9/7/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo
pessoal da Vila Vudu
Tom Malinowski - EXPULSO |
O Bahrain
expulsou do país um
alto funcionário do Departamento de Estado dos EUA – Tom Malinowski,
secretário-assistente – no curso da visita que fazia a Manama. É movimento
muito grave, que ofende o governo Obama e não pode ser simplesmente “apagado”
por alguma “desculpa” de porta-voz. Que um microscópico estado do Golfo – o
menor deles, de fato – ponha na rua, tão ousadamente, a única potência “indispensável”
era, antes de acontecer, impensável.
O Bahrain vive sob o guarda-chuva
político, econômico e de segurança de Riad, e é inconcebível que o gesto
beligerante de desafio ao governo Obama tenha acontecido sem conhecimento e
algum tipo de aceno, concordando, vindo dos sauditas. A questão é que o pessoal
em Manama, Bahrain, sabia muitíssimo bem que o trabalho de Malinowski no Departamento
de Estado é oferecer pregações de democracia e respeito aos direitos humanos a
qualquer governo do mundo acusado de atropelar aqueles itens: um dia é o
Bahrain, amanhã pode ser a Arábia Saudita.
É verdade que o Bahrain não poderia
impedir que Malinowski fosse a Manama em viagem “de inspeção”, quando
Washington aceitou a precondição que Manama impôs, de que um “elemento local”
estivesse presente em todas as reuniões de Maninowski com ativistas de direitos
humanos. Não se sabe exatamente o que aconteceu – se
(I) Malinowski desentendeu-se com esse “elemento
local” quando expunha ideias de tal modo “democráticas” em Manama, que o Emir
entrou em pânico; ou se
(II) fez contato com gente proibida; e
assim por diante.
A Vª Frota dos EUA está hospedada no Bahrain |
O caso é que, num dado momento, o
Bahrain decidiu que o nonsense não
poderia continuar. Os governantes do Bahrain são muito sensíveis à repressão
patrocinada pelo estado saudita e lançada contra a maioria xiita do país que
clama por justiça e direitos. Sobretudo agora, quando reaparecem, por toda a
região, as linhas de divisão sectária. O que aconteceu é que o Bahrain traçou
uma “linha vermelha” além da qual o governo Obama não poderá avançar.
Washington está examinando “uma série de
alternativas” para responder à ofensa que lhe fez o Bahrain. Mas Riad e Manama
com certeza consideraram os prós e contras da própria ação; e com certeza
concluíram que os EUA não podem fazer muito, na tal ‘'reação'’ – afinal de
contas, a Vª Frota dos EUA está ancorada no Bahrain.
O episódio mostra claramente que os
modelos de estratégia dos EUA começam a bater-cabeça, no Oriente Médio.
O pequeno Bahrain desafiou o “excepcionalismo”
dos EUA. Toda a região, agora, está postada para observar como Washington
reagirá ao desafio.
A Vª Frota (parte dela) dos EUA no Golfo Pérsico |
Pelo menos em parte, os governantes árabes
do Golfo estão-se mostrando assim tão ousados por causa da polarização na
política norte-americana. Obama está sob fogo por causa de suas políticas para
o Oriente Médio, e os Republicanos criticam-no por ter abandonado tradicionais
aliados dos EUA no mundo árabe, como Hosni Mubarak do Egito ou o rei Abdullah
da Arábia Saudita.
O desafio que o Bahrain fez aos EUA não
é caso isolado. Dito de modo simplificado, os aliados árabes dos EUA estão
ficando cada vez mais agitados, incomodados e falantes, cada vez mais fora de
controle. Os nervos estão em frangalhos, para tudo que tenha a ver com “Primavera
Árabe”. Na Síria e no Egito já houve desafio no nível estratégico.
Outro caso: Washington disse
recentemente a Bagdá que só lhe aumentará o poder de fogo contra o Estado
Islâmico do Iraque e Levante (ISIS/ISIL/DAASH/EIIL),
se houver mudança de governo. O primeiro-ministro Nouri al-Maliki simplesmente
ignorou a “proposta”; e obteve dos russos e iranianos os jatos de ataque de que
carecia.
Rabo balança o cachorro |
Israel, claro, sempre foi a lei em si, e
é caso especial de rabo que balança o cachorro, mas os árabes do Golfo
não podem aspirar a alcançar o nível de Israel. As oligarquias do Golfo estão
absolutamente minadas por dentro, o poder ali não têm legitimidade alguma e
sempre, quando a coisa apertou, contaram com a proteção dos EUA.
E o petrodólar é um cordão umbilical que
liga aquelas oligarquias ao sistema bancário ocidental. A dependência é mútua,
se as coisas são postas no plano da reciclagem do petrodólar.
Em anos recentes, também a Turquia tem
dado sinais de fazer as coisas à sua maneira, ignorando aconselhamento dos EUA,
mas isso também é desafio cuidadosamente calibrado, que visa mais a
impressionar o público interno dentro da Turquia (o que um partido islâmico
pode fazer para defender a honra nacional). Mas, sim, a Turquia é membro da
OTAN, e agudamente consciente de sua identidade “europeia”.
Agora, o Afeganistão torna-se a mais
recente caso no Oriente Médio Expandido no qual a influência regional dos EUA
será testada. Será que os candidatos rivais no segundo turno das eleições
presidenciais – Abdullah Abdullah e Ashraf Ghani – ouvirão os graves avisos que
Washington deu-lhes, sobre ou mostrarem contenção ou deixarem as coisas como
sempre foram no bazaar afegão desde tempos imemoriais? (Mas isso exige
explicação à parte).
[*]
MK Bhadrakumar foi diplomata
de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do Oriente Médio, Afeganistão e Paquistão e
escreve sobre temas de geopolítica, de energia e de segurança para várias
publicações, dentre as quais The
Hindu, Ásia Times Online, Al Jazeera,
Counterpunch, Information Clearing House,Common
Dreams, Strategic Culture e muitas
outras. Anima o blog Indian Punchline no sítio
Rediff BLOGS. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor,
jornalista, tradutor e militante de Kerala, Índia.
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