12/9/2013, Press TV, Teerã (vídeo e entrevista
transcrita)
Transcrição traduzida pelo pessoal
da Vila Vudu
Parte 1
Parte 2
Press
TV:
Como
mencionamos na introdução, recebemos hoje o ministro Mohammad Javad Zarif.
Obrigado por aceitar nosso convite, em sua agenda tão ocupada. E por falar em
agenda ocupada, o senhor está no cargo há 36 dias, e já está tendo de enfrentar
um grave desafio, o possível ataque dos EUA à Síria. Parece que os EUA, que
entraram agora em compasso de espera, tinham muita pressa para iniciar essa
guerra, com sua intervenção. Por que tudo isso, em sua opinião?
Zarif:
Agradeço
a você, por essa oportunidade. Quanto ao que você pergunta, acho que alguns
grupos e pessoas dentro dos EUA, e alguns interesses fora dos EUA, quiseram
empurrar o presidente dos EUA – o qual, me parece, já relutava antes – para uma
armadilha. E a armadilha, afinal, ele mesmo se criou, infelizmente. A armadilha
seria envolvê-lo numa guerra. O pretexto foi o uso de armas químicas, uma
questão hipotética, porque ainda não há provas de que o governo sírio tenha
usado as tais armas.
Permita
que lhe diga que o Irã, que é vítima de armas químicas, condena absolutamente o
uso de qualquer arma química, não interessa quem sejam os culpados ou as
vítimas. Mas entendemos que ninguém tem o direito de tomar a lei nas próprias
mãos. Quero dizer: nessa questão, os EUA não têm qualquer direito legal de agir
ao mesmo tempo como acusação, juiz e, infelizmente, se acontecer, também como
executor. E não tem qualquer direito, particularmente, à luz do apoio que os EUA
deram a um regime, de Saddam Hossein, que usou armas químicas não só contra
soldados e civis iranianos, mas também contra seu próprio povo em Halabja. E
aqui não se fala de desconfianças ou suspeitas: esses fatos foram várias vezes
comprovados pela equipe de inspetores investigadores da ONU.
Temos
agora uma equipe da ONU para a Síria, que visitou a Síria, mas ainda não
apresentou relatório. E seja qual for o resultado do relatório, aquela equipe
não tem autoridade para determinar responsabilidades. A situação permanece muito
obscura. Esperemos que com o novo acordo, comecemos logo o processo de carregar
todas as armas químicas para bem longe dessa região. Nossa região, todo o
Oriente Médio, temos dificuldades suficientes, há agitação suficiente, para que
nos envolvamos numa guerra na qual se usem armas químicas e outras armas de
destruição em massa. Por isso o Irã tanto trabalha a favor de um Oriente Médio
livre de armas de destruição em massa.
Permita
que esclareça mais um ponto. O uso de armas químicas é crime, crime contra a
humanidade, mas entendemos também que o uso da força, a ameaça de usar a força
também é crime. Também agride a lei internacional.
Infelizmente,
a impressão que se tem é que os EUA parecem estar vivendo ainda no século 19,
quando o uso da força era uma das prerrogativas dos estados.
Parece-me
que o presidente dos EUA, que parece ser atilado advogado constitucional,
precisa voltar aos seus livros de Direito, aos livros de Direito Internacional,
que tudo leva a crer que ele não tem relido ultimamente, e considerar que,
quando concede, como fez no discurso de ontem à noite ao povo norte-americano,
que não há ameaça direta ou iminente aos EUA, os EUA absolutamente não têm
qualquer fundamento para o ataque que anunciaram. Não há lei que os ampare, nem
podem tomar a lei nas próprias mãos.
Press
TV: Dr.
Zarif, se a Síria não é ameaça iminente à segurança dos EUA, por que tanto se
ouve falar de guerra dos EUA contra a Síria?
Zarif: Minha
impressão, como já disse no início, é que o presidente dos EUA está sendo
empurrado para uma armadilha, montada por alguns interesses dentro dos EUA, aos
quais interessam as hostilidades e a tensão; e também por alguns interesses fora
dos EUA, infelizmente na nossa região, que tentaram há dois anos alterar o
equilíbrio militar na Síria. Primeiro, tentaram envolver o povo sírio numa
guerra civil que os sírios nem desejam nem fizeram. Na Síria, hoje, o governo
luta contra extremistas e infiéis vindos de fora.
Press
TV: Quem
os apoia, quem os financia, quem os está armando na Síria?
Zarif: Todos
nós conhecemos os que insistem em fazer guerra na nossa região. Infelizmente, é
um modo muito raso, de visão muito curta, para promover interesses específicos,
porque todos sabemos que guerra, na nossa região pode até começar como algum
tipo de operação cirúrgica, limitada. Mas uma vez iniciada a guerra, não haverá
como impedir que se alastre. Creio que os EUA sabem disso.
Os
EUA tentaram a operação “Choque e Pavor”. Você lembra [o ex-secretário de Defesa
dos EUA, Donald] Rumsfeld, a terminologia que usou quando os EUA queriam invadir
o Iraque: iam fazer uma operação de “Choque e Pavor”, que estaria resolvida em
alguns dias. Quantos anos durou? 10, 11 anos depois, como soube agora, quando
estive no Iraque, só no mês do Ramadã, mais de mil pessoas morreram no Iraque,
em explosões em estradas minadas.
É
necessário que os EUA entendam, e acho que será entendimento importante para os
EUA, não só que o uso da força é ilegal, que ameaçar de usar força militar é
grave violação da lei internacional, mas, sobretudo, que o uso da força é
inefetivo. A força, a violência, perderam a serventia nas relações
internacionais. Perderam, há muito tempo, a utilidade.
Em
1928, as nações civilizadas decidiram rejeitar o uso da força como instrumento
de política nacional. Antes disso, a guerra era instrumento de política
nacional, dizia-se que a guerra seria a diplomacia, por outros meios. Mas desde
então a comunidade internacional amadureceu, começou a entender que a guerra não
dá o resultado esperado por quem inicia guerras. E o uso da força imotivada foi
proibido, a lei proíbe. Não se trata de advogados idealistas que sentaram,
conversaram e baniram o uso da força imotivada. É porque a guerra realmente
perdeu a serventia que teve noutros tempos.
Há
um número que ajuda a demonstrar o que estou dizendo: no século 20, 85% dos
casos em que um país recorreu a força, são casos em que aquele país ou foi
arrasado ou não se alcançaram os objetivos da guerra. Está já suficientemente
provado que a guerra já não é instrumento político efetivo. Espero que os EUA, o
país de maior força bélica na face da Terra, logo descubra que é preciso
recorrer a outros meios de influenciar. A força já não resolve os problemas que
os EUA supõem que ela ainda resolva.
Press
TV: Isso
me leva à questão das muitas, muitas vezes em que os EUA repetiram – e o senhor
comentou recentemente, quando estava no Iraque – que “todas as opções estão
sobre a mesa”. Mas, antes de sua resposta, queria mostrar aos que nos assistem
as várias matérias publicadas no ocidente sobre a sua nomeação. A reação foi
positiva, nos EUA, à sua nomeação. Os jornais publicaram: “Afinal alguém que
conhece os EUA muito bem” etc. E o senhor já recebeu vários telefonemas, dentre
os quais do vice-presidente dos EUA Joe Biden e do secretário da Defesa Chuck
Hagel. O senhor acredita que todas essas relações que o senhor construiu no
passado, que hoje estão nos postos em que estão, o senhor acredita que tudo isso
abrirá portas para buscar outro tipo de relacionamento com os EUA, se estiver
previsto em sua agenda?
Zarif: Quanto
à primeira parte de sua pergunta, entendo que a declaração de que “todas as
opções estão sobre a mesa” é declaração antiquada, porque se sabe que nem todas
as opções estão de fato sobre a mesa, não, com certeza, para países que se
disponham a respeitar a lei, a seguir a Carta da ONU. A via de ameaçar de usar a
força já foi, há muito tempo, retirada da mesa, inclusive pelos EUA, quando se
reuniram em San Francisco e decidiram poupar as gerações futuras do flagelo da
guerra que, para aquela geração, fora suplício conhecido duas vezes e causou
miséria indescritível. A noção de que não é verdade que “todas as opções
estão sobre a mesa” nasceu da Carta da ONU, sob a hospitalidade dos EUA, em
1945. É importante que os EUA compreendam que não, todas as opções não estão sobre a
mesa.
Quanto
à segunda parte de sua pergunta, sim, já encontrei vários membros do atual
governo dos EUA, quando eles eram membros do Congresso dos EUA e eu era
embaixador do Irã à ONU. Creio que eles sabem de onde venho. Por isso, porque os
conheço, é que me parece que estejam sendo empurrados para uma guerra que eles
não desejam, da qual não precisam. Entendo que a comunidade internacional deve,
sim, ajudar o governo Obama para que se evite essa catástrofe, que queimará essa
região e arrastará também os EUA no mesmo incêndio.
Press
TV: Deduzo,
do que o senhor diz, que o Irã estamos entendendo que os EUA estão sendo
arrastados para a guerra, digamos assim, por outras forças na região e fora da
região. O senhor pode elaborar sobre essa questão? Os EUA vão atacar
militarmente a Síria no fim do dia, ou o senhor crê que não, que os EUA não
querem fazer isso, mas há imensa pressão sobre os EUA para que faça guerra
contra a Síria?
Zarif: Espero
que a razão prevalecerá. Espero que, com a proposta dos russos e a oportunidade
que se abriu com a aceitação da Síria, outros pararão de inventar pretextos para
fazer nova guerra, pararão se bater os tambores de guerra. Afinal, é importante
que entendam que há grande perigo para eles mesmos e para toda a região.
Mas
vimos, pelos comentários que circulam, que alguns países aqui na região, bem
como países fora da região, enfim, há muita gente infeliz, e lamento ter de
dizer, porque estamos conseguindo evitar a guerra. Escapa-me a lógica usada por
amigos nossos na região, que estão infelizes porque se busca uma via diplomática
e, esperemos, parece que encontramos meio para evitar grande catástrofe aqui, à
porta deles. Porque não há dúvidas de que será uma grande catástrofe, que levará
ao extremismo, à divisão sectária, levará a mais conflitos por aqui. Ainda há
gente interessada em intervir no equilíbrio de forças dentro da Síria, e
provocar mais derramamento de sangue, mais mortes de gente inocente.
Todos
precisamos sentar e trabalhar com todos os fatores sírios, ouvir todos,
inclusive o governo sírio e todos os que se interessem pelo futuro da Síria,
reuni-los numa mesa de negociações e encontrar uma solução pacífica. Todos têm
de compreender que não há solução militar para a crise da Síria.
Press
TV: O
Irã já tem algum plano prático nesse momento?
Zarif: Entendemos
que é preciso pôr um fim nos combates na Síria. Todos têm de sentar e encontrar
solução pacífica, democrática, baseada na participação de todos os segmentos da
sociedade síria na governança do país. E sem interferência estrangeira. Creio
firmemente que sim, que se pode fazer.
Infelizmente,
há grande interferência externa na Síria, vários grupos recebem armas e dinheiro
de fora, grupos que já causaram muitas dificuldades na região e fora da região e
que continuam a perseguir seus interesses rasos, sem visão ampla.
Devem
saber que os que ajudam, criam e alimentam o extremismo na região cairão, eles
também, vítimas do extremismo que criaram e alimentaram. Nada muda se for o
extremismo da al-Qaeda, dos Talibã ou de Saddam Hussein. Todos são extremismos.
Os que patrocinem o extremismo serão vítimas dele.
Press
TV:
Voltemos
à questão das armas químicas que discutimos no início. O Irã sabe quem usou
armas químicas no atentado de 21/8 na Síria?
Zarif: Temos
indicações, e partilhamos essas indicações no passado com os EUA e outros, de
que, infelizmente – porque é muitíssimo grave e extremamente perigoso – que as
armas químicas estão sendo contrabandeadas para dentro do território sírio, para
grupos armados que lutam contra o governo da Síria e contra o povo sírio.
Não
é informação nova. Já tínhamos essa informação há algum tempo, e a comunicamos.
Houve várias prisões esse ano, em países vizinhos, que sugerem fortemente que o
contrabando esteja realmente acontecendo.
Press
TV: E
o Irã obteve alguma resposta dos norte-americanos?
Zarif: Lamentavelmente,
não! Nós os alertamos, dissemos que estava acontecendo, dissemos e continuamos a
repetir que esse é o pesadelo absoluto: armas químicas em mãos de atores não
estatais, atores extremistas não estatais, que são ameaças para todos.
É
uma ameaça que não respeita fronteiras, que se alastrará por toda a região, e
quem ajuda esses grupos a terem acesso a armas químicas terá, mais dia ou menos
dia, de enfrentar a questão de o que fazer delas? Os alvos dessas armas são
todos. A possibilidade de elas serem usadas são ilimitadas.
Não
sou homem de espalhar medo, não gosto disso e não faço isso, mas a questão de
haver armas químicas em mãos de extremistas é preocupação real. Temos de
conseguir resolver isso. Temos de inventar um meio. Estamos agora um pouco mais
tranquilos, agora que os sírios estão negociando uma espécie de acordo
internacional para tirar do país o que haja de armas químicas. Mas até aí é só
metade do problema: é preciso enfrentar a questão das armas químicas que estão
sob controle dos terroristas extremistas.
Press
TV: E
quanto ao programa nuclear iraniano e as recentes notícias de que a questão
passou, da órbita do Conselho Nacional Supremo de Segurança, para o Ministério
de Relações Exteriores? O senhor pode falar sobre isso e o seu papel na nova
organização?
Zarif: Bem,
o presidente decidiu que o Ministério de Relações Exteriores ficará encarregado
de conduzir as negociações da questão nuclear. Entendo que é uma sábia decisão.
O Ministério de Relações Exteriores é responsável pela condução dos assuntos
externos do Irã, tem as competências e os instrumentos, além do pessoal
especializado em questões dessa natureza.
Claro,
o Conselho Supremo de Segurança Nacional ainda supervisiona o arquivo nuclear, e
temos esperança de conseguir avançar nas negociações. Temos de trabalhar por
resultados. Permita-me que faça alguns comentários genéricos sobre como as
negociações devem prosseguir. Entendemos, para começar, que não se trata de
negociações sem meta clara. E que as negociações não são um fim nelas
mesmas.
Entendemos
que as negociações têm de ter prazos, devem ser orientadas para resultados e que
devem ser baseadas na boa fé, em condições de igualdade para os negociadores e
respeito mútuo. Temos de mudar o modo de abordar as negociações. Gostaria de
aproveitar a oportunidade que você me dá e detalhar um pouco essa questão, para
que se entenda melhor o que estou dizendo.
Entendo
que o ambiente internacional depois da Guerra Fria é diferente, é uma fase de
transição da política mundial, porque já não cabe falar de “política
internacional”, mas já se tem de falar de “política mundial”. Preferimos falar
de política mundial, porque as questões se entreteceram de tal modo que já não
se buscam jogos de ‘soma zero’. Já não cabe perseguir interesses de um país, à
custa do interesse dos demais países ou de outros países. Não haverá segurança
para um, à custa da insegurança de outros.
Se
já estivéssemos trabalhando sob essa perspectiva, o 11/9 jamais teria
acontecido. Estamos hoje num outro dia 11 de setembro, e é boa ocasião para
todos pensarmos que, se houvesse meio para garantir alguma segurança pela via
militar, se a segurança num país fosse possível, à custa da insegurança em
outros pontos do mundo, o 11/9 não teria acontecido. E aconteceu num país
poderosíssimo e bem distante das regiões consideradas “voláteis” do planeta.
Ninguém jamais estará seguro, à custa da insegurança de outros pontos do mundo.
Sobre
o arquivo nuclear iraniano, é preciso mudar a perspectiva. Não podemos continuar
a buscar um objetivo para o Irã e outro objetivo para o chamado
“P5+1” , ou que outro nome tenha; são os países
que se dizem ameaçados pelo programa nuclear do Irã, como se tudo isso fosse um
joguinho de crianças. Esse tipo de abordagem já não funciona no atual ambiente
de política mundial. Só funcionará uma abordagem que sirva aos objetivos dos
dois lados. Para isso, é preciso definir objetivos comuns que sirvam aos
interesses de todos os envolvidos. Hoje, esses objetivos são: (1) o programa
nuclear iraniano deve ser e manter-se orientado para finalidades pacíficas; esse
é o objetivo declarado do outro lado, do “P5+1” .
Ora,
do lado iraniano, posso declarar oficialmente, que esse também é o nosso
objetivo, porque isso interessa à segurança nacional do Irã. Já incontáveis
vezes declaramos que não queremos armas atômicas; que as armas atômicas não têm
lugar na doutrina de segurança do Irã; e que até a noção, que o outro lado
dissemina pelo mundo, de que o Irã desejaria construir bombas atômicas, já é
prejudicial à nossa segurança.
Assim
sendo, o primeiro objetivo é objetivo comum aos dois lados. Nesses termos, temos
agora de redefinir os problemas, para poder encontrar a solução. Nós partilhamos
o primeiro objetivo. É hora, portanto, de o outro lado partilhar o segundo
objetivo, e explico por quê.
O
segundo objetivo (2) tem a seguinte forma: o único meio pelo qual se pode
assegurar que o programa nuclear iraniano continuará a ser pacífico é criar um
ambiente regional e internacional aceitável e pacífico. Por quê? Porque as
capacidades nucleares pacíficas do Irã existem hoje e estão sob total controle
do Irã. Elas não dependem de nenhum agente fora do Irã.
Portanto,
nenhum agente fora do Irã tem meios para impedir que o Irã faça o que lhe pareça
mais conveniente dos recursos e capacidades que ele já tem, que são nossas.
Temos a ciência, a tecnologia, e ninguém conseguirá nos privar de nossos
cientistas, de nossa infraestrutura tecnológica. Tudo isso está aqui. Não faz
sentido pretender que não esteja ou que não seja o que é.
A
capacidade nuclear pacífica do Irã é um fato. Assim sendo, para alcançar o
objetivo comum [(1), acima], devemos concordar com esse ponto (2): que essa
capacidade instalada e operante iraniana local possa ser exercida em contexto
transparente, internacionalmente reconhecido como tal. Isso também é fácil de
obter, porque a usina de enriquecimento está aí, aberta, plenamente acessível
aos inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica, e pode voltar a ser
posta sob monitoramento internacional, como já aconteceu no passado.
Só
assim, criando um ambiente regional e internacional pacífico, e reconhecendo o
fato de que o Irã não se opõe a nenhuma inspeção ou monitoramento será possível
assegurar que o programa nuclear iraniano será programa exclusivamente para
finalidades pacíficas.
Press
TV: Uma
última pergunta, senhor ministro. O senhor está otimista quanto às conversações
com o P5+1?
Zarif: Vejo
com otimismo que estamos chegando às negociações determinados a resolver o
problemas; nosso lema é “chegar ao sim”, para essas conversações. Mas são
precisos dois, para o tango. Se os EUA e os demais “P5+1” estiverem preparados para
envolverem-se seriamente no processo, sim, é possível que o cenário seja
completamente diferente.
Devo
dizer que nem esse governo nem qualquer outro governo iraniano estará disposto a
ceder, nem um iota, dos direitos do povo do Irã. Digo isso, porque será
contraproducente até pedir ou esperar que isso aconteça, nem essa será jamais a
via acertada para garantir que o programa nuclear do Irã seja mantido
pacífico.
Press
TV: O
senhor se encontrará com Catherine Ashton [Comissária do Comércio Europeu na ONU], dizem os
jornais, à margem da Assembleia Geral da ONU que se aproxima. Com certeza o
senhor exporá a ela o que acaba de nos dizer. Mas não se deve esquecer que um
dos membros do P5+1, os EUA, ainda dizem que “todas as opções estão sobre a
mesa”. Temos lá um país que diz que vai respeitar o novo governo do Irã, mas
onde, ao mesmo tempo, 76 deputados e senadores impõem novas sanções ao Irã. Que
diferença haverá no modo de abordar os EUA, um dos países do
P5+1?
Zarif: Bem...
Entendo que os EUA podem ter papel chave no processo de encontrar uma solução ou
de impedir uma solução, se observarem o primeiro princípio das novas
negociações. Você sabe: negociações que se pautem pela lei internacional só
podem ter sucesso se todos os negociadores negociarem em espírito de boa
fé.
Se
os EUA quiserem negociar em espírito de boa fé, não poderão falar de solução
diplomática, ao mesmo tempo em que pressionam, não só o Irã mas o resto do
mundo, torcendo braços, com medidas de intimidação e, até de agressão
extraterritorial, para impor restrições ao comércio iraniano. Essas medidas são
absolutamente ao contrário do que determina a lei internacional, são dirigidas
contra o povo iraniano, contra civis inocentes. São medidas que visam a impedir
que o povo iraniano tenha acesso a produtos de primeira necessidade, de
tecnologia a remédios, de ciência a comida. Essa política não deu os resultados
esperados. Sanções e intimidação não levaram o povo iraniano a desistir de lutar
pelos próprios direitos. Quanto mais agredirem o povo iraniano, mais
resistiremos. Os EUA erram grave e completamente, se creem que o Irã resiste e
continuará a resistir ‘'porque’' desejemos uma arma atômica.
O
Irã resiste e resistirá porque exige respeito. Não aceitaremos que ninguém nos
desrespeite. E ponto final.
Press
TV: O
senhor falou de situação de “ganha-ganha”. O presidente Hassan Rohani também
falou de “ganha-ganha”. Que cenário seria esse, de “ganha-ganha”?
Zarif: Cenário
ou situação de “ganha-ganha” seria um programa nuclear iraniano transparente,
sob supervisão internacional, no quadro da legalidade internacional, com os
mecanismos de salvaguarda da AIEA, nos termos do Acordo de Não Proliferação, que
o Irã subscreveu, e que é baseado em cooperação.
Nem
se deve falar de “comunidade internacional”, porque essa expressão tem sido
aplicada hoje só para alguns países que falam mais alto e têm meios poderosos
para manipular a opinião pública. Mas é do interesse de todos os países
realmente interessados em que o programa iraniano se mantenha pacífico, que
todos abracem a nova negociação, não a intimidação ou a pressão. Assim, com tudo
isso bem entendido, teremos uma situação de ganha-ganha.
O
Irã terá seus direitos respeitados, as sanções serão removidas e o resto da
comunidade internacional poderá ter certeza de que o programa nuclear iraniano é
exclusivamente pacífico e assim permanecerá. Porque é do interesse de todos
esses países que o programa iraniano possa prosseguir e continuar pacífico,
plenamente transparente, em instalações a serem supervisionadas, nos termos da
lei, pela AIEA.
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