre matarão qualquer possibilidade
de acordo com o Irã – disse Friedman.
Entre essas condições impossíveis de satisfazer, há a exigência, como
condição para levantar as sanções, de que o Irã ponha fim completo e total a
qualquer tipo de enriquecimento de urânio em solo iraniano – condição a qual
Netanyahu já se referiu várias vezes; que Teerã já rejeitou várias vezes; e que
muitos especialistas entendem que poria fim a qualquer tipo ou possibilidade de
acordo.
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