10/5/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
A IVa. Guerra Mundial |
Há doidos já dizendo que começou a IIIª
Guerra Mundial. “Doidos” no sentido de que essa ideia é impensável, indizível,
não mencionável, em tempos termonucleares. Mas as tensões, sim, estão-se
sobrepondo, nas relações entre as grandes potências.
É modo de dizer, mas Rússia e China,
essa semana, parecem estar na trilha de testarem os limites do poder dos EUA.
Por vias diferentes, Rússia e China estão “cutucando” a única superpotência na
região da Ásia-Pacífico. Pode não passar de simples coincidência, mas pode nada
ter a ver com coincidência e pode, sim, haver aí pensamento coordenado.
Relatos norte-americanos falam de
“aumento significativo” na atividade aérea russa e “muito mais” atividade em
águas na região do Pacífico Asiático num “show de força e para recolher
inteligência”. Especialistas norte-americanos dizem dessas atividades que elas “evocam
a Guerra Fria”.
Simultaneamente, as tensões espiralaram
aos céus no Mar do Sul da China, envolvendo a China, de um lado; e Vietnã e
Filipinas, do outro lado. Os especialistas abraçaram os diagnósticos pró um dos
lados e já se puseram a “declarar” que “Pequim está dando grande salto na
defesa de suas demandas territoriais, testando a decisão dos vizinhos armados –
e também dos EUA” – como se lia no Wall Street Journal.
Mas, se se examina mais de perto, os
dois desenvolvimentos parecem nada ter a ver um com o outro, e podem ser
eventos de caráter completamente diverso. Seja como for, a China parece ter
afastado para longe do Vietnã a sua plataforma de petróleo, e o bate-boca com
as Filipinas faz Manila aparecer como tola, por ter detido um barco chinês e
metido na cadeia 11 marinheiros por manter cativas algumas tartarugas – de
fato, 30, as quais, infelizmente, vieram a falecer.
Mar do Sul da China e o contorno da porção oceânica disputada |
Em resumo, Pequim parecia ter conseguido
“deter” Hanoi e está requerendo que Manila não seja desnecessariamente provocatória.
As declarações dos chineses revelaram que há registro de 171 incidentes com
barcos vietnamitas, que atropelam navios chineses.
O governo Obama, corretamente, pôs as
tensões do Sul da China sob a perspectiva devida, e conclamou os dois lados e
exercer a contensão e a moderação. Entrementes, os olhos de Washington estão
treinados para acompanhar a próxima visita do Secretário do Tesouro dos EUA,
Jacob Lew, a Pequim, amanhã, 3ª-feira (13/5/2014), como enviado especial do
presidente Barack Obama.
Lew é interlocutor chave para Pequim e
arquiteto do relacionamento EUA-China. Já tem audiência marcada com o
presidente Xi Jinping. Obviamente, há item gordo nessa agenda.
As tensões que envolvem a Rússia, por
sua vez, são diretamente rastreáveis até a crise na Ucrânia. A Rússia tem dado
passos calibrados milimetricamente, e distribuído ruídos que deixem claro que
suas capacidades militares existem e serão usadas, para evitar, assim, que EUA
e OTAN metam os pés pelas mãos. Isso, por um lado.
Ao mesmo tempo, bufar alto e forte, ar
quente e ar frio alternadamente, é tática útil para confundir o adversário
sobre as reais intenções do bufador. Fato é que na 6ª-feira (9/5/2014) o
presidente Vladimir
Putin viajou para a Crimeia (ato que Washington imediatamente criticou
como “provocatório e desnecessário”).
Vladimir Putin e veteranos da IIa Guerra Mundial depositam flores no Memorial dos Heróis em Sebastopol, Crimeia (9/5/2014 - Dia da Vitória) |
Mas a visita de Putin coincide com os 70
anos da libertação da Crimeia, pelo Exército Vermelho, derrotando a ocupação
nazista. Não há dúvida alguma de que a visita é riquíssima em simbologia
política, em vários sentidos, todos importantes.
E numa direção, em especial, essa visita
é muito, muito significativa, a saber: a visita de Putin à Crimeia cai
praticamente na véspera do referendo à moda da Crimeia, que está sendo planejado
pelos militantes pró-Rússia no leste da Ucrânia, a realizar-se domingo
(11/5/2014), para decidir sobre o futuro da região. (já se realizou e os
resultados são conhecidos, ver postagens anteriores, [Nrc]).
É altamente provável que o referendo
resulte em secessão, com a região optando por separar-se da Ucrânia. O mais provável
é que uma vasta fatia de terra, que cobre o leste e o sul da Ucrânia separe-se
do país e declare-se nova república da Confederação Russa, sob o nome de “Novorossiya”.
Em termos táticos, o referendo põe
abaixo a eleição presidencial marcada para 25 de maio de 2014 na Ucrânia, e que
é [seria] crucialmente importante para re-estabelecer em Kiev algum governo
eleito, representativo, que substitua o deposto presidente Viktor Yanukovich e
o presidente “interino” lá instalado ninguém sabe por quem, mas com o apoio dos
EUA.
Mas, diferente do que está fazendo em
relação à China, em relação à Rússia o governo Obama fez o mais absoluto
silêncio. Nem a volta de circunavegação do “Urso” em Guam, apitando na costa da
Califórnia faria Obama pegar o telefone e ligar para o Kremlin [Moscou já
anunciou que não atende telefonemas da Casa Branca, enquanto Kerry andar por lá
(NTs)].
Mas, aconteça o que acontecer, no
próximo dia 6 de junho de 2014, Obama não terá como esconder-se, no Desfile da
Vitória, em Paris. Será a primeira excursão de Putin para fora das fronteiras
russas, depois da reintegração da Crimeia na Federação Russa. As areias da
Normandia terão algum efeito curativo? Quantas e quantas almas circularão por
ali, naquelas praias. Rindo, provavelmente, dos “grandes líderes”.
[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira
do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do
Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É
especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia
e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian
Punchline. É o filho mais
velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e
militante de Kerala.
"É modo de dizer, mas Rússia e China, essa semana, parecem estar na trilha de testarem os limites do poder dos EUA."
ResponderExcluirEngraçado este senhor não citar os exercícios da OTAN ali, encostadinho da Rússia.
Para ele isso não é "teste de limites"?
Bom, este senhor, citando o WSJ, mostra o grau de "informação" que tem...
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirA diferença é que só agora China e Rússia "parecem estar na trilha de testar os limites do poder dos EUA", mas o que ficou subentendido é que " a única superpotência" está há MUITO TEMPO testando os limites de Rússia e China,,. Bhadrakumar é excelente analista de política internacional e usa os a mídia "main stream" como poucos, pois a informação SEMPRE pode ser encontrada mesmo distorcida, manipulada ou mesmo escondida. Aqui no bloguinho você pode encontrar várias traduções de artigos dele; é só usar o buscador.
ExcluirCaro Castor, eu acompanho Bhadrakhumar já há bastante tempo e tenho-o na lista de analistas responsáveis.
ExcluirEntretanto, este artigo dele, em particular, me deixou meio p(*).
Precisava citar o WSJ? Ele poderia passar muito bem sem isso.
Abração.