6/11/2012, Blog 7our, Argélia
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido numa mesa de dominó na Vila Vudu:
Mas pô... O William Waack e seus “especialistas” NÃO SABEM (nem)
disso?!
Ev’rybody’s talkin’
’bout
Bagism, Shagism, Dragism, Madism,
Ragism, Tagism
This-ism, that-ism, ism ism
ism
All we are saying is give peace a
chance
All we are saying is give peace a
chance
John Lennon – The
Beatles
Que
lições o Afeganistão oferece para o conflito no Mali?
Declaração do Ansar al-Dine |
Há negociações em curso [novembro
de 2012] em Ouagadougou e Argel com o
grupo islamista Ansar al-Dine (AD), um dos grupos islamistas que ocupam o norte
do Mali. Ainda não sabemos o que resultará dessas discussões, se haverá um
processo de paz com as autoridades de Bamako, e se a comunidade internacional
fará demandas moderadas e aceitáveis. Em sua primeira
declaração nessa 3ª-feira (2/1/2013), o grupo
Ansar al-Dine “rejeita todas as formas de extremismo e terrorismo e está
comprometido com a luta contra o crime transnacional
organizado”.
Vale
observar que essas conversações foram recebidas com muitos comentários negativos
e duros. Para começar, alguns veículos de imprensa já trabalham para aumentar a
confusão.
Em
recente documentário exibido pelo canal francês de televisão M6, os jihadistas
do Movimento pela Unidade e pela Jihad na África Ocidental. MUJAO (que não tem
nome no documentário) em Gao são mostrados como se fossem membros do movimento
Ansar al-Dine.
Ansar al-Dine numa aldeia do Magreb (observe a bandeira símbolo do grupo) |
E
– dito com clareza – qualquer conversação que inclua o movimento AD irrita
muitos círculos. Exemplo dentre outros, um
artigo do Figaro
apresentava
uma das primeiras conversações secretas em Argel, entre um oficial militar do
Mali e delegados do grupo AD com membros do Movimento Nacional para Libertação
do Azawad (MNLA) e líderes tribais, como negociações diretas, que já estariam em
andamento, entre “autoridades da Argélia e islamistas do norte do Mali”.
Quem são os líderes do movimento
Ansar al-Dine (em Jeune Afrique)?
Iyad Ag Ghali |
São,
quase todos da tribo tuaregue dos Ifoghas. Iyad Ag Ghali e Ahmada Ag Bibi foram
rebeldes nos anos 1990. Alghabass Ag Intallah foi membro da Assembleia Nacional
do Mali e é provável sucessor de seu pai como chefe dos Ifoghas.
Assim
sendo, cuidado com comentários impensados que “exijam” que os insurgentes
tuaregues islâmicos sejam arrancados de seu próprio território.
Quem
leia ou ouça os apoiadores de intervenção militar ou de guerra no Mali,
perceberá forte tendência a sobrevalorizar as possibilidades de sucesso de
qualquer solução militar. Segundo eles, não haveria diferença alguma entre os jihadistas estrangeiros e os islâmicos
locais, e o único alvo de qualquer futuro ataque deve ser o grupo AD. Os que
assim pensam não veem o quadro geral em campo.
Por
que uma intervenção militar estrangeira teria de neutralizar os tuaregues
islâmicos insurgentes? Esses combatentes ameaçam algum “interesse” estrangeiro
no Mali? O grupo Ansar al-Dine jamais fez reféns, nem planejou ou executou
qualquer ataque em território estrangeiro e tem agenda exclusivamente local.
Sim, eles têm crenças fundamentalistas, mas não têm agenda jihadista internacional.
Essa é a avaliação, inclusive, do
novo emir da Al-Qaeda no Maghreb Islâmico no Sahara. Perguntado sobre suas
relações com o grupo AD, Yahya Abu El Hamam, disse em entrevista
(em árabe):
Yahya Abu El Hamam |
Ansar
al-Dine é um grupo islamista local que trabalha para implantar a religião de Alá
e escolheu a Jihad
em nome de
Alá para fazê-lo. Embora nós discordemos desse grupo por sua
visão limitada à dimensão local, partilhamos com eles vários outros traços,
dentre os quais a fraternidade islâmica e tudo que essa fraternidade implica em
termos de cooperação para fazer o bem e cumprir os deveres religiosos, apoiar os
oprimidos, lutar por justiça para os oprimidos, defender a honra dos muçulmanos
e lutar pela restituição dos direitos a seus legítimos beneficiários. Essa é a
pauta que serve de base a todas as nossas conversações e contatos com todos os
grupos islâmicos.
Gostem
ou não gostem deles, o movimento Ansar al-Dine já era ator da cena política no
norte do Mali, muito antes de as muitas manchetes sobre “Mali, o novo
Afeganistão” começarem a brotar como cogumelos na imprensa dominante em todo o
mundo.
É
boa hora para lembrar o que houve no Afeganistão e ouvir o que disse, em 2008, o
ex-enviado especial da ONU ao Afeganistão, Lakhdar Brahimi – que negociou a
formação de um governo afegão de transição depois da queda do governo dos Talibã
em 2001.
Em
2008, Bhahimi confessou, em artigo intitulado “Uma
nova estratégia para o Afeganistão”, publicado no Washington
Post:
Lakhdar Brahimi |
Há
sete anos, os Talibã foram desalojados e desapareceram de Cabul e outras grandes
cidades, mas jamais se renderam a quem quer que fosse. Sempre foi evidente que
suas intenções e capacidades teriam grande peso no futuro do país. A ONU
apresentou então duas sugestões, no início de 2002: buscar os membros dos
Talibãs que tivessem interesse potencial em participar do processo político; e
implantar unidades da International
Security Assistance Force (ISAF) fora de
Cabul, com capacidade militar significativamente ampliada. As duas sugestões
caíram em
ouvidos surdos. Lamento amargamente não ter insistido mais
nessas duas propostas junto aos mais altos níveis de poder. Tivessem sido
seguidas, essas sugestões poderiam ter mudado o curso dos eventos no
Afeganistão.
11
anos depois de iniciada a operação “Liberdade
Duradoura”, o
Afeganistão ainda está longe de ser país em paz e estabilizado. Sim, mas os
Talibãs já foram convidados, aceitaram o convite e já chegaram à mesa de
negociações com os EUA (Huffington Post, 24/4/2012, em: “Taliban Peace Talks: U.S. Eyes Options To Restart
Negotiations”. (...)
ATUALIZAÇÕES:
7/11/2012
Sanda Ould Bouamama |
1.
No postado acima, não falei de outros elementos que também compõe, além dos
tuaregues, o movimento Ansar al-Dine. Por exemplo, o grupo de Timbuktu, sobre o
qual fala o “porta-voz do AD”, Sanda Ould Bouamama.
Na
minha visão da crise no Mali, há pelo menos dois grupos AD: um tem base em
Kidal, em torno de líderes tuaregues islamistas; o outro tem base em Timbuktu e
tem composição mista. Mas a diferença crucial entre eles é a atitude em relação
a negociações. O grupo AD-Kidal participa no processo político e parece disposto
a negociar concessões. No extremo oposto do espectro islamista, o grupo
AD-Timbuktu tem posição radical e tensa a favor da rígida aplicação de uma visão
feroz da Xaria. Não surpreendentemente, muitos líderes da AD-Timbuktu são
ex-membros da Al-Qaeda no Magheb Islâmico, AQIM. Seria interessante saber como
receberam as declarações do AD-Kidal em Ouagadougou.
2.
Sim, alguns chefes do grupo AD-Kidal estiveram envolvidos como intermediários no
negócio de reféns. Devem os únicos condenados por isso? Antes de mais nada é
atuação menos condenável que a de oficiais do exército do Mali do
governo/presidência anterior no mesmo negócio de reféns; em atividades de
lavagem de dinheiro; e no contrabando de drogas. E quanto às negociações com
reféns, há outros intermediários, entre os quais um coronel francês, JMG, o
negociador da Air France e intermediários da Areva... Tem-se de admitir que o
grupo AD-Kidal não é o único envolvido nesse negócio.
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