7/7/2013,
Poder e Política, Folha de
S.Paulo/UOL ( vídeos)
Entrevista gravada (57’ )
em 3/7/2013 no estúdio da FSP em Brasília.
Enviada
pelo pessoal da Vila Vudu e pela
Entrevistada
Recomendação
do pessoal da Vila Vudu
Abstraiam todas as opiniõezinhas do Fernando Rodrigues -- que são opiniõezinhas
dele e não interessam a ninguém mais que à Folha de São Paulo e ao próprio
Fernando Rodrigues -- e leiam o que diz a Manuela, sempre
claríssima.
Manuela
D’Ávila: Sou
muito jovem, mas já vi três parlamentares relatarem a reforma política. Vi o
[ex-deputado] Ibsen Pinheiro [PMDB-RS], que foi meu colega, o [ex-deputado]
Flávio Dino [PC do B/MA], que foi meu colega, porque já não são mais deputados,
e, agora, o Henrique Fontana [PT/RS]. As três tentativas naufragaram. Nós temos
que ser claros. O Congresso, a Câmara dos Deputados, não consegue chegar a um
consenso, a uma maioria sobre os temas da reforma política
Folha/UOL:
Deputada, a presidente Dilma agiu bem ao propor primeiro uma constituinte e
depois um plebiscito para a reforma política?
Manuela
d'Ávila: Eu
acredito que a presidente agiu bem ao fazer a leitura que a população brasileira
, dentre as diversas críticas que a presidente, nas manifestações populares,
tem. Entre elas, uma forte crítica às instituições colocadas de maneira geral e,
entre essas instituições, as instituições políticas. Como presidente do Brasil,
ela tem a necessidade de traduzir e as instituições políticas precisam ser
reformadas.
Então,
ela agiu de maneira adequada ao propor a reforma política. Escolheu como forma
de reformar a política, sugeriu como forma de reformar a política, um
plebiscito. Então, na minha avaliação, [agiu bem] sim. Ela traduziu a indignação
das ruas como método de reforma política: um plebiscito. E nós o apoiamos.
A
primeira proposta era uma constituinte exclusiva. Era uma boa proposta
também?
Na
minha avaliação, sim. Mas ela foi modulando essa proposta também para fazer
novas consultas. E eu acho isso absolutamente natural. As pessoas reagem de
maneira muito ruim às críticas e às modulações das propostas, como se isso fosse
o fim do mundo. Acho que nós somos um país que ainda reage de maneira muito
nebulosa à mudança de opinião e às modulações. Eu defendi a constituinte
exclusiva, achava que seria uma boa.
O
Congresso vê... Eu sou uma parlamentar muito jovem, embora já tenha sete anos de
mandato de deputada e já vi três parlamentares relatarem a reforma política. Vi
o [ex-deputado] Ibsen Pinheiro [PMDB-RS], que foi meu colega, o [ex-deputado]
Flávio Dino [PC do B/MA], que foi meu colega, porque já não são mais deputados,
e, agora, o Henrique Fontana [PT/RS]. As três tentativas naufragaram. Nós temos
que ser claros. O Congresso, a Câmara dos Deputados, não consegue chegar a um
consenso, a uma maioria sobre os temas da reforma política.
Por
isso, a constituinte era uma ideia válida e por isso o plebiscito pode não só
ouvir a população, mas, também tenhamos a humildade, auxiliar a Câmara a
construir maioria sobre as opiniões. Por isso, na minha avaliação, as sugestões
que a Dilma dá ao Congresso são absolutamente válidas.
Tem
algumas das sugestões que ela fez nos cinco itens que ela enviou aí nessa
mensagem ao Congresso que não agradaria a sra.?
Na
minha avalição, ela faz sugestões mais simbólicas e nós do PC do B defendemos,
por exemplo, voto secreto. Eu acredito que o Congresso pode resolver mais
rapidamente porque já há uma unanimidade no Congresso sobre o fim...
Unanimidade, né? Unanimidade entre aspas. Mas já há, digamos, uma maioria no
Congresso para aprovar muito rapidamente.
E
nós do PC do B achamos que o plebiscito deve girar em torno de duas ou três
questões. Não devemos levar muito as questões às ruas. Devemos levar as questões
centrais do sistema político que são, sobretudo, financiamento e sistema de
voto. Para nós, essas são a questões nevrálgicas que devem ser reformadas. Se o
financiamento deve continuar sendo privado ou não, que é a questão essencial,
não os adereços do tipo do financiamento. E como deve ser o sistema de voto. Ele
deve continuar sendo proporcional ou não, distrital ou não.
E
aí, as bijuterias, digamos, os adereços disso, a Câmara tem condições de
construir. Inclusive porque é comum e nós já temos visto muitas manifestações.
Até me surpreende porque alguns têm a coragem de dizer publicamente isso - achei
que só teriam coragem de dizer nos corredores em baixo tom de voz - que o povo
não tem condições de [se] manifestar sobre temas complexos como a política. Eu
fico surpreendida com a petulância de algumas pessoas ao dizer isso.
Mas
nós precisamos de tempo de propaganda política sobre esses. Propaganda política
no sentido de propaganda esclarecedora sobre essas matérias. Como é o
financiamento público, como será o fim...
A sua
opinião sobre financiamento público é a favor? O seu partido é a favor de
financiamento público exclusivo?
Do
fim do financiamento privado. Eu defendo que os cidadãos possam contribuir.
Então não é público exclusivo. Eu defendo que tu possas contribuir com
candidatos.
Mas não
empresas?
Não
empresas. Por isso o fim do financiamento privado. E também o fim do voto
individual, não é? O novo tipo de sistema político também. Nós precisamos de
tempo para esclarecer a população sobre isso.
Então,
há necessidade de que o plebiscito seja bem construído. Por isso nós defendemos
que sejam poucas as perguntas.
Tem
alguns itens na reforma política sempre debatidos que vão afetar os seu partido
particularmente. Por exemplo, o fim da coligação para eleições proporcionais,
que está, inclusive, mencionado na mensagem da presidente. Qual é a sua opinião
e a do PC do B sobre o fim da coligação para eleições
proporcionais?
Nós
somos contra o fim das coligações e nós achamos que essa não é uma questão
essencial na reforma política.
Por que
é contra?
Porque,
diferentemente do que os grandes partidos alegam, para nós o número dos partidos
não é uma questão essencial na reforma que o sistema político brasileiro precisa
fazer. Nenhuma das crises políticas que o Brasil viveu, Fernando, diferentemente
do que muitas vezes a imprensa ou os grandes partidos alegam, passam pelo número
de partidos. Passam sim pelo tipo de financiamento que a política brasileira
vive.
Veja
bem. A governabilidade brasileira não se dá pelos pequenos partidos. Se dá pelos
grandes. A falta dela. Quem não conseguiu governar pela falta de relação com o
PC do B no Congresso Nacional? A presidente Dilma teve problema de
relacionamento com o PC do B quando? Um partido que se relaciona pela relação
política, pelo projeto de país... não é uma verdade. Os problemas se dão pelas
relações, sobretudo, com os grandes partidos.
Então,
nós achamos que os pequenos partidos, aqueles que são ideológicos, fazem parte e
estão garantidos constitucionalmente quando está escrito na Constituição que
este é um país democrático em que é garantida a livre manifestação do pensar e a
diversidade, a pluralidade, partidária.
Mas o
PC do B é aliado ao governo da presidente Dilma Rousseff, que pertence ao PT, da
presidente. Ela propôs o fim da coligação...
Ela
sugeriu nas perguntas. Como sugeriu o fim do voto [secreto].
Sugeriu.
Nesse caso, o PC do B não teve como influir para deixar isso de
fora?
Nós
sugerimos à presidente que o plebiscito tenha poucas perguntas. Mas nós não
somos obrigados a concordar com ela em tudo e nem ela conosco. Isso faz parte da
democracia.
A
coligação na proporcional para eleições para deputados, ou vereador, ou deputado
estadual permite, por exemplo, que partidos de esquerda estejam coligados com
partidos de direita ou de centro ou, se desejar esse tipo de designação,
partidos liberais com partidos conservadores. Aí o eleitor às vezes dá um voto
para um candidato a deputado que é liberal ou de esquerda, como seja, mas ele
está coligado também á outros candidatos que são conservadores. Às vezes, o voto
que ele dá para o liberal vai para o conservador e vice-versa. Isso não é ruim e
não deixa a política mais difícil de ser compreendida pelo eleitor?
Se
essa máxima fosse uma verdade, os grandes partidos deveriam propor também o fim
das coligações na eleição majoritária. Porque ao acabar na eleição proporcional,
não está acabada a coligação na eleição majoritária. E não está...
Mas é
diferente. Veja bem que na eleição majoritária...
Desculpa.
Não está proibida a coligação de um partido conservador com um partido não
conservador na eleição majoritária.
Mas
veja que é diferente. Deixe só eu fazer uma observação. Quando a gente elege um
presidente, um governador e um prefeito, ele é o presidente, o governador e o
prefeito de todos daquela circunscrição. Então, ele vai representar os
conservadores e os liberais. E digamos que, em algum momento, uma pessoa consiga
centralizar todos os apoios dos liberais e dos conservadores porque é um cargo
apenas. Quando se trata da Câmara dos Deputados, é natural que os conservadores
queiram eleger conservadores e os liberais eleger os liberais. Mas, no sistema
atual do Brasil, o liberal vota no liberal, elege o conservador e vice-versa. É
isso o que eu estou dizendo.
Sim.
Porque o nosso sistema tem distorções. Por isso que nós precisamos discutir todo
o sistema de eleição. Se nós discutirmos que nós teríamos lista, as coligações
podem estar dentro de frentes políticas. E, aí, não haverá mais essa contradição
que tu colocas.
No
Uruguai, no sistema uruguaio, de listas partidárias, as coligações ou o que nós
chamamos de coligações se dão dentro de frentes partidárias. E, aí, as frentes
partidárias são frentes dentro de uma aliança mais ideológica, para usar um
termo um pouco forçado porque não estão dentro de uma ideologia, mas dentro de
um campo político.
Então,
nós estamos discutindo uma tese dentro de um sistema político brasileiro atual
numa reforma política que não aconteceu. Por isso que há o risco de nós
debatermos as coligações brasileiras atuais, que eu também acho que podem
incorrer excessos dentro do que tu te referes, dentro do sistema brasileiro
atual, para um sistema que nós estamos planejando num futuro. Nós estamos
especulando uma hipótese para um Brasil do futuro dentro de um Brasil do
presente.
Então,
nós somos contra especular essa tese para o sistema político futuro sem sabermos
quais serão as hipóteses aprovadas, Fernando. Porque nós estamos discutindo o
quê? Listas? Nós vamos acabar com coligações para listas?
Na sua
opinião, o sistema de voto em lista fechada, como defende, por exemplo, o PT, é
bom ou ruim?
Ele
é melhor que o atual. Ele é melhor que o atual. Por quê? Porque eu defendo que
nós votemos em ideias e não mais em pessoas. Aí nós podemos ter as federações
partidárias por quatro anos. Alianças por quatro anos. Aí, o termo coligação
continua a ser defendido por nós num outro sentido, não no atual.
Qual
é, na sua avaliação, o grau de influência que tem o sistema político atual na
insatisfação das pessoas que foram às ruas protestar e que faz com que
pouquíssimos brasileiros hoje acordem de manhã e digam assim: "Puxa, estou
pensando em me filiar a um partido político hoje." Ninguém mais pensa isso
quase. São poucas as pessoas que estão querendo se filiar aos partidos e
construir os partidos. Essas pessoas da rua, por exemplo, muito poucas. Qual é a
razão disso estar acontecendo? Eu sei que tem muitas teorias, a gente estava até
comentando um pouco antes, mas qual é a sua teoria e o grau de influência que o
atual sistema político tem nisso tudo? Na indignação das
pessoas.
Eu
acho, como eu te disse antes, que a insatisfação das pessoas que estão nas ruas
se dá por diversas causas. É uma insatisfação difusa. As pessoas têm centenas de
motivos para estar nas ruas, mas o sistema político brasileiro é uma das causas.
O nosso sistema faz com que eu, enquanto parlamentar, por diversas vezes tenha
pensado se seguiria concorrendo ou não. E o parlamentar que diga que não refez
essa reflexão provavelmente não esteja sendo honesto consigo mesmo.
Então,
eu acredito que os jovens não façam a reflexão sobre a filiação na maior parte
dos partidos porque os partidos são estruturas que não conseguem se adaptar a
esse tempo novo, dessas manifestações diferentes de uma realidade que se
transformou muito mais rapidamente do que os partido conseguiram se transformar.
Os
partidos ficaram obsoletos diante dessa nova [realidade]?
Claro.
E a maior prova disso, eu não preciso fazer tese sobre isso: Há 15 anos, o
Congresso tentando reformar a política e não consegue. Quer dizer, a prova disso
é que o próprio Congresso tenta mudar o sistema político. Se o Congresso se
reúne para fazer a reforma política é porque ele sabe que a política está
superada. Uma coisa é se ele não consegue.
Tem
algum aspecto positivo no atual modelo político brasileiro?
Ele
é democrático.
Mas sem
ser o conceito. Algum detalhe funcional dele que seja positivo e não deva ser
jogado fora?
Acho
que nós temos várias coisas que as nossas cidades foram complementando que são
positivas. A minha cidade mesmo [Porto Alegre] tem há quase 30 anos o orçamento
participativo. Como é que tu vai jogar fora isso? Então tem experiências que são
muito positivas nas cidades, não é? E que o povo também foi aprendendo. É isso
que faz com que as pessoas estejam nas ruas, Fernando. A democracia brasileira é
muito jovem. A gente não pode jogar tudo o que nós construímos desde a
redemocratização fora.
Essas
pessoas estão na rua... Alguém me disse isso. Todo mundo está falando muito, não
é? Acho que provavelmente alguém no táxi. O taxista falando. Só o fato de as
pessoas estarem nas ruas sem medo... Eu tenho 30 anos. 31 anos. E provavelmente
há 15 [anos], quando eu comecei a participar de manifestações, a minha mãe não
tivesse deixado eu voltar para o protesto depois da repressão policial dos
primeiros. Então, o fato dos protestos terem crescido após a repressão policial
é a prova de que a democracia brasileira é muito sólida.
Então,
só de a gente ter conseguido protestos crescentes após a repressão policial, é a
prova de que o nosso país tem uma democracia sólida. De que essas pessoas,
dentro delas, independente de qualquer coisa que exista, elas acreditam no nosso
país, na nossa democracia.
Essa
indiferenciação que os manifestantes em geral fazem sobre os políticos, contra
todos, contra tudo, tem origem no quê? Por que eles olham nos políticos, que são
diferentes - tem bons, tem ruins - e acham que todos são ruins?
Porque
é muito difícil diferenciar mesmo. Eu acho que é natural que o sistema político,
que é tão complexo de ser compreendido no nosso país... É difícil eu depurar
esse sistema para quem está fora dele, para quem tem dificuldade de acompanhar.
E também porque a participação dos cidadãos - eu tentei falar isso para aqueles
que conversavam comigo - é muito baixa.
Então,
também é a hora dos políticos que têm uma participação diferenciada conversarem
com essas pessoas e dizerem para elas alguns pontos importantes. As pessoas
perguntavam: "O Congresso agora está votando mais sintonizado com a população?"
Pois então, reflitam sobre o papel que vocês têm em acompanhar o parlamentar de
vocês.
Eu
gosto muito de uma frase que o Rio Grande o Sul, ao menos, se diz: "Quando a
gente aponta um dedo para o outro, os outros ficam para nós." Então, o dedo dos
manifestantes foi apontado para uma parte da política, certo? Os outros também
podem ser apontados para eles para que eles reflitam sobre o papel que eles têm
enquanto cidadãos. Não é?
Então,
se essa cidadania saiu para as ruas, esses cidadãos fizeram com que o Congresso,
por exemplo, atuasse mais sintonizado com os anseios deles. Se eles forem
cidadãos ou fiscalizarem, ao menos o parlamentar em que eles votaram, todos os
dias, e não só depositarem ou debocharem do voto, como muitos fazem, todos os
dias. "Ah, votei e tanto fez, tanto faz." Muitos fazem isso. A gente sabe disso.
"É um saco a eleição. Vou viajar na eleição. Não estou nem aí para o meu voto."
Muitos fazem isso. Acham feio votar. Acham feio...
Muitos
talvez não se lembram hoje em quem votaram há quatro anos.
Hoje
não. 30 dias depois. Vocês fazem pesquisa sobre isso, não é? E hostilizam o
voto. Então, se a gente não olhar para o dedo que aponta, mas olhar para olhar
para os outros três que ficam apontados para a gente, talvez o Congresso, apenas
para dar um exemplo das instituições hostilizadas, trabalhe mais
permanentemente. A pari passu com os anseios da sociedade.
Então,
uma recomendação para os manifestantes seria tentar observar em que eles votaram
e cobrar mais desses representantes que eles elegeram? É isso?
Eu
acho que sim. Eu acho que ser cidadão não é... A manifestação, para mim, que vim
do movimento social, é um exercício de cidadania. É uma das formas de ser
cidadão. Eu acredito na participação a partir do voto também. E acho que... Como
é que a gente não perde força de manifestação? Quer dizer, não dá para quem
estar indo na rua ficar na rua o dia inteiro. Não existe estado de vigília, não
é? Rua é uma forma de manifestar.
*Essa
indiferenciação... Eu até ia te perguntar. No caso da sua disputa pela
prefeitura de Porto Alegre em 2012, teve uma aliança em torno do seu nome com
partidos que não são ideologicamente afinados ao PC do B historicamente. O PP,
não foi isso? Apoiou? *
Não.
Não me apoiou não.
Mas a
[senadora] Ana Amélia apoiou.
A
Ana Amélia me apoiou.
Ana
Amélia, que é do PP, apoiou de maneira informal. Estava na sua coligação também
o PSC ou não?
Estava.
PSC que
é um partido cristão, de valores mais conservadores, tradicionais. Este tipo de
aliança que os políticos têm que fazer por conta do sistema atual contribui para
que as pessoas sintam essa indiferenciação geral?
Eu
acho que quando os candidatos flexibilizam o que eles acreditam, sim. Então, eu
vi muitas vezes, ao longo da minha vida, candidatos com uma plataforma num
sentido negarem publicamente aquilo que eles acreditam. Eu jamais fiz isso.
Então,
eu jamais me pronunciei... Por exemplo, o PSC me apoiou e eu continuei sendo uma
candidata que defendeu todas as bandeiras relacionadas aos direitos humanos.
Então, mesmo naquele episódio, o [deputado] Marco Feliciano [PSC-SP] gravou um
longo e extenso vídeo dizendo que negava o partido dele. Antes de ele ser quem
ele é, não é? De se tornar alguém conhecido nacionalmente. Dizendo que tinha
vergonha do partido dele em função do apoio a mim.
Então,
eu acho que o que interessa são as bandeiras que nós defendemos e a não flexão
delas. Por quê? Porque a candidatura a prefeito, como tu dissestes, é uma
candidatura que representa uma plataforma. Se os partidos localmente topam a
defesa daquela plataforma para a cidade, enfim, eles aderiram a um conceito de
administração que nós fixamos para Porto Alegre. Não houve nenhuma
flexibilização dela.
No caso
do PSC, o Partido Social Cristão, é um partido que defende muitos valores mais
tradicionais. Família... É contra a liberalização do aborto, contra a
liberalização das drogas. É um partido mais conversador, de corte conservador.
Esse partido apoiou também a presidente da República em 2010, na campanha dela
vitoriosa. A presidente Dilma Rousseff. Durante a campanha de 2010, houve uma
discussão grande sobre esses temas no Brasil. E a presidente Dilma, na época
candidata, acabou tendo um discurso moderado em relação a esses temas. Na sua
opinião, ela acabou ficando refém desse tipo de aliança muito
ampla?
Eu
conheço bem a presidente Dilma e acho que ela é alguém incapaz de se tornar
refém de qualquer pauta. Ela é uma mulher muito corajosa para ser tratada como
refém de qualquer pauta. O que eu acho é que ela é presidente de um país que
ainda apresenta muitas contradições sobre esses temas e é natural que ela medeie
não o seu discurso, mas que ela medeie as posições do país. Ela tem a obrigação
de não apresentar a sua posição individual, mas de mediar a posição do país até
o país amadurecer esses temas.
Mas o
fato de ela ter adotado um discurso mais moderado e ter se recusado a repetir o
que tinha dito no passado a respeito de ser a favor de a mulher ter o poder de
decidir se vai fazer ou não o aborto, como ela tinha dito, na campanha ela
deixou de fazer isso. Significa o quê?
Eu
acho que nós temos ainda muitas dificuldades no Brasil, sobretudo no Congresso
Nacional, de pautar esses temas. E isso faz com que uma mulher, enquanto
candidata a presidente da República, sempre seja colocada numa situação mais
constrangedora. Sobretudo quando o então candidato José Serra [PSDB] fez uma
campanha absolutamente conservadora e a levou a ter posições mais tímidas nesse
sentido.
Nós
mulheres, Fernando, sempre somos colocadas numa posição mais defensiva quando
surge a pauta do aborto porque nós somos um país muito conservador nesse tema.
Nunca essas perguntas são feitas de maneira ofensiva aos candidatos homens,
entende?
Eu
recentemente dei uma entrevista para uma revista feminina em que essa pauta era
colocada. Os candidatos homens, na pauta do aborto, nunca são tratados da mesma
maneira que as candidatas mulheres porque... E aí me perguntam: "Por que isso?"
Porque eles não têm útero.
Não em
todos os lugares, não é?
Não
em todos os lugares. Mas, no Brasil, essa pauta sempre vem com uma força
gigantesca quando as candidatas mulheres surgem com força. E aí me perguntavam
por que, por que, por que. E aí eu fiquei vendo tudo que é lado e a única
resposta que me veio foi uma resposta engraçada. Porque eles não têm útero.
Porque, invariavelmente, eles não podem ser submetidos ao aborto.
Então,
sempre surge como uma força maior quando as candidatas mulheres têm [chances],
surgem e podem vencer as eleições. Então, o que eu acho é que nós temos que, no
Brasil, fazer a reflexão sobre o número de mulheres que são submetidas a essa
prática, se nós queremos que essas mulheres continuem morrendo ilegalmente e se
nós vamos continuar permitindo que o Congresso Nacional não debata os
procedimentos... Agora mesmo, ontem [2.jun.2013] nós tivemos o arquivamento do
projeto da "cura gay", só para tu ver como o Congresso é conservador, que é um
projeto que tratava dos tratamentos psiquiátricos para os homossexuais. Nós
temos um outro projeto que oferece bolsa para as mulheres que foram vítimas de
estupro não fazerem aborto, que proíbe o aborto para mulheres vítimas de
estupro, mas que também proíbe outros procedimentos que a ciência formulou. Que
proíbe que as mulheres engravidem por métodos que a ciência avançou com todas as
técnicas com embriões de laboratório. E que o Brasil nem sequer discute.
A sua
posição é a favor da liberalização da lei que regula o aborto no
país?
Eu
sou a favor que o Brasil vá avançando gradativamente nessa lei. E sou a favor
que o Brasil, por exemplo, hoje estabeleça o aborto dos fetos anencéfalos para
as mulheres.
Agora,
não é curioso que num país como o Brasil, que tem um governo de um partido que
tem origem na esquerda, que tem uma aliança forte do centro para a esquerda e
cujos dirigentes, pelo menos a maioria desses partidos de esquerda, sejam a
favor dessa posição que a sra. disse, mas que, depois de 10 anos no poder, não
tenha conseguido vencer e impor essa pauta ao Congresso?
Se
não é curioso? Não.
Não?
Por quê?
Não
acho curioso porque nós somos um país que tem muitas contradições e essa é uma
delas. A nossa política ainda é predominantemente machista e conservadora nessas
pautas.
Ou
seja, vai demorar?
Vai
demorar bastante.
Qual
que é a tua avaliação? Quanto tempo?
Nós
ontem votamos o "cura gay" no Congresso. Como é que eu posso achar curioso?
Mas o
que você acha? Você acha que é coisa de 10 anos, 20 anos? Qual que é a tua
expectativa para esse tipo de agenda avançar no país?
Eu
espero ser surpreendida como eu fui e muitos foram por manifestações gigantescas
e lindíssimas nas ruas do país. Então, eu espero que a minha bola de cristal
esteja errada.
A tua
bola de cristal diz o que?
A
minha bola de cristal diz que nós levaríamos... Acho que pelo menos 5, 7 anos.
Na próxima década isso pode acontecer, mas não é uma coisa que pode acontecer...
Não é
uma coisa para amanhã?
Não
é uma coisa para amanhã.
Para
essa legislatura, muito difícil?
Não.
Não é. E é muito triste porque embora eu, como todas as mulheres, o sonho da
minha vida é ter um filho. Então, eu não faria um aborto. Eu acho que nenhuma
mulher faria um aborto. Mas nós temos mulheres pobres que morrem fazendo abortos
clandestinos. As mulheres ricas não, não é? Porque conseguem fazer em outros
países, ou conseguem fazer pagando um preço caro pelo aborto ilegal. Mas nós
temos muitas mulheres que fazem e morrem ainda no nosso país.
Tem um
outro debate também que é polêmico, que é a legalização das drogas ou de parte
das drogas, pelo menos. Do consumo e uso de drogas. Esse também cai no mesmo
escaninho, que vai demorar porque o país é conservador para avançar no
Congresso?
Para
mim, são questões bem diferentes porque um tema lida com a questão legalização
de fetos anencéfalos, por exemplo, que era o que a gente estava discutindo, lida
com a questão da saúde de mulheres, sobretudo mulheres pobres, que já estão
morrendo. A questão da legalização de um tipo de droga lida com um outro de tipo
valor, com outro tipo de sociedade. Embora as duas coisas aconteçam em
sociedades mais modernas e nos mesmos tipos de países, não é?
Mas
eu acho que o Brasil não está preparado para nenhum tipo dos dois debates ainda
porque nós somos conservadores para as duas pautas.
No caso
da liberalização das drogas, ou descriminalização do uso das
drogas...
São
temas diferentes.
Exato.
A descriminalização do uso de drogas total. Qual é a sua
opinião?
Primeiro
que são duas coisas diferentes [a questão do aborto e a questão das drogas]. Eu
defendo que o usuário seja sempre tratado como um dependente químico e,
portanto, com medidas que restabeleçam a sua saúde e não com medidas que o
coloquem no sistema penitenciário. O sistema penitenciário, para mim, deve ser
um sistema que prenda aqueles que cometam delitos e não aqueles que precisam ter
a sua saúde restabelecida. Então, o primeiro é esse.
Por
isso que as drogas serem tratadas de maneira não criminosa, para deixar claro
que é diferente de serem livres, não criminosas, é importante e grande parte
delas para o usuário já é tratada na legislação atual. Algumas tiveram
retrocessos na legislação aprovada recentemente na Câmara dos Deputados no
projeto do deputado Osmar Terra [PMDB/RS].
Hoje,
para mim, o Brasil não tem condições de liberar as drogas. Hoje. O Brasil hoje
não tem condições de liberar as drogas.
Por
quê?
Porque
somos um país com muitas fronteiras com o narcotráfico. Então, nós temos que
resolver algumas questões relacionadas a isso para podermos dar passos num outro
sentido.
Entendi.
Primeiro resolver um problema policial, vamos dizer assim, nas fronteiras, de
segurança...
Hoje.
Eu digo isso hoje.
Entendi.
Eu
não digo no Brasil ideal. No meu Brasil ideal seria outra
realidade.
Mas uma
vez resolvido esse problema nas fronteiras, essa seria uma
possibilidade?
Essa
seria uma possibilidade. Nós não somos nenhum país europeu.
Definitivamente
não.
Para
esse assunto também.
A
insatisfação dos manifestantes nas ruas, deixe eu voltar um pouco a isso, tem
sido também contra certas atitudes que os políticos têm quando ocupam cargos
públicos. O presidente da Câmara dos Deputados [Henrique Eduardo Alves - PMDB/RN]
utilizou um avião da FAB [Força Aérea Brasileira], que ele tem direito de usar
para se deslocar quando necessário pelo cargo que ocupa, para ir até Natal
buscá-lo junto com vários integrantes da sua família e ir até o Rio de Janeiro
na última sexta-feira. Passou três dias lá para assistir o jogo da seleção
brasileira. Todos os parentes também. E depois retornou, pouco depois das 11h da
noite, para Natal, levando ele, Henrique Alves, e sua família de volta a Natal.
É correto isso?
Não.
O que
deve ser feito nesse caso?
Não
sei. Eu vou ouvir os meus outros colegas. Mas acho que é uma atitude incorreta
do presidente [da Câmara] usar o avião. Usar o avião da FAB, como tu disseste, é
um direito dele para as atividades dele enquanto presidente da Câmara dos
Deputados. Então, na minha avaliação, eu não usaria um avião da FAB para nenhuma
atividade que não fosse absolutamente de trabalho.
E,
embora estar num jogo da seleção brasileira possa ser considerado uma atividade
oficial, como a presidenta da República, os presidentes dos poderes
tradicionalmente estejam em jogos da seleção, eu não iria com a minha família à
um deles.
A
história do Brasil tem fartos exemplos semelhantes recentes. E a experiência
geral que a gente tem é que acontece, as pessoas ficam um pouco chateadas, olham
de lado, mas nada acontece. O que tem que acontecer quando ocorre um evento
desses?
Eu
acho que a história das punições tem sido alterada no nosso país no último
período. E nós... A Câmara dos Deputados, recentemente... Inclusive sob a
presidência do Henrique, que, na minha avaliação, tem se esforçado bastante para
dar respostas mais rápidas à sociedade. Eu tenho uma avaliação positiva dele
enquanto presidente da Câmara nesse sentido.
Inclusive,
nós tivemos o exemplo da prisão do deputado Natan [Donadon], que foi uma decisão
muito célere dele enquanto presidente da Câmara, tanto qual seria o rito da
perda do mandato dele ao ser decretada a prisão, como seria instalado o processo
de cassação...
Posso
fazer uma observação sobre isso? O Natan Donadon foi condenado a 13 anos por
peculato e formação de quadrilha em 2010. E ficou recorrendo. A Câmara não abriu
nenhum procedimento contra ele desde 2010. Esperou ele ir para a cadeia para
fazer alguma coisa contra ele.
Mas
eu fiz um comentário, Fernando. E fiz um comentário sobre a presidência do
Henrique...
Mas ele
está na presidência já desde fevereiro.
No
momento em que foi decretada a prisão dele [Natan Donadon], e ele estava
recorrendo aos processos dele porque é um direito dele...
Deputada
Manuela, desde fevereiro ele é presidente da Câmara.
No
momento em que foi decretada a prisão dele, que ele recorreu de todos os
processos dele, então...
Mas a Câmara poderia ao mesmo tempo já ter aberto um procedimento anterior a isso. Ele já estava condenado.
Mas a Câmara poderia ao mesmo tempo já ter aberto um procedimento anterior a isso. Ele já estava condenado.
O
que houve a compreensão dele é que é um rito que será tomado para todos os
deputados e que eu acho que é interessante que a sociedade compreenda é que, ao
terminar todos os trâmites de defesa de qualquer parlamentar... E essa é uma
decisão que valerá como regra. E o que eu acho que é interessante que a gente
compreenda é que isso sempre foi assim na Câmara. E isso eu acho interessante:
as regras... As interpretações da Constituição e do regimento [interno da
Câmara] são válidas para todos os casos. Então, ao acabarem os recursos, ao se
esgotarem os recursos para qualquer deputado, a interpretação é de que não há
mais a imunidade parlamentar. Não vale. E há um deputado preso. Houve
repercussão para isso na minha avaliação.
Então,
o que eu acho... Eu fui educada assim, e acho que é o mais interessante e acho
que todas as pessoas devem analisar os episódios assim: a corrupção ou os erros
deixam de acontecer na medida em que há punição.
Pois é.
Mas vamos voltar, então, a esse caso específico do voo no jato da FAB. O que
deveria ser feito nesse caso?
Essa
notícia aconteceu... Como esse programa é gravado e ele vai... Eu soube dela há
uma hora [atrás]. Eu não sei qual é o tipo de punição que poderá acontecer. Não
sei qual é o tipo de erro que ele se enquadrará na realidade. O uso do voo para
ida a um jogo não é eminentemente o ato equivocado, já que ir a um jogo é algo
que um presidente de um poder poderia ir como a presidente poderia ir, não é? O
que nós estamos falando é a confusão de ir a um jogo levando a família, buscando
a família.
Então,
há um sombreamento de erros. O que eu te disse é que eu vou averiguar qual é o
tamanho desse erro e vou conversar com os meus outros colegas para que a gente
veja qual é o erro que há certamente nisso.
Certamente,
esse episódio não contribui para melhorar a imagem no Congresso.
Eu
concordo contigo, como eu já manifestei.
Agora,
olhando o episódio em si, abstraindo, por que esse tipo episódio ocorre com
tanta frequência na política brasileira?
Eu
acho que as pessoas cometem muitos descuidos na vida delas e também na vida
pública.
Mas por
que acontece isso, já que a população tem, cada vez mais, cobrado e
etc.?
Eu
não tenho como explicar erros que eu não cometo, Fernando. Eu sou muito
atenciosa na minha vida. Eu não cometo determinados erros. Nunca cometi. Então é
difícil nós falarmos sobre o que nós não cometemos. Eu não costumo especular
sobre coisas que eu não... Entende? O que eu posso te dizer sobre o que eu não
cometo? Então, é difícil especular sobre coisas que eu não cometo.
Nesse
caso, eu estava pensando, será que seria aceitável ele aferir o valor gasto de
passagens, o equivalente, e devolver para o erário, alguma coisa
assim?
Eu
vou ouvi-lo hoje. Ele tem tido a prática de falar sobre as coisas, não é? Então
eu acredito que ele vai fazer isso. E eu costumo ter com os outros os gestos que
eu gosto que tenham comigo.
É
bom que a gente diga isso. Acabou de acontecer. A internet produz isso, não é? A
gente tem que ter com o internauta a transparência que ele tem com a gente.
Então, [enquanto] a gente está gravando, eu mal tive a chance de ler essa
notícia. Eu não tive a oportunidade de ouvir o presidente Henrique. Eu acho que
ele vai esclarecer esse episódio e, ao ter a oportunidade de o ouvir - que é
algo que eu gostaria que fizessem comigo, ter a chance de ser ouvida -, também
vou poder aferir qual é a dimensão que isso tem e quais são as hipóteses que
isso poderá... Quais são os desdobramentos que isso poderá ter.
Em que
pé está o projeto do Estatuto da Juventude?
Ele
vai votado em plenário para ser sancionado pela presidente [Dilma Rousseff]. Nós
estamos fazendo os ajustes finais na redação.
Qual é
a expectativa de data de votação?
Na
quarta que vem [10.jul.2013] no plenário da Câmara.
Tem,
parece, que alguma resistência ainda da bancada religiosa que queria talvez
adiar essa votação, é isso?
Na
verdade, esse é o primeiro texto que traz, na história recente... Porque é a
primeira vez que tem um texto que faz menção a obrigação do governo, na sua área
educacional, promover a livre orientação sexual. Mas ele foi votado por consenso
na Câmara há dois anos atrás.
Claro
que houve uma, digamos assim, com a vitória do Marco Feliciano na Comissão de
Direitos Humanos... Não com a vitória, mas com a força que adquiriu, com a força
que a parte fundamentalista da bancada evangélica adquiriu, eles gostam mais do
protagonismo que têm na Câmara dos Deputados. Mas eu acho difícil que eles
consigam derrotar o projeto.
Mas
adiar a votação será que eles conseguem?
Não.
Não. Eles não conseguem porque a gente já está com ela marcada.
Entendi.
A sra. é deputada e filiada ao PC do B. No estatuto do PC do B está escrito
que...
Estava
esperando vir com uma pergunta dessas [risos].
Tem que
vir.
Porque
eu te conheço já. Estava olhando esse teu olho.
O
estatuto do partido diz o seguinte, abre aspas: "O partido guia-se pela teoria
científica e revolucionária elaborada por Marx e Engels, desenvolvida por Lênin
e outros revolucionários marxistas." O estatuto diz também que, abrem aspas: "O
PC do B luta contra a exploração e opressão capitalista, imperialista e tem como
objetivo superior o comunismo." Pergunta: O comunismo pode ser alcançado via
democracia representativa?
Pode.
Fechou suas aspas já? Fecha a minha então. Pode sim.
É? Um
regime comunista pressupõe expropriação de bens e, enfim, todos serão
proprietários de tudo. Nesse caso, como que na democracia representativa isso se
daria sem quebrar?
Tu
leu o nosso estatuto. Tu não leu o nosso programa.
Não. Li
o programa também, mas, eles falam coisas...
Sim,
mas as aspas...
As
aspas são do estatuto, é.
Tu
não leu o nosso programa. Eu quero sugerir ao internauta que leia o nosso
programa porque o nosso programa fala sobre qual etapa que o Brasil vive hoje e
o que nós achamos que o Brasil que a gente está construindo hoje precisa passar.
O
nosso programa é um programa absolutamente atual porque quando nós lemos o
estatuto, o estatuto é uma peça das regras ao filiado do partido. Que, aliás,
todos os partidos deveriam ter e seguir porque, se seguissem, talvez os
parlamentares agissem mais de acordo como os que o do PC do B agem. E o programa
fala sobre a realidade brasileira. E muito dos que as pessoas saem às ruas para
contestar hoje já tem dentro do programa do PC do B porque no nosso programa
constam, basicamente, as 10 reformas que nós acreditamos que o Brasil deve
passar para viver um ciclo de desenvolvimento mais profundo, Fernando.
O
que nós defendemos hoje para o Brasil são reformas estruturantes para um nível
de desenvolvimento melhor para o povo brasileiro. Então, ali tem a reforma da
política, que ali já dá as linhas gerais da reforma que nós defendemos, com o
fim do financiamento privado, com o fim do sistema de voto não nominal. Claro
que não é... Um programa de um partido não pode ter o detalhe, como eu te disse,
não tem a bijuteria ali. Mas tem ali o fim do voto nominal, o voto mais
ideológico. Ali tem reforma do sistema de saúde. Ali tema reforma da educação.
Tem a reforma tributária.
Então,
hoje, o que nós defendemos hoje para o Brasil? Nós não somos um partido que quer
durar 10 anos, tanto que já temos 90 [anos]. O que nós afirmamos? Nós queremos
que o Brasil viva um momento de desenvolvimento econômico e social mais
profundo. E isso significa passar por um ciclo de reformas. Reformas que
garantam que o povo viva melhor.
Qual o
tamanho da bancada do PC do B hoje?
Nós
temos hoje 14 deputados, um deles é ministro, que é o Aldo [Rebelo, ministro dos
Esportes].
O PC do
B é um partido, talvez eu acho que é o mais antigo do Brasil
hoje?
É.
É
né, 90 anos. Com a volta da democracia, no início dos anos 80, os partidos todos
foram refundados, nasceram novos partidos, o PC do B foi legalizado e foram
crescendo, cada um deles da sua forma. O PC do B se manteve um partido modesto
em número de deputados. Por que o PC do B, diferentemente, por exemplo, do PT,
que era um partido menor do que o PC do B é hoje. O PT teve 5 deputados, se não
me engano, na 1ª legislatura em 82. O PT foi crescendo, sendo um partido de
esquerda. Por que que o PC do B não cresceu com o PT?
Por
vários motivos. Primeiro, nós não disputamos em 82, nós somos o último partido
legalizado.
Mas
ainda sim. 86 já estava, enfim...
Mas
esse é um motivo. Nós tomamos essa decisão. Nós não disputávamos as primeiras
eleições majoritárias, nós começamos a disputar eleições majoritárias
recentemente. Eu sou da turma que disputou, claro que nós tínhamos candidatos
pontuais.
Mas não
muitos...
Não
muitos eu sou fruto da geração que começa a disputar eleições majoritárias, e o
Brasil é um país...
O que
faltou, uma das razões é que talvez tenham faltado candidatos
majoritários?
Tem
relação com isso, claro, porque nós passamos a ter essa tática de disputar
eleições majoritárias já nos anos 2000, e o Brasil é um país que tem a
característica de concentrar muito em nomes fortes. Isso faz
parte da democracia, ou do tipo de construção política do nosso país. Nós
tivemos grandes e amplas campanhas concentrando o regime brasileiro entre dois
partidos, o PSDB e o PT, nós tomamos a decisão política correta de apoiarmos as
candidaturas petistas. Outros partidos se construíram a partir de candidaturas
fracas, mas foram se construindo por aí. Nós não, desde 89 nós apoiamos o
presidente Lula. Então nossa história não é uma história de construção só da
nossa bancada na Câmara. Ela é a história de construção de um país. Nós
decidimos apoiar Lula em
todas... O PSB , por exemplo, ele foi construindo candidaturas a
presidente separadas. Não apoiaram Lula em todas as eleições. Isso cresce a
bancada de deputados. Trilharam um outro caminho em outras eleições. Nós
não, em todas as eleições apoiamos Lula. Só para te dar um exemplo. Claro, tem
erros, tem acertos...
A sua
expectativa ou do partido é que a bancada possa ter que tamanho agora na próxima
eleição, em 2014?
Nós
devemos ter 25, 24 deputados.
Essa é
a expectativa, dobrar praticamente?
É.
Porque nós já tivemos muitos candidatos a prefeitos na última eleição.
A UNE
não apareceu muito nessas manifestações. A UNE ficou obsoleta, um
pouco?
Primeiro,
a UNE participou de todas as manifestações.
Não
protagonizando, né?
Ninguém
protagonizou as manifestações. E quem tentar protagonizar as manifestações será
arrastado por elas.
Mas a
UNE certamente não esteve entre aqueles que chamaram a manifestação no
começo.
É,
eu vi muita gente dizer que alguém chamou as manifestações. Sobretudo uma
tentativa de ler as manifestações a partir de São Paulo, que é um erro, porque
as manifestações não começaram e não terminarão em São Paulo. Isso causa
bastante revolta em quem não é paulista. Eu sei que aqui [Grupo Folha] é um
grupo que começa em São Paulo, mas assim... O MPL [Movimento Passe Livre], por
exemplo, o MPL chamou as manifestações em São Paulo. Em Porto
Alegre as manifestações não são do MPL. Em Pará, não são...
Mas a
UNE, a UNE...
A
UNE esteve e participou das manifestações no país inteiro. Agora, o que eu quero
dizer é que ninguém hegemonizou e participou das manifestações em todos os
cantos. O que eu quero te dizer é o seguinte, Fernando. Todas as entidades,
sejam partidos, entidades da sociedade civil, tradicionais, foram pegas de
surpresa pelo volume das manifestações sociais. Inclusive as pessoas que
participaram do teu programa, ou de outros programas, dizendo que não.
O
que eu verdadeiramente acho é que quem tem verdades absolutas para dizer sobre
as manifestações não entendeu exatamente nada que está acontecendo. Eu acho que
a UNE participou das manifestações, à medida que elas foram surgindo, por quê?
Porque 15 dias antes das manifestações a UNE realizou o maior congresso da sua
história, com estudantes que estavam organizados nas sua base. Que não eram os
mesmos das manifestações. E que bom que não eram, porque isso é sinal que temos
jovens diferentes, participando de movimentos diferentes da sua história, e isso
é que tem de nos levar a refletir.
Como
que nós tínhamos a UNE organizando seu congresso em Goiânia, com o maior número
de jovens da sua história, e lá estavam os do Prouni, os bolsistas, ao mesmo
tempo nós temos outros jovens nas ruas. Tu entendes? É esse encontro que a gente
tem que conseguir refletir. Jovens num lado, jovens do outro, um organizado, os
outros desorganizados. Esse Brasil de anseios comuns, uns lá questionando,
outros cá questionando. Como é que esses jovens não se encontraram. É isso que a
gente tem que conseguir refletir. Pelo menos é isso que eu estou tentando
entender há 20 dias.
E
no caso da UNE propriamente, a sua avaliação é que a forma de organização e
conexão da entidade com os jovens, com os estudantes, é a melhor possível ou
precisa ser aperfeiçoada. Qual é a sua opinião?
Eu
acho que ela é.... acho que ela é boa, e eu acho que ela precisa ser
aperfeiçoada. Acho que não é uma coisa ou outra. Ela existe com um método de
organização.
O que
que ela poderia fazer, por exemplo? A UNE há muitos anos fica sob a influência
do seu partido, seu braço jovem, a UJS [União da Juventude Socialista], desde
1991, que ganha sucessivas eleições na urna. Tem como oxigenar um pouco e ter
mais pluripartidarismo ali dentro?
Todos
os partidos têm diretores na urna. A forma de eleições na UNE já é proporcional
aos partidos políticos. Que é uma coisa que poucos dizem, todos os partidos que
disputam..
Mas a
direção principal, a presidência...
A
presidência, mas todos participam proporcionalmente. Agora, o que eu acho é que
todo mundo foca muito na UNE, mas todo mundo, dos partidos aos jornalistas, aos
senadores, aos deputados, todo mundo vai ter que parar e pensar na forma como
essas organizações... não as organizações sociais... na forma como essas
passeatas se organizaram e o que elas questionaram. Porque para mim chama muito
a atenção que a UNE tenha conseguido realizar um congresso tão representativo e
tão massivo a poucos dias das passeatas, entende? Por quê? Porque isso significa
para mim não algo ruim, mas algo contraditório. Entende? Que tantos jovens
estivessem juntos e que dias depois tantos outros jovens também estivessem
juntos. Isso significa que tem mais jovens querendo falar do que a gente
conseguiu entender. E não que uns estivessem contra os outros.
A
leitura de um contra os outros é a leitura velha, é a leitura dessa oposição
binária, louca, que a gente faz sempre. Uns tão contra os outros... isso é a
forma velha de fazer leitura política. 'Olha ali, aqueles ali são contra esses,
esses são contra aqueles'. É a leitura do Congresso, sabe? Oposição e situação.
Uma tribuna de um lado e uma tribuna do outro. Isso é antigo, gente. Para mim,
aqueles jovens que estão nas ruas não são contra os jovens que estão no
congresso da UNE. Eles têm causas muito comuns, muito próximas, eles só estão se
organizando de uma forma diferente. E a gente tem que tentar ver como é que a
gente promove o encontro dessas formas, né? Porque a forma da UNE é uma forma
tradicional, sim. Qual é o problema de ser tradicional? Enquanto os outros
estavam dormindo, como eles dizem, esses aqui estavam acordados. Eles têm que
ter vergonha de estar acordados?
Eu
não tenho vergonha de ter ficado acordado na década de 90, eu tenho orgulho.
Vocês querem que a UNE tenha vergonha de ter ficado acordada? É isso? Eu não
entendo. Eu não tenho vergonha que o pessoal da UNE estava acordado. Eles
estavam organizados de uma forma tradicional. Eles têm que refletir? Claro que
têm. Então eu quero promover o encontro entre os que estavam acordados e os que
não estavam, é isso que tem que acontecer, na minha opinião.
Deputada,
deixa eu voltar para o plebiscito. Há dúvidas se o plebiscito para a reforma
política vai ser realizado a tempo de as propostas que eventualmente sejam
apresentadas sejam aplicadas na eleição já de 2014 por conta do principio da
anualidade que está na Constituição. Se não for possível fazer o plebiscito para
que valha para 2014, ele deve ser mantido nessa data, já tão rápido, ou talvez
fazê-lo mais para frente?
Ótima
pergunta. Primeiro, o que eu acho que é mais importante, é que ele seja feito.
Segundo, eu acho que ele tem que ser feito com o tempo suficiente para que a
população seja esclarecida. Para mim essas são as duas premissas. Porque que eu
digo que essas são as duas premissas? E eu acho que tem que ser feito nessa onda
de participação popular. Porque que eu digo nessa ordem, Fernando? Porque para
mim o mais importante é que essas 3 questões sejam levadas em consideração, e
isso responde a tua pergunta, mesmo que ele não valha para 2014, ele tem que ser
feito rapidamente. Existem alguns juristas que dizem que...
Mas
você analisou o documento do TSE?
Analisei.
O TSE disse que precisa de 70 dias.
Não,
não, mas ele disse também que não tem sentido fazer [o plebiscito neste ano] e
não aplicar [em 2014].
Eu
não tenho certeza disso. Inclusive o que eu estava conversando antes de vir para
cá era sobre isso. Eu não tenho essa convicção jurídica. Porque nós temos outros
argumentos constitucionais que podem fazê-lo valer. Porque eu
não...
Mas
a prevalecer a interpretação que me parece forte do TSE, 27 presidentes de TREs,
que dizem que o plebiscito, se realizado, tem que ser aplicável já na eleição do
ano seguinte. A prevalecer essa interpretação, daí o que
fazer?
Aí
a Câmara terá que formular as perguntas
A
jato?
É.
E se
não conseguir?
Ontem
me manifestei sobre isso no plenário. Nós tivemos [na relatoria da reforma
política] os deputados Ronaldo Caiado (DEM-GO), [o ex-deputado] Ibsen Pinheiro,
[o ex-deputado] Flavio Dino e Henrique Fontana (PT-RS). Nós sabemos o que nós
queremos para a reforma política. Nós só não conseguimos chegar a uma conclusão,
certo? Nós sabemos quais são as dúvidas que nós temos.
Agora,
essa interpretação de uma parte considerável da bancada do PMDB, que é um
partido grande dentro do Congresso, de que o ideal é fazer o plebiscito no ano
que vem, em 2014, junto com a eleição possivelmente, isso não atenderia ao que o
PC do B defende.
Isso
não corresponde ao que nós achamos melhor. Inclusive porque eu acredito que é
necessário aproveitar esse grande momento de participação popular.
Seria
inútil, vamos supor que a posição de fazer agora seja derrotada e prevaleça a de
fazer no ano que vem, daí fica inútil ou não?
Não,
não fica inútil.
Daí faz
no ano que vem
Faz
o ano que vem
Entendi.
E nesse caso a primeira discussão grande que vai ter que ter na Câmara é se é
possível fazer agora e se ele vai valer para 2014. Essa é o primeiro
debate.
A
Câmara tem uma parcela grande que não quer que [o plebiscito] seja feito. Essa é
a primeira [discussão].
A
impressão que eu tenho, falando com vários de seus colegas, é que vai ser muito
difícil aprovar esse plebiscito no prazo em que o TSE está estipulando para que
ele seja feito. A sra. tem essa impressão também?
Tenho.
Ou
seja, não será uma surpresa para ninguém se o plebiscito acabar não saindo nesse
prazo, é isso?
Não
será uma surpresa.
E há
algo que pode ser feito ainda? Que que pode ser feito?
É
um jogo de posições. Nós temos ali uma parte que defende plebiscito e uma parte
que não defende plebiscito, certo? Dentro da parte que defende plebiscito nós
temos partes que defendem datas diferentes, então nós temos duas batalhas a
vencer, os que defendem o plebiscito agora. A primeira: ter maioria para ganhar
o plebiscito, porque DEM e PSDB não querem plebiscito. Depois nós temos que
pactuar uma data para ele.
E hoje
a avaliação é que é difícil fazer na data que tá todo mundo achando que pode ser
feito, 7 de setembro, porque há uma divergência ali dentro.
Na
verdade, ainda não tem, nós estamos no meio do processo de tabular as posições
de todos os partidos.
PMDB
ficou já para fazer no ano que vem. Os de oposição nem querem nada. Então isso
já é uma baixa grande.
PMDB
e PSB querem o ano que vem.
Exato,
já são dois da base do governo. Não teria sido mais prudente a presidente, ainda
que ela tenha feito varias reuniões, ter se esforçado ainda mais para a hora que
chegasse com o projeto ter pactuado pelo menos entre os partidos da base aliada
ao governo uma posição unificada?
Eu
acho que a presidente fez seu maior esforço, é que às vezes na leitura política
as pessoas têm memória muito curta. É bom lembrar que de 13 de junho a 20 de
junho nosso país viveu um momento bastante conflituoso. É que agora está todo
mundo analisando com a sua calma, né.
Mas ela
teria como...
A
análise política agora está muito tranquila.
Mas
você acha que o esforço que ela fez para enviar isso para o Congresso já mais ou
menos pactuado foi o máximo que poderia ser feito?
Ela
fez o maior esforço possível dentro de um país que viveu 15 dias de protestos
sociais nas ruas de um grau de intensidade nunca antes vivido. Porque nós
vivemos muitos momentos de passeatas gigantescas, mas nós vivemos alguns dias de
conflito, inclusive policiais, conflitos policiais nas ruas bastante
grandes.
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FIM DA ENTREVISTA *********
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