Complexo do Alemão - Traçado do Teleférico
*José Flávio Abelha
Toda a mídia brasileira, com as exceções de praxe (pouquíssimas) levou o brasileiro às raias de um surto coletivo com o pânico que esparramou, via satélite, urbe et orbi.
Espalhou o pânico no país em tal grau que o Brasil parou neste fim de semana, de sábado para domingo, para assistir à versão nova em cores da “Tomada de Monte Castelo”.
O pânico se espalhou de tal forma que, nos distritos mais longínquos, as pessoas não saíram de casa, algumas, nem as janelas abriram, com medo de bala perdida.
A invasão do chamado Complexo do Alemão era uma espécie de versão com efeitos especiais do episódio italiano de Monte Castelo.
Na manhã de sábado recebi um telefonema da minha mulher que estava em Belo Horizonte, implorando para que eu não saísse da nossa casa aqui em Niterói. Perguntou-me sobre o tempo e eu informei que o céu era de brigadeiro, azul maravilhoso. Sol de rebentar mamona e o pessoal nas praias. Mas eu teria de ficar em casa ante o perigo do conflito iminente.
Disse-lhe não era possível atender ao seu pedido. Eu estava de carro, na Linha Amarela, rumo ao Rio Centro para visitar a Feira da Providência.
O telefone ficou mudo. Acho que minha mulher desmaiou.
À noitinha, fui buscá-la do Santos Dummont, ambos tranqüilos, eu e o aeroporto. E tranqüilos, eu e minha mulher, rumamos para Piratininga enfrentando o trânsito caótico com tanta gente voltando da região oceânica depois de um dia de praia.
Resumo da ópera que a mídia desejava, a anunciada Tomada de Monte Castelo, com a carnificina que os nossos comunicadores anunciavam, frustrou-se.
E o que se viu foi repetição da famosa Batalha de Itararé.
Em 1930 as tropas de Vargas não foram molestadas e, agora, as tropas das gloriosas Forças Armadas repetiram o ocorrido na naquela época.
O arsenal da bandidagem, tão decantado pela mídia, foi esquecido na retirada humilhante, afinal, o recado aos chefões do tráfico fora muito claro pelos comandantes das três armas: da aeronáutica, nossos helicópteros estão armados com foguetes, mas não vamos dispará-los, da marinha, nossos tanques que rodam sobre lagartas e passam por cima de qualquer obstáculo servem para uma cobertura às forças policiais estaduais, e do exército surgiu o recado unificador e alertador: nossos homens estão portando armas de guerra, mas somente serão disparadas se formos atacados.
E o conjunto de forças, de mãos dadas, sitiou e depois entrou naquele território que era a casa do diabo: o Complexo do Alemão.
Enquanto isso o carioca estava curtindo um céu azul maravilhoso, um sol escaldante e um mar calmo. Praias lotadas contrastando com o resto, a maior parte, do Brasil, apavorado, assustado, em pânico provocado pela nossa eficiente, competente e ética mídia.
Desta ameaça midiática de uma carnificina surgiram pontos que eu já andei indicando em um pequeno texto sobre os parafusos bambos da máquina chamada Brasil.
Seria bom que, passada a Batalha de Itararé, nossos homens públicos refletissem mais antes de se pronunciarem.
Uma alta autoridade judiciária mandou dizer ao Brasil que "ainda existem juízes em Berlim"... E no Rio de Janeiro também e, pela primeira vez, decretou a prisão de intocáveis advogados, os pombos-correios, os parafusos bambos.
A vaidade andou campeando ao ponto de um líder comunitário criticar as UPP's como se elas fossem a salvação da lavoura. Não são não. Elas são a abertura da estrada que vai levar a paz e a presença do Estado aos morros dominados por marginais de alta periculosidade.
A finalidade é, tão somente, ganhar terreno.
Elas são os pára-quedistas que primeiro saltaram no planalto central para fazer uma clareira onde avionetas, os teco-tecos, pudessem levar as primeiras ferramentas para a construção de uma pista de pouco maior. Nesta, desciam os Douglas transportando pequenos tratores e, quatro anos depois, nascia Brasília, o sonho de Dom Bosco e do Presidente Juscelino.
Não fosse o cientista Sérgio Besserman Vianna explicar as verdadeiras funções das UPP's e o vaidoso líder, com uma pontinha de inveja por não ter dado palpites na engenharia dessa salvação da lavoura que o próprio Besserman havia ajudado a desenhar, teria azedado a entrevista global. De qualquer forma, saiu mal na foto.
O secretário Beltrame, com o seu ímpeto gauchesco declarou histórica a colaboração da Marinha e informou que o Exército não se pronunciara.
Nunca ouvi falar que cumprir o dever é um gesto histórico.
A resposta veio no ato, dada pelo Comandante, dizendo que não lhe fora pedido nada. De imediato o governador pediu ajuda e o Presidente Lula determinou que o Ministro da Defesa fornecesse o necessário ao governador.
Corre, agora, o Secretário Bletrame o desprazer de ver um afoito vereador propor mais um feriado para marcar o "histórico" dia.
A OAB, diante da descoberta dos pombos-correios, apenas disse serem necessárias mais provas, ao contrário de dizer que está certo quem mandou prender seus associados, pois são fora-da-lei, porém, o esprit de corps falou mais alto.
As ONG's caladinhas, não tugindo nem mugindo.
Dizem, hoje, que associações na Rocinha estão com medo de uma futura invasão das forças do Bem visando colocar ordem naquela grande comunidade, como se a Rocinha fosse o melhor dos mundos e não precisasse de uma UPP, ou várias.
O resto é o resto e foi debitado na conta da excitação dos focas e repórteres que repetiam, à exaustão, as mesmas notícias e as TVs reprisavam as mesmas cenas. O Brasil em pânico e o carioca na praia, aproveitando o domingo de sol.
As favelas sentindo o gostinho da cláusula pétrea da Constituição que dá a todos o direito de ir e vir... Sem pagar pedágio.
Muito político vendo seus currais eleitorais virarem fumaça... De pólvora.
E um Oscar para a Edith Head global que desenhou os elegantíssimos coletes a prova de balas com que os globais se apresentaram na frente da Batalha de Itararé!
E isso é só o começo.
No Rio de Janeiro existe milhares de favelas pedindo PAZ!
*Mineiro, autor de A MINEIRICE e outros livretes, reside na Restinga de Piratininga/Niterói, onde é Inspector of Ecology da empresa Soares Marinho Ltd. Quando o serviço permite o autor fica na janela vendo a banda passar.
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