5/12/2013, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Reunião da OTAN em Bruxelas de 3-5 de dezembro de 2013 |
A reunião dos ministros de Relações Exteriores dos países da Organização
do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em Bruxelas fez aumentar a pressão sobre o
presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, para que assine logo o Acordo sobre o Status
das Forças [ing. State of the Forces Agreement, SOFA] com os EUA.
Até aí, tudo perfeitamente
previsível. A pressão psicológica deve ter sido imensa
sobre o Ministro de Relações Exteriores em exercício, Zarar
Ahmad, e o Ministro do Interior, Mohammad Daudzai, do Afeganistão, com os
ministros de 28 países aliados da OTAN e 41 países à volta da mesa, na 4ª-feira
à tarde no quartel-general da Aliança em Bruxelas, todos a dizer a mesma coisa:
“Rápido, rápido! É p’rá já!”.
Simultaneamente, apareceram duas variantes intrigantes. Uma, o secretário
de Estado, John Kerry, introduziu ideia das mais enigmáticas: para ele, não
seria necessário que Karzai assinasse o acordo SOFA. Disse claramente
que o acordo poderia também ser assinado entre altos funcionários da Defesa dos
governos afegão e norte-americano. A impressão inicial foi que Kerry, como
parece estar-se tornando sua marca registrada, falara mais do que devia.
John Kerry (E) e Chuck Hagel (D) |
Mas o secretário de Defesa, Chuck Hagel, aproveitou a ideia e, dia
seguinte, ampliou-a. Hagel
disse que:
A questão
sobre quem é a autoridade para falar pela nação soberana do Afeganistão,
entendo eu, é assunto para os advogados. Seja o ministro da Defesa ou o
presidente, alguém com autoridade para assinar pelo Afeganistão… Acho que assim
teremos o compromisso de que precisamos.
B. K. Mohammadi |
A tentativa temerária, pelo governo Obama, de contornar Karzai – ou, até,
pior, de estimular
um golpe palaciano em Kabul contra Karzai – é movimento perigoso. Circulam
notícias de que os EUA já teriam abordado o Ministro da Defesa, Bismillah
Khan Mohammadi (que é tadjique étnico, como também o primeiro vice-presidente,
Mohammed Fahim).
É atitude que só faz chamar a atenção para o quão desesperado está o
governo Obama para ver fixadas as bases norte-americanas no Afeganistão. Vem à
cabeça imediatamente o momento em que Ngo Dinh Diem do Vietnã do Sul entrou
diretamente na
linha de tiro dos EUA há exatos 50 anos, em agosto de 1963.
Hamid Karzai |
Mas... conseguirão intimidar Karzai? O representante especial dos EUA para
o AfPak, James Dobbins, já pousou em Cabul. Não sabe sequer se Karzai aceitará
recebê-lo. O porta-voz de Karzai, Aimal Faizi, falou em tom desafiador. Disse
que Karzai quer “um fim absoluto” de todos os ataques militares
norte-americanos contra lares afegãos; e “início significativo” do processo de
paz com os Talibã.
Mas... suponhamos que não haja golpe algum em Kabul, que nenhuma usurpação
de poder seja possível em Kabul. O que acontecerá na sequência? O governo Obama
não parece ter na manga qualquer tipo de Plano B. O general Martin Dempsey,
comandante do Estado-Maior das Forças Conjuntas dos EUA revelou na 4ª-feira que
a Casa Branca ainda não lhe falou de qualquer “opção zero”.
Disse muito significativamente que “Nada é irreversível”, e que o
Pentágono ainda pode inventar um meio de deixar alguma força residual no
Afeganistão, se algum acordo estiver assinado até o começo do verão de 2014.
Martin Dempsey |
O que se ouve agora é que os EUA só teriam insistido tanto no prazo de
dezembro de 2013 para a assinatura do acordo SOFA, porque, como Kerry
disse em Bruxelas ontem,
Há mais de
50 países engajados, através da OTAN, em tentar ajudar o Afeganistão. E esses
países têm orçamentos cíclicos. Têm exigências de planejamento. Têm exigências
de equipamentos. Têm exigências de deslocamento. E essas coisas, para serem bem
feitas, têm de ser planejadas.
Fica assim bem claro que o governo Obama não se vê obrigado a entrar em
modo de “opção zero” nas próximas semanas; pode também derrubar Karzai.
No verão de 2014, espera-se, a eleição presidencial (marcada para 5/4/2014)
já terá acontecido; e Karzai já terá sido encaminhado à lata de lixo da
história: esse parece ser o Plano B de Washington.
Buscachi ou Buzkashi, o jogo |
Com isso,
as próximas eleições de abril viram algo como um Buscachi, o
jogo nacional do Afeganistão, no qual jogadores montados a cavalo disputam e
lançam um objeto – quase sempre uma carcaça de bode sem cabeça – contra uma
meta demarcada. O Buscachi tradicional é jogo sem limite de tempo. Tudo depende
agora de o quanto a equipe de Obama saberá jogar duro para instalar suas nove
bases militares no Hindu Kush – e salvar a nação afegã dela mesma.
[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço
Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri
Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões
do Irã, Afeganistão e Paquistão
e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The Hindu,Asia
Times Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso
escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.
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