4/1/2013, Robert
Parry, Consortium News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Robert Parry |
A empreitada “midiática” de Al Gore está acabando; foi fracasso
em praticamente todos os aspectos. A única contribuição que deixa aos pósteros
parece ser o fato de que será comprada pela rede Al Jazeera – com o que
essa importante voz do mundo islâmico conseguirá, como se espera, pôr, afinal,
um pé nos EUA.
A
história da rede e canal Current TV, de Al Gore, que agoniza, deve ser
estudada detalhadamente como caso exemplar, por todos os progressistas
interessados em aprender o que não fazer na criação e gestão de um veículo de
imprensa comercial.
A
empreitada foi fracasso em praticamente todos os aspectos. A única contribuição
que deixa aos pósteros parece ser o fato de que será comprada pela rede Al
Jazeera – com o que essa importante voz do mundo islâmico conseguirá, como
se espera, pôr, afinal, um pé nos EUA.
Joel Hyatt (E) Al Gore (D) |
O principal erro que Al Gore e seu
sócio, Joel Hyatt, cometeram aconteceu logo na
fundação do canal Current, em 2004-05, quando o canal deliberadamente
fugiu da disputa que, então, era a mais acirrada luta subterrânea pelo futuro
dos EUA; e o canal optou por não se contrapor à estratégia do presidente George
W. Bush, para construir uma maioria Republicana permanente no Congresso.
Gore,
especificamente, esqueceu qualquer inclinação democrática que o novo canal e
rede pudessem ter, prometendo que seria “voz independente” focada em jovens
adultos de 18-34 anos, para dar-lhes “uma voz que eles próprios reconhecessem e
um ponto de vista que reconhecessem como seu”. O plano era criar uma MTV, com um
pouco de consciência social.
Gore
e Hyatt cuidaram de instalar a base do novo canal e rede em San Francisco, cidade agradável para
morar, mas, francamente, péssima opção para base de rede de televisão, distante
3.000
milhas – e com três horas de atraso – em relação aos
centros de notícias de New York e Washington. Ao instalar a sede na Bay Area, o canal e rede Current TV seguiram a tendência dos
veículos progressistas, de escolher endereços simpáticos na retaguarda, em vez
de tentar disputar cada palmo de terreno nas trincheiras já superlotadas da
chamada “mídia dominante”.
Naquele
momento, o povo dos EUA enfrentávamos uma das mais ferozes ameaças que jamais
houve contra nosso futuro político – estratégia ousada concebida por Karl Rove e
outros agentes operadores dos Republicanos para assumir controle total sobre a
opinião nos EUA e empurrar o país para uma direção violenta, cruel, de direita,
pode-se dizer, doentia. E o ex-vice-presidente e porta-estandarte dos Democratas
de 2000 – conscientemente impediu que seu novo canal de TV e sua rede se
envolvessem naquela disputa.
Ter
evitado a disputa poderia ser boa estratégia negocial – se tivesse gerado bons
negócios – mas nem isso se viu. E foi, isso sim, ato bem visível de covardia
política. Em 2005, quando o canal e rede de televisão Current afinal
foram ao ar, o povo norte-americano desesperadamente precisava de alguma voz de
coragem que se opusesse aos desmandos de Bush e aos abusos do poder; de alguém
que, inclusive, se opusesse à campanha midiática pró-guerra do Iraque e às
violências que o governo Bush cometia contra as proteções constitucionais
fundamentais, como o direito de habeas corpus e a proibição contra a
tortura, da qual se falava sob a fórmula “punição cruel e não usual”. Tortura, é
claro.
Bush
e a Direita também pouca atenção davam ao aquecimento global e outras ameaças
bem conhecidas.
Joe McCarthy |
A
rede de televisão de Gore poderia ter-se engajado ativa e agressivamente nesses
fronts de batalhas políticas; poderia
ter oferecido informação histórica relevante; poderia ter revelado à opinião
pública abusos muito mais amplos do poder político por Republicanos, de fato,
desde os dias do senador Joe McCarthy, passando pelo presidente Richard Nixon,
pelos crimes de Ronald Reagan e de George H. W. Bush; dentre outros crimes, por
exemplo, a tolerância com os traficantes de cocaína que constituíam as gangues
de “rebeldes” dos Contra, na Nicarágua.
Gore
poderia ter mostrado efetiva e significativa independência de opinião, se
noticiasse que também os Democratas muito contribuíram para a prática de crimes
assemelhados aos dos Republicanos, durante os anos imediatamente posteriores à
2ª Guerra Mundial – crimes por comissão e por omissão.
Público
audiente e telespectador mais jovem talvez apreciasse conhecer fatos e provas
que jamais foram objeto de notícias nos EUA; mais adequadamente bem informados,
os mais jovens talvez encontrassem meios e modos eficazes para pôr a política
dos EUA em rota mais segura. Com certeza o tal “público-alvo entre 18-34 anos”
teria noção mais clara e mais bem informada sobre verdadeira batalha que se
trava à volta deles, contra uma estrutura de poder que absolutamente não será
modificada – sequer cosmeticamente, que fosse! – só porque algum sujeito
“midiático” põe-se a exibir filminhos documentários sobre “cuidar do planeta”.
Bush,
o Todo-Poderoso
George W. Bush |
Soa
estranho, quase inacreditável, hoje – quando o presidente George W. Bush é
tratado como rematado fracassado, político que não foi convidado, sequer, para a
Convenção Nacional dos Republicanos! Mas há oito anos, Bush estava no comando de
uma nave-monstro de guerra completamente ensandecida, que apavorava o mundo; e
que calou muita gente. Calou, sobretudo, muitos políticos e jornalistas e
analistas e “especialistas” que preferiram o silêncio cúmplice e covarde, a
perder uma tal pressuposta “credibilidade”, que a mídia dominante lhes dava, ou
negava.
Por
isso, a tarefa de explicar à opinião pública a estrutura política dos EUA deixou
de ser função da imprensa-empresa comercial dominante. E passou a caber, como
missão e dever a uma meia dúzia de blogs e páginas internet, entre os quais esse
nosso Consortiumnews.com, que sobrevive de doações de cidadãos e sempre
enfrentando dificuldades financeiras, o trabalho de desmentir, de desmascarar a
opinião-feita, a “opinião-geral-da-imprensa-e-dos-intelectuais-midiáticos”.
Passou a caber-lhes o trabalho de argumentar contra a opinião convencional sobre
a guerra do Iraque; produzir e distribuir informação indispensável sobre o
contexto histórico – único meio pelo qual os EUA teriam meios para entender o
próprio descaminho.
Naqueles
anos cruciais, a televisão de Gore, Current TV, captou muitos milhões de
dólares dos poucos que há para financiar jornalismo que não seja o
“jornalismo-empresa-das-empresas-comerciais-de-mídia”, mas, correspondentemente,
produziu muito pouco que pudesse, de fato, fazer alguma diferença na luta pelo
futuro político dos EUA.
Ironicamente,
o primeiro fruto do caminho de abertura jornalística que Gore desperdiçou foi
gerado por um ramo “midiático” da General
Electric, membro fundador do Complexo-Militar-Industrial nos EUA.
Phil Donahue |
A rede MSNBC, outra rede de
televisão a cabo, tentou, por algum tempo, disputar espaço contra a direita
ocupada pela rede Fox News. Mas em
2003, na preparação para a guerra do Iraque, a rede MSNBC demitiu o popular Phil
Donahue, que
se atrevera a entrevistar alguns militantes antiguerra em seu programa. Em seguida,
durante a invasão, a rede MSNBC já produzia os mais deslavados vídeos de
propaganda, em que se viam soldados dos EUA “libertando” o Iraque, exatamente o
que a Fox também fazia.
A
rede MSNBC, como vários outros veículos da “grande” imprensa, censurou
cuidadosamente imagens de civis iraquianos mortos e de criança feridas nos
hospitais superlotados, para não abalar a histeria jingoísta generalizada que rapidamente
se convertia em picos de audiência e, daí, em ouro, em caixa. Mas os executivos
perceberam rapidamente que a Fox já
cercara completamente o mercado do público mais conservador; e os
super-quase-patriotas da rede MSNBC foram obrigados a tentar outra estratégia.
Keith Olbermann |
Essa estratégia emergiu pela voz
singular de Keith
Olbermann, ex-comentarista de esportes
que transformou seu programa “Countdown”, transmitido pela MSNBC, que chegou ao
topo de audiência ao mesmo tempo em que crescia a guerra no Iraque, em programa
imperdível para os norte-americanos preocupados com o rumo que Bush estava
impondo ao país.
Homem
de temperamento forte, Olbermann várias vezes deu provas de coragem, desafiando
abertamente o governo Bush e a rede Fox
News – e provou que seu estilo combativo, embora erudito, podia penetrar
também as casamatas do conformismo político que predominava, de meados até o
final da década. Todas as noites, Olbermann atacava a falsa versão da “Missão
Cumprida” de Bush, contando, dia a dia, o tempo de duração da guerra, mesmo
depois daquela declaração ensandecida.
Os
índices de audiência, que comprovavam o sucesso crescente do trabalho de
Olbermann, convenceram os executivos da rede NBC Universal a aumentar o número de
programas progressistas na grade da programação diária, o que converteu a MSNBC
em contraponto do noticiário da rede Fox
News e expôs, como ocos e irrelevantes, os esforços da CNN para parecer
“isenta” e “equilibrada”.
Mas discussões e discordâncias
cada vez mais frequentes entre Olbermann e a direção da rede MSNBC levaram Olbermann a demitir-se em
janeiro de 2011, mas seu legado permaneceu,
duradouro e profundo. Naquele momento, Bush já era universalmente considerado um
dos piores presidentes de toda a história dos EUA; e guerra do Iraque já estava
definida como trágico fracasso, e a rede MSNBC recebia milhões de preferências
dos telespectadores, cansados da escandalosa propaganda da direita, pelo canal
Fox; e do ridículo falso “equilíbrio”
da rede CNN.
Só
depois que Olbermann deixou a rede MSNBC – e depois de a escandalosa máquina de
promover guerra de Bush-Rove-Fox já estar em boa parte desmoralizada – é que
Gore e o canal Current TV decidiram abandonar o formato
“MTV-com-alguma-consciência-social” e optar por programação política mais adulta
e densa. O canal Current contratou
Olbermann para dirigir o setor de jornalismo e noticiário e para dar
continuidade ao seu programa, mas rapidamente a proposta esvaziou-se, por causa
da produção pobre e dos valores políticos capengas de toda a rede; em março de
2012, Olbermann deixou a rede Current.
A
dura e inescapável verdade sobre o canal de televisão que Gore criou, Current
TV, é que deixou passar o momento histórico e, assim, perdeu a oportunidade
de oferecer comunicação comercial e de massa que realmente operasse a favor de
melhor futuro político para os EUA. Gore e sua rede supuseram que estariam
fazendo algum bem à sociedade por não atacar empenhadamente as forças que
atuavam então exclusivamente para esmagar qualquer pensamento político
progressista e o próprio espírito democrático nos EUA.
A
ideia foi que a rede se afastaria da “sujeira” do mundo político, tanto em
termos políticos quanto em termos geográficos, instalando-se o mais longe
possível de Washington, dando destaque ao belo e ao positivo, não ao feio e ao
negativo.
Difícil
imaginar erro mais grosseiro, de planejamento e de cálculo; ou fracasso político
mais completo; ou mais total manifestação de covardia política; ou manifestação
mais indiscutível de incapacidade de conceber negócio decente e lucrativo no
campo da comunicação de massa. A rede Current TV está sumindo da paisagem
midiática nos EUA, sem ter feito coisa alguma do que se propôs a fazer. Poucos,
de fato, sabem do fim da empresa; e poucos lamentam.
Castor,
ResponderExcluirO seu blog é nota 1.000! Excelente mesmo. Aqui tem notícias que dificilmente aparecem noutro lugar. Parabéns e continue publicando.
Só pediria uma coisa: coloque um ícone para opção "imprimir". As notícias que mais me interessam costumo imprimir e guardar.
Um forte abraço.
Dejanir
Acho que o blogger não tem essa opção. Sugiro que você utilize o ícone de impressão do seu navegador. Em todo caso vou perguntar a alguém que entenda desse assunto se é possível juntar a opção no próprio "template".
ExcluirGrato pela sugestão e aproveite nossa postagens subscrevendo nossa "newsletter" e seguindo o blog ali mesmo na lateral esquerda.
Abraço
Castor