domingo, 17 de fevereiro de 2013

O Equador tem boas razões para amar Rafael Correa


Apesar de o William Waack achar que não e não e não...

15/2/2013, Mark Weisbrot, Information Clearing House
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Mark Weisbrot
Rafael Correa está bem à frente de seu mais próximo concorrente às eleições presidenciais de domingo no Equador, e espera-se que se reeleja sem dificuldades para mais quatro anos de mandato presidencial. Não é difícil entender por quê.

O desemprego caiu para 4,1% no final do ano passado – o índice mais baixo de desemprego dos últimos 25 anos. A pobreza diminuiu em mais de ¼, 27%, desde 2006. O investimento público em educação mais que dobrou, em termos reais, ajustados pela inflação. O investimento em saúde pública não parou de aumentar, com acesso expandido a serviços médicos; e outros investimentos sociais também aumentaram muito, inclusive com grande ampliação no crédito para moradia subsidiado pelo Estado.

Se alguém pensou em mudanças não sustentáveis, errou. O serviço da dívida pública custa ao Tesouro do Equador menos de 1% do PIB, muito pouco. E a razão dívida pública/PIB não passa de modestos 25%. A revista The Economist, jamais simpática aos governos de esquerda que hoje governam amplíssima maioria da população da América Latina, atribuiu o sucesso de Correa a “uma mistura de sorte, oportunismo e habilidade”. Mas verdade é que a habilidade – de fato, a competência – sim, fez toda a diferença.

Correa pode ter tido alguma sorte, mas a sorte não decidiu coisa alguma. Assumiu a presidência em janeiro de 2007 e logo no ano seguinte o Equador foi um dos países mais duramente atingidos, no hemisfério, pela crise financeira internacional e a recessão mundial. Aconteceu assim, porque o país dependia muito do dinheiro mandado do exterior por emigrados (por ex., de trabalhadores nos EUA e na Espanha); e das exportações de petróleo, que constituíam, naquele momento, 62% dos ganhos de exportação e 34% da renda do Estado. Os preços do petróleo despencaram quase 80% em 2008 e o dinheiro enviado do exterior, também despencou. O efeito combinado desses dois fatores sobre a economia do Equador foi comparável ao colapso da bolha imobiliária nos EUA, fator decisivo que levou à Grande Recessão.


O Equador ainda teve a má sorte extra de não ter moeda própria (desde 2000, o pais adotou o dólar norte-americano) – o que implica que não pôde usar a taxa de câmbio, nem o tipo de política monetária que o Federal Reserve dos EUA usou para enfrentar a recessão. Apesar disso, o Equador atravessou a tempestade com recessão leve que durou três trimestres; um ano depois estava de volta aos níveis de antes da recessão e a caminho de realizar os feitos que converteram Correa em um dos presidentes mais populares do hemisfério.

Como foi possível? O fator mais importante talvez tenha sido um vasto estímulo fiscal em 2009, cerca de 5% do PIB (ah, se, pelo menos, tivéssemos feito coisa semelhante cá no EUA!) Grande parte disso foi para a construção civil, com o governo ampliando o crédito para moradia em cerca de $599 milhões em 2009 e mantendo o crédito até 2011.

Mas o governo teve também de reformar e regular o sistema financeiro. Fez-se no Equador o que bem se pode definir como a mais ampla reforma do sistema financeiro de todos os países do mundo, no século 21. O governo assumiu pleno controle do Banco Central e obrigou-o a repatriar cerca de $2 bilhões de dólares em reservas depositadas em bancos do exterior. Esse dinheiro foi usado pelos bancos públicos para fazer empréstimos para reforma da infraestrutura, construção de moradias, agricultura e outros investimentos domésticos.

O Equador cobra impostos sobre dinheiro que deixe o país e exige que os bancos mantenham no país 60% dos ativos líquidos. As taxas de juro real baixaram, e os impostos cobrados aos bancos subiram. O governo renegociou acordos com empresas estrangeiras de petróleo quando os preços subiram. A renda do governo passou, de 27% do PIB em 2006, para mais de 40% no ano passado. O governo Correa aumentou também o financiamento do ramo “popular e de solidariedade” do setor financeiro – cooperativas, uniões de crédito e outras organizações populares. Os empréstimos para cooperativados triplicaram em termos reais, entre 2007 e 2012.

O resultado final dessa e de outras reformas foi redirecionar o setor financeiro no rumo de mais bem servir ao interesse público, em vez de só servir bem aos interesses privados (como se vê nos EUA). Para tanto, o governo separou setor financeiro para um lado, imprensa-empresa para outro (antes da eleição de Correa, os bancos equatorianos eram proprietários das principais redes de empresa-imprensa) – e introduziu reformas antitrustes.

Claro: a sabedoria convencional reza que essa prática “inimiga do business”, de renegociar contratos de petróleo, ampliar o tamanho e a qualidade da autoridade regulatória do Estado, aumentar impostos e criar dificuldades para a movimentação do capital seria receita garantida para o desastre econômico. E o Equador também “deu calote” em 1/3 de sua dívida externa, depois que uma comissão internacional concluiu que aquela porção da dívida havia sido contratada em contratos ilegais. E a “independência” do Banco Central, que foi revogada no Equador de Correa, também é considerada sacrossanta por muitos economistas contemporâneos. Mas Correa, que tem um PhD em Economia, sabia bem o momento de, simplesmente, ignorar os conselhos da maioria de seus colegas de profissão.

Assange e a bandeira do Equador
Correa sofreu duro ataque pelos veículos da imprensa-empresa por não dar ouvidos à sabedoria convencional e, sobretudo – no que tenha a ver com a imprensa-empresa especializada em finanças – quando seu plano deu certo. Mas o pior ataque veio quando o Equador ofereceu asilo político ao jornalista Julian Assange, de WikiLeaks. Pois também aqui, como na economia política e na reforma financeira, Correa acertou. Era óbvio, sobretudo depois que o governo britânico ameaçou invadir a Embaixada do Equador em Londres – ameaça absolutamente sem precedentes – que o caso Assange configurava perseguição política.

É raro, mas é estimulante e enche-nos de renovadas esperanças, ver um Estado e um governo democrático que se opõem tão firmemente a forças tão poderosas – os EUA e seus aliados europeus e à imprensa-empresa global – na defesa de um princípio moral e democrático.

A coragem e a tenacidade de Rafael Correa prestaram também importante serviço ao seu país. Por isso será reeleito amanhã, para mais quatro anos de governo.


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