sábado, 30 de março de 2013

Uma estrela (iraniana) ascendente


27/3/2013, MK Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Robert Burns
The best laid schemes o’mice na’men / Os melhores planos que ratos e homens façam,
Gay aft a-gley/Alegres depois do trabalho,
Na’lea’e us nought but grief a’pain/Só trazem luto e dor
For promised pay/pelo que um prometeu ao outro, mas não cumpriu.
[Robert Burns, “To a Mouse”/Para um rato]
[Íntegra, em inglês, em Poesia Escocesa]
[Epígrafe acrescida pelos tradutores]


Ali Akbar Velayati
Há exatamente um mês, quando escrevi [1] que um candidato a ser observado nas eleições presidenciais do Irã de 12/6 próximo seria Ali Akbar Velayati, ex-ministro de Relações Exteriores, foi um tiro no escuro, mas também opinião cevada na observação atenta dos corredores da política bizantina em Teerã e em Qom, nos últimos meses.

Bloomberg Businessweek acaba de chegar à mesma conclusão. [2] BB evidentemente serve-se de fontes de alto nível em Washington e em Teerã, para instruir seus artigos, e a minha única fonte é pura, incansável paixão por observar o Irã, alimentada por velha paixão por aquele país e seu belo povo.

De fato, é também minha opinião desejante, enviesada, indiano-cêntrica. Estive várias vezes na mesma sala com Velayati em Teerã e em Delhi, quando ele ali esteve como Ministro; e não tenho dúvidas de que sua ascensão ao poder como Presidente do Irã será magnífica novidade para a Índia – desde que, é claro, Delhi procure genuinamente reconstruir seus laços estratégicos com o Irã.

Velayati teve papel chave no movimento ascendente da curva das relações entre Índia e Irã, nos dez anos a partir do fim dos anos 1980s (quando o então Primeiro-Ministro da Índia fez movimento dramático de aproximação com Teerã).

O entendimento estratégico deu excelentes frutos, quando Teerã ajudou a Índia a conter a tempestade nos países muçulmanos, depois da destruição de Babri Masjid (1992), e a liderança iraniana mostrou incansável compreensão na questão das atrocidades então em curso nas regiões da Caxemira, no início dos anos 1990s.

Depois, o Irã ajudou a Índia a conter a detonação diplomática, relacionada ao problema da Caxemira, que os sauditas promoviam na Organização de Cooperação Islâmica, com o Irã, de fato, já organizando a resistência anti-Talibã conhecida como Aliança do Norte (1997). [3]

Eram tempos em que nenhum indiano se atreveria a subestimar o Irã como fator de estabilidade, com certeza no que tivesse a ver com interesses centrais da Índia. Boa parte de tudo isso aconteceu sob a orientação de Velayati. Tinha visão clara sobre as relações Irã-Índia e via essas relações como crucialmente importantes para o Irã.

Lembro perfeitamente a conversa, em Hyderabad House, no final de 1989, quando Velayati falou pela primeira vez da ideia do corredor Norte-Sul, como acesso da Índia à rota para a Rússia e a Ásia Central – de fato, delineou ali as potencialidades do projeto de um óleogasoduto Irã-Paquistão-Índia (IPI).

Oleogasoduto Irã - Paquistão - Índia 
É homem cordial, erudito, tem nervos de aço [4] e cabeça de negociador incansável. E é muito bem-humorado, capaz de fechar com risadas um dia de negociações duríssimas – talentos que muito ajudarão o Irã a acalmar as águas do Estreito de Ormuz.

Absolutamente todos sabem que Velayati manifesta e representa os interesses mais radicalmente fundamentais do regime iraniano. Mas é pragmático, dos que sabem que a política é a arte do possível.

Estreito de Ormuz - passagem de 40% do petróleo que abastece o ocidente
Tudo isso volta a ser extraordinariamente importante, porque o próximo presidente do Irã tem papel decisivo na modelagem do “Novo Oriente Médio” e da segurança regional e internacional.

E se e quando as conversações se iniciarem entre EUA e Irã, como provavelmente começarão depois de passadas as eleições de junho no Irã, Velayati é o homem mais qualificado para melhor negociar pelo Irã: goza da confiança do Supremo Líder, Ali Khamenei; tem ampla e clara compreensão da política mundial e de como opera o sistema internacional; e fala perfeito inglês (embora com sotaque norte-americano). É garantia de conversa iluminadora, caso o Presidente dos EUA, Barack Obama, algum dia apareça para conversar com ele sobre guerra e paz no Oriente Médio – e depois resolva continuar o papo numa mesa menos formal, para falarem de ratos e homens. [5] 
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Notas dos tradutores

[1] 5/2/2013, Indian Punchline, MK Bhadrakumar em: A rising star in Iranian politics [Uma estrela ascendente na política iraniana]

[2] 26/3/2013, Business Week, Ladane Nasseri, em: Velayati May Run for Iran President as Calm to Ahmadinejad Storm

[3] Aliança Afegã do Norte [orig. ing. Afghan Nothern Alliance], oficialmente, Frente Islâmica Unida para Salvação do Afeganistão (em persa Jabha-yi Muttahid-i Islami-yi Milli bara-yi Nijat-i Afghanistan), foi frente militar formada no final de 1996, depois que os Talibã (Emirado Islâmico do Afeganistão) tomaram Cabul. A Aliança do Norte foi proposta por afegãos e lutou guerra de defesa contra o governo dos Talibã – com apoio de Rússia, Irã, Índia, Tadjiquistão e outros; os Talibã era apoiados pela al-Qaeda e pelo exército do Paquistão. Depois que os EUA invadiram o Afeganistão e lá implantaram o governo Karzai, no final de 2001, a Aliança do Norte dividiu-se, dando origem a vários partidos políticos.

[4] Ali Akbar Velayati discursava na ONU, como Ministro de Relações Exteriores do Irã, quando um dissidente saltou sobre ele, arrancou-lhe das mãos o discurso que lia e rasgou-o. Um segurança tirou o homem da sala. Velayati esperou calmamente, de mãos no bolso. “Alguém, da nossa delegação tinha cópia do texto e me entregou” – conta Velayati, recordando o episódio do início dos anos 1980s, em entrevista para a televisão iraniana. – “Achei a página 10, onde lembrava que havia parado, e continuei a ler” (ver no primeiro parágrafo do “link” da Nota [2]).

[5] Orig. mice and men. A expressão, do verso de Burns que se lê na epígrafe, dá título também ao romance Ratos e Homens de John Steinbeck, de 1937, cujo enredo também é relevante para compreender a metáfora que se lê aqui.
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MK Bhadrakumar* foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The HinduAsia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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