Publicado em 14/06/2012 por Mair Pena Neto*
Tenho
acompanhado, com interesse, a Eurocopa, que se disputa na Polônia e na Ucrânia,
mas não deixo de me sentir incomodado pela diferença de tratamento que os
próprios brasileiros, imprensa incluída, dão à competição européia em comparação
com a Copa América, que reúne as seleções da América do Sul e, desde 1993, o
México e mais um convidado da América Central ou do Norte.
Não
nego o nível de importância e, principalmente, a dimensão da Eurocopa, que,
devido ao grande número de países do continente, permite uma competição com 16
seleções, divididas em quatro grupos, o que seria o tamanho ideal até para uma
Copa do Mundo. A América do Sul tem apenas 10 países e, mesmo com os dois
convidados, não pode ter um torneio tão grande.
Mas
como tamanho não é documento, a importância das duas competições se equivale, e,
se perdemos em alguns aspectos, ganhamos em outros. Curiosamente, um dos
primeiros pontos a nosso favor é a tradição. A Copa América é muito mais antiga
que a Eurocopa, apesar do início do futebol organizado no velho continente. Os
países sul-americanos se enfrentam desde 1916, enquanto os europeus só começaram
a disputar um torneio entre seleções em 1960.
Essa
longevidade da Copa América, inicialmente disputada a cada ano, proporcionou a
realização de 43 edições, ricas em histórias. O Uruguai ,
sempre pioneiro, assim como na Copa do Mundo, ganhou as duas primeiras edições
(1916 e 1917), e a competição de 1918, prevista para o Rio de Janeiro, não
aconteceu pelo surto da gripe espanhola, que matou milhares de pessoas,
inclusive Otávio Egídio, que jogara no primeiro jogo internacional da seleção
brasileira, como conta Ivan Soter, em Enciclopédia da
Seleção.
O
adiamento retardou em um ano a inscrição do nome do Brasil na taça, o que
aconteceu em 1919, no torneio disputado no novo estádio do Fluminense, então o
maior da América Latina, com capacidade para 25 mil pessoas. Segundo os cálculos
da época, essa capacidade só seria atingida em 30 ou 40 anos, mas no jogo de
abertura o estádio estava lotado, sem contar os que não conseguiram entrar em
assistiram ao jogo na pedreira da rua Pinheiro Machado.
Brasil,
Argentina e Uruguai protagonizaram muitas batalhas na Copa América, muitas vezes
descambando para a pancadaria, e criaram uma rivalidade que transcende o
continente pelo sucesso do seu futebol. A supremacia brasileira nas Copas do
Mundo não se repete na Copa América, na qual os uruguaios são os maiores
vencedores, com 15 títulos, seguidos pelos argentinos, com 14. O Brasil vem em
terceiro, com oito títulos, quatro deles nas edições mais recentes, excetuando a
última, vencida pelo Uruguai.
Também
pelos craques em campo, a Copa América, mesmo em menor escala, rivaliza e,
muitas vezes, supera, a Eurocopa. Uma competição sul-americana hoje com Messi,
Neymar e Forlán não perderia para a atual edição da Eurocopa. Alguns poderiam
argumentar que a Copa América se reduz a Brasil, Argentina e Uruguai. É verdade
indiscutível, já que são as principais potências esportivas da América do Sul.
Mas a Eurocopa não é muito diferente. A Alemanha é a maior vencedora, seguida
por França e Espanha. A poderosa Itália só venceu uma vez, e existem outros
títulos isolados, que podem ser comparados às vitórias de Colômbia e Bolívia,
por exemplo.
Nas
competições entre seleções, a Europa não pode ostentar o poderio econômico que
leva para seus clubes os melhores jogadores do mundo. Com isso, entram em campo
os jogadores europeus. E se vemos grandes jogos, como Espanha e Itália, também
assistimos a peladas, como Polônia e Grécia.
O
propósito aqui não é desmerecer a Eurocopa, uma excelente competição, muito bem
organizada e, sobretudo, propagandeada. Mas chamar a atenção para a necessidade
de se valorizar mais a nossa competição continental, a partir daqui, para não
voltarmos no tempo e reeditarmos o complexo de vira-lata, superado desde a
gloriosa conquista da Copa de 1958 na Suécia.
Mair Pena Neto*
é um jornalista, carioca e trabalhou em O Globo, Jornal do Brasil, Agência
Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de
economia.
Enviado por Direto
da Redação
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