21/2/2013, MK Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Sergey Lavrov anuncia conversações de paz na Síria ao lado de Mohamed Kamel Amr |
A
Rússia
deu grande e importante passo para consertar as pontes com a Liga Árabe, com uma
minuta de um Plano de Ação para o Fórum Russo-Árabe (FRA) [orig.
Action
Plan for the Russian-Arab Forum
[RAF]).
O
FRA foi deixado à espera, enquanto as relações da Rússia com a Arábia Saudita e
o Qatar desmontaram-se, com o advento do conflito na Síria e as inúmeras
incertezas que surgiram no Oriente Médio trazidas pela Primavera Árabe.
O
Plano de Ação afirma que não há contradições fundamentais entre a Rússia e o
mundo árabe, no que tenha a ver com as questões nucleares do conflito entre
árabes e israelenses e do problema palestino, ou quanto ao estabelecimento no
Oriente Médio, de zona sem armas nucleares e de “cooperação internacional na
esfera da energia nuclear pacífica”.
Clara indicação de que o conflito
na Síria caminha para negociações políticas, e de que a Rússia espera
desempenhar papel decisivo no processo, é que a primeira reunião do FRA tenha
acontecido em Moscou, na 4ª-feira. A declaração
conjunta distribuída depois da reunião destaca um alto grau de
convergência no que
tenha a ver com a situação síria.
Os
dois lados rejeitaram intervenção estrangeira e reafirmam seu respeito à
soberania, independência, integridade territorial e unidade da Síria; mais
importante que isso, já tocaram em modalidades de “transição” para a Síria.
Sugeriram
que se deve iniciar um processo político, depois de imediato cessar-fogo, o que
levará “a formar um corpo de governo de transição com plenos poderes executivos
para atravessar o período de transição e transferir o poder em prazo a ser
acordado”. Claro: “todos os sírios” devem participar no processo político.
Interessante,
a declaração conjunta cita o Comunicado de Genebra, de junho de 2012, como base
fundamental do processo de paz. (A Rússia argumentou, consistentemente, que o
regime sírio deve também participar do processo de paz).
Walid al-Mualem |
O ministro de Relações Exteriores
da Rússia, Sergey Lavrov, disse, depois da reunião do Fórum Rússia-Árabes, que
Moscou deseja hospedar um diálogo entre os
próprios sírios.
O ministro sírio de Relações Exteriores, Walid al-Mualem é esperado em Moscou na
2ª-feira; e também já se cogita de visita à Rússia, em março, do líder da
oposição síria, Moaz al-Khatib.
As
coisas parecem estar começando a melhorar. O Ministério de Relações Exteriores
em Moscou já parece arriscar-se a anunciar boas novas: “Hoje [5ª-feira] ouvimos
que há sinais de movimentação rumo a um diálogo entre o governo sírio e a
oposição”.
Além
do mais, o MRE da Rússia tuitou as
seguintes observações, atribuídas a Lavrov:
Nós
[a Rússia] fizemos belo trabalho para convencer a liderança síria a cooperar com
a liga árabe, à base desse iniciativa.
E
em seguida:
A
Rússia apoiou a ideia de enviar observadores da Liga Árabe à Síria.
E
outra vez, interessante:
Importante
é que a prontidão para o diálogo manifestada pela oposição síria foi respondida
com igual prontidão pelo governo.
Nabil al-Arabi |
Lavrov
“convocou” fortemente o regime sírio, na presença do Secretário-Geral da Liga
Árabe, Nabil al-Arabi (que estava em Moscou na 4ª-feira, para a reunião do FRA):
A
necessidade de iniciar um diálogo torna-se cada dia mais clara. Nenhum dos dois
lado pode permitir-se apostar em solução militar, que é caminho para lugar
algum, uma via para a autodestruição.
Significativamente,
o Ministro de Relações Exteriores do Egito, Mohamed Kamel Amr participou da
reunião do Fórum Rússia-Árabes. É a segunda visita de Amr a Moscou, nos últimos
dois meses. O Egito deve assumir agora a presidência rotativa da Liga Árabe.
As
atenções agora se mudam para Roma, onde, na 5ª e 6ª-feiras, reúnem-se os países
que clamam por “mudança de regime” na Síria – EUA, Grã-Bretanha, França,
Alemanha, Qatar, Arábia Saudita, Turquia, etc. Será a primeira vez em que se
verá o novo Secretário de Estado dos EUA John Kerry
em
ação oficial, na questão síria.
Com
as pombas da paz ansiando por abrir asas e decolar rumo aos céus de Moscou, o
encontro em Roma terá de haver-se com a adequação ou não de insistir em bater os
tambores de guerra. Ações dos EUA para armar os rebeldes sírios parecem hoje
ainda mais improváveis.
Isso
posto, e apesar de retiradas táticas, a estratégia dos EUA não mudou
fundamentalmente. A prioridade imediata será trabalhar para formar um governo de
transição na Síria que não seja “antiocidente” e que Washington espera conseguir
influenciar.
Ao
mesmo tempo, os EUA esperam que as forças do governo sírio e os radicais
islamistas continuem a enfraquecer-se mutuamente, e que, a cada dia
enfraqueçam-se mais. Do ponto de vista dos EUA, a era pós-Bashar al-Assad já
pode começar, apesar de o espectro da al-Qaeda instilar dúvidas sobre qualquer
apressamento na dinâmica em campo.
O
coração da questão é que a crise síria já modificou o equilíbrio estratégico
regional. A ruptura nos laços entre o Hamás e Damasco, o surgimento de tensões
sectárias entre xiitas e sunitas, o isolamento do Irã no mundo árabe – são
condições que já mostraram inabalável potencial para “gerenciar” a crise síria
num largo espectro, com vistas a calibrar outras questões regionais, como a
questão nuclear do Irã, o problema palestino, a intransigência dos israelenses,
etc..
Principal objetivo da missão dos Patriots na Turquia: proteger o radar da OTAN |
Mais uma vez, em escala mais
ampla, o conflito sírio já ofereceu o álibi para que os EUA instalem seu sistema
de mísseis de defesa na Turquia, embora, de fato, o objetivo real seja outro
(como se lê no jornal do Departamento de Defesa dos EUA, 20/2/2013, “Patriots' Main Mission in Turkey: Protect NATO Radar” [Principal objetivo da
missão dos Patriots na Turquia: proteger o radar da OTAN]).
MK
Bhadrakumar*
foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas
de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu, Asia Online e Indian
Punchline. É o filho mais
velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e
militante de Kerala.
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