25/2/2013, Rasha Sadek,
Al-Ahram Weekly, Cairo
Traduzido p[elo pessoal da Vila Vudu
Praça Tahrir durante o Ramadã em setembro de 2012 |
TAHRIR
A
Praça Tahrir, no Cairo, foi o lar icônico da Revolução desde que irrompeu, dia
25/1/2011. Durante os 18 dias de revolta, antes da deposição do ex-presidente
Hosni Mubarak, Tahrir deu voz às demandas de todos os grupos da opinião pública
revolucionária, que pediam pão, liberdade, justiça social e o fim de um regime
que se arrastava por 30 anos, já decadente. Gente de todo o espectro social,
político e econômico acorreu ao epicentro da cidade do Cairo, às vezes, aos
milhões. Estavam decididos. Eram unidos.
Durante
os últimos dois anos, Tahrir viveu dias de celebração e dias de luto. Muitos
foram mortos ali pelas forças de segurança de Mubarak. Montaram-se hospitais de
campanha na praça e em torno da praça para tratar manifestantes contra os quais
se lançavam bombas lacrimogêneas, canhões de água e tiros de munição real, ou
feridos pela polícia ou por soldados do exército. Os funerais dos mártires da
Revolução – os mortos nos sangrentos eventos da Batalha do Camelo, nos
confrontos na rua Mohamed Mahmoud e diante do prédio do Gabinete – também várias
vezes cruzaram a praça. Tahrir foi o centro de uma nação tomada de euforia
quando Mubarak foi afinal expulso da presidência, dia 11/2/2011.
Durante
18 dias, até que Mubarak afinal partisse, Tahrir mostrou uma face do Egito que o
mundo jamais vira. Durante o dia, a multidão enfrentava os ataques das forças de
segurança; à noite, as pessoas sentavam-se em círculos, discutindo o futuro e as
mudanças que a revolução teria de trazer. Cozinhavam, lavavam as panelas e
tomavam banho na praça. Cantavam, às vezes a capella, às vezes
acompanhando um violão, ou assistiam a concertos improvisados de Rami Essam, que
ficou conhecido como “o cantor da Revolução”. Recitavam poemas em que
denunciavam a injustiça e a corrupção do governo Mubarak, o assassinato de
companheiros, ou que pintavam um futuro risonho, otimista, do amanhã, já sem
Mubarak.
Praça Tahrir em 11/2/2013 no segundo aniversário da Revolução |
A
Praça Tahrir realmente conquistou a imaginação do mundo, ainda mais depois que
os revolucionários, em gesto civilizado, limparam e repintaram a praça antes de,
afinal, partirem, dia 12/2/ 2011. Contudo, poucos meses depois, já surgiam
fissuras entre os revolucionários. Começaram as divisões políticas, e Tahrir
nunca mais ecoou demandas unificadas. Passou a manifestar, isso sim, o grito de
uma nação dividida entre, de um lado, um governo de religiosos, da Fraternidade
Muçulmana, dos salafistas e de outras forças islamistas e de militares do
Conselho Supremo das Forças Armadas [orig. Supreme Council of the Armed
Forces (SCAF), que estava encarregado da fase de transição, mas que, de
fato, era a continuação de 60 anos de governo militar; e, de outro lado, um
governo civil. E todos, sempre, sob ameaças de que o país despencava num abismo
econômico. Cada um desses dois grandes blocos organizou seus comícios e “marchas
de milhões” na Praça Tahrir, os dois lados decididos a mostrar que era o mais
forte.
A
“Sexta-feira da Reunião”, dia 29/7/2011 foi organizada para unir todas as
forças, sob plataforma única de demandas. Mas, naquele dia, desde cedo, centenas
de milhares de afiliados das forças islamistas tomaram a praça, cercando-a e
impedindo a entrada dos demais grupos. Ergueram bandeiras negras e chamaram de
ateus os que falavam de democracia e os liberais em geral. O dia terminou com a
mídia falando de uma “Sexta-feira de Kandahar” – cidade afegã governadas por
islamistas conservadores, e para onde convergiam, atraídos como por um imã,
organizações como a Al-Qaeda e os Talibã. Dia 2/11/2011, aconteceu o segundo ato
organizado pelos islamistas, sob o mote de “6ª-feira de aplicar a Xaria”, que
outros chamaram de “Kandahar II”.
No
primeiro aniversário da Revolução, a Praça Tahrir viu chegar mais marchas
organizadas por forças revolucionárias. Repetiram os cantos da Revolução, a qual
ainda não atendera nenhuma das demandas revolucionárias. Do outro lado da praça,
forças islamistas celebravam uma recente vitória no número de eleitos para o
Parlamento. E, organizados pelos militares do SCAF, outros manifestantes
exigiam, também na Praça Tahrir, a antecipação das eleições presidenciais, com
muitos ainda sem terem definido o que queriam que viesse antes, as eleições, ou
a redação de uma nova Constituição.
Mohamed Mursi |
Quando
o candidato da Fraternidade Muçulmana, Mohamed Mursi, foi anunciado presidente,
dia 24/6/2012, com pequena margem de 49% dos votos, os islamistas acorreram à
Praça Tahrir para celebrar. O próprio Mursi lá esteve, foi empossado à vista do
povo e anunciou que “os objetivos da Revolução foram, afinal, conquistados”. As
forças revolucionárias, liberais em geral e outras, deixaram-se ficar à margem
da cena, chorando o que chamavam de “a morte da Revolução”.
Dia
22/11/2012, a Praça Tahrir voltou a brilhar. As pessoas outra vez convergiram
para o ponto onde a Revolução nascera, para rejeitar furiosamente a declaração
constitucional, assinada por Mursi, que lhe dava poderes ditatoriais e o punha
acima da lei. A declaração também blindava a Assembleia Constituinte, super
recheada de islamistas, encarregada de redigir a nova Constituição, e o Conselho
da Shura, contra qualquer processo judicial que contestasse sua
legitimidade; e expulsava ilegalmente o Procurador-Geral do país, Abdel-Meguid
Mahmoud; para seu lugar foi nomeado Tallat Abdallah, da Fraternidade Muçulmana.
Organizou-se
imediatamente um sit-in, ou acampamento: montaram-se cerca de 250 tendas,
na praça e em torno da praça. Mais de 30 partidos políticos, além de grupos
civis e movimentos revolucionários e sindicatos de todos os governoratos
egípcios integraram-se à manifestação. Havia ali até indivíduos e grupos sem
qualquer filiação política. Eram pelo menos 1.500 manifestantes acampados na
Praça Tahrir; o número dobrou depois que se intensificaram os ataques das forças
de segurança; e ultrapassou 1 milhão de manifestantes em ocasiões especiais,
como, dia 30/11, na “Sexta-feira do Sonho do Mártir”.
Os
protestos cresceram quando Mursi deu à Assembleia Constituinte – da qual já se
haviam retirado representantes da sociedade civil e da mesquita de Al-Azhar, em
sinal de protesto contra a dominação pelos islamistas – prazo de dois meses para
acabar de redigir a nova Constituição, para dar tempo de os partidos renitentes
reconsiderarem e voltarem à Assembleia. Mas passadas apenas 48 horas, a
Assembleia Constituinte deu por concluídos os seus trabalhos e exibiu projeto de
Constituição, de 236 artigos, pondo fim a qualquer esperança de outras forças,
além dos islamistas, participassem do trabalho de redigir a nova Constituição do
Egito. Mursi, imediatamente, convocou um referendo, para dia 15/12, ignorando
todas as demandas de grupos não islâmicos, que contavam com adiar o referendo
até que fosse possível construir algum consenso popular.
Esse
clima político foi o combustível que voltou a energizar os protestos em Tahrir.
Dessa vez, havia unidade nas demandas: ou Mursi revogava a declaração
constitucional e adiava o referendo, ou “Fora Mursi”. Mas nada aconteceu. O
referendo foi realizado na data prevista, e a Constituição foi aprovada com
63,8% de votos a favor.
Hoje,
os manifestantes continuam na Praça. E Mursi continua de costas viradas para
eles.
O
PALÁCIO PRESIDENCIAL AL-ITTIHADIYA
Localizado
na rua Al-Mirghani, no elegante bairro de Heliópolis, o palácio presidencial
Al-Ittihadiya não havia sido local de protestos até recentemente (na noite em
que Mubarak foi deposto, houve celebrações frente ao palácio), quando já haviam
fracassado todas as demais tentativas de chamar a atenção do presidente.
A
controversa declaração constitucional que Mursi assinou dia 22/11 incomodou
muita gente, fora dos círculos islamistas. Houve uma primeira manifestação,
exigindo que Mursi anulasse o decreto. Duas semanas depois, nada mudara. Estava
acabando o tempo, sobretudo depois que Mursi marcou para 15/12 o referendo para
aprovar a nova Constituição.
Dia
4/11, várias marchas, de vários pontos do Cairo, dirigiram-se para o palácio
presidencial. Esperavam-se poucas centenas de manifestantes. Mas às 20h, quando
todas as marchas já haviam chegado, a cena era impressionante. Operadores de
celulares informaram que registraram mais de 700 mil chamadas da região próxima
ao palácio. Homens, mulheres, jovens e velhos, ricos, pobres, maltrapilhos, de
todo o espectro social e econômica estavam à frente de Al-Ittihadiya. Já não
cantavam nem exigiam a revogação da declaração constitucional: pediam o fim do
governo Mursi e da Fraternidade Muçulmana.
Protesto em frente o palácio de Al-Ittihadiya (sede do governo egípcio) em 4/12/2012 |
As
forças de segurança, a polícia antitumultos, a Guarda Presidencial e
funcionários do Ministério do Interior estavam no palácio. O palácio estava
muito fortemente protegido, com rolos de arame farpado que mantinham os
manifestantes à distância. Correndo grave risco, jovens manifestantes puseram-se
a empurrar os rolos de arame farpado; as forças de segurança responderam com
bombas de gás lacrimogêneo. Por um momento, o país prendeu a respiração, vendo
delinear-se ali um cenário dos mais desastrosos. A multidão recuou, procurando
abrigo nas ruelas estreitas em volta de Al-Mirghani.
Na cabeça de todos havia medo e morte.
Aos
poucos, com a fumaça das bombas já dispersa no ar, ouviram-se gritos de que já
era possível voltar à frente do palácio. Para surpresa geral, as forças de
segurança haviam sumido, deixando o palácio presidencial sem qualquer proteção.
A multidão festejou, aos gritos, a notícia de que Mursi, aparentemente,
escapulira pela porta dos fundos, realmente assustado ante a ameaça daquela
enorme multidão. Em minutos, os manifestantes formaram uma corrente humana em
torno do palácio Al-Ittihadiya. Quisessem, poderiam ter invadido e ocupado o
palácio, mas decidiram não fazê-lo. Em vez disso, grafitaram as paredes externas
com imagens dos mártires e slogans contra Mursi e seu grupo.
Enquanto
parte dos manifestantes anunciavam que permaneceriam acampados em frente ao
palácio até que Mursi respondesse suas exigências, a Frente de Salvação
Nacional, de oposição, deu um ultimato ao presidente: 48 horas para anular a
declaração constitucional.
No
dia seguinte, às 3h da tarde, com dezenas manifestantes pacificamente acampados
à frente do palácio, as milícias islamistas atacaram. Rasgaram as tendas e
espancaram os manifestantes, inclusive mulheres. No início da noite, o número de
islamista aumentara; e também aumentara o número de manifestantes. As milícias
portavam facas, porretes, pistolas e munição real e gás lacrimogêneo. Os
manifestantes portavam pedras. As Forças da Segurança Central foram chamadas,
mas não intervieram. Lá ficaram, assistindo a uma batalha sangrenta entre os
dois grupos, que continuou até as primeiras horas do dia seguinte. Houve oito
mortos e mais de 750 feridos.
Batalha Campal entre manifestantes e FFAA, em frente ao Ministério da Defesa |
Dia
7/12, os manifestantes voltaram, dessa vez em maior número. Outra vez,
grafitaram as paredes externas do palácio – que haviam sido pintadas pelos
islamistas, não por funcionários municipais –, com slogans contra Mursi. E outra
vez acamparam frente ao palácio, erguendo cartazes que diziam “fora a
Fraternidade Muçulmana” e “fora o supremo líder”. Esse acampamento lá está,
frente ao palácio presidencial, até hoje.
O
JUDICIÁRIO
O
prédio da Suprema Corte Constitucional [orig. Supreme Constitutional Court
(SCC)] dá frente para a Corniche Maadi. Como a mais alta autoridade judicial
no Egito, a SCC é respeitada em todo o mundo, mas é vista pelos islamistas
egípcios como instituição que se mantém fiel a Mubarak. A SCC deu posse a Mursi
na presidência dia 30/6/2012, mas, para grande desgosto dos islamistas, logo no
mês seguinte ordenou que o Parlamento, no qual os islamistas são maioria, fosse
desconstituído. Desde então, os islamistas vivem às turras com o SCC. Começou na
noite de 1º/12, quando Mursi marcou o referendo da nova Constituição.
Durante
a manifestação que os islamistas chamam de “protesto de um milhão” na praça
Al-Nahda em Gizé – espaço onde não cabem nem 50 mil pessoas, segundo o
governador de Gizé – e que não passou de manifestação de força, sob o pretexto
de apoio ao presidente e às suas decisões, líderes islamistas convocaram seus
seguidores para uma manifestação em frente ao prédio da SCC, dia seguinte, antes
de a Corte dar seu veredicto em dois processos muito discutidos: um contestava a
constitucionalidade da lei sobre eleições para o Conselho da Shura –
dominado pelos islamistas; o outro contestava a legitimidade da Assembleia
Constituinte que, dia 29/11, havia atropeladamente aprovado o projeto de nova
Constituição (depois que forças civis, cristãs e da mesquita Al-Azhar
desligaram-se da Assembleia , em protesto contra a dominação pelos islamistas.
Dezenas
de islamistas partiram imediatamente para o prédio da SCC; mas, na manhã
seguinte, na manhã de 2/12, já eram milhares. Apesar da presença de forças
policiais, os juízes da SCC nem conseguiram entrar no prédio, cujas entradas
foram bloqueadas pelos islamistas, alguns dos quais escalaram as cercas externas
e pularam para dentro do pátio de entrada. A SCC descreveu aquele domingo como
“o pior dia de toda a história do judiciário”. Pela primeira vez na história, a
Corte Suprema egípcia decidiu suspender seus trabalhos por tempo indefinido;
disseram que “não voltaremos a trabalhar até que os juízes possam julgar sem
pressões psicológicas ou materiais”.
Na
calçada, em frente ao prédio, os islamistas celebraram sua “vitória”, com cantos
e slogans em que atacavam os juízes e as forças de oposição. Um desses cantos
dizia “Mursi nos deu a pista. Vamos levar p’rá vocês, num caixão”. Exibindo
fotos do presidente, descreviam-se como “os verdadeiros revolucionários” e
Mursi, seu legítimo representante. Para os islamistas, a Corte Suprema deveria
ter encerrado os dois processos imediatamente depois de Mursi assinar o decreto
constitucional que tornava imunes a qualquer contestação judicial o Conselho da
Shura e a Assembleia Constituinte.
Manifestantes islamistas em frente à Suprema Corte no Cairo em 12/2/2013 |
Os
juízes entraram em greve, seguindo o exemplo de outros juízes e procuradores que
pararam de trabalhar em protesto contra o decreto de Mursi que, para eles, “mina
a autoridade judicial”. O Clube dos Juízes, sindicato com 9.500 membros,
solidarizou-se com os demais juízes e anunciou que não supervisionaria o
referendo constitucional. Os círculos judiciais já enfrentavam forte turbulência
nesse front, sobretudo depois que
forças islamistas organizaram manifestações em frente Supremo Tribunal
Judicial , exigindo a demissão do Procurador-Geral, Abdel-Meguid
Mahmoud, indicado por Mubarak, o qual, afinal, foi demitido pela declaração de
22/11. Comentando as manifestações contra a Corte Suprema, o pesquisador
político Amr Hamzawy disse que “o presidente e seu grupo estão arrastando o
Egito para um período par excellence de obscurantismo (...) Tomou uma
decisão ditatorial de fazer um referendo para legalizar um projeto ilegal de
constituição que divide a sociedade. E, agora, pôs o Judiciário sob sítio, para
aterrorizá-lo”.
Apesar
de os islamistas terem, em boa parte, conseguido o que queriam, nem por isso
desocuparam a área que cerca o prédio da Corte Suprema. Havia barracas em torno
do cordão de segurança instalado pela Polícia, e algumas centenas de islamistas
permaneceram lá, para garantir que a Corte Suprema não voltasse a reunir-se.
Depois de 24 dias de manifestações, o resultado do referendo sobre a
Constituição foi afinal anunciado: 63,8% dos votantes votaram “sim”. Só depois
disso, e depois de terem comemorado o resultado in situ, os islamistas
afinal levantaram acampamento.
A
última vez que os juízes egípcios declararam-se em greve geral foi durante a
Revolução de 1919, quando se uniram ao levante popular contra o governo colonial
britânico.
A
MÍDIA
Dia
6/12/2012, centenas de islamistas fizeram uma manifestação na Media Production City [aprox. “Cidade de
Produção”], localizada nos arredores da cidade do Cairo. Foram 17 grupos
fundamentalistas comandados pelo movimento Hazemoun, de seguidores do salafista
Hazem Salah Abu Ismail, derrotado nas eleições presidenciais de março. Os
islamistas declararam que a manifestação era “protesto contra a corrupção da
mídia atéia”, e exigiram “o expurgo dos veículos hostis, sem razão
compreensível, aos islamistas”, nas palavras do próprio Abu Ismail. Os
manifestantes anunciaram que não deixariam o local até que a nova Constituição
estivesse confirmada pelo referendo.
As
manhãs dos islamistas ali reunidos começavam com rezas e citações do Corão; e as
tardes eram dedicadas a cantos contra a mídia, não raras vezes insultantes.
Figuras de destaque a imprensa egípcia como Ibrahim Eissa, Lamis Al-Hadidi e Amr
Adib receberam a parte mais substanciosa das ameaças e insultos. E à noite os
manifestantes matavam ovelhas e camelos; um dos camelos mortos fora usado num
filme de publicidade e havia queixa de que teria sido roubado de dentro da
Cidade de Produção.
A
manifestação e acampamento dos islamistas provocou fúria entre jornalistas e
figuras da mídia, que os denunciaram como “tentativa de intimidar a mídia e
fazê-la calar”. Denunciaram-nos também como ameaça direta à segurança de
jornalistas, no trajeto de chegar e sair do trabalho. Os islamistas insistiram
que a manifestação seria pacífica, apesar de o carro do diretor Khaled Youssef
ter sido apedrejado, no percurso para chegar à Cidade de Produção.
Entrada da Egyptian Media Production City |
Poucos
dias depois de iniciada a manifestação dos islamistas na Cidade de Produção, um
dos canais por satélite que transmitem de lá recebeu um telefonema –
retransmitido ao vivo – de um líder islamista que participava da manifestação. A
voz ameaçava que as forças islamistas “atacarão a Cidade de Produção, se canais
privados continuarem a divulgar ideias enviesadas contra os islamistas”. Dia
seguinte, Gamal Saber, organizador do movimento Hazemoun e porta-voz dos
manifestantes disse ao jornal Al-Masry Al-Youm que “não passou de ameaça.
Não planejamos qualquer ataque. Só queremos encostar a espada do medo e do
terror no pescoço dos corruptos da mídia, essa gente que escreve contra o
presidente Mursi e os islamistas”.
Manifestantes em frente ao EMPC |
Dia
14/12, e contra os planos iniciais, os islamistas decidiram pôr fim à
manifestação e ao acampamento, para votar, dia seguinte, a favor do projeto de
Constituição. Por ironia, o dia em que os islamistas acamparam à entrada da
Cidade de Produção de Mídia foi o mesmo dia em que Essam Al-Amir ,
presidente da televisão estatal, renunciava ao posto, em protesto contra “a
islamização da mídia”. Um dia antes da renúncia, houvera confrontos violentos no
palácio presidencial, depois que islamistas atacaram manifestantes pacíficos.
Al-Amir disse que “a televisão estatal apresentou um lado da história,
claramente enviesada a favor dos islamistas, o que não surpreende ninguém, dado
que o Ministro da Informação, Salah Abdel-Maksoud, é membro da Fraternidade
Muçulmana”.
CIDADE
DE MAHALLA
Mahalla,
localizada no governadorato de Gharbiya, é considerada um dos núcleos da
revolta, hoje, no Egito. Cidade industrial, com vasta população de trabalhadores
nas indústrias têxteis, Mahalla teve e tem papel de destaque no Egito pré e
pós-revolucionário.
Trabalhadores téxteis em Mahalla "enterram" Mursi |
Dia
27/11/2012, 5.000 trabalhadores da empresa de fiação e tecelagem Misr Spinning & Weaving Company
marcharam até a Praça Shon em Mahalla em protesto contra “a declaração
ditatorial de Mursi do dia 22 de novembro, seguida, três dias depois, por seu
decreto de intervenção no trabalho” – disse Sayed Habib, ativista da defesa de
direitos trabalhistas do Centro Sindical dos Trabalhadores em Mahalla. “O decreto
relativo ao trabalho favorece a hegemonia da Fraternidade, acima dos sindicatos.
Esse é o objetivo da ordem para que sindicalistas com idade superior a 60 anos
sejam demitidos da Federação dos Sindicatos, para serem substituídos por novos
membros indicados”.
Esse
era o contexto sob o qual os trabalhadores de Mahalla marcharam para a Praça
Shon, cantando “Mursi, espere! Mahalla cavará sua sepultura” e “Fora o governo
do supremo líder”. Foram recebidos por apoiadores dos islamistas armados com
coquetéis molotov, tiros e pedradas.
Os
trabalhadores de Mahalla revidaram, e houve batalha feroz, com coquetéis molotov jogados pelos islamistas e
jogados de volta, sobre os islamistas, pelos operários. Nem a chuva de granadas
de gás lacrimogêneo, colaboração das forças de segurança que acorreram ao local,
conseguiu dispersar os grupos em luta. A batalha durou toda a noite e fez, pelo
menos, 400 feridos.
Dia
7/12, algumas poucas centenas de operários sindicalizados de Mahalla marcharam
até o prédio do conselho municipal e declararam “a independência de Mahalla”. A
“República Independente da Grande Mahalla” foi uma reação aos sangrentos
confrontos do dia 5/12 no palácio presidencial Al-Ittihadiya. A independência de
Mahalla, que não é vista como movimento secessionista, foi gesto que manifestou
oposição ao regime de Mursi e da Fraternidade Muçulmana.
Dois
dias depois, sindicatos e moradores de Mahalla reuniram-se na Praça Shon para
celebrar seu novo estado autônomo e denunciar o regime reinante. Cantavam
“Levante a cabeça! Você é de Mahalla!” e “Fora o governo da Fraternidade
Muçulmana”. A praça vibrava. A mensagem, clara, era que “não nos deixaremos
aterrorizar pelas milícias da Fraternidade”. Em discurso à multidão, Fathi
Abdel-Hamid da Federação Independente de Aposentados, disse que “cá estamos para
declarara que não toleraremos governantes que nos sangrem para manter-se no
poder”. George Ishak, ex-líder do Movimento Kifaya, acrescentou que “a
Fraternidade Muçulmana está arrastando o Egito na direção de converter-se
em estado
fascista. Não toleraremos nenhum fascismo.” Pelas paredes da
cidade surgiram grafittis, desenhados por furiosos moradores da cidade,
nos quais se lia “Mahalla, território livre. Aqui a Fraternidade não manda”.
Esse
ato nominal de independência nasceu em cidade que tem longa tradição de
dissidência. Mahalla é considerada cidade na qual predomina uma cultura já
histórica de revolta contra a injustiça e a corrupção. Em dezembro de 2006 e em
abril de 2008, dezenas de milhares de operários do setor têxtil conduziram uma
intifada contra os baixos salários e as terríveis condições
em que viviam.
A intifada alastrou-se, com mais de 650 manifestações e
acampadas ao longo de 2007, dos quais participaram quase 200 mil
trabalhadores de praticamente todos os setores da economia da região. É opinião
amplamente difundida e aceita no Egito, que as rebeliões de Mahalla estão na
raiz da Revolução de 25 de janeiro, consideradas precursoras.
BAIRRO
DE
ABBASIYA
O
bairro de Abbasiya, no Cairo, foi cenário de vários eventos graves. Em novembro
de 2011, aconteceram em Abbasiya as manifestações pró-SCAF, promovidas pelo
jornalista e âncora de noticiários de televisão Tawfik Okasha, do canal Faraeen
de TV por satélite. Um mês depois, durante outra manifestação pró-SCAF, os
altofalantes tocavam música e grupos dançavam em círculo, enquanto, no mesmo
momento, em outro ponto do bairro, na rua Qasr Al-Aini, aconteciam confrontos
mortais entre manifestantes e forças do exército.
Abbasiya, no Cairo, foi cenário de vários eventos graves |
Dia
27/4/2012, Abbasiya encaminhava-se para mais um confronto sangrento, o qual,
contudo, só aconteceria uma semana depois. Apoiadores de Hazem Salah Abu Ismail,
islamista e candidato à presidência, e outras forças islamistas e de esquerda
haviam-se reunido aos milhares em Abbasiya, próximos de onde está localizado o
Ministério da Defesa, sempre pesadamente fortificado, para protestar contra o
fim da candidatura de Abu Ismail à presidência. Exigiam a dissolução da Comissão
para Eleições Presidenciais (PEC); e a anulação do artigo 28 da declaração
constitucional provisória, do SCAF, que proibira qualquer tipo de recurso
judicial contra decisões da PEC.
No
início da manifestação e acampada, instalada sem data para terminar, os
manifestantes de Abbasiya atraíram algumas simpatias, mas não dos moradores e
residentes da área. Houve inúmeros confrontos entre grupos, praticamente todos
os dias. Mas ao amanhecer do dia 1º de maio, grupos de milicianos armados com
facas, punhais e armas de vários calibres, atacaram os manifestantes: houve 11
mortos. O clamor entre os manifestantes aumentou, convocando para a “6ª-feira da
Grande Marcha” sobre o Ministério da Defesa, agendada para o dia 4 de maio. E os
generais do SCAF, que até aí se haviam limitado a observar à distância, lançaram
dura declaração, na qual ameaçavam contra qualquer tentativa de alguém se
aproximar daquela “toca dos leões”.
Na
6ª-feira, o número de manifestantes reunidos em Abbasiya havia aumentado.
Cantavam slogans a favor da derrubada do SCAF e de seu líder Hussein Tantawi. Um
manifestante pulou a cerca de arame farpado que cercava o prédio do Ministério
da Defesa. Era o que os soldados esperavam, para atacar. Usaram canhões de água
e granadas de gás lacrimogêneo. Os manifestantes reagiram com pedradas. Cerca de
300 manifestantes foram presos; outros foram caçados na fuga pela rua Ramsés até
a mesquita Nour, e espancados; e, segundo relatos dos militares, um soldado foi
morto a tiros e centenas de policiais militares e das forças antitumultos foram
feridos.
RUA
MOHAMED MAHMOUD
Dia
19/11/2011, eclodiram os confrontos na rua Mohamed Mahmoud, uma das ruas que
partem da Praça Tahrir, depois que forças de segurança tentaram evacuar a praça
à força. Os combates arrastaram-se por cinco dias; resultaram daí 42
manifestantes mortos e centenas de feridos. Todos foram atacados com gás
lacrimogêneo, porretes, balas revestidas de borracha e munição real. Os combates
da rua Mohamed Mahmoud foram particularmente terríveis por causa de atiradores
instalados pelas forças de segurança em pontos estratégicos e que, ao que
parece, atiravam contra os olhos dos manifestantes, usando balas de borracha. O
Comando Superior das Forças Armadas, SCAF, justificou a violência, anunciando
que “todos, na Praça Tahrir, são agitadores e criminosos, não são manifestantes
pacíficos”.
Confrontos na rua Mohamed Mahmoud |
Um
ano depois desses confrontos, as feridas permaneciam abertas no coração e na
mente dos manifestantes. Organizaram manifestação para a rua Mohamed Mahmoud,
que aconteceu dia 19/11/ 2012, para homenagear os mártires e sua contribuição
para a Revolução, e para exigir punição para os agressores. Os agressores do ano
anterior, novamente se posicionaram. Um dos manifestantes, de 17 anos, Gaber
Salah, conhecido como “Jika”, recebeu um tiro na cabeça, nos combates que
imediatamente se reiniciaram contra as forças de segurança; morreu alguns dias
adiante. A morte de Jika foi prova, para muitos, de que, fosse em governo de
Mubarak ou em governo de Mursi , nada
mudara nem no SCAF nem no Egito.
O
GABINETE
Depois
dos combates na rua Mohamed Mahmoud em 2011, manifestantes reuniram-se em nova
acampada frente ao prédio do Gabinete, na rua Qasr Al-Aini, para protestar
contra a nomeação de Kamal Al-Ganzouri para o cargo de primeiro-ministro, pelo
SCAF. Na terceira semana dessas manifestações, na madrugada do dia 16/12, um
manifestante foi espancado por forças militares dentro do prédio do Gabinete,
ação que reacendeu a ira dos manifestantes.
Milhares
de manifestantes convergiram para a entrada do prédio, exigindo a deposição do
SCAF. Seguiu-se batalha feroz entre soldados armados e manifestantes. A
violência do exército provocou a morte de quatro manifestantes, entre os quais o
Xeique Emad Effat, clérigo de Dar Al-Iftaa, e ferimentos em mais de 250. Nesse
dia, a brutalidade do exército contra os manifestantes ficou manifesta quando
soldados arrastaram uma mulher pela rua, de modo que ela teve expostas partes de
seu corpo e roupas íntimas, para os que lá estavam e, também, para as câmeras de
televisão.
Praça Tahrir, protestos contra o Presidente Mohamed Mursi em 23/12/2012 |
Os
combates à frente do prédio do Gabinete continuaram por uma semana, com o
exército perseguindo manifestantes pela rua Rihan, na praça Tahrir e em Qasr
Al-Aini e destruindo e incendiando vários hospitais de campanha. Nesses combates
morreram 17 manifestantes e houve mais de 1.000 feridos. No curso desses
eventos, o Instituto Egípcio de Ciências, que tem importante biblioteca de
livros raros, foi incendiado. O SCAF acusou manifestantes, pelo incêndio; e os
manifestantes, que se declararam inocentes, acusaram as milícias islamistas
também ativas naqueles confrontos.
Na
6ª-feira, 23/12, dezenas de milhares de manifestantes reuniram-se na praça, para
uma manifestação que chamaram de “6ª-feira das Mulheres Livres”, para denunciar
crimes contra as mulheres e contra manifestantes em geral, praticados por
soldados do exército. Levavam esquifes simbólicos, como homenagem aos mártires.
Simultaneamente,
no bairro de Abbasiya, realizava-se comício de apoio ao Conselho Superior das
Forças Armadas.
MASPERO
Maspero
é a região do Cairo onde se localizam a sede da rádio e televisão estatais. Mas,
depois da Revolução, passou a ser local de protesto dos coptas contra ataques às
suas comunidades, inclusive as bombas que explodiram na Igreja dos Dois Santos,
em Alexandria, nos primeiros minutos de 2011; o incêndio na Igreja do Sol em
Muqattam; e a profanação da Igreja de Mar Mina, em Imbaba, em maio do mesmo ano.
Os coptas sentiram ameaçada a sua liberdade de culto e protestavam contra a
erosão de seus direitos civis.
Maspero Building |
Obtiveram
imediatamente algum consolo, porque muçulmanos logo se aliaram a eles. Ergueram
cruzes em Maspero e cartazes em que se lia “com muçulmanos e coptas, de mãos
dadas, construiremos um Egito grande e forte”.
O
mais sangrento dos confrontos em Maspero aconteceu dia 9/10/2011, quando uma
passeata quase exclusivamente de cristãos acabou encurralada entre grupos de
milícias islamistas e de soldados. Atacados com porretes e à bala, os
manifestantes, como sempre, reagiram com pedradas. Um blindado do exército
avançou em alta velocidade contra a multidão, soldados incendiaram carros e
manifestantes incendiaram veículos do exército.
Enquanto
isso, em transmissões ao vivo, a rádio e a televisão estatal exortavam os
“cidadãos a acorrer a Maspero, para proteger os soldados que estavam sendo
atacados pelos coptas.” Naquela noite morrera 27 coptas.
No
primeiro aniversário da Revolução, aconteceram em Maspero várias manifestações
anti-SCAF. A Praça Tahrir estava lotada de islamistas que celebravam a vitória
nas eleições parlamentares, sem espaço para quem não estivesse convencido de que
a Revolução alcançara seus objetivos. Para reanimar o ímpeto revolucionário, a
esses só restou rumar para Maspero, onde acamparam por duas semanas, a exigir o
fim do conselho militar superior; indenização para as famílias dos mortos; e
antecipação das eleições presidenciais, marcadas para junho de 2012.
Os
manifestantes também exigiam “o expurgo dos veículos de mídia, que só fazem
obedecer ao que lhes ordena o governo e não passam de porta-vozes dos
militares”. No quinto dia desse acampamento, os manifestantes foram atacados por
milícias com pedras, porretes e garrafas de água; houve grande número de
feridos. Vários grupos foram acusados dessas agressões, mas até hoje não se
conhece o verdadeiro responsável.
PRAÇA
MUSTAFA MAHMOUD E ROXY
Aí
se realizaram comícios pró-Mubarak ou manifestações de apoio ao SCAF em
2011-2012.
A praça Mustafa Mahmoud em Mohandessin foi onde se
reuniram grupos antirrevolucionários dia 28/1/2011. Autodenominavam-se “Filhos
de Mubarak” e desejavam que seu “pai espiritual” permanecesse no poder, pelo
menos até concluir o mandato, em setembro de 2011.
Manifestação pró-Mursi na Praça Mahmoud |
Mas
seus hinos de aviso contra a instabilidade e o caos que viriam se Mubarak
partisse acabaram sufocados pelas vozes que vinham da praça Tahrir, exigiam
mudanças. Durante alguns dias, uns poucos milhares de pessoas reunidas na Praça
Mustafa Mahmoud mantiveram agenda leve: apareciam ao meio dia e partiam no final
da tarde. Mas, depois, a Praça Mustafa Mahmoud tornou-se ponto de encontro das
forças revolucionárias, antes de partirem para as passeatas ou manifestações em
outros pontos da cidade.
Os
apoiadores de Mubarak sumiram da Praça Mustafa Mahmoud. Só reapareceram no
verão, num bairro residencial de classe alta em Heliópolis, na Praça Roxy. Nessa
ressurreição, já não eram apoiadores de Mubarak, mas do SCAF. Embora não
passassem de poucas dúzias, diziam falar por toda “a maioria silenciosa”.
Carregavam faixas exigindo estabilidade e discursavam em termos nostálgicos
sobre a era Mubarak. Durante algumas semanas, apareceram regularmente na Praça
Roxy às sextas-feiras. Em seguida, calaram-se ou a voz deles desapareceu no
alarido das vozes revolucionárias.
ALEXANDRIA
Alexandria,
cidade mediterrânea, desempenhou papel central desde os primeiros momentos da
Revolução. A Praça Al-Qaed Ibrahim, na Corniche, fazia eco aos cantos que vinham
da Praça Tahrir, e repetia as mesmas demandas. Mantiveram ativo ali o espírito
revolucionário por dois anos, sem se deixar dominar por um ou outro grupo. Na
Praça Al-Qaed só se ouviam, incansáveis, os objetivos da Revolução, com cuidado
para preservar um equilíbrio moderado. E assim foi, até que, há dois meses,
grupos islamistas realizaram ali um comício de apoio ao decreto de Mursi.
Passeata de 1 milhão de pessoas na Praça Al-Qaed Ibrahim em Alexandria em 2/12/2012 |
Alexandria
teve sua cota de escaramuças contra as forças de segurança, contra islamistas e
contra mercenários armados. Dia 1/12/2012, na Praça Sidi Gaber, milícias
mercenárias, armadas com punhais, pedras e garrafas quebradas, atacaram comício
organizado por movimentos civis solidários às acampadas da Praça Tahrir e contra
a Constituição islamista. As Forças Centrais de Segurança conseguiram conter os
tumultos. O partido Liberdade e Justiça, da Fraternidade Muçulmana, negou que
tivesse enviado apoiadores para aquele local.
Dia
5/12, enquanto os que protestavam à frente do palácio presidencial no Cairo eram
atacados por milícias islamistas, em Alexandria vários grupos reuniram-se
rapidamente na Praça Sidi Gaber, para denunciar a violência dos islamistas,
quando se tratava de enfrentar diferenças políticas. A bandeira, em Alexandria,
era “o povo quer verdadeira democracia. Pão, liberdade e o fim da Assembleia
Constituinte”.
Dia
21/12, irromperam confrontos à frente da mesquita Al-Qaed Ibrahim, na Corniche,
entre apoiadores e opositores do projeto de Constituição. A luta começou depois
que o pregador Ahmed Al-Mahalawi conclamou os fiéis a votar “sim” no referendo
sobre a Constituição; disse que “assim alcançaremos a estabilidade tão
longamente almejada”.
Segundo
relato de testemunhas presentes na mesquita, um dos fiéis levantou-se e cantou
“abaixo o governo do supremo líder”. Pelo que se pôde ver, foi cercado,
espancado e arrastado, com dois que o acompanhavam, para dentro da mesquita, por
membros da Fraternidade Muçulmana. Do lado de fora da mesquita, barbudos
afiliados a grupos islamistas armados com espadas, punhais, coquetéis molotov e
pedras lutavam contra opositores. Morreram nove, e houve centenas de feridos.
Na
6ª-feira seguinte, declarada “Sexta-feira de Proteger Mesquitas e Pregadores”,
islamistas de vários governadoratos chegaram à mesquita Al-Qaed Ibrahim, em
Alexandria, para reforçar a defesa contra os inimigos. Impediram que pessoas sem
ligação com os grupos islamistas entrassem na mesquita para orar. Depois das
orações, a luta irrompeu. Mas os islamistas, quase todos do grupo salafista
Hazemoun estavam em minoria. As batalhas de rua prosseguiram até o dia seguinte.
À noite, quando os islamistas escaparam para ruas laterais, os manifestantes
locais incendiaram seus ônibus.
Até
a semana passada ainda havia combates em Alexandria. Dia 19 de janeiro,
manifestantes anti-Fraternidade Muçulmana e familiares dos mártires enfrentaram
a polícia em frente ao prédio da Corte Judicial em Manshiya, durante o
julgamento de alguns acusados da morte de revolucionários em Alexandria. Bombas
de gás lacrimogêneo foram lançadas contra os manifestantes. Até agora, a
indenização às famílias dos que morreram durante a Revolução Egípcia continua a
ser demanda sempre repetida e jamais atendida.
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