sexta-feira, 19 de novembro de 2010

“71 milhões em dívidas. Esse foi o Clube que recebi de Marcelo Teixeira”

Em entrevista exclusiva ao jornal “A Tribuna”, de Santos, o atual Presidente do Santos Futebol Clube, fala sobre dívidas , rejeição de contas e até “leilão” dos craques.

Herança
Impostos e taxas 6.667.000,00
Empréstimos bancários 42.821.000,00
Empréstimos do Santa Cecília 15.610.000,00
Dívidas a jogadores 6.076.000,00
Fornecedores em atraso 791.000,00
Total 71.965.000,00

DA REDAÇÃO

O presidente do Santos, Luís Álvaro Ribeiro, diz que herdou de seu antecessor, Marcelo Teixeira, uma dívida de mais de R$ 71milhões. Eacusa o ex-presidente de ter gasto, em dois anos, R$ 20 milhões de juros. O presidente "peixeiro" rompeu um silêncio de 11 meses para, em entrevista exclusiva à A Tribuna, falar do calvário que tem enfrentado por causa da administração anterior, de Teixeira. Ele frisa que até agora se manteve "rigorosamente sob um recatado silêncio". E isso porque entende que "levar os assuntos internos do Santos ao conhecimento do grande público não costuma ser saudável para a instituição". Só mudou de idéia, entre outros motivos, porque Marcelo Teixeira levou o Santos às barras dos tribunais, "para cobrar uma dívida contraída por ele no passado, resultado de sua desastrosa gestão dos negócios financeiros do clube". A dívida que ele recebeu do antecessor, segundo Luis Álvaro, chega exatamente a R$ 71,965 milhões e é a soma dos seguintes itens: impostos e taxas não recolhidos, R$ 6,667 milhões; empréstimos bancários, R$ 42,82 milhões: fornecedores em atraso, R$ 791 mil; empréstimos da Universidade Santa Cecília, R$ 15,61 milhões; dívidas junto a jogadores, R$ 6,76 milhões.

Joias fatiadas
Além disso, "foram vendidos percentuais de sete atletas para um investidor (a DIS), incluindo nesse elenco Paulo Henrique Ganso, Wesley e André. Arrecadou com isso apenas R$ 3,85 milhões". Luís Álvaro compara: "Enquanto pagou (Marcelo Teixeira) 20 milhões de juros, cedeu ponderáveis fatias dos jogadores que notoriamente teriam sucesso, como esses três".

Vender as joias
O presidente relata uma proposta que recebeu, indiretamente, de seu antecessor: "Eu soube que havia interesse de se marcar uma reunião com a nova direção propondo a seguinte questão: o Santos prefere que sejam vendidos alguns atletas Neymar e Ganso, especificamente - e se zere o caixa ou entregue o caixa com o buraco que tem (R$ 71 milhões) e os atletas não sejam vendidos? Isso depois da eleição. Eu não fui oficialmente consultado, mas fui informalmente consultado se eu toparia participar de uma reunião, que eu não topei. Eu me recusei a ter esse tipo de conversa porque a venda de atletas formalmente é proibida pelo Conselho três meses antes das eleições. E os números que se falavam de Neymar e do Ganso estavam muito aquém daquilo que eu entendi que valiam. Então é você vender o jantar para comer o almoço."

Alívio?
Luís Álvaro comenta a dívida do Santos com a Universidade Santa Cecília, contraída por Teixeira: "Nós queríamos entender como é que essa dívida se deu. E porque ela aconteceu. Isso gerava um processo de investigação que levava algum tempo. Mas nós tínhamos confiado na palavra do presidente, com quem eu falei por telefone. Ele dizia, recorrentemente, desde o tempo em que eu era conselheiro, que o dinheiro devido à sua família não deveria ser objeto de nossa preocupação, porque não era um dinheiro necessário para sobrevivência deles. Que os interesses do Santos estava acima de tudo. Mas, surpreendentemente, me disse que se precisasse mais recursos dessa origem ele poderia levar à apreciação da família. Isso antes do Natal do ano passado. O que me deixou razoavelmente aliviado, porque pelo menos esses recursos não iam ser cobrados do Santos com a faca no pescoço".

Decepção
"Nós tínhamos confiado na palavra do presidente, com quem eu falei pelo telefone. Ele sempre dizia que o dinheiro devido à sua família não era problema. Não era necessário para a sobrevivência deles; os interesses do Santos estavam acima de tudo"

"Em qualquer atividade econômica, de uma banca de camelô a uma quitanda de bairro ou uma grande multinacional, ou mesmo na vida pessoal, quem gasta mais do que ganha quebra. E o Santos vinha fazendo isso"

Rejeição das contas
O presidente informa que Teixeira propôs um parcelamento da dívida do Santos com a Santa Cecília se as contas de sua gestão fossem aprovadas. "O Conselho Deliberativo se reuniu. A Comissão Fiscal examinou as contas auditadas (gestão Teixeira) e entendeu por reprová-las. Ele,Marcelo,e o seu conjunto de advogados, voltam a nos procurar, propondo um parcelamento em condições razoáveis de amortização. Mas exigindo, como condição "sine-qua-non", que o parecer da Comissão Fiscal fosse rejeitado e as contas dele aprovadas". Luís Álvaro explica sua postura no episódio: "Eu disse que eu não era membro da Comissão Fiscal, não era conselheiro em exercício. Portanto, eu não podia assumir nenhum compromisso em nome de terceiros. Ao contrário, eu entendia, por convicção e por ideologia, que o Conselho Deliberativo é um poder diferente do Poder Executivo. E essa promiscuidade do presidente do clube opinar ou exigir que a Comissão Fiscal seja composta por a, b ou c, ou que a Mesa seja indicada pelo presidente do clube, não era minha prática. Nem era minha visão de democracia. O plenário do Conselho manteve o parecer da Comissão Fiscal e rejeitou as contas".

Na justiça
Segundo Luís Álvaro, quando a proposta de Teixeira não foi aceita, ele ingressou na Justiça contra o Santos. Com a penhora de bens do clube e o bloqueio de suas contas. O presidente considera "incompreensível" a atitude do antecessor, porque "difere do discurso dele". Segundo esse discurso, "o Santos era o mais importante, os interesses da família eram menores".E cita:"Quando eu era conselheiro, perguntei um dia, na tribuna do Conselho, quanto o Santos devia a ele e a sua família. Ele respondeu (deve estar gravado) que isso não deveria ser objeto da nossa preocupação, porque a família tinha voluntariamente procurado ajudar o Santos e que o Santos era muito mais importante do que esse dinheiro emprestado. O que, aparentemente, me deixaria sossegado, não fosse o desenrolar da novela e a venda do elenco campeão de 2002 para, entre outras coisas, quitar dívidas que ele contraiu".

E os 200 milhões?
Luís Álvaro acusa Marcelo Teixeira de ter sido eleito em 2000 e contratar "medalhões", não aproveitando os meninos da base. "Vocês lembram, ele saiu comprando Márcio Santos, Rincón, Valdo, Edmundo, Marcelinho Carioca, Carlos Germano, jogadores de muita exposição, mas quase sempre no fim de carreira. Portanto, a política dele não era a de prestigiar os meninos. O técnico Leão declarou que em 2002 o Marcelo queria contratar mais medalhões e jogadores veteranos. Ele, Leão, recusou e disse que havia na base garotos muito bons. Agora ele (Marcelo) vem dizer que foi uma decisão dele dar chance aos meninos Elano, Diego, Alex etc. E que ele estranhou que, tendo sido vendido esse elenco, por 200 milhões de reais, afirmação dele, esse dinheiro tenha sumido e o Santos, ao fim de um tempo, estivesse devendo 71 milhões de reais."

Como quebrar
O presidente critica o antecessor por gastar sem controle quando esteve à frente do clube. "Nesses últimos anos o Santos tem gastado mais do que arrecada, de forma sistemática. Em qualquer atividade econômica, de uma banca de camelô a uma quitanda de bairro, ou uma grande multinacional, ou mesmo na vida pessoal, quem gasta mais do que ganha quebra, é inexorável". E dá uma pista, com base em um relatório preliminar de auditoria, de como os 200 milhões de reais viraram fumaça: "Grande parte desses recursos foi gasto em amortizações de dívidas, entre as quais a da própria família, nos pagamentos de juros e no pagamento de despesas correntes".

Presente de grego
Luís Álvaro conta, pela primei- ra vez, como foi o pior aniversário de sua vida. "No dia 16 de dezembro, o primeiro da minha gestão, às quatro da tarde recebi a informação de que o cofre estava vazio e que precisaríamos pagar, em 48 horas, R$ 5 milhões. Se não pagos, o Santos perderia os direitos econômicos de praticamente todo o elenco. Saí do clube às 11 da noite, com meu vice Odílio Rodrigues. Como eu, aparvalhado diante da situação que a gente tinha que enfrentar. Odílio me perguntou: é dia do seu aniversário, você vai jantar em algum lugar? Comi um sanduíche, tomei dois chopinhos e fui dormir. Nessa noite acordei doze vezes, uma das noites mais intranqüilas em toda minha vida.

Aos 48 do segundo tempo
O presidente acredita que Deus é torcedor do Santos. E dá suas razões: "Depois da eleição, fomos convidados para uma festa do Clube dos 13 na CBF. O ex-presidente não foi. E lá descobrimos que ele estava tentando sacar uma importância muito considerável em cima do Campeonato Brasileiro de 2010. A operação estava para ser concluída quando alguém me consultou. Eu mostrei que isso não era ético, não era razoável e não era sério. Conseguimos abortar essa operação".

Patético
As críticas de Luís Álvaro voltam-se, agora, para Milton Teixeira, pai de Marcelo e também ex-presidente: "Ele (Marcelo) cita, em matéria no seu site, que os méritos de 1978 (gestão Rubens Quintas, com os primeiros Meninos da Vila) devem ser creditados ao pai dele, que ganhou o campeonato paulista de 1984. Eu acho isso patético, para não dizer surrealista, porque quando o pai deixou de ser presidente em 84 a situação do Santos era tão absolutamente precária que não havia quem se dispusesse a se candidatar a presidente do Santos.
As disposições estatutárias foram comprometidas e acabou se descobrindo, para a presidência, alguém que não era torcedor do Santos. A partir daí foi o calvário de mais de uma década em que nós pagamos o preço da falta de responsabilidade na gestão dos recursos do clube. Só alterado de novo quando, por obra de um treinador com mais visão (Emerson Leão), nós usamos os jogadores da base para formar o time competitivoqueganhouotítulode2002".

Segunda divisão
O presidente "peixeiro" relembra "dois anos trágicos na história do Santos": 2008 e 2009. "Em 2008 fomos salvos do rebaixamento por um gol marcado por um atleta colocado por um investidor. Chutando a bola desastradamente na direção da bandeira de escanteio, ela resvalou no Gustavo Nery, que tinha sido revelado pelo Santos, entrou no gol e nos livrou da Série B. E no ano passado até às duas últimas rodadas nós eram os candidatos ao rebaixamento. E tínhamos trazido jogadores da Seleção Brasileira, como Emerson, por exemplo, em fase de ocaso de sua carreira. Enquanto isso, Neymar e Paulo Henrique eram considerados despreparados para assumir a titularidade do Santos. Um era alcunhados pelo então treinador (Luxemburgo) de filé de borboleta.O outro era considerado lento para o ritmo do Santos, ditado por Emerson, talvez mais capacitado fisicamente..."

CARLOS NOGUEIRA

B-8
Esportes
A TRIBUNA - Sexta-feira, 19 de novembro de 2010

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