Adriano
Benayon*
- 25.03.2013
1.
O percentual no PIB dos investimentos na produção e na infra-estrutura física e
social está em patamar muito baixo na comparação com os países em que a
indústria é basicamente nacional. Isso ocorre desde os anos 1970s, quando já se
deveria ter entendido que o modelo dependente é incompatível com o
desenvolvimento.
2.
Embora o crescimento natural da população tenha sido contido, devido à
intervenção de fundações norte-americanas, a produção é, de longe, insuficiente
para assegurar sequer tolerável qualidade de vida à esmagadora maioria dos
brasileiros. Ademais, a produção e a infra-estrutura são orientadas em função de
interesses estrangeiros.
3.
O modelo dependente gerou enorme endividamento, cujo serviço asfixia a economia
brasileira. De há muito, a taxa de investimento do Brasil corresponde a cerca de
metade das da China, Coreia, Taiwan e outros.
4.
Houve um processo cumulativo de desnacionalização e de concentração econômica,
determinantes de crescente ascendência das transnacionais sobre o “poder
público”, criando instituições e mentalidade que levam a brutal desperdício dos
recursos investidos.
5.
Por isso não só se investe pouco, mas se investe mal, em todos
os sentidos: na escolha de em que investir e no modo de realizar os
investimentos.
6.
Enquanto o Titanic afunda, economistas prosseguem fazendo propostas tópicas, sem
perceber – ou fingindo não perceber – que nenhuma delas resolve coisa alguma
enquanto perdurar o modelo dependente.
7.
Lembrando que, desde 1990, a renda per capita cresce a 1,7%
ao ano (4% entre 1930 e 1980) e que a taxa de investimentos patina em torno de
míseros 18% do PIB, Bresser Pereira propõe, como solução salvadora, reduzir
substancialmente os juros e desvalorizar a taxa câmbio do
real.
8.
Essas medidas seriam, em si, benéficas. De fato, seis pontos percentuais na
redução dos juros públicos, incidindo sobre a dívida interna de 3 trilhões de
reais, liberariam recursos para investimentos de infra-estrutura e produtivos de
R$ 180 bilhões anuais (4% do PIB).
9.
Vantagem adicional decorreria da baixa dos juros pagos pelas empresas produtivas
e por pessoas físicas, diminuindo custos e elevando renda. Ademais, é infundada
a ideia, amplamente disseminada, de que juros altos detêm a inflação.
11.
Entretanto, sem essa entrada de capitais, sem grandes investimentos diretos
estrangeiros e aquisições de empresas nacionais, o elevado déficit de transações
correntes se traduziria em déficit no BP.
Desencadear-se -ia fuga de capitais estrangeiros (dos quais uma
parte é de brasileiros com depósitos no exterior).
12.
Isso faria o real desvalorizar-se muito além do desejável e acelerar a inflação,
pois o País está mais dependente, que no passado, de importações de bens de
capital, insumos e bens finais.
13.
É evidente, pois, que não seria viável reduzir significativamente os juros, sem
instituir rigoroso controle de capitais e sem racionar de divisas, diferenciando
importações essenciais das demais, seja com taxas múltiplas de câmbio, seja com
elevados impostos para as importações menos essenciais e para as supérfluas.
14.
Óbvio também que tudo isso só é viável se o governo tiver autoridade, poder e
vontade de afrontar as regras da comunidade financeira (oligarquia da ordem
mundial anglo-americana) instrumentadas através de seus cães de guarda, FMI,
Banco Mundial e Organização Mundial do Comércio (OMC).
15.
Além de ter autonomia em face dessas instâncias “internacionais”, teria o
governo de, ou exercer efetivo controle sobre bancos e empresas oligopolistas,
ou estatizá-los, já que, do contrário, represálias de uns e das outras levariam
à desestabilização do governo, como de hábito, dirigida por serviços secretos
das potências imperiais.
16.
Precisaria, ainda, elevar, inclusive qualitativamente, a produção e manter a
inflação sob controle, e isso só seria possível retirando dos oligopólios, na
maioria de transnacionais, o domínio, sem concorrência, sobre os mercados e
acabando com os abusos dos detentores dos serviços públicos privatizados e dados
em concessões.
17.
Ora, o que o atual Executivo federal está fazendo é o contrário de tudo isso,
apoiado pelo Congresso, sempre entreguista. Não só mantêm-se as privatizações e
as concessões, que já haviam deteriorado a qualidade e encarecido os preços da
eletricidade e das telecomunicações, como se ampliam os privilégios dos grupos
que os exploram. Além disso, o Estado prossegue fugindo a seus deveres, ao
entregar novas áreas, como aeroportos, portos e ferrovias.
18.
O modelo é outorgar a exploração dos serviços, oferecendo dinheiro público e
financiamento, a juros mínimos, por bancos estatais, e garantir lucro elevado e
sem risco aos beneficiários.
19.
Em requinte privatista, regado a dinheiro dos contribuintes, o governo planeja
que o Tesouro e o BNDES repassem recursos aos bancos privados para emprestarem
aos concessionários dos novos serviços privatizados.
20.
Ou seja: mais negócios para os bancos lucrarem com dinheiro que não lhes
pertence, acrescendo aos colossais fundos que já lhes são providos pelos
depositantes (em dezembro, o governo reduziu em mais R$ 15 bilhões, os depósitos
compulsórios dos bancos no Banco Central).
21.
Lucro sem comparação em todo o mundo para grupos privados - garantido e sem
risco - tudo bancado pelo Estado – é como o governo pretende promover o
crescimento dos investimentos em infra-estrutura.
22.
“Pretendem” diminuir o famigerado “custo Brasil”, melhorando a competitividade
da economia. Mas não atentam para:
a)
custos artificialmente elevados pela contabilidade dos
oligopólios;
b)
o kafkiano e abstruso método usado para que as distribuidoras (privatizadas) da
energia fiquem com o grosso dos ganhos decorrentes de preços altíssimos, sem
nada terem investido na geração e na transmissão;
c)
as restrições impostas por IBAMA, FUNAI, organizações estrangeiras e ONGs, e
ministérios públicos federal e estaduais, a que hidrelétricas sejam construídas
com integral aproveitamento do potencial hídrico;
d)
a supressão das eclusas, cuja falta deixa de criar vias fluviais navegáveis, num
País em que a infra-estrutura de transportes não poderia ser mais
horrorosa;
e)
a falta de adequados procedimentos de controle dos custos das obras e de
concorrência que viabilize a participação de empresas de capital nacional de
menor porte.
23.
Por fim, não se consegue tornar o Brasil competitivo aplicando vultosos recursos
em pesquisa científica e tecnológica (previstos R$ 32,9 bilhões em 2013/2014),
apregoando grande salto na inovação, porque esse dinheiro é dissipado enquanto
não houver condições para que empreendimentos de capital nacional vinguem no
mercado.
Adriano
Benayon* é doutor em economia e autor do livro Globalização versus
Desenvolvimento.
Texto
enviado pelo autor
Ilustrações:
redecastorphoto
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