15/1/2013, Maria Bustillos, Al-Jazeera, Qatar
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Lawrence Lessig |
O
sistema de leis, [construído] para o mundo analógico e redigido nos anos 1970s
não faz, literalmente, sentido algum em mundo digital, não porque o
copyright
não
faça sentido; o copyright
é
importante;
mas
o modo como o copyright
é
implementado numa infraestrutura digital não faz sentido algum. De fato, já se sabe que as leis têm, mesmo, de ser
atualizadas. Mas sempre houve gente, forças,
que
jamais tiveram interesse algum em modernizar as leis do
copyright,
porque lucram com o sistema arcaico.
E
o governo dos EUA tornou-se Procurador vigilante, em nome daquelas forças, na
defesa daquelas forças.
O
muito que Aaron sabia que estava em disputa no processo que o sistema legal dos
EUA movia contra ele levou Aaron ao desespero.
Lawrence
Lessig, professor da Faculdade de Direito de Harvard
Maria Bustillos |
É
muito importante distinguir claramente entre o ativismo de Swartz e a luta
contra o copyright.
Aaron
nunca trabalhou na direção de impedir que os detentores de direitos de autor
sejam pagos. Aaron nunca foi dos que entendem que não deva existir nenhum
direito de autor.
O
que ele queria era liberar a todos o acesso a documentos – produzidos por
acadêmicos – e por cuja propriedade todos os cidadãos já pagamos, quando pagamos
impostos.
Aaron
trabalhou para garantir acesso público a artigos cuja propriedade pertence a
instituições de pesquisa e que, portanto, são documentos que têm de ser
livremente acessíveis a todos os cidadãos que pagam impostos. Maria
Bustillos, escritora e jornalista
_______________________________________________
Aaron
Swartz começou a fazer programação de computadores aos 12 anos. Aos 14, foi
co-criador do padrão RSS (internet syndication standard) que permite que
usuários da Internet reúnam conteúdo que lhes interesse e agreguem conteúdo.
Depois
de um ano de curso, abandonou a Universidade Stanford e fundou uma empresa de
inovação para a Internet, a Infogami; adiante, a Infomami fundiu-se com a página
Reddit, uma rede social de noticiário e entretenimento online. A Reddit,
logo depois, foi comprada pelo conglomerado-gigante de comunicações Conde Naste.
A
venda tornou Swartz muito rico. Ele, então, passou a dedicar sua energia a
campanhas a favor da liberdade na Internet, e co-fundou “Demand Progress”, um
grupo de ativismo.
Participou
ativamente da organização da bem-sucedida campanha “Stop Online Privacy Act
(SOPA)”, que visava a monitorar a Internet à caça de violações da regra de
liberdade total na rede e derrubava as páginas onde houvesse violações.
Na
6ª-feira, 11/1/2013, Swartz suicidou-se em New York.
Sua
família e seu sócio divulgaram declaração em que se lê:
A
morte de Aaron não é simples tragédia pessoal. É efeito de um sistema de justiça
criminal contaminado pela intimidação e pela perseguição ilegal, descabida,
inadmissível, sem limites.
Decisões
tomadas pelos agentes do Gabinete do Procurador Geral dos EUA no Estado de
Massachusetts e no MIT
empurraram Aaron, de fato, ao suicídio.
O
Gabinete do Procurador Geral dos EUA lançou contra Aaron uma carga
excepcionalmente violenta de acusações, que implicariam, no caso de condenação,
em 30 anos de cárcere, como castigo para um crime alegado, do qual não há
vítimas.
No processo quase
inimaginavelmente doloroso de esperar por esse julgamento descabido, ao
contrário de JSTOR, que o apoiou e defendeu, a direção do Massachusetts Institute of Technology,
MIT não defendeu Aaron, nem os mais solenes princípios de sua própria
comunidade acadêmica
e científica.
[1]
Rafael Reif |
Rafael
Reif,
presidente do MIT, anunciou abertura de inquérito para esclarecer o papel do MIT
e distribuiu declaração de solidariedade:
Quero
manifestar bem claramente que eu e todos no MIT estamos profundamente
entristecidos pela morte desse jovem promissor, que tocou tão de perto a vida de
tantos. Dói pensar que o MIT tenha tido qualquer papel na sequência de eventos
que culminaram nessa tragédia. É hora de todos refletirmos sobre nossas ações –
o que inclui também todos nós, no MIT.
Como
motor que impulsionava o trabalho de Swartz, havia a crença apaixonada de que
era absolutamente indispensável manter a vigilância para assegurar que a
Internet continuasse aberta a todos e para dar a mais ampla divulgação a
qualquer impedimento que se tentasse criar à plena liberdade de acesso à
informação.
Tim Lee |
Um
dos problemas subjacentes é que só temos a Lei das Fraudes e Abusos
Computacionais [orig. Computer Fraud and Abuse Act] que foi aprovada nos anos
1980s. Hoje já se sabe muito mais do que naquela época sobre como funciona o
mundo online. Aquela lei
absolutamente não ajuda a entender o que significa computer hacking (...) Por isso,
Procuradores e juízes acabam decidindo e julgando, não segundo a lei, mas
segundo o que haja na cabeça de cada um. Tim
Lee, professor adjunto no Cato Institute
Na
campanha SOPA, Swartz disse:
Há uma
batalha em andamento nesse instante, uma batalha para definir tudo que acontece
na internet em termos de coisas tradicionais que a lei absolutamente não
entende. Partilhar um vídeo por Bit Torrent é a mesma coisa que roubar coisas de
uma loja de antessala de cinema? Ou é a mesma coisa que emprestrar um cassete de
filme a um amigo? Recarregar muitas e muitas vezes uma mesma página de internet
é igual a uma manifestação pacífica, na calçada, ou é igual a quebrar todas as
vitrines de uma loja de rua? A liberdade de conectar-se é como a liberdade para
manifestar-se, ou é como a liberdade para matar? Essa lei será um dano, imenso e
potencialmente permanente. Será uma perda. Se nós perdermos a capacidade para
nos comunicar uns com os outros pela Internet, terá sido introduzida uma mudança
na Bill of
Rights [Constituição dos EUA]. As
liberdades garantidas na nossa Constituição, as liberdades sobre as quais os EUA
foram construídos, terão sido, repentinamente, deletadas.
A
nova tecnologia, em vez de nos trazer maior liberdade, terá servido para detonar
direitos fundamentais que todos nós sempre consideramos assegurados. (...)
E
acontecerá outra vez. Não há dúvidas. Virá sob outro nome, e talvez sob novo
pretexto e provocará dano e causará perdas de outros modos. Mas que ninguém se
engane – os inimigos da liberdade para conectar-se não desapareceram. O fogo nos
olhos daqueles políticos não se apagou. São muitos, são gente muito poderosa, os
que querem cravar as garras na internet.
E,
falando francamente, não há muita gente cujos interesses os empurrem para
proteger as liberdades contra tantas ameaças. Há até grandes empresas, que, para
dizer bem claro, lucrarão mais num mundo no qual consigam censurar os pequenos
concorrentes.
Maria Bustillos é escritora e jornalista
As
acusações contra Aaron Swartz
Aaron
foi indiciado em junho de 2011. O Procurador Federal no Estado de Massachusets
acusou-se de invadir o centro de computação do Massachusetts Institute of Technology
(MIT).
A
acusação diz que, com um computador seu, teria conseguido acesso à rede de
computadores do MIT; e conseguiu
baixar, para aquele seu computador, quatro milhões de artigos de JSTOR – um
arquivo de artigos e periódicos científicos de autoria de acadêmicos.
Foi
acusado de fraude eletrônica, fraude computacional, crime de apropriação
indevida de informação e grave dano a sistema protegido de computador.
Se
condenado, poderia receber pena de 35 anos em prisão fechada e multas num total
de 1 milhão de dólares.
Nota
dos tradutores
[1]
Ver declaração completa de 15/1/2013, redecastorphoto em: Aaron
Swartz (1986-2013), ativista, combatente da liberdade, “hacker”.
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