7/4/2014, [*] Sergey Lavrov, Min. Rel. Exteriores
da Rússia, Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Sergey Lavrov, Ministro das Relações Exteriores da Rússia |
A crise
profunda e generalizada na Ucrânia é tema de grave preocupação para a Rússia.
Entendemos perfeitamente bem a posição de um país que se tornou independente há
apenas 20 anos e que ainda tem pela frente tarefas complexas na construção de
um estado soberano. Dentre elas, a busca de algum equilíbrio entre os
interesses de suas várias regiões, de povos que têm raízes históricas e
culturais diferentes, falam línguas diferentes e têm diferentes perspectivas
sobre o próprio passado e presente, e sobre o lugar futuro de seu país no
mundo.
Dadas essas
circunstâncias, o papel de forças externas deve ser ajudar os ucranianos a
proteger as fundações da paz civil e do desenvolvimento sustentável, que ainda
são frágeis.
A Rússia fez
mais que qualquer outro país para apoiar o estado ucraniano independente,
incluindo subsidiar por muitos anos a economia ucraniana mediante baixos preços
da energia. Em novembro passado, no início da atual crise, apoiamos o desejo de
Kiev, de consultas urgentes entre Ucrânia, Rússia e a União Europeia, para
discutir a harmonização do processo de integração. Bruxelas rejeitou
completamente a ideia. Essa atitude refletiu a linha perigosa e improdutiva já
tomada pela União Europeia e pelos EUA, há muito tempo. Tentavam já forçar a
Ucrânia a fazer uma dolorosa escolha entre leste e oeste, o que agravou as
diferenças internas.
Manifestantes pró-Rússia lotam a Praça Lênin em Donetsk, Ucrânia em 6/4/2014 |
Sem
considerar as realidades na Ucrânia, foi fornecido apoio massivo a movimentos
políticos que promoviam a influência ocidental, e isso foi feito em direta
violação da Constituição da Ucrânia. Foi o que aconteceu em 2004, quando o
presidente Viktor Yushchenko venceu um terceiro turno inconstitucional das
eleições, introduzido sob pressão da União Europeia. Agora, o poder em Kiev foi
tomado por vias não democráticas, mediante violentas ações de rua das quais
participaram diretamente ministros e outros altos funcionários dos EUA e de
países da União Europeia.
Afirmativas
de que a Rússia tivesse empreendido qualquer esforço para minar parcerias
dentro do continente europeu são falsas, não correspondem aos fatos. Ao
contrário, nosso país promoveu com constância um sistema de segurança igual e
indivisível na área euro-atlântica. Propusemos assinar um tratado para esse
efeito, e defendemos a criação de um espaço econômico e humano comum do
Atlântico ao Pacífico, que seria também aberto aos países pós-soviéticos.
Simultaneamente,
estados ocidentais, apesar de repetidamente garantir que não, promoveram
sucessivas ondas de expansão da OTAN, moveram a infraestrutura militar da aliança
para o leste e puseram-se a implementar planos de defesa antimísseis. O
programa da Parceria Ocidental da União Europeia está desenhado para amarrar
fortemente à Europa os chamados estados-foco, vedando-lhes a possibilidade de
cooperação com a Rússia.
Os esforços,
pelos que encenaram a secessão do Kossovo, hoje separado da Sérvia, e de
Mayotte, hoje separado de Comoros, para questionar a livre vontade dos
crimeanos só podem ser interpretados como flagrante manifestação de duplicidade
de padrões. Não menos estranha é a ação de fingir que não sabe que o principal
perigo a ameaçar o futuro da Ucrânia é que o caos gerado por extremistas e
neonazistas se espalhe.
Manifestação pró-Russia em Donetsk exige referendo igual ao da Crimeia |
A Rússia está
fazendo tudo que pode para promover a rápida estabilização na Ucrânia. Estamos
firmemente convencidos de que ela pode ser alcançada, mediante, dentre outros
passos: uma verdadeira reforma constitucional, que assegure os direitos
legítimos de todas as regiões da Ucrânia e responda às demandas da região
sudeste, de fazer do idioma russo a segunda língua oficial do estado; firmes
garantias de que o status de estado não alinhado da Ucrânia seja consagrado na
lei do país, consagrando assim o seu papel de elo de conexão numa arquitetura
de segurança indivisível para toda a Europa; e medidas urgentes para pôr fim às
formações armadas ilegais do Setor Direita e de outros grupos
ultranacionalistas.
Não estamos
impondo coisa alguma a ninguém. Apenas vemos que, se isso não for feito, a
Ucrânia continuará em espiral rumo à crise, com consequências imprevisíveis.
Permanecemos prontos a nos somar aos esforços internacionais que visam a
alcançar esses objetivos. Apoiamos o apelo feito pelos ministros de Relações
Exteriores de Alemanha, França e Polônia, para que seja implementado o acordo
de 21 de fevereiro. A proposta deles – de fazerem-se conversações Rússia-União
Europeia, com a participação da Ucrânia e de outros estados da Parceria
Ocidental, sobre as consequências de acordos de associação com a União Europeia
– corresponde à posição da Rússia.
O mundo de
hoje não é escola primitiva, na qual os professores distribuam castigos à
vontade. Declarações beligerantes, como as que se ouviram na reunião de
ministros da OTAN em Bruxelas, dia 1º de abril, não correspondem a demandas por
uma desescalada. A desescalada deve começar por desescalar-se a retórica. É
hora de pôr fim ao aumento infundado da tensão, e de voltar ao trabalho
conjunto, sério.
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[*] Sergey Viktorovich Lavrov (russo : Сергей
Викторович Лавров, nasceu em
21 de março de 1950) é diplomata e desde 2004 ocupa o cargo de Ministro das
Relações Exteriores da Rússia . Sua nomeação foi aprovada por dois presidentes
da Rússia , em 2008 por Dmitry Medvedev e em 2012 por Vladimir Putin. Antes
disso, Lavrov atuou na diplomacia como embaixador da Rússia à Organização das
Nações Unidas (1994-2004). Além de seu russo nativo, Lavrov fala inglês, francês e cingalês.
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