20/2/2013, Paul R. Pillar, Consortium News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Paul R Pillar |
Os dois maiores produtores
mundiais de pistache são os Estados Unidos e Irã. Eles se defrontam
comercialmente há mais de três décadas. Agora, ficamos sabendo que Israel tem
preferência pela variedade iraniana e até o Primeiro-Ministro Netanyahu dispõe
de rubrica orçamentária especial para sorvete de pistache, escreve o ex-analista da CIA Paul R. Pillar.
Os pistaches são, há muito tempo, um
dos principais itens de exportação do Irã, depois do petróleo. Por isso, quando
o governo Clinton, em seu último ano no poder, quis dar um passo de
reaproximação com o Irã, lá estavam os pistaches.
Pistache ou Pistachio |
Em discurso, a secretária de
Estado Madeleine Albright, depois de relembrar alguns dos
movimentos que o Irã teria feito contra os EUA, anunciou o fim da proibição de
importar pistaches do Irã; além dos pistaches, foram liberadas as importações de
caviar e tapetes iranianos. A iniciativa deu em nada, porque os iranianos
ofenderam-se com uma referência, naquela fala da secretária, a “mãos não
eleitas” que governariam o Irã. Mas serve para lembrar a importância dessa noz
esverdeada, de casca castanha, e, sobretudo, a importância, para o Irã, da
exportação dos pistaches.
Madeleine Albright |
13 anos e uma montanha de sanções
depois, não deixa de surpreender que o regime iraniano esteja proibindo – por
seis meses – a exportação de pistaches. Pela explicação oficial, a proibição
visaria a forçar para baixo os preços domésticos dos pistaches – que subiram
muito, no bojo da inflação exacerbada pelas sanções que atormenta a economia
iraniana.
O preço doméstico dos pistaches
estaria sendo considerado especialmente importante, agora que se aproxima o Ano
Novo iraniano, quando muitos iranianos comprarão muitos pistaches para suas
festas familiares. Outra
explicação, não oficial, seria que o regime
estaria tentando forçar os produtores de pistache a aceitar reduções voluntárias
no preço, mas não estaria obtendo a cooperação desejada. A proibição de exportar
seria um meio de forçar os plantadores recalcitrantes.
Seja porque não funcionou, seja
porque o regime concluiu que seria mais danosa para o próprio Irã, fato é que,
pouco depois, a
proibição foi revogada. Os produtores iranianos temeram que
a curta interrupção das importações implicasse perda de espaço no mercado,
difícil de recuperar. Seu principal concorrente nesse mercado – o país que é o
segundo maior exportador mundial de pistaches e nos últimos anos já ameaça a
primazia iraniana – é os EUA. Os dois países, que furiosamente se encaram na
questão de um programa nuclear e em gravíssimas disputas de segurança no Golfo
Persa, vivem engalfinhados também na disputa pelo mercado mundial de
pistaches.
O quadro vai ficando cada vez mais
interessante, se se considera também o país que mais consome pistaches per
capita em todo o mundo – e que é também o país que mais assopra o fogo sob o
caldeirão da questão nuclear iraniana: Israel. Por estranho que pareça hoje,
dada a incansável campanha israelense para pressionar e isolar o Irã, há pouco
tempo eram os EUA que faziam lobby para que Israel parasse de importar
pistaches iranianos.
Oficialmente, Israel nada importa do
Irã, já há algum tempo. Mas o comércio do pistache parece incontrolável, e
sabe-se que não faltam pistaches iranianos em Israel, lá chegados através da
Turquia e por outras rotas. No governo Clinton, voltando a ele, a secretária
Albright muito se dedicou ao caso.
Em
instruções que enviou à embaixada dos EUA em Israel, três anos antes daquele
discurso sobre Irã e pistaches, o Departamento de Estado anotava que:
“Relatórios sobre pistaches iranianos à venda
em Israel (...) são causa de crescente preocupação. Se se considera o objetivo
fixado por Israel, sobre a necessidade de a comunidade internacional pressionar
e isolar economicamente o Irã (...), a importação de pistache iraniano é
inaceitável”.
Colheita de pistache em San Joaquin Valley, CA |
O lobby norte-americano
sobre Israel, nesse quesito, não foi motivado apenas, nem basicamente, pela
preocupação com agir contra o Irã. O lobby manifestava, exclusivamente a
força
dos plantadores de pistache no San Joaquin Valley, na
Califórnia, interessados em conquistar parte
mais substanciosa do lucrativo mercado israelense.
Israel negou que houvesse qualquer
problema, mas, pelo sim pelo não, aumentou os esforços para quebrar as pernas,
digamos, dos pistaches ilegalmente importados. Israel impôs tarifa especial
sobre todos os pistaches não norte-americanos, para tornar mais equilibrada a
concorrência entre os preços dos produtores iranianos e
norte-americanos.
Apesar dessas medidas, a questão
não foi superada. Adiante, já no governo Bush, os EUA
ainda discutiam pistaches com Israel. Mesmo sem diferença nos preços, o
consumidor israelense continuava a preferir pistaches iranianos. “Todo mundo
sabe que o gosto é muito melhor” – disse,
em Israel, o atacadista Moshe Mussafi.
Pistache iraniano enlatado para exportação |
A cereja do bolo, nessa história, é
uma notícia do fim de semana passado, matéria de primeira página na imprensa de
Israel, segundo a qual o Primeiro-Ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, gasta,
só em pistaches que consome em casa, pagos com dinheiro público previsto no
orçamento nacional, o total de $2.700 por ano. O sorvete é fornecido por um
restaurante gourmet próximo à residência do Primeiro-Ministro: sempre
sabor pistache.
A história está sendo explorada,
sobretudo por adversários políticos de Netanyahu: uma extravagância
injustificável, sobretudo quando os israelenses são conclamados a observar a
mais estrita austeridade. O ponto de vista dos iranianos parece não interessar a
ninguém, e artigo
do New York Times sobre o tema informa que o sorvete
de pistache não é, “presumivelmente”, fabricado com pistaches
iranianos.
Mas
há aí questões de gosto. E as dificuldades para coibir o comércio de pistaches
iranianos, que prossegue em Israel, ininterrupto, há vários anos, tornam
bastante duvidoso esse “presumivelmente”.
Netanyahu e seu sorvete de pistache |
Muitíssimo mais provável, isso sim,
é que Netanyahu, quando relaxa frente ao seu sorvete preferido, depois do
jantar, coma pistaches plantados, cultivados e colhidos na província de
Kerman.
Não
há “moral da história” a extrair disso tudo, mas vêm à cabeça algumas
observações:
Primeiro, que se intrometer entre forças do
mercado pode levar a consequências estranhíssimas.
Segundo, que sanções, em geral, podem ter
efeitos inusitados ou provocar respostas não previstas. Políticas que, ao que se
supõe, têm amplos objetivos diplomáticos, respondem, muitas vezes, a interesses
bem paroquiais, sobretudo econômicos.
Terceiro, que os pistaches, como a política
e a miséria, produzem estranhos parceiros de cama, ou, no mínimo, estranhas
linhas de conflito e de cooperação.
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