Advogada festejada na manchete da Folha de hoje é a cara e a voz da maior ameaça à liberdade de expressão na Internet brasileira.
Por Lino Bocchini, desabafando
Taís Gasparian, advogada da Folha, é a responsável maior pela manchete do jornal de hoje. Seguramente recebeu os efusivos parabéns de Otávio Frias Filho, ou pelo menos do diretor de redação do jornal, Sérgo Dávila. Não é para menos: graças ao seu empenho pessoal, o jornal terá acesso ao processo que o STM (Superior Tribunal Militar) mantinha sob sigilo. Segundo o presidente do Tribunal, Carlos Alberto Soares , o sigilo era para evitar o “uso político do material” no período eleitoral. Uma preocupação descabida em se tratando de um jornal sabidamente imparcial e ético como a Folha.
“O STM honrou com sua tradição liberal. É uma vitória um pouco óbvia, já que o processo jamais poderia ficar sob sigilo”, afirmou Taís ao jornal, que destacou a frase. Disse também, que não foi uma vitória da Folha, “e sim de toda a sociedade”. Arquivado desde 1970, o processo traz, entre outras coisas, detalhes sobre as torturas sofridas pela presidente eleita Dilma Roussef, e também as declarações que ela deu durante as seções de tortura, além das opiniões dos militares que a prenderam e a seviciaram por meses.
Permitam-me abrir um rápido parêntese pessoal: meu pai e minha mãe também foram torturados, como tantas outras pessoas que conheci ao longo da vida. Ouço relatos tenebrosos sobre isso desde criança. Não sei se Taís ou Otávio Frias Filho fazem alguma ideia do que é ser torturado, e do que uma pessoa pode (ou não) falar nessa situação. A bem da verdade, eu também não sei ao certo, só quem passou por isso sabe. Mas tenho a mais absoluta certeza de que a Folha, honrando sua tradição democrática, saberá ponderar tudo isso ao divulgar o material, e não irá tomar como verdade tudo o que os militares escreveram…
Volta fita para 2009. Naquele ano, a mesma Taís Gasparian ganhou outro belo processo em nome da liberdade de expressão. Foi quando defendeu José Simão de uma tentativa da atriz Juliana Paes de censurá-lo na Justiça, impedindo-o de fazer piadas e críticas à sua atuação. Ao vencer, Taís disse uma frase maravilhosa, publicada na Folha: “Tratar o humor como ilícito, no fim das contas, é a mesma coisa do que censura”. Assino embaixo.
Em setembro de 2010, Taís Gasparian assinou outra ação inédita e emblemática para quem se importa com a liberdade de expressão e de imprensa em nosso país: é de sua autoria um processo de 88 páginas que censurou o blog independente Falha de S.Paulo. A mando da Folha, Taís conseguiu duas liminares: a primeira contra eu e meu irmão nos obrigando a tirar o blog do ar, sob a desculpa de “uso indevido da marca”. A segunda liminar foi contra o Registro.br, órgão que administra todos os endereços terminados em .br, cassando assim o endereço “na fonte”, congelando-o para que ninguém mais o registre e impedindo que eu e meu irmão registremos qualquer outro domínio parecido com o nome Folha de S.Paulo. Não bastasse, a ação de Taís pede ainda uma indenização em dinheiro a título de danos morais, de valor a ser arbitrado pelo juiz em caso de vitória sua e do jornal (o que deve ocorrer, dada a competência da profissional).
A manchete de hoje da Folha explica ainda porque, convidada formalmente, Taís não compareceu ontem ao Fórum Internacional de Cultura Digital, que termina hoje na Cinemateca São Paulo.
O evento contou com 3 dias de debates e oficinas com todos os principais militantes e ativistas de liberdade de expressão na Internet e fora dela. Teve a presença de gente como Gilberto Gil ou de J.P. Barlow, ex-Grateful Dead, atual Eletronica Frontier Foundation e um dos principais ativistas mundiais pela liberdade na internet. Por duas horas e meia, ontem à noite, participei de uma discussão com Sérgio Amadeu, um dos maiores ativistas brasileiros pelo software livre e liberdade digital, e Guilherme Almeida, do Ministério da Justiça. Juntamente com mais 100 pessoas, debatemos justamente a ação de Taís. Não a do Tribunal Militar, mas sim a que se tornou emblemática por censurar um blog.
A preocupação geral dos presentes é que, na hipótese de uma provável vitória da Folha, abre-se um precedente horroroso e inaceitável. A Justiça estará dando um claro recado às demais grandes empresas do país, sejam de comunicação ou de outra área.
Quando um blog ou qualquer outro site pisar no seu calo, faça como a Folha: use a desculpa de uso indevido de imagem, alegue danos morais e pronto. Já haverá jurisprudência. Você conseguirá uma liminar imediatamente e quem te importunou ainda vai ter que morrer com uma bela grana pra aprender a nunca mais fazer isso.
Enfim, esse inédito processo elaborado e assinado por Taís Gasparian em nome da Folha (o tal “Jornal do Futuro”) irá inaugurar uma nova e perigosa forma de censura e intimidação entre os blogueiros, justamente a grande novidade na comunicação dos últimos tempos – esses sim, a imprensa do futuro.
Convido todos a se engajarem nessa dura tarefa de desmascarar o jornal e sua advogada-militante-da-liberdade-de-expressão.
Não pretendo assistir a essa hipocrisia gigantesca de Taís Gasparian e da Folha de braços cruzados. Não mesmo. Não nessa vida.
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