Apesar de o William Waack achar
que não e não e não...
15/2/2013, Mark Weisbrot, Information Clearing
House
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Mark Weisbrot |
O
desemprego caiu para 4,1% no final do ano passado – o índice mais baixo de
desemprego dos últimos 25 anos. A pobreza diminuiu em mais de ¼, 27%, desde
2006. O investimento público em educação mais que dobrou, em termos reais,
ajustados pela inflação. O investimento em saúde pública não parou de aumentar,
com acesso expandido a serviços médicos; e outros investimentos sociais também
aumentaram muito, inclusive com grande ampliação no crédito para moradia
subsidiado pelo Estado.
Se
alguém pensou em mudanças não sustentáveis, errou. O serviço da dívida pública
custa ao Tesouro do Equador menos de 1% do PIB, muito pouco. E a razão dívida
pública/PIB não passa de modestos 25%. A revista The Economist, jamais
simpática aos governos de esquerda que hoje governam amplíssima maioria da
população da América Latina, atribuiu o sucesso de Correa a “uma mistura de
sorte, oportunismo e habilidade”. Mas verdade é que a habilidade – de fato, a
competência – sim, fez toda a diferença.
Correa
pode ter tido alguma sorte, mas a sorte não decidiu coisa alguma. Assumiu a
presidência em janeiro de 2007 e logo no ano seguinte o Equador foi um dos
países mais duramente atingidos, no hemisfério, pela crise financeira
internacional e a recessão mundial. Aconteceu assim, porque o país dependia
muito do dinheiro mandado do exterior por emigrados (por ex., de trabalhadores
nos EUA e na Espanha); e das exportações de petróleo, que constituíam, naquele
momento, 62% dos ganhos de exportação e 34% da renda do Estado. Os preços do
petróleo despencaram quase 80% em 2008 e o dinheiro enviado do exterior, também
despencou. O efeito combinado desses dois fatores sobre a economia do Equador
foi comparável ao colapso da bolha imobiliária nos EUA, fator decisivo que levou
à Grande Recessão.
O Equador ainda teve a má sorte
extra de não ter moeda própria (desde 2000, o pais adotou o dólar
norte-americano) – o que implica que não pôde usar a taxa de câmbio, nem o tipo
de política monetária que o Federal Reserve dos EUA usou para enfrentar a
recessão. Apesar disso, o Equador atravessou a tempestade com recessão
leve que durou três trimestres; um ano
depois estava de volta aos níveis de antes da recessão e a caminho de realizar
os feitos que converteram Correa em um dos presidentes mais populares do
hemisfério.
Como
foi possível? O fator mais importante talvez tenha sido um vasto estímulo fiscal
em 2009, cerca de 5% do PIB (ah, se, pelo menos, tivéssemos feito coisa
semelhante cá no EUA!) Grande parte disso foi para a construção civil, com o
governo ampliando o crédito para moradia em cerca de $599 milhões em 2009 e
mantendo o crédito até 2011.
Mas
o governo teve também de reformar e regular o sistema financeiro. Fez-se no
Equador o que bem se pode definir como a mais ampla reforma do sistema
financeiro de todos os países do mundo, no século 21. O governo assumiu pleno
controle do Banco Central e obrigou-o a repatriar cerca de $2 bilhões de dólares
em reservas depositadas em bancos do exterior. Esse dinheiro foi usado pelos
bancos públicos para fazer empréstimos para reforma da infraestrutura,
construção de moradias, agricultura e outros investimentos domésticos.
O
Equador cobra impostos sobre dinheiro que deixe o país e exige que os bancos
mantenham no país 60% dos ativos líquidos. As taxas de juro real baixaram, e os
impostos cobrados aos bancos subiram. O governo renegociou acordos com empresas
estrangeiras de petróleo quando os preços subiram. A renda do governo passou, de
27% do PIB em 2006, para mais de 40% no ano passado. O governo Correa aumentou
também o financiamento do ramo “popular e de solidariedade” do setor financeiro
– cooperativas, uniões de crédito e outras organizações populares. Os
empréstimos para cooperativados triplicaram em termos reais, entre 2007 e 2012.
O
resultado final dessa e de outras reformas foi redirecionar o setor financeiro
no rumo de mais bem servir ao interesse público, em vez de só servir bem aos
interesses privados (como se vê nos EUA). Para tanto, o governo separou setor
financeiro para um lado, imprensa-empresa para outro (antes da eleição de
Correa, os bancos equatorianos eram proprietários das principais redes de
empresa-imprensa) – e introduziu reformas antitrustes.
Claro:
a sabedoria convencional reza que essa prática “inimiga do business”, de renegociar contratos de
petróleo, ampliar o tamanho e a qualidade da autoridade regulatória do Estado,
aumentar impostos e criar dificuldades para a movimentação do capital seria
receita garantida para o desastre econômico. E o Equador também “deu calote” em
1/3 de sua dívida externa, depois que uma comissão internacional concluiu que
aquela porção da dívida havia sido contratada em contratos ilegais. E a
“independência” do Banco Central, que foi revogada no Equador de Correa, também
é considerada sacrossanta por muitos economistas contemporâneos. Mas Correa, que
tem um PhD em Economia, sabia bem o momento de, simplesmente, ignorar os
conselhos da maioria de seus colegas de profissão.
Assange e a bandeira do Equador |
Correa sofreu duro ataque pelos
veículos da imprensa-empresa por não dar ouvidos à sabedoria convencional e,
sobretudo – no que tenha a ver com a imprensa-empresa especializada em finanças
– quando seu plano deu certo. Mas o pior ataque veio quando o Equador ofereceu
asilo
político ao jornalista Julian Assange, de WikiLeaks. Pois
também aqui, como na economia política e na reforma financeira, Correa
acertou. Era
óbvio, sobretudo depois que o governo britânico ameaçou invadir a Embaixada do
Equador em Londres – ameaça absolutamente sem precedentes
– que o
caso Assange configurava perseguição política.
É
raro, mas é estimulante e enche-nos de renovadas esperanças, ver um Estado e um
governo democrático que se opõem tão firmemente a forças tão poderosas – os EUA
e seus aliados europeus e à imprensa-empresa global – na defesa de um princípio
moral e democrático.
A
coragem e a tenacidade de Rafael Correa prestaram também
importante serviço ao seu país. Por isso será reeleito amanhã, para mais quatro
anos de governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.