Francis Gurry |
Por Geraldine Juarez em 1 de março de 2011 | 17:00 h
Segundo Francis Gurry, Diretor da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, “a história do confronto entre o mundo clássico do copyright com o entorno digital tem sido mais uma história lamentável de resistência ludista do que um exemplo de empenho inteligente”.
Na semana passada, Francis Gurry – diretor da Organização Mundial da Propriedade Intelectual – se apresentou na Universidade de Queensland em Sydney, Austrália, numa conferência sobre o futuro das leis da propriedade intelectual.
A intervenção de Gurry se dá em meio à controvérsia em torno do ACTA – as iniciais em inglês de Acordo Comercial Anti-Falsificação – e do fato de que, apesar de ser um tratado de propriedade intelectual, foi intencionalmente negociado fora da instituição que a dirige. A boa notícia é que o diretor da OMPI pensa como a maioria das pessoas que já não está de acordo com a velha forma de se administrar os direitos da propriedade intelectual.
Especificamente, Gurry criticou o modelo institucional de criação de políticas públicas baseada na influência desproporcional (lobby) para criminalizar consumidores e responsabilizar intermediários (como provedores ou plataformas), assim como o modelo de tratados plurilaterais (problema que já havia sido abordado no ALT1040) que pretendem forçar mecanismos de auto-regulação. Gurry admitiu que a OMPI está limitada pela falta de vontade de muitos países para discutir o tema.
É muito importante que não esqueçamos que, além de todas as loucuras já propostas pelo ACTA, ele propõe a criação de uma instituição paralela à OMPI, chamada Comitê ACTA. O capítulo 5 do acordo estabelece as margens e metas para que este comitê se encarregue da implementação, operação, desenvolvimentos e emendas a este acordo. Em poucas palavras, se for aprovado, o Comitê pode alterar seu conteúdo para convertê-lo em uma arma legal ainda mais perigosa.
O Artigo 36 do Capítulo 5 estipula que o Comitê decidirá os procedimentos de consultoria por parte de grupos ou indivíduos não governamentais e para compartilhar informações com terceiros. O ponto sexto estabelece que as decisões para criar emendas no conteúdo devem ser tomadas e aprovadas por consenso dos integrantes do Comitê.
Finalmente, e em coerência com sua natureza opaca, o último ponto estabelece que as posições das partes consultadas devem ser confidenciais de acordo com as regras e procedimentos da Organização Mundial do Comércio. Os acordos plurilaterais de comércio gozam de sigilo, mas este é um tratado de propriedade intelectual e a razão pela qual os negociadores do ACTA negociaram por fora da OMPI, agora, é mais do que clara. Este é mais um argumento que converte o acordo em um candidato ao veto absoluto.
Enquanto supostos especialistas legais dizem que o modelo de propriedade intelectual tem que ser reforçado, o diretor da OMPI disse em seu discurso que:
“- Os velhos princípios de regulação da propriedade intelectual já não funcionam, particularmente para a internet [...] e podem colapsar o sistema inteiro de direitos de propriedade intelectual.
- Devemos reformular a pergunta que a maioria das pessoas vê ou escuta sobre o copyright e sobre a internet. As pessoas não reagem ao serem chamadas de piratas. De fato, alguns, como vimos, sentem-se orgulhosos. Temos que falar menos em termos de pirataria e mais em termos do risco da viabilidade financeira da cultura no século XXI.
- A história do confronto entre o mundo clássico do copyright com o entorno digital tem sido mais uma história lamentável de resistência ludista do que um exemplo de empenho inteligente.
- O copyright deve promover o dinamismo cultural, e não preservar interesses estabelecidos pelos negócios.”
Os argumentos contrários ao ACTA são infinitos, e o discurso de Gurry é um que dificilmente os políticos encarregados de tomar uma decisão quanto ao ACTA poderão ignorar.
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