21/6/2012, Pepe Escobar,
Asia Times Online –The Roving
Eye
Traduzido pelo pessoal da
Vila Vudu
Pepe Escobar |
Num movimento
ousado, do qual John Le Carré muito se orgulharia, Julian Assange, o
superstar
de
WikiLeaks, entrou no prédio da Embaixada do Equador em Knightsbridge, centro de Londres, pediu
asilo político, nos termos da Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU
e detonou mais uma tempestade internacional. (...)
À primeira vista, a
coisa toda é só... sexo. Semana passada, a Corte Suprema da Grã-Bretanha
rejeitou, em última instância, o recurso de Assange contra a extradição para a
Suécia. Estocolmo o quer lá, para ser interrogado em processo no qual foi
acusado de ter estuprado uma mulher e agredido sexualmente uma segunda mulher,
em agosto de 2010.
Julian & as
tietes periguetes [orig.
Julian's groupies
from hell]
O caso dos suecos
contra Assange clama aos céus escandinavos – estrelando uma Procuradora e
conhecida odiadora de homens (Marianne Ny) e duas tietes periguetes: uma
vingativa e ultra manipuladora (Anna Ardin), a outra do tipo tímida (Sofia
Wilen), e ambas mantiveram intercurso sexual consensual com Assange.
Resumo da ópera:
Ardin decidiu vingar-se de Assange – que trocou os favores sexuais de Ardin
pelos de Wilen, mais jovem que Ardin. Foi Ardin quem convenceu Wilen a
apresentar queixa à polícia, acusando Assange de tê-la agredido sexualmente; e
levou Wilen a uma delegacia de Polícia.
Wilen ainda estava
sendo interrogada, quando uma policial (mulher) telefonou à Procuradora (mulher)
e obteve dela uma ordem de prisão (in absentia) contra Assange. O fato
conhecido de a Procuradora ter emitido uma ordem de prisão sem ler a queixa
(fosse queixa de Wilen, fosse queixa de Ardin, fosse queixa das duas) – prova
que não estamos assistindo a filme
noir
sofisticado à moda
do escandinavo Stieg Larsson; contra Assange, é pornochanchada.
Tudo aconteceu numa
noite de 6ª-feira. No sábado pela manhã, um tabloide sueco, direitista à moda
dos tabloides de Murdoch, Expressen, publicou uma foto de Assange,
primeira página; e a manchete: “Duplo Estuprador”.
Anna Ardin (D) e Sofia Wilen (E) |
Documentos da
polícia que vazaram informam que Wilen estava desesperada; não queria acusar
Assange de tê-la estuprado. O namorado de Wilen, norte-americano, explicou que o
problema era que Wilen sempre fora super, ultra, mega paranoica sobre fazer sexo
sem proteção.
E Ardin contou a
outra policial (mulher), em entrevista por telefone, que o sexo com Assange fora
consensual – mas que não teria sido, de modo algum, se ela soubesse que Assange
não estava usando camisinha. A anotar, que Ardin só se lembrou de sentir-se
ofendida ou ameaçada pela ausência de camisinha depois de, digamos, várias
vezes: o chamado intercurso não aconteceu só uma vez nem foi “ficada” casual de
uma noite-e-tchau.
Decidida a impedir
que WikiLeaks armasse seu QG na Suécia, a sórdida direita sueca não economizou
golpes. Foi ajudada por ninguém menos que Karl Rove – que trabalhara na
assessoria do primeiro-ministro sueco Fredrik Reinfeldt, conhecido como “o
Reagan sueco”, por dois anos.
Depois de já ter
ameaçado Assange para que destruísse absolutamente todos os arquivos de
WikiLeaks onde houvesse “segredos” militares, diplomáticos e de inteligência dos
EUA, o Pentágono pouco se preocuparia com a coisa virar chantagem da mais suja,
ou qualquer tipo de sórdida manipulação dos fatos.
O Pentágono está
decidido a pegar Assange, custe o que custar. Para todas as finalidades
práticas, já há acusação “formal” contra ele, em processo secreto. É o próximo
Bradley Manning – breve numa tela próxima de você, em Imax 3D.
E também encenarão sessão de grande júri.
Bradley Manning |
Isso, depois de um
porta-voz do Pentágono, ao vivo e para quem quisesse ouvir, já ter descartado o
respeito à lei:
“Se fazer a coisa certa não basta
no caso deles [WikiLeaks], veremos que outras alternativas nos restam para
obrigá-los a fazer a coisa certa”[1].
Passagem só de ida
para Quito,
please
Assange tinha prazo
até a 5ª-feira da próxima semana para impetrar recurso, na Corte Europeia de
Direitos Humanos em Strasbourg, contra a decisão da corte britânica. As
autoridades britânicas já haviam dito que, se nada obtivesse, Assange seria
deportado para a Suécia até a meia noite de 7/7/2012. Antes de decidir pelo
movimento rumo ao território do Equador, os advogados devem ter considerados as
(sombrias) possibilidades restantes.
Assange foi preso e
libertado sob fiança (mais de US$370 mil dólares, arrecadados por seus
apoiadores) na Inglaterra, desde o outono de 2010. Permaneceu em prisão
domiciliar desde então, numa casa de campo em Suffolk, cujo proprietário,
Vaughan Smith, é fundador do Club
Frontline, em Londres; tem de se apresentar uma vez por dia à Polícia; e tem
de usar uma tornozeleira de monitoramento eletrônico.
Assange explicou,
em declaração, que estava pedindo asilo político porque seu país de nascimento,
a Austrália – nas palavras da primeira-ministra Julia Gillard – declarara,
oficialmente, que não mais lhe garantiria proteção; na Suécia, “os mais altos
funcionários do governo têm-me atacado abertamente”; e nos EUA “estou sendo
acusado de haver cometido crimes políticos que são puníveis com pena de
morte”.
Julian Assange |
O que vem depois
disso é a matéria de que se faz a fama de John Le Carré. Assange estará agora
protegido de ser extraditado? Dado que violou as condições da prisão
domiciliar... Londres pode tentar prendê-lo? O que fará a Agência Contra o Crime
Organizado Grave [orig.
Serious Organized
Crime Agency (SOCA)] na Inglaterra – à
qual compete executar os Mandados Europeus de Prisão – nesse quadro de grave
turbulência política? Como Assange sairá da embaixada e entrará num avião que o
leve a Quito, se infringiu as regras da prisão domiciliar e tem contra ele um
mandado de extradição a ser executado?
Imediatamente, foi
iniciada também campanha organizada de difamação contra o Equador em toda a
imprensa-empresa, pode-se dizer, do planeta. Dentre outras coisas, já disseram
que “menos de um terço da população equatoriana tem acesso à internet”. Correa
já está sendo apresentado como besta fera, ainda pior que Hugo
Chávez:
“O pedido de asilo pode ajudar
Correa a polir sua reputação de desafiante provocador no relacionamento entre
nações latino-americanas em desenvolvimento e os EUA. Foi o papel de agente
anti-imperialista desempenhado até aqui, com grande talento histriônico, pelo
presidente Hugo Chávez da Venezuela. Agora, com Chávez doente de um câncer,
Correa já vê espaço para um novo líder. Para muitos, Correa apressa-se a tentar
ocupar o espaço de Chávez”[2].
MRE do Equador - Ricardo Patiño |
Segundo o Ministro
de Relações Exteriores do Equador, Ricardo Patiño, Assange escreveu pessoalmente a
Correa, pedindo-lhe asilo político. O quanto poderia esperar, de Correa, em
termos de solidariedade intelectual, foi algo que Assange teve oportunidade para
aferir, durante entrevista absolutamente aberta e sem barreiras, à qual o mundo
assistiu pela rede
Russia
Today. [3]
Durante os contatos
para organizar a entrevista, levada ao ar em teleconferência, o asilo político
foi, realmente, oferecido a Assange (mas não diretamente pelo próprio
presidente).
Não há dúvidas de
que Assange não é fugitivo. Tem absoluto direito de buscar asilo político
baseado numa violação de direitos humanos – nesse caso, pela real possibilidade
de ser extraditado sob condições de risco absoluto e ameaça à vida. A Suécia
jamais ofereceu qualquer garantia de que Assange não viesse a ser extraditado
para os EUA.
Se Assange fosse
chinês, cego e se chamasse Chen Guangcheng – e, se, além disso, denunciasse
excessos chineses – toda o hipócrita ocidente atlanticista estaria desfilando em
passeatas de solidariedade à sua frente. E, equanto isso, “Dábliu” (Bush),
“Dick” (Cheney) e “Rummy” (Rumsfeld) – Os Três Patetas Assassinos –, destroem um
país inteiro, mas escapam da polícia e continuam por aí, em plena
liberdade.
Notas
dos tradutores
[1] 6/8/2010, The Guardian,
UK, David Battie em: “Pentagon
increases pressure on WikiLeaks to return military files”
[2] 21/6/2012, NYT Examiner,
Chis Spannos em: “Somaiya
Spins Assange Political Asylum Four Times, From Ecuador in Spotlight to London
Standoff”
[3] 22/5/2012, em redecastorphoto assiste-se ao vídeo da
entrevista, com texto transcrito e traduzido, em português, em: Assange
entrevista No. 6 – “Rafael
Correa , presidente do Equador”
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