segunda-feira, 18 de junho de 2012

Juros e economia desestruturada


Adriano Benayon* 14 de junho de 2012

I. Juros

1. Fez-se grande alarde da suposta pressão da presidente para que os bancos reduzissem um pouco as taxas de juros, acompanhando as baixas recentes na taxa SELIC, determinadas pelo Banco Central para os títulos do Tesouro Nacional.    

2. Houve polêmica, com alguns enaltecendo a iniciativa governamental, e a grande mídia veiculando, junto com os usuais economistas a serviço dos bancos, as tradicionais advertências de que seria perigoso diminuir as taxas de juros. Na essência, tudo não passou de teatro.

3. O fato é que os juros praticados no Brasil são os mais usurários do Planeta, e as  finanças da grande maioria dos brasileiros vai mal, pois os devedores perdem, cada vez mais, a capacidade de quitar as prestações.

4. Em suma, atuais taxas de juros são incompatíveis com a manutenção do volume do crédito no País. Ou seja: se elas não baixarem, grande número de pessoas físicas e  empresas não-oligopolistas não mais terão condições de tomar crédito, e os bancos verão cair muito seu volume de negócios.

5. Ademais, os bancos foram compensados pelo BACEN com a diminuição dos depósitos compulsórios  sobre os depósitos a prazo. Além disso, o BACEN permite-lhes elevar em 10% (R$ 18 bilhões) o volume de seus financiamentos de automóveis e veículos comerciais leves.

6. Assim, o governo prossegue privilegiando dois dos setores poderosos, ambos controlados por grupos concentradores, o dos bancos - em que a participação estrangeira segue crescendo - e transnacionais estrangeiras montadoras de veículos.

7. O governo petista continua favorecendo essas montadoras com repetidas baixas e isenções de impostos, como voltou a fazer, há pouco. Parece querer, de qualquer maneira, fazer com que essas transnacionais prossigam remetendo ao exterior lucros oficiais (sem falar nos disfarçados) em montantes recordes, o último dos quais foram os US$ US$ 5,58 bilhões em 2011, com aumento de 36,1% em relação a 2010.

8. Estimula, de todos os modos, a compra de automóveis, enquanto a infra-estrutura de transportes públicos urbanos é  cada vez mais insatisfatória, as rodovias também se deterioram e inexistem transportes ferroviários e aquaviários. Desse jeito, os veículos automotores, sonho de consumo, se atravancam nas vias urbanas e, quando chegam ao destino, começa o sofrimento para estacionar, acompanhado de tarifas extorsivas.

9. Com efeito, como temos demonstrado em vários artigos, as transnacionais e uns poucos  grandes grupos locais, em geral associados a elas, comandam a política econômica do Brasil, há muitos decênios.   Isso é verdade tanto em relação à  chamada economia produtiva, como no que se refere à financeira, como ilustram, entre outros, estes  instrumentos destinados a assegurar que a economia brasileira seja sangrada em favor de banqueiros estrangeiros e locais:

a) juros reais elevados;
b) prioridade a alocar recursos para o “superávit primário”;
c) a emenda constitucional da Desvinculação das Receitas da União (DRU), pela qual se desviam vultosíssimos recursos tributários, inclusive os da seguridade social, para o serviço da dívida;
d) a Lei de “Responsabilidade” Fiscal;

10. Muita gente tem a ilusão de que, nos últimos anos, houve mudanças significativas na redistribuição da renda, mas isso só se deu em relação a estratos marginalizados pelo sistema produtivo. Este prossegue oferecendo poucos empregos em geral e ainda mais raros quando se trata dos mais qualificados e bem remunerados, a não ser no topo dos executivos financeiros.

11. A redistribuição que se faz é a recomendada pelo Banco Mundial e visa ao objetivo irrealista de manter acomodados os mais destituídos. De outra parte, praticamente nada mudou quanto ao privilegiamento aos concentradores financeiros mundiais, como exemplifiquei acima nos parágrafos 6 a 9.

12. Alterou-se somente a retórica, supostamente mais à esquerda em relação a governos anteriores, o que serve para alimentar a oposição por parte da grande mídia e montar a encenação de que as instituições políticas oferecem alguma alternativa por ocasião das eleições.

II – Camisa de força estrutural

13. O sistema de poder imperial amarrou a política econômica “brasileira” numa camisa de força, uma vez que estabelece a meta de inflação associada à ideia (falsa) de que os juros funcionam contendo a alta dos preços.

14. Acontece que houve, ao longo dos últimos decênios, acentuada decadência estrutural da economia, causada pela desnacionalização. A desindustrialização, associada também à abertura ao comércio mundial, é apenas uma das facetas dessa decadência.

15. Isso implica cada vez maior dependência de produtos importados, especialmente os de maior conteúdo tecnológico e maior valor agregado.

16. A população mal alimentada ou incorretamente alimentada, além de explorada por carteis  transnacionais nas sementes, fertilizantes e alimentos industrializados, submetida a stress por dificuldades financeiras, transportes precários, precariedade nos empregos etc. é grande consumidora de exames médicos em aparelhos importados e enorme quantidade de drogas (chamadas de remédios) cujos insumos principais são  importados. 

17. Além disso, impostos altos, tarifas absurdas, como a dos pedágios indecentes nas rodovias paulistas, as da eletricidade privatizada etc. Ademais,  os  produtos industriais encontrados no mercado são dominados,  na maioria, por carteis e empresas em oligopólio.

18. Assim, tanto a produção local, nas mãos das transnacionais, como as importações têm preços elevados, e tudo isso leva a pressão inflacionária. Então, a pretexto de conter essa pressão, os juros no Brasil têm-se mantido incomparavelmente altos (são atualmente negativos na Europa, EUA e outros).

19. Fundos e outros aplicadores estrangeiros tomam, no exterior, recursos a juro zero para aplicá-los no Brasil, em títulos públicos e outros instrumentos financeiros. Isso faz o câmbio do real sustentar-se em patamar alto e tornar menos competitiva a produção realizada no Brasil. Junto com a decadência estrutural, isso causa, nas contas externas do País, déficit de transações correntes dos mais altos do mundo, em proporção do PIB.

20. Portanto, o modelo econômico leva forçosamente a crises e assegura que o País não realize o tão falado e jamais alcançado desenvolvimento. É o modelo da dependência, adotado desde meados dos anos 50 e radicalizado, a partir de 1990, com a adesão subalterna à globalização dirigida pelas potências imperiais.

Adriano Benayon* é Doutor em Economia e autor de “Globalização versus Desenvolvimento”

Um comentário:

  1. (Comentário de Artur Rosa Teixeira, enviado por e-mail e postado por Castor)

    Mais um artigo esclarecedor do Economista Brasileiro Adriano Benayon, cuja leitura nos mostra à evidência de como o Brasil, embora governado por um partido que se reclama da Esquerda, desde há 12 anos, o PT, continua na senda da entrega do país aos grandes interesses internacionais, tal como os antecessores.

    Vejam como a receita de usurpação do sistema bancário é o mesmo que se aplica em Portugal, apenas com a diferença que o "País Irmão", pela sua riqueza endógena, não precisava disso...

    Daí que a crise, de que tanto nos falam, não passa de um expediente para nos espoliar.

    Lá não é a crise, contudo os métodos e a propaganda é a mesma.

    Mais, vejam como não passa de um mito o Desenvolvimento Econômico do Brasil, que tanto elogio recebe deste lado do Atlântico.

    Num país de cujo Orçamento de Estado (Federal) quase 40% vai para os bancos e, embora o discurso oficial se focalize na pobreza, esta apenas recebe cerca de 1% para a bolsa de família, uma esmola envenenada que não liberta os pobres da pobreza, e à volta de 6% para a Saúde e o Ensino.

    Nada disto é do conhecimento geral...

    Pudera, quem mais lucra são os "mercados" e estes são hábeis na propaganda e contam com muitos servidores apátridas...

    Quanto ao PT, obcecado com o Poder pelo poder, mandou às urtigas a sua ideologia, que na oposição, era um dos mais contestatários ao Poder do Capital Privado e ao Imperialismo Yanque, de que é agora um aliado conveniente.

    Não admira pois os incentivos à indústria automóvel. No tempo do sindicalismo de Lula da Silva, este pressionava o Governo Militar para liberar os preços dos automóveis em consonância com os desejos dos patrões da indústria automobilística.

    O pretexto era proporcionar melhor remuneração do operariado...

    Na verdade defendia-se os interesses do Capital Estrangeiro que operava na região do ABC, em São Paulo. Daí também, que à falta de verdadeiras causas, se engaje nas propostas fracturantes, como o aborto, a liberdade de gênero, ecologia “babaca” que defende a Natureza excluindo o homem, etc. que funcionam como “faits divers”, distraindo a opinião pública para que não se aperceba do essencial, ou seja, a contínua drenagem dos recursos naturais e activos brasileiros para a "burra" dos piratas internacionais, ou se entretêm a julgar o passado recente excluindo os crimes lesa pátria praticados por alguns membros que hoje formam o seu governo através de uma pseudo "Comissão da Verdade". Haja decoro!

    Abraços.
    Artur

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