terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A Doença da Ucrânia...e a Cura da Europa

24/2/ 2014, [*] Eric Draitser  Counterpunch
Traduzido por João Aroldo


Manifestantes do "Pravy Sektor" (Setor Direita) enfrentam policiais com barricadas móveis (20/2/2014)
A situação na Ucrânia está evoluindo a cada hora. Ultranacionalistas de direita e seus colaboradores "liberais" tomaram o controle da Rada (Parlamento ucraniano) e depuseram o presidente democraticamente eleito, embora totalmente corrupto e incompetente, Yanukovich.

A ex-primeira-ministra e condenada criminalmente, Yulia Timoshenko, foi libertada, e agora está a fazer causa comum com o Setor da Direita, Svoboda, e os outros elementos fascistas, enquanto os líderes nominais da oposição, como Arseny Yatsenyuk e Vitali Klitschko, começam a ir para o segundo plano.

Em Moscou, o presidente russo, Vladimir Putin, sem dúvida, observa com ansiedade. Em Washington, Victoria Nuland e a administração Obama se alegram. No entanto, talvez o desenvolvimento mais importante esteja prestes a surgir na Europa, enquanto as forças do capital financeiro ocidental se preparam para receber a Ucrânia no rebanho. Eles virão com os presentes neoliberais de sempre: austeridade e “liberalização econômica”.

Destroços da Praça Maidan em 20/2/2014
(clique na imagem para aumentar)
Com a derrubada do governo Yanukovitch, os 15 bilhões de dólares em assistência financeira que a Rússia prometeu à Ucrânia estão em dúvida. De acordo com a agência de classificação Moody's:

A Ucrânia vai exigir 24 bilhões de dólares para cobrir um déficit orçamental, o pagamento da dívida, contas de gás natural e apoio a pensões apenas em 2014.

Sem continuidade da compra de títulos por Moscou e outras formas de ajuda financeira, e com as forças pró-UE assumindo o controle da política econômica e externa do país, o resultado não é difícil de prever: um pacote de resgate da Europa com todas as condições de austeridade habituais.

Em troca de “ajuda” europeia, a Ucrânia será forçada a aceitar a redução dos salários, cortes significativos no setor público e nos serviços sociais, além de um aumento dos impostos sobre a classe trabalhadora e corte de pensões. Além disso, o país será obrigado a aderir a um programa de liberalização que permitirá à Europa despejar mercadorias no mercado ucraniano, a desregulamentação e a maior abertura do setor financeiro do país à especulação e à privatização predatória.

Não são necessários poderes psíquicos para prever esses acontecimentos. Basta olhar para a onda de austeridade nos países europeus, como Grécia e Chipre. Além disso, os países do Leste Europeu, com as condições econômicas e históricas semelhantes à Ucrânia - a Letônia e a Eslovênia especificamente - fornecem um roteiro para o que a Ucrânia deve esperar.

Yulia Timoshenko
O modelo de "sucesso”

Quando a “liderança” pró-UE da Ucrânia sob Timoshenko & Cia. (e a direita fascista) começar a olhar para futuro, eles imediatamente vão olhar para a Europa para resolver os problemas econômicos mais urgentes. O povo ucraniano no entanto faria bem em examinar o precedente da Letônia para entender o que os aguarda. Como os renomados economistas Michael Hudson e Jeffrey Sommers escreveram em 2012:

O que permitiu à Letônia sobreviver à crise foram os resgates da UE e do FMI... Elites à parte, muitos emigraram... Demógrafos estimam que 200.000 partiram na última década - cerca de 10% da população ... A Letônia experimentou os efeitos da austeridade e do neoliberalismo. As taxas de natalidade caíram durante a crise - como é o caso em quase toda parte, são impostos programas de austeridade. Ela continua tendo uma das maiores taxas da Europa de suicídio e de mortes nas estradas causadas por dirigir embriagado. O crime violento é alto, sem dúvida, por causa do desemprego e cortes orçamentários prolongados da polícia. Além disso, há a fuga de cérebros em conjunto com a emigração de trabalhadores.

Manifestantes eslovenos contra "austeridade" em Liubliana (20/8/2013)
O mito da prosperidade a acompanhar a integração e resgates da UE é apenas isso, um mito. A realidade é a dor e o sofrimento em uma escala muito maior do que a pobreza e o desemprego que a Ucrânia já experimentou, especialmente na parte ocidental do país. O mais educados, os mais preparados para assumir a liderança, vão fugir em massa. Os líderes que permanecerem vão fazê-lo enchendo seus bolsos e insinuando-se aos financistas europeus e norte-americanos que migram para a Ucrânia como abutres em cima de carniça. Em suma, a corrupção e a má administração do governo Yanukovitch vão parecer uma memória agradável.

A “liberalização” que a Europa demanda criará enormes lucros para os especuladores, mas muito poucos empregos para as pessoas que trabalham. A melhor terra será vendida às empresas estrangeiras e grileiros, enquanto os recursos, incluindo o setor agrícola altamente cobiçado, serão tomados e vendidos no mercado mundial deixando, tanto os agricultores como os moradores das cidades, em pobreza extrema, os seus filhos irão para a cama com fome. Este será o “sucesso” da Ucrânia. É assustador pensar que como seria o fracasso

Na Eslovênia, outro país do Leste Europeu que tem experimentado o “sucesso” que a Europa deseja, os ditames econômicos de Bruxelas têm devastado as pessoas que trabalham no país e suas instituições. A Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou um relatório de 2013, em que se recomenda que, como primeiro passo, a Eslovênia aja para “ajudar o setor bancário a ficar de pé outra vez”, acrescentando que “são necessárias medidas adicionais e radicais o mais rápido possível”.

Protestos em Liublana (Eslovênia) contra a privatização dos bancos públicos (20/6/2013)
Além disso, a OCDE recomendou a privatização total dos bancos da Eslovênia e outras empresas importantes, apesar de prever uma contração maior que 2% da economia. Em termos leigos, a Europa recomenda que a Eslovênia e seu povo se sacrifiquem para as forças do capital financeiro internacional, nada menos. Esse é o custo da “integração” europeia.

A Ucrânia está passando por uma transformação da pior espécie. Suas instituições políticas foram pisoteadas por uma coleção heterogênea de liberais delirantes, políticos espertos em ternos extravagantes e extremistas nazistas. O tecido social está se rasgando, com cada região em busca de uma solução local para os problemas do que costumava ser sua nação. E, no meio de tudo isso, o espectro de financistas em busca de lucros com cifrões nos olhos é tudo o que o povo ucraniano pode esperar."

[*] Eric Draitser é analista independente de Geopolítica com sede em Nova Yorque e fundador do sítio Stop Imperialism. É colaborador regular de Russia Today, Counterpunch, Research on Globalization, Press TV,New Eastern Outlook e muitos outros meios de comunicação. Produz também podcasts; disponíveis no iTunes e Stop Imperialism, bem comoThe Reality Principle, disponível exclusivamente no sítio BoilingFrogsPost.com.
Visite StopImperialism.com e acesse todas as suas postagens.
Recebe e-mail em: ericdraitser@gmail.com.

Um comentário:

  1. NOTA MUITO ÚTIL, de Tlaxcala, Rede Internacional de Tradutores:

    A Organização dos Nacionalistas Ucranianos [orig.Organization of Ukrainian Nationalists (OUN)], organização fascista criada em 1929 na Ucrânia do Oeste (então sob governo polonês), dividiu-se em duas em 1940: a OUN-M mais moderada, com Andriy Melnik; e a OUN-B mais radical, com Stepan Bandera. A OUN-B declarou uma Ucrânia independente, em junho de 1941, como estado-satélite da Alemanha Nazista. Todos os grupos direitistas na Ucrânia de hoje apresentam-se como herdeiros das tradições políticas da OUN, inclusive o Partido Svoboda, a Assembleia Nacional Ucraniana, o Congresso dos Nacionalistas Ucranianos e o Setor Direita (Pravyi Sector).

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