segunda-feira, 19 de maio de 2014

Vladimir Putin: “Relações com a China são prioridade da política exterior russa”

18/5/2014, Entrevista de Vladimir PutinRT-TV en español
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Às vésperas de sua visita à China, o presidente russo, Vladimir Putin, concedeu entrevista aos principais veículos da imprensa russa. Aqui, a transcrição da conversa, de RT.

I. O que o senhor espera de sua próxima visita à China? Que resultados espera da Conferência sobre Interação e Medidas de Confiança na Ásia (na sigla em ing. CICA, Conference on Interaction and Confidence-Building Measures in Asia), que se celebrará em Xangai?

Vladimir Putin: Ampliar nossos laços com a China, nação amiga de confiança, é definitivamente prioridade da política exterior russa. Atualmente a cooperação bilateral está entrando numa nova etapa de ampla associação e cooperação estratégica.

Não me engano, se digo que vivemos o melhor momento de vários séculos da história da cooperação entre nossos países. Estou esperando um novo encontro com o presidente da China, Xi Jinping, com quem mantemos boa relação, tanto laboral como pessoal. Vamos discutir a implementação dos acordos alcançados e traçar novas tarefas para o futuro.

Estou certo de que as negociações proporcionam forte impulso para a cooperação bilateral em todos os âmbitos e facilitarão nossa coordenação na arena mundial. Os resultados da reunião e os planos para o futuro refletir-se-ão numa declaração conjunta dos líderes e num pacote de documentos a serem assinados durante a conferência.

Rússia e China estão promovendo ativamente a ideia de formar uma nova arquitetura de segurança e desenvolvimento, que seja estável, no Pacífico Asiático. É aliança que se baseará nos princípios da igualdade, repeito ao direito internacional, a indivisibilidade da segurança e na recusa ao uso da força como tal e como recurso de chantagem e ameaça. Hoje, essa tarefa tem máxima urgência. A próxima reunião de cúpula está centrada na realização dessa tarefa.

A Conferência sobre Interação e Medidas de Confiança na Ásia (na sigla em ing. CICA) é mecanismo de cooperação que já comprovou plenamente sua funcionalidade. Em torno desse mecanismo realizam-se trabalhos em âmbitos significativos para a região, como segurança, novos desafios e ameaças, economia, ecologia e assuntos de assistência humanitária. A Rússia participa ativamente nas atividades da CICA-Ásia.

Em meados de abril passado, os países membros da Conferencia aprovaram o Artigo sobre o Conselho de Negócios da CICA-Ásia, que foi elaborado a partir de uma iniciativa nossa. Tenho certeza de que, tão logo seja adotado,  se estreitarão os laços operacionais práticos entre os círculos empresariais dos países asiáticos. Durante a reunião de cúpula, há planos também para que seja assinado o memorando de mútuo entendimento entre os secretariados de la CICA-Ásia e da Organização de Cooperação de Xangai. Será mais um passo na direção de constituir na região um sistema de associação entre diversas organizações e fóruns.

II. A China está movendo-se na direção de implementa um ‘sonho chinês’, um grande renascimento nacional. A Rússia também se autoimpôs a missão de ressuscitar o próprio poder. Em sua opinião, como nossos países poderão cooperar para ajudar-se mutuamente na realização dessas tarefas? Que âmbitos se devem considerar prioritários, nesse contexto?

Vladimir Putin: O desenvolvimento das relações de amizade, boa vizinhança e associação correponde plenamente aos interesses mútuos de Rússia e China. Já não há qualquer problema político que possa afetar negativamente o desenvolvimento de cooperação ampla.

Conjuntamente, construímos uma interação verdadeiramente exemplar, que se deve converter em modelo para as grandes potências. É cooperação que se baseia no respeito aos interesses fundamentais de todos e no trabalho eficaz com vistas ao bem de todos os povos do mundo.

Rússia e China cooperam com êxito na arena mundial e coordenam os passos que dão para resolver problemas e crises internacionais. Nossas posições sobre os principais assuntos globais e regionais são ou extremamente próximas, ou perfeitamente coincidentes.

É gratificante que as duas partes estejam prontas a estreitar a cooperação. Tanto Moscou como Pequim entendem que os potenciais de nossos países estão longe de esgotados. Ainda há metas a alcançar. Como prioridades de nossa cooperação na fase atual, pode-se destacar o estreitamento de laços econômicos e a colaboração no âmbito das ciências e das altas tecnologias. Essa cooperação para o desenvolvimento de potenciais que beneficiam os nossos países muito ajudará também para a implementação das tarefas de desenvolvimento interno.

III. A cooperação russo-chinesa intensifica-se sempre, mas a economia global permanece assediada por incertezas. As economias emergentes encontram novos desafios – como a desaceleração da economia. Como Rússia e China podem ajudar-se mutuamente, para fazer frente a esses desafios? Como se pode garantir o crescimento estável do comércio e os investimentos mútuos?

Vladimir Putin: Ante as turbulências da economia global, é altamente importante reforçar os vínculos comerciais e econômicos que nos beneficiam mutuamente, além de aumentar os investimentos entre Rússia e China.

É fator significativo, não só para o desenvolvimento socioeconômico de nossos países, mas, também, é importante contribuição para a estabilização de todo o mercado global.

Atualmente, a China é líder indiscutível entre os parceiros comerciais da Rússia. Em 2013, o comércio bilateral aproximou-se dos 90 bilhões de dólares e esse não é o limite. Vamos aumentar nosso intercâmbio até 100 bilhões em 2015  e para 200 bilhões, em 2020.

Também estamos colaborando exitosamente em projetos energéticos. Estamos criando uma aliança energética estratégica. Estamos trabalhando num amplo projeto, de mais de 60 bilhões de dólares, para levar petróleo até a China, pelo oleoduto Skovorodinó-Mohe.

Os contratos de exportação de gás natural russo para a China estão adiantados, no processo de preparação e redação. A aplicação desses contratos implicará para a Rússia a diversificação de rotas de exportação de gás, e permitirá que nossos parceiros chineses reduzam seus graves problemas de escassez de energia e de segurança ecológica, o que se alcançará com o emprego de combustíveis “limpos”.

Ao mesmo tempo, estamos avançando também num trabalho para reduzir a dependência do comércio bilateral, dos mercados estrangeiros. Portanto, no marco de uma melhor cooperação comercial e econômica, estamos dedicando atenção especial aos setores de vanguarda, dentre eles o aumento da eficiência energética, a proteção ao meio ambiente, a produção de medicamentos e aparelhagem médica, desenvolvimento de novas tecnologias de informática, energia nuclear e indústria espacial.

Temos uma lista de projetos conjuntos em 40 áreas prioritárias com volume de inversões de cerca de 20 bilhões de dólares. Nessa lista também figura a indústria aeronáutica civil. Já se obteve um acordo sobre o desenvolvimento conjunto de aviões de fuselagem larga para longos percursos [para saber o que são, veem-se em: Jets de negocios de fuselaje ancho y de largo recorrido (NTs)]. Planejamos também a criação de um helicóptero pesado. Estou certo de que nossas empresas são capazes de produzir e fornecer produtos competitivos aos mercados mundiais.


Temos a intenção de melhorar consideravelmente a cooperação em investimentos, que ainda não atende todas as necessidades e possibilidades reais de nossos países. Há vários exemplos de projetos bem-sucedidos. Destaco a participação do capital chinês na reconstrução de um aeroporto na região de Kaluga e a construção, naquela mesma região, de fábricas de produção de componentes automotivos e materiais de construção.


Vemos muitas outras áreas promissoras para investimentos. Podem destacar-se vários ramos da engenharia, processamento de produtos agrícolas, mineração, desenvolvimento de infraestruturas de transporte e o campo da energia. Devemos fortalecer também a cooperação financeira, proteger-nos contra as flutuações das taxas de câmbio das principais divisas mundiais.

Por isso, estuda-se agora, para afinal começar a implementá-lo, afinal, o plano para aumentar os pagamentos recíprocos em moedas nacionais.

IV. Recentemente, a Rússia anunciou a criação de uma zona econômica especial em Vladivostok. Que papel, em sua opinião, a China pode ter na criação dessa zona e no desenvolvimento em geral das áreas do Extremo Leste da Rússia?

Vladimir Putin: O desenvolvimento econômico avançado da Sibéria e do Extremo Leste da Rússia é nossa prioridade nacional para o século 21. Nesse momento, já estão em andamento vários programas relacionados à modernização e ampliação das infraestruturas dessas regiões – tanto no campo dos transportes como do uso das energias e das infraestruturas sociais.

Apostamos na criação de territórios especiais de desenvolvimento econômico avançado nos quais se criará ambiente favorável ao investimento. Há condições de competitividade para que se organize uma produção manufatureira orientada para a exportação.

Para as novas empresas que se instalem nas zonas de desenvolvimento avançado, planejam-se várias subvenções: de descontos em impostos e taxas reduzidas, além de regime aduaneiro simplificado, incluindo portos livres. Um regime especial de uso dos terrenos e da conexão com elementos das infraestruturas. Atualmente, trabalhamos numa lei federal para essa normatização. Estamos criando institutos de desenvolvimento e determinando as áreas de priorização.

Uma dessas áreas, sim, está planejada para ser instalada em Vladivostok, na ilha Russki, onde foi realizada a reunião de Cúpula do Foro de Cooperação Econômica Ásia- Pacífico. Sem dúvida, estamos interessados em que o setor de negócios da China aproveite as oportunidades que estão sendo criadas e posicione-se como líder naquelas regiões.

Porque fato é que o desenvolvimento avançado do Extremo Oriente da Rússia é evento que beneficia tanto a Rússia, como a China.  O comércio não é nosso único interesse. É necessário formar alianças tecnológicas e industriais sólidas. Promover conjuntamente investigações científicas e relações humanitárias. Fixar as bases para o desenvolvimento estável e durável de nossas relações econômico-comerciais para o futuro. E, sim, o Extremo Oriente da Rússia pode e deve ser o ambiente natural para esses esforços.

V. Como o senhor avalia o nível atual de cooperação entre nossos países, na esfera humanitária e as perspectivas nessa área? Que projetos no marco dos anos “duplos” (dos dois países, dos dois idiomas, de turismo nas duas direções e de intercâmbio entre jovens) causaram-lhe impressão mais marcante?

Vladimir Putin: Os laços humanitários entre Rússia e China seguem a linha do desenvolvimento progressivo de todo o complexo de associação estratégica entre nossos países. Hoje em dia, têm alcançado melhores níveis que jamais antes. Nesse processo, têm destaque os grandes projetos em grande escala, dos chamados ‘anos nacionais’, ‘anos dos idiomas’ e ‘anos do turismo’ – que são projetos que mobilizam milhões de nossos concidadãos.

Atualmente estão em andamento uma série de eventos regulares: festivais culturais, semanas de cinema, esportes juvenis, festivais de estudantes, campos de férias para crianças e estudantes, fóruns de reitores de universidades e exposições de serviços educativos, dentre outras atividades. [...] Claro que não vamos dormir sobre os louros. O interesse dos jovens na história, na cultura e nas tradições dos povos de Rússia e China está crescendo. Este é um processo objetivo e tenemos a intenção de apoiá-lo plenamente, cada vez mais, no futuro.

VI. Em 2015, Rússia e China celebrarão o 70º aniversário da vitória sobre o fascismo. Que importância têm esses esforços conjuntos de Rússia e China, na resistência contra as tentativas que se veem para distorcer o resultado da IIª Guerra Mundial?

Vladimir Putin: É verdade que, hoje, enfrentamos todos os dias novas tentativas para distorcer, alterar, deformar os fatos da história ocidental recente.

Há quatro anos, Rússia e China emitiram declaração conjunta na ocasião do 65º aniversário do fim da IIª Guerra Mundial. Nossa opinião comum partilhada já era de que não se aceitará, de modo algum, que o resultado da luta que se travou na IIª Guerra Mundial seja “reinterpretado”; é absolutamente inaceitável. As consequências de qualquer revisão nesse campo seriam extremamente perigosas.

Prova disso são os atuais e muito trágicos eventos na Ucrânia – onde já se veem as ações de forças nazi-fascistas que semeiam o terror entre a população civil.

A Rússia está profundamente agradecida a nossos amigos chineses, por homenagearem e reverenciarem a memória dos milhões de compatriotas nossos que deram a vida pela libertação do noroeste da China, quando invadido.

No próximo ano, haverá uma série de celebrações conjuntas, de russos e chineses, por ocasião do 70º aniversário da vitória contra o nazifascismo europeu, tanto no formato bilaterial, como, também, no marco da Organização de Cooperação de Xangai. Daremos especial atenção ao trabalho com os jovens. Não há dúvida de que, sim, continuaremos a resistir contra todos os esforços para falsear a história e para converter em heróis, no século XXI, os nazifascistas e seus colaboradores, tentativa que já se vê em andamento, hoje, Ucrânia.


[fim da entrevista]

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