6/8/2013, [*] Mark Weisbrot, The Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido
na Quebrada dos Muquifos na Vila Vudu:
O argumento desenvolvido no artigo abaixo serve também como luva, ao golpismo
“midiático” em que está empenhado o facinoroso governador Alckmin, em São Paulo,
Brasil.
Alckmin
está usando a imprensa-empresa udenista/venal paulista para fazer-crer que não
saberia de coisa alguma do mar de lama que cobre todo o governo do Estado de São
Paulo, desde os anos de Mário Covas, no escândalo que as empresas Siemens e
Alstom decidiram, afinal, expor ao Ministério Público e ao CADE.
Alckmin
pôs-se a esbravejar, pelos jornais, que “exigirá” acesso aos documentos do
processo. Não tem direito de exigir porcaria nenhuma de documentos – como o CADE
respondeu-lhe na lata e muito bem, resposta agora já plenamente confirmada pela
justiça.
Nem
por isso Alckmin -- tucano tão facinoroso que conseguiu varrer de seu caminho
até o tal de Cerra, o hiper arapongueiro mór, o homem dos dossiers inventados e da chantagem
desbragada -- calou o bico.
Alckmin
é bandido perigoso. Mas não seria tão perigoso e tão danoso ao Estado e ao
Brasil, se não tivesse, a seu serviço, a hiper imundíssima empresa-imprensa de
São Paulo e do Rio de Janeiro e porque não dizer do
Brasil...
Os
EUA têm hoje gasto militar mais alto, em valores corrigidos pela inflação, do
que no pico da avançada da Guerra Fria de Reagan, durante a Guerra do Vietnã e a
Guerra da Coreia. Parecem viver em estado de guerra permanente e – como acabamos
de descobrir – de espionagem massiva pelo governo, com vigilância sobre os
próprios norte-americanos. Isso, apesar de já não haver ameaça real grave contra
a segurança física dos norte-americanos.
Desde
o 11/9/2001, só 19 pessoas morreram em atos de terrorismo nos EUA; e nenhuma
dessas mortes teve qualquer relação com terroristas estrangeiros. Os EUA
tampouco enfrentam “inimigos do estado” que impliquem ameaça militar
significativa contra o país – não há, no mundo, estado que possa ser
classificado como “estado inimigo” dos EUA.
Keane Bhatt |
Uma
das causas dessa profunda desconexão é que praticamente toda a imprensa-empresa
e as mídias de massa nos EUA vivem de oferecer imagem profunda e grosseiramente
distorcida do que é hoje a política externa dos EUA.
A “notícia” é que a política
externa dos EUA sempre é muito mais benévola e justificável do que a realidade
do império que a maior parte do mundo conhece. Em estudo bem fundamentado,
fartamente documentado e publicado pelo North American Congress on Latin America
(NACLA), Keane Bhatt nos mostra, com
riqueza de detalhes, como o simulacro “jornalístico” é construído.
Bhatt concentra-se num programa
popular e interessante exibido pela rede National Public Radio (NPR), “This
American Life” [Essa vida norte-americana], [Programa do dia 2/8/2013, em
inglês (NTs)] com especial atenção a um
dos episódios, que recebeu o Peabody Award
[Programa da
rádio em 27/7/2013 (NTs)].
O Peabody Award, para realização de alta qualidade no jornalismo eletrônico, é prêmio de muito prestígio – o que torna ainda mais relevante o caso estudado.
O Peabody Award, para realização de alta qualidade no jornalismo eletrônico, é prêmio de muito prestígio – o que torna ainda mais relevante o caso estudado.
Descoberta do massacre da vila de Dos Erres na Guatemala |
Aquela
edição do programa trata de um massacre, na Guatemala, em 1982. Apresenta
impressionantes depoimentos de testemunhas oculares de um horrendo massacre de
praticamente todos os moradores da vila de Dos Erres, mais de 200 pessoas. As
meninas e as mulheres foram violentadas, antes de serem assassinadas; os homens
foram assassinados a tiros ou esquartejados com serras; e muitos, inclusive
crianças, foram jogados – vários ainda vivos – num poço abandonado, que acabaria
sendo a sepultura comum deles todos.
O programa de rádio leva o ouvinte a acompanhar uma heróica investigação do crime – o primeiro desse tipo, naquela região, em que os assassinos foram processados e condenados. E, no final, ainda se ouve o depoimento emocionante de um sobrevivente que tinha três anos à época do massacre. Trinta anos depois, já vivendo em Massachusetts, esse sobrevivente afinal descobre as próprias raízes e o pai biológico, como um dos resultados daquela investigação. O pai perdeu a esposa e os outros oito filhos, mas sobreviveu, porque, por acaso, não estava na cidade no dia do massacre.
O programa de rádio leva o ouvinte a acompanhar uma heróica investigação do crime – o primeiro desse tipo, naquela região, em que os assassinos foram processados e condenados. E, no final, ainda se ouve o depoimento emocionante de um sobrevivente que tinha três anos à época do massacre. Trinta anos depois, já vivendo em Massachusetts, esse sobrevivente afinal descobre as próprias raízes e o pai biológico, como um dos resultados daquela investigação. O pai perdeu a esposa e os outros oito filhos, mas sobreviveu, porque, por acaso, não estava na cidade no dia do massacre.
Efraín Rios Montt |
O
roteiro não esconde que esse foi apenas um dentre muitos massacres do mesmo
tipo:
Aconteceu
em mais de 600 vilarejos, com dezenas de milhares de mortos. Uma Comissão da
Verdade conseguiu descobrir que mais de 180 mil guatemaltecos foram mortos ou
resultaram desaparecidos em massacres perpetrados pelo próprio governo da
Guatemala.
Mas
há um detalhe que, esse sim, o programa omite cuidadosamente: o papel dos EUA no
que uma Comissão da Verdade da ONU, em 1999, definiu, em termos jurídicos, como
“genocídio”.
A
ONU condenou especificamente o papel de Washington, e o presidente Clinton teve
de pedir desculpas públicas por aquele papel – a primeira vez, e, que eu saiba,
a única vez, que algum presidente dos EUA teve de pedir desculpas por
participação dos EUA em um genocídio.
A
ONU comprovou que os EUA forneceram armas, treinamento, munição, cobertura
diplomática e política e outros tipos de cobertura e de apoio aos criminosos
assassinos em massa: tudo fartamente documentado; e o caso recebeu ainda mais
atenção por causa do recente julgamento do militar e ex-ditador general Efraín
Ríos Montt, que governou a Guatemala em 1982-83.
Pedro Pimentel |
(Como Bhatt observa em seu
estudo, o programa diz que a embaixada dos EUA ouvira relatos de massacres
durante aqueles anos, mas “não lhes deu atenção”. No mínimo, o programa falseia
os fatos: há inúmeros telegramas que mostram que a embaixada estava recebendo
farta e clara informação sobre o que estava acontecendo).
De
fato, um dos soldados que participou do massacre de Dos Erres, Pedro Pimentel,
condenado mais tarde a 6.060 anos de prisão, foi resgatado por avião e levado,
um dia depois do massacre, para a Escola das Américas, a instalação militar
norte-americana de treinamento, onde foram adestrados alguns dos principais e
mais nefandos ditadores e criminosos violadores de direitos humanos da região.
É
espantoso que um dos mais sanguinários genocidas do pós-IIa. Guerra Mundial
tenha sido ajudado, apenas algumas horas depois de cometido o massacre, e levado
para território dos EUA para ser protegido, sem que nenhum jornal, rede de
televisão ou de rádio jamais noticiasse o fato.
Allan Nairn |
O jornalista investigativo Allan
Nairn entrevistou um soldado guatemalteco em 1982, que narrou como ele e
seus camaradas massacraram aldeias inteiras, como em Dos Erres. Apesar disso, a
grande imprensa-empresa norte-americana ignorou a entrevista, o que permitiu que
Ronald Reagan promovesse Ríos Montt como “homem de grande integridade e
comprometimento pessoais”. Por tudo isso, deve-se estranhar muito as omissões na
narrativa do episódio premiado de “Essa vida norte-americana”.
É
bem claro na fala de Ira Glass, apresentador do episódio, que ele conhecia bem o
papel dos EUA no genocídio na Guatemala. Nos anos 1980s, parece que chegou a
viajar à América Central, e era jornalista muito ativo na luta contra guerras
financiadas pelos EUA e respectivos crimes de guerra naquela região. Em
correspondência por e-mail com Bhatt, ele reconhece que “talvez não
tenhamos agido corretamente” ao omitir qualquer informação sobre o papel dos EUA
naquele genocídio.
Ira Glass |
É
pouco, como avaliação crítica, mas é avaliação muito significativa. Permite
concluir que, do ponto de vista da grande imprensa-empresa norte-americana, para
programa radiofônico transmitido em inglês para todo o território dos EUA, essa
semiverdade, essa vasta omissão de fatos conhecidos, seria tudo o que os
cidadãos norte-americanos precisariam saber sobre aquele genocídio.
Nem
estou culpando Glass. É provável que, se tivesse destacado o papel dos EUA
naquele genocídio e se tivesse questionado alguns dos oficiais e funcionários
dos EUA responsáveis por aquela ação, jamais tivesse obtido autorização para
distribuir o programa pela rádio pública. E com absoluta certeza o programa
jamais teria recebido o Prêmio Peabody.
Por
isso o programa e o prêmio são tão impressionante ilustração de como a censura e
a autocensura operam na imprensa-empresa dos EUA. Demonstra, no plano micro,
algo que testemunhei incontáveis vezes nos últimos 15 anos de conversas com
jornalistas sobre esses temas. Os jornalistas têm ideia bem clara de quanto de
verdade podem noticiar. Encontrei inúmeros bons jornalistas que tentaram
ultrapassar esses limites e alguns até conseguiram – mas, regra geral, não
duraram muito.
Scott Wilson |
Scott
Wilson, que foi editor de internacional do Washington Post e cobriu a
Venezuela durante o golpe (que teve vida curta) contra governo democraticamente
eleito na Venezuela em 2002, disse, numa entrevista, que “os EUA tiveram
envolvimento” naquele golpe. Pois essa importante informação jornalística jamais
apareceu publicada no Post, nem em qualquer outro veículo da grande
imprensa-empresa nos EUA, apesar da abundância de documentos e de provas de que,
sim, o governo dos EUA participara ativamente do golpe. Mais uma vez, pode-se
dizer que esse detalhe era o mais fundamentalmente importante da história, para
o público norte-americano – sobretudo porque desempenhou papel decisivo no
envenenamento de todas as relações entre Washington e Caracas ao logo de toda a
década e teve provavelmente impacto significativo nas relações dos EUA com todo
o continente sul-americano. Mas, como na história do massacre de Dos Erres, o
papel dos EUA naquele crime não é “mpublicável”.
O
mesmo vale para o papel dos EUA no golpe que destruiu a democracia em Honduras
em 2009. Os consideráveis esforços feitos pelo governo Obama para apoiar e
legitimar o governo golpista não foram considerados “noticiáveis”... pelos
jornalistas norte-americanos. (Bhatt também é roteirista de outro episódio da
série “Essa vida americana”, no qual o golpe apoiado pelos EUA ficou fora da
história da qual deveria ser, de fato, o evento determinante). E também nesse
caso, a participação decisiva dos EUA em mais um Golpe de Estado não foi
considerada noticiável na imprensa-empresa norte-americana.
Que
cara teria a política externa dos EUA, sua política militar e a chamada
“segurança nacional” dos EUA, se a imprensa-empresa realmente noticiasse os
fatos determinantes reais, conhecidos e comprovados dessas políticas?
Com
certeza, diminuiria muito o número de esquifes de soldados norte-americanos
enterrados longe de casa e, também, dos que voltam para serem entregues às
famílias. E tampouco os EUA estariam cortando os programas de comida para os
pobres, ou de hospitais para velhos desamparados... Só para conseguir continuar
a manter o mais inacreditavelmente ensanguentado orçamento militar que o mundo
jamais conheceu.
[*] Mark Weisbrot é um economista americano,
colunista e co-diretor, com Dean Baker, do Centro para Pesquisas Econômicas e de
Políticas Públicas (Center for Economic
and Policy Research - CEPR) em Washington. Como comentarista, ele contribui
em publicações como o New York Times,
o The Guardian e a Folha de S.
Paulo. Como economista, Weisbrot criticou a
privatização do sistema norte-americano de seguridade social e foi um grande
crítico da globalização e do FMI. Os trabalhos de Weisbrot a respeito dos países
latino-americanos (incluindo Argentina, Bolívia, Brasil, Equador e Venezuela)
atraíram interesse nacional e internacional.
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